Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que cerca de 50 milhões de pessoas no mundo sofrem de epilepsia, mais do que a população de um grande país como a Espanha, o que a posiciona como uma das doenças neurológicas crônicas mais comuns no planeta. Já no Brasil, estima-se que a proporção seja de 1% a 2% da população, variando de 2 a 3 milhões de pessoas.

Todos os anos, no dia 26 de março, ocorre o Purple Day (Dia Roxo, em inglês), uma iniciativa internacional que tem como objetivo conscientizar a sociedade sobre a epilepsia, promovendo eventos que tragam conhecimento sobre a doença. A data busca esclarecer e alertar sobre a doença, além de dar luz aos avanços da ciência no tratamento e prevenção. Nesta data, pessoas do mundo todo são convidadas a usar roxo, arrecadar fundos e sediar eventos em apoio à conscientização.

A epilepsia pode ser definida como uma condição neurológica que ocorre quando o cérebro não funciona corretamente e os neurônios produzem uma atividade excessiva e anormal. Durante alguns segundos ou minutos, uma parte do cérebro emite sinais elétricos incorretos, causando crises que podem se manifestar em convulsões ou outros sintomas. Durante esses episódios, há um agrupamento de células cerebrais que passam a se comportar de forma super estimulada, levando às manifestações da epilepsia.

O distúrbio é caracterizado por crises agudas que culminam em espasmos graves e perda momentânea de consciência, fazendo com que o paciente produza cargas elétricas excessivas num agrupamento de células do cérebro. Ela pode variar de breves lapsos de atenção, a desmaios ou convulsões prolongadas, sendo mais prováveis em pacientes atingidos por lesões no cérebro ou por grandes infecções corporais.

As consequências dessas crises podem ser neurobiológicas, cognitivas, psicológicas e também sociais. Para além do impacto direto na saúde e rotina, a condição também afeta a vida familiar e social do doente. Um grande desafio para os pacientes, as famílias e também os especialistas é a epilepsia resistente a medicamentos, também conhecida como epilepsia refratária. Pessoas com esse quadro têm grande impacto em suas vidas, seja na escola, trabalho, convívio social.

“Também apresentam maior risco de traumas, queimaduras, necessitam de tratamentos médicos frequentes, exames e até avaliações de emergência no pronto-socorro. Por fim, também apresentam maior risco de morte, não apenas pelas lesões que podem sofrer mas também devido a crises prolongadas, estado de mal epiléptico e morte súbita”, explica Maria Alice Susemihl, presidente da Associação Brasileira de Epilepsia (ABE).

Opções de tratamento incluem cirurgia, terapia genética e estimulação cerebral

O tratamento da epilepsia é feito com uso de medicamentos, e em alguns casos são necessárias outras opções, como a cirurgia ressectiva, neuromodulação (terapia VNS) e dieta cetogênica. Com o tratamento medicamentoso correto, aproximadamente 70% das pessoas têm as suas crises completamente controladas. por meio de terapias e consultas médicas regulares.

De acordo com Fabrício Borba, neurologista e coordenador do setor de neurofisiologia clínica do Hospital São Luiz Campinas, da Rede D’Or, o combate à epilepsia vem ganhando maior amplitude e força através de novas técnicas.

“Os tratamentos evoluíram significativamente nas últimas décadas. Somado aos medicamentos antiepilépticos tradicionais, hoje temos opções como cirurgias pouco invasivas, estimulação cerebral profunda e terapias genéticas. Todas trazem novas esperanças aos pacientes, dando a eles um leque dinâmico de alternativas de tratamentos de acordo com os vários casos e manifestações da doença”, explica o médico.

O exame de eletroencefalograma contínuo para pacientes neurocríticos é fundamental. “A detecção e o monitoramento contínuo do EEG são essenciais para o manejo adequado de pacientes com crises epilépticas, permitindo intervenções rápidas e precisas, direcionando corretamente condutas e medicações a cada pessoa”, explica Dr. Fabrício Borba.

Terapia VNS: neuromodulação com implante de estimulador do nervo vago

A Secretaria de Atenção Especializada do Ministério da Saúde, por sua vez, alerta que pelo menos 25% dos pacientes brasileiros diagnosticas com epilepsia apresentam estágio grave. A condição determina a necessidade do uso de medicamentos por toda a vida, uma vez que os episódios são frequentes e incontroláveis. Por esta razão, muitos pacientes são candidatos à intervenção cirúrgica.

A cirurgia, quando bem indicada é possível, consiste na retirada da região cerebral responsável pelas crises, desde que não leve a consequências ao paciente. No entanto, grande parte dos pacientes que não respondem aos medicamentos também não são candidatos à cirurgia ressectiva.

Uma solução para esses casos é a neuromodulação através do implante de estimulador do nervo vago (terapia VNS), um tratamento aprovado há muito tempo. Nos Estados Unidos isso aconteceu em 1997 e no Brasil em 2000.

“Trata-se de uma opção segura e eficaz, que leva à redução na frequência e intensidade das crises, além de outros ganhos, como melhora na recuperação após crise e até mesmo no humor e comportamento. A melhora acontece de forma gradual após início da estimulação. Aguardamos há algum tempo a disponibilização desta alternativa no SUS, porque, para muitos dos nossos pacientes, outras alternativas já foram esgotadas, e essa terapia poderá melhorar sua qualidade de vida”, afirma Maria Alice.

