Da adolescência à adultez: os desafios enfrentados pelas mães

Estreando este espaço mensal sobre mães, suas dores e amores, abordamos como lidar com o difícil processo de transição dos filhos

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De repente dezesseis, dezessete anos. Grandes alterações físicas, biológicas, sociais e psicológicas acompanham essa fase e, junto com elas, a cereja do bolo: é hora de ter que mirar no futuro, escolher que profissão seguir, decidir e, finalmente se inscrever em provas como a do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

A despeito das inquietações internas e externas, é difícil fugir desse momento. E, para muitos pais da geração Y (nascidos entre 1980 e 1995),  uma vez escolhida uma carreira,  uma sentença é decretada, não há mais volta. Seu filho terá que segui-la pelo resto da vida. Será mesmo?

Planejamento de vida mudou radicalmente

Segundo Rosely Sayão, psicóloga e consultora educacional, com mais de 30 anos de experiência na área, a forma como as gerações anteriores pensavam o planejamento de vida mudou radicalmente. Com o desenvolvimento de novas tecnologias e o surgimento da inteligência  artificial, algumas profissões foram extintas.

As que sobreviveram e surgiram nessa onda, entretanto, estão sofrendo adaptações e permitem um vasto campo de possibilidades. O profissional de hoje não é mais engessado dentro de uma carreira. A inovação é um imperativo para a sobrevivência das empresas e ampliar o espectro de habilidades e atividades de um profissional é fundamental.

Desistências dificultam o fim da adolescência

Outro dado a ser destacado é  o fato de ser cada vez mais comum uma pessoa cursar várias faculdades ao longo da vida. Porém, para Rosely, o ideal é que, uma vez iniciado o primeiro curso, nossos filhos devem finalizá-lo antes de partir para outro.

“Escolher não significa renunciar, mas é preciso que os jovens entendam a necessidade de fechar um ciclo. Não devemos ser coniventes com essas desistências. Do contrário, estaremos contribuindo para que a adolescência não termine”, observa Sayão.

Até chegar nessa fase de escolha da profissão, entretanto,  há uma longa jornada que se inicia no Ensino Médio, com todas as novas exigências que traz para os adolescentes e seus familiares. A carga horária das aulas se amplia, as horas de descanso e lazer diminuem e, não raro, começam os conflitos.

Falta e excesso

Recebo na clínica mães que sofrem com as demandas inerentes a esse momento e, em muitos casos, com óticas diametralmente opostas. Há relatos de genitoras preocupadas com a imaturidade dos filhos e a dificuldade de fazê-los entender a necessidade de estudar,  comprometer-se com as responsabilidades que surgem nessa fase da vida.

Por outro lado, há aquelas que encaminham seus filhos ao consultório em virtude da preocupação com a possibilidade de adoecimento dos seus filhos, provocado pelo excesso de horas de estudo, da renúncia a outras atividades comuns e necessárias para uma vida saudável (se exercitar, socializar, relaxar nos intervalos dos afazeres escolares).

Quando a pressão adoece

Vivi de perto a complexidade desse momento pelo exemplo da minha filha, na época, com 17 anos. Nunca precisei cobrar que ela estudasse. Após o período da infância, no qual a auxiliamos com as tarefas escolares de casa, Manuela assumiu a responsabilidