O Dia Mundial da Doença de Fenilcetonúria, lembrado neste 28 de junho, quando também se celebra o Dia Internacional do Teste do Pezinho, tem o intuito de conscientizar a sociedade sobre a patologia, também conhecida como PKU (na sigla em inglês).

Essa doença crônica rara é causada por uma mutação genética que faz com que os portadores não consigam metabolizar a fenilalanina, levando ao acúmulo deste aminoácido que, em grandes quantidades no sangue, tem efeito tóxico.

“A doença metabólica rara reduz a produção de substâncias cerebrais e sistêmicas importantes. O maior problema do acúmulo da fenilalanina no sangue é o efeito tóxico que pode causar no cérebro, capaz de estabelecer lesões permanentes”, afirma Renata França Braga, nutricionista da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Anápolis (GO).

Os recém-nascidos que têm fenilcetonúria não apresentam sintomas, porém, sem tratamento podem desenvolver sinais da doença logo nos primeiros dias de vida, como problemas comportamentais ou sociais, convulsões, tremores ou espasmos nos braços e pernas, hiperatividades, alteração no crescimento, microcefalia e odor desagradável na respiração, pele ou urina, causado pelo excesso da fenilalanina no organismo.

“Crianças com a forma mais grave de PKU podem desenvolver deficiência intelectual permanente se não receberem tratamento e acompanhamento adequado por toda a vida”, alerta Mônica Aderaldo, presidente da Federação das Associações de Doenças Raras do Norte, Nordeste e Centro Oeste (Fedrann).

Fenilcetonúria pode ser diagnosticada no Teste do Pezinho

Segundo Renata, é de extrema importância a triagem neonatal – conhecida como o Teste do Pezinho, que tem como objetivo diagnosticar precocemente doenças que não apresentam sintomas no nascimento. “O diagnóstico precoce e o tratamento multidisciplinar são fundamentais para uma melhor qualidade de vida.

Há mais de 30 anos, foi determinado que todo recém-nascido no Brasil deve realizar o “Teste do Pezinho”. Se não forem detectadas e tratadas cedo, podem causar sérios danos à saúde. Este rastreamento é o modo mais eficaz de diagnosticar a doença.

“Desde a obrigatoriedade do exame, houve um grande aumento nos diagnósticos precoces de PKU, entretanto essas pessoas ainda têm um grande desafio pela frente: acesso ao tratamento adequado”, ressalta Mônica Aderaldo, presidente da Federação das Associações de Doenças Raras do Norte, Nordeste e Centro Oeste (Fedrann).

Tratamento da fenilcetonúria prevê restrição de alimentos

Atualmente, o principal tratamento consiste na restrição do consumo de alimentos ricos em proteínas e que possuem altas quantidade de fenilalanina, como carnes, leites, ovos, grãos, pães, massas e chocolates, por exemplo. “Uma dieta restrita em fenilalanina, se iniciada cedo, bem mantida, associado ao uso das fórmulas permite um bom desenvolvimento”, ressalta Renata.

Ao mesmo tempo que os pacientes conseguem evitar o consumo do aminoácido, acabam também se privando de consumir outros nutrientes importantes para a saúde. Com isso, foram criadas algumas fórmulas metabólicas específicas que suplementam esses nutrientes de acordo com as exigências de cada pessoa.

“Apesar de parecermos ter uma solução plausível para a restrição alimentar, infelizmente ainda precisamos lidar com alguns contratempos: a falta desses suplementos, ou seja, há mais demanda do que oferta, e há uma recorrência de casos de intolerância a lactose após o uso dessas fórmulas, restringindo o seu uso em certos casos”, afirma Mônica Aderaldo, presidente da Fedrann.

Anvisa aprova nova medicação, mas custo elevado impede oferta

Fora a possibilidade do manejo da PKU pela dieta alimentar, existe também outra forma de tratamento já aprovada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), a medicação Kuvan (dicloridrato de sapropterina), indicada para pacientes a partir de 30 dias de vida.

Segundo Mônica, o medicamento consegue controlar a patologia em 30% dos casos, evitando assim complicações nas funções motoras e cognitivas nos pacientes, além de diminuir, mesmo que um pouco, a restrição alimentar.

Desde 2018, no entanto, a orientação contida no Protocolo Clínico e Diretriz Terapêutica (PCDT) do Ministério da Saúde para a doença recomenda o seu uso apenas para mulheres portadoras da condição em caso de gravidez. Isso porque durante a gestação, o excesso de fenilalanina no cérebro é tóxico também para o feto, podendo resultar em microcefalia e deficiência intelectual mesmo quando o bebê não tem a doença.

Assim, segundo a especialista, infelizmente os pacientes que não se enquadram neste perfil descrito no PCDT ficam desatendidos e precisam seguir uma dieta alimentar extremamente restrita e que, sem a suplementação adequada, se torna prejudicial.

Na tentativa de rever o atual PCDT e ampliar a disponibilidade dessa terapia medicamentosa na rede pública, foi realizada uma submissão na Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS), que acabou recebendo um parecer negativo em que a justificativa foi pautada pela falta de estudos e o custo elevado da medicação.

