Quem foi ao cinema assistir Divertida Mente 2, a animação infantil da Disney/ Pixar, certamente ouviu burburinhos nas salas de exibição de pessoas se identificando, ou identificando alguém com as novas emoções apresentadas no filme “infantil”. Só que, na maioria das vezes, é um adulto e não uma criança, que é atingida pelas emoções de maneira mais intensa. E isso tem motivos, que podem ser explicados pela análise psicológica.
Nós, adultos, somos uma geração de emoções negligenciadas e muitas vezes, quando crianças e apresentávamos uma delas, isso era visto até como fraqueza. Não podíamos senti r nada, nem tristeza, nem raiva, nem medo, nem nojo, apenas alegria. Hoje, já adultos, temos uma cognição maior para entendê-las e para aprender a vivê-las de forma saudável”, explica a psicóloga Bárbara Couto.
Uma das novas emoções apresentadas no filme é a ansiedade, com a qual a maioria mais se identifica e os dados mostram porque isso acontece. Classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como mal do século, ansiedade vem atingindo cada vez mais pessoas ao redor do mundo.
Em 2019, a OMS já havia apontado o Brasil com a maior prevalência estimada de Transtornos de Ansiedade no mundo, atingindo 9,3% da população. Já em 2023, relatório divulgado na pesquisa Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas Não Transmissíveis em Tempos de Pandemia revelou que 26,8% da população tem o diagnóstico médico de transtorno de ansiedade.
Ansiedade positiva x ansiedade negativa
Quando equilibrada, a ansiedade é uma emoção importante, porque permite que a gente se planeje. Mas, quando se descontrola fica patológica através do medo desmedido do futuro, da catastrofização, que é a tendência de trazer à mente constantemente a pior situação possível para um evento futuro. Ou seja, uma pequena preocupação cresce e se transforma em um cenário gigantesco repleto de medo”, esclarece a psicóloga.
E, para que uma emoção não tome conta da pessoa, modificando até quem ele é, só é possível se permitindo sentir e viver essa emoção. “É preciso entender que as emoções são normais e que só dois tipos de seres humanos não sentem emoções: os psicopatas e os que já morreram. Então, se sentimos emoção quer dizer que somos humanos e que vamos ter essa manifestação do nosso cérebro como forma de agir a algum acontecimento”.
Para a psicóloga, ao aprender a comunicar se bem com a emoção, não as negligenciar, se permitir vive-las, faz com que se ganhe controle sobre elas. O filme Divertidamente II mostra de forma bem clara a importância da ansiedade, mas que fora do controle ela nos adoece, por mais que o nosso cérebro ache que esteja nos protegendo”, analisa Bárbara.
O segredo é ouvir e entender as emoções
O filme mostra também que as palavras moldam o pensamento e este gera a emoção, que vai levar a um comportamento. “As emoções são manifestadas pelos pensamentos, diante de uma situação. E todas as emoções têm um motivo para existir. Por exemplo se eu sinto raiva, na verdade é só o meu cérebro sinalizando que alguém está cruzando algum limite e a raiva me permite colocar esse limite ou me afastar dessa pessoa.
Quando sinto tristeza significa que meu cérebro diz que preciso ficar mais introspectivo para pensar sobre e resolver a situação que me causou essa emoção. Quando sinto medo é um indício para que que eu não me arrisq ue, eu planeje e não ponha a minha vida em risco ou meta os pés pelas mãos por decisões precipitadas. Todas as emoções são importantes. O segredo entender e ouvir nossas emoções, saber que podemos controla-las melhor e usá-las a nosso favor. Apenas se permitindo sentir é que saberemos como lidar,” finalizou Bárbara.
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Ansiedade é cada vez mais comum entre brasileiros; por que estamos adoecendo?
A conscientização sobre a importância da saúde mental tem crescido não só no Brasil, mas no mundo todo. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil tem o terceiro pior índice global de saúde mental. No que diz respeito à ansiedade, é o país com maior índice desse transtorno mental: 9,3% da população brasileira sofrem com a ansiedade considerada patológica.
É uma doença que pode ser grave, porque diminui consideravelmente a qualidade de vida das pessoas, mas é importante deixar claro que existem tratamentos”, comenta Ariel Lipman, médico psiquiatra e diretor da SIG – Residência Terapêutica.
São diversas as causas da ansiedade, segundo o psiquiatra, desde problemas familiares até traumas passados. “Os sintomas também variam, podendo ser tanto físico quanto psíquicos, ou seja, o paciente pode ter tensão muscular, taquicardia, palpitação, dor no peito, transpiração em excesso, dor de cabeça, tontura, além de sensação de desrealização, quando o ambiente parece todo diferente, ou sensação de despersonalização, quando a pessoa parece não se reconhecer mais”, resume.
Aumento de casos é relacionado a estresse e isolamento social
O estresse sem precedentes causados ainda pelo isolamento social decorrente da pandemia ainda é uma das principais explicações para o aumento no número de pessoas com transtornos mentais.
Foi uma época em que as pessoas viveram incertezas, se afastaram de amigos e familiares e nem sempre só a volta ao normal é suficiente para que a ansiedade, depressão e outros transtornos causados por isso estejam controlados. Pelo contrário, com a ausência de tratamentos efetivos, eles podem ter piorado ao longo do tempo”, explica o Dr. Lipman.
Desemprego, crise, insegurança e excesso de telas
Mas não é só isso. Há ainda muitos fatores por trás do adoecimento da nossa população: desemprego, mudanças na economia e a falta de segurança pública. “São temas que diariamente aparecem nos noticiários e que até mesmo são vividos no cotidiano por essas pessoas. A pessoa passa dificuldade financeira, sai de casa com medo, vive a incerteza, é normal que isso vire uma ansiedade, um pânico, uma depressão”, complementa.
Outro ponto a se considerar é o uso excessivo de telas, que com o passar dos anos vem aumentando, podendo gerar diversos problemas ao longo do tempo, até mesmo impactando no desenvolvimento cerebral e na educação dos mais jovens. Um estudo realizado pela Canadian Journal of Psychiatry já comprovou que o nível de ansiedade aumenta com o uso de telas.
A rede social é o pior problema dentro disso, porque pode gerar cobranças nas pessoas. Elas querem levar a vida que as pessoas levam na internet, comparam seus corpos, seus trabalhos, tudo”, opina o especialista.
Diante deste cenário, ele diz que é sempre importante ressaltar que a prevenção é a melhor maneira de se proteger. “É o que a gente sempre indica aos pacientes, uma mudança de estila de vida com viés mais saudável, incluindo exercícios físicos, boa alimentação e bom padrão de sono. Além disso, menos ingestão de álcool e estimulantes como cafeína”, finaliza.
Com Assessorias