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Medicina Nuclear pode ser ferramenta para casos graves que necessitam de cirurgia

A medicina nuclear não exerce papel direto no tratamento propriamente dito da epilepsia, mas se mostra uma ferramenta importante para o adequado planejamento terapêutico do paciente. Por meio de estudos e exames, durante as crises e em seus intervalos, a ferramenta pode garantir maior precisão e eficácia na localização do foco epileptogênico (onde surge a alteração), como explica a vice-presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN), Cristina Matushita.

“A avaliação de focos epileptogênicos é de grande valia, especialmente em casos complexos, de difícil manejo clínico e para os quais a opção de tratamento cirúrgico é indicada. As imagens permitem identificar (ou, ao menos, sugerir com grande acurácia) focos epileptogênicos para que o tratamento seja guiado de forma personalizada”, afirma.

Ainda de acordo com a especialista, não há radiotraçadores que sejam utilizados com o intuito de curar as crises epilépticas. “Após o procedimento cirúrgico, caso haja a suspeita de persistência de focos epileptogênicos, novamente a medicina nuclear pode auxiliar na identificação destes focos secundários”, destaca.

Os principais exames da medicina nuclear utilizados para a detecção desses pontos originários das crises são a cintilografia de perfusão cerebral, em estados interictal (entre as crises) e ictal (após as crises); e PET-CT neurológico, em estado interictal. Este último apresenta maior definição de imagem, o que permite melhores chances de identificação do foco epileptogênico.

“Com o avanço da tecnologia, houve importante aumento na sensibilidade do método. Os atuais exames permitem a obtenção de imagens metabólicas do cérebro, com muito boa definição anatômica e funcional”, explica a vice-presidente da SBMN.

Risco ou contraindicações

Pelo fato de a medicina nuclear realizar exames que se utilizam de radiação, ainda há certo receio por parte de algumas pessoas quanto ao risco ou contraindicações. Dra. Cristina Matushita desmistifica essa crença:

“Muito se fala da exposição ao material radioativo. Todo método diagnóstico preza pela segurança do paciente. Se há a necessidade de que ele se submeta a qualquer um destes exames que utilizam radiação ionizante, o médico nuclear (ou radiologista, em casos de tomografias) será responsável pela redução dos níveis de exposição de radiação e será capaz de orientar riscos e benefícios em todo o momento”.

Ela destaca que ainda existem mitos em torno da especialidade, a médica nuclear reforça que a medicina nuclear, de forma geral, não apresenta contraindicações absolutas aos seus exames.

“Hipersensibilidade a algum fármaco utilizado pode ser um limitador, embora não haja registros de alergia significativa aos radiotraçadores. Outro limitador são casos em que o paciente não é capaz de ficar parado durante os exames (pacientes claustrofóbicos, que apresentem algum déficit neurológico ou crianças hiperativas), que demoram cerca de 20 a 30 minutos”, afirma.

Uma contraindicação relativa é gestação ou suspeita de gestação. Por utilizar material radioativo, a orientação é sempre a de evitar a exposição de fetos ao material. Em certas situações, entretanto, em que haja maior benefício que o potencial risco associado à exposição do feto ao material radioativo, a medicina nuclear pode ser empregada em mulheres gestantes”, finaliza Dra. Cristina.

Com avanços, combate à epilepsia ganha destaque no “Purple Day”

Laço em prol da conscientização da epilepsia, em Março Roxo, mês de conscientização sobre a doença. (Imagem: jcomp via Freepik)

O Purple Day é uma iniciativa criada em 2008 pela canadense Cassidy Megan. Motivada por sua própria luta contra a epilepsia, ela uniu forças a associações em prol da doença, e assim se instituiu esse dia para a discussão sobre a epilepsia, visando dissipar mitos e oferecer apoio às pessoas que sofrem com essa condição, mostrando que elas não estão sozinhas. Desde então, o movimento se expandiu para inúmeros países.

De acordo com Fabrício Borba, neurologista e coordenador do setor de neurofisiologia clínica do Hospital São Luiz Campinas, da Rede D’Or, a data é essencial, pois atua como uma fonte de conhecimento e acolhimento. “É fundamental que a sociedade entenda e apoie pessoas com epilepsia, eliminando estigmas e promovendo inclusão para gerar naturalmente motivação e segurança ao paciente”, enfatiza Borba.

Seguindo esse propósito, a Associação Brasileira de Epilepsia (ABE) promove, neste domingo (24), uma caminhada que terá como ponto de partida a Avenida Paulista, na altura do número 1853, em frente ao Parque Mário Covas, com previsão para começar às 9h. Além de São Paulo, haverá uma série de eventos sobre conscientização da epilepsia por todo país. Maria Alice Susemihl, presidente da ABE, essas iniciativas são essenciais para promover a conscientização da população.

“É importante mantermos essa conscientização não só em março, mas em todo ano. Apesar de ser uma doença conhecida, que atinge milhões de pessoas, ainda há muitas dúvidas e até mesmo desinformação sobre a epilepsia. Por isso, levar esse conhecimento a todos de forma simples, com atividades onde a pessoa com epilepsia é protagonista, é essencial e pode promover mudanças significativas tanto a nível individual quanto social”, ressalta.

A ação conta com apoio da LivaNova, empresa do mercado de neuromoduladores, equipamentos recomendados no tratamento da epilepsia refratária.

Com assessorias

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