Doença crônica requer cuidados vitalícios

“Sabemos que por se tratar de uma enfermidade rara, estamos lidando com populações pequenas, o que dificulta termos um grande volume de evidências. Já em relação ao custo, não são todos os pacientes elegíveis ao medicamento, o que diminui a quantidade de pacientes que utilizariam a terapia”, destaca Mônica Aderaldo.

Segundo ela, com o conhecimento de que quanto maior a concentração do aminoácido no sangue, maior a gravidade da doença e urgência no tratamento. “É inaceitável que uma pessoa seja privada de receber o medicamento que deveria ser fornecido por toda a vida, uma vez que estamos falando de uma doença crônica e que requer acompanhamento vitalício”, ressalta.

Para a presidente da Fedrann, o tratamento medicamentoso acaba se tornando uma esperança para essas pessoas, pois com ele conseguem diminuir a restrição de alimentos e ter mais qualidade de vida.

“Ter acesso a um cuidado adequado é um direito de todos, ainda mais em um cenário que já conseguimos ter diagnósticos precoces, pois de nada adianta identificarmos a doença e não conseguirmos controlá-la”.

Mitos e verdades sobre a fenilcetonúria

Cientificamente, Renata explica o que significa a PKU. “Doença de herança autossômica, a fenilcetonúria tem um defeito metabólico, gerado da enzima hepática fenilalanina hidroxilase, que leva ao acúmulo do aminoácido fenilalanina (FAL) no sangue e ao aumento da excreção urinária de ácido fenilpirúvico”, esclarece.

Segundo a nutricionista, conhecer alguns mitos e verdades sobre essa doença rara é essencial para que as capacidades e realidades das pessoas com PKU sejam compreendidas.

  • O rastreamento neonatal é o modo mais eficaz de diagnosticar fenilcetonúria

Verdade. A coleta de sangue deve ser feita preferencialmente entre 48 horas[i] e cinco dias de vida completos após exposição à dieta proteica, ou seja, aleitamento materno. Os recém-nascidos com níveis elevados de fenilalanina são encaminhados para avaliação diagnóstica, conforme recomenda o Programa Nacional de Triagem Neonatal, do Ministério da Saúde. Caso confirmado o diagnóstico de fenilcetonúria, o tratamento deve ser iniciado.

  • O tratamento consiste somente em uma dieta restrita

Mito. O tratamento consiste na adoção de uma dieta com baixo teor em fenilalanina associada ao uso da fórmula metabólica e, em alguns casos, tratamento medicamentoso, de acordo com a orientação da equipe médica e nutricional. O tratamento deve ser seguido rigorosamente e por toda a vida, uma vez que as alterações nos níveis de fenilalanina no sangue também podem gerar danos cerebrais e dificultar a manutenção do tratamento.

  • Todas as pessoas com fenilcetonúria têm deficiência intelectual (DI)

Mito. Embora parte dos indivíduos com fenilcetonúria clássica não tratados apresentam deficiência intelectual, o tratamento adequado com uma dieta com um baixo teor de fenilalanina associada ao uso de fórmulas mantém os níveis plasmáticos desse aminoácido na faixa ideal de 2-6 mg/dL até a adolescência, o que pode eliminar os efeitos adversos relacionados ao desenvolvimento intelectual. Neste sentido, a combinação de detecção precoce ao nascimento e aderência a uma dieta restrita como parte do tratamento pode prevenir os casos de DI em crianças nascidas com fenilcetonúria.

  • Mulheres com PKU em idade fértil são consideradas grupo de risco

Verdade. O excesso de fenilalanina no cérebro é tóxico também para o feto, podendo acarretar microcefalia, deficiência intelectual, malformação cardíaca, alterações faciais e até mesmo aborto. Para minimizar a chance de alteração no desenvolvimento do embrião, mulheres com PKU devem receber, após a menarca, orientação especial quanto aos métodos anticoncepcionais e ao planejamento da gravidez.

Para as mulheres nesse período, foram desenvolvidos tratamentos medicamentosos permitindo a redução dos níveis de FAL, junto com a mudança da alimentação, abrindo caminhos para alternativas, pois as reduções dos níveis de FAL relacionadas com o uso do dicloridrato de sapropterina (KUVAN), por exemplo, foram acompanhadas por melhorias.

Disponível no Brasil e incluso no Protocolo Clínico e Diretriz Terapêutica (PCDT) do Ministério da Saúde para PKU, a sapropterina pode ajudar a atividade residual da FAH e permitir o aumento da tolerância à fenilalanina entre os respondedores.

  • Fenilcetonúria é uma doença que não tem cura

Verdade. Importante saber que a fenilcetonúria é uma doença crônica e não tem cura. Isso significa que o tratamento deve ser iniciado o quanto antes e mantido por toda a vida. A assistência nutricional é fundamental para os pacientes e suas respectivas famílias nessa longa jornada, pois a lista de alimentos que contém o aminoácido fenilalanina (FAL) é longa, como carnes em geral, peixe, frutos do mar, leite e derivados, ovos, grãos, frutas secas, chocolate, vegetais etc.

Com Assessorias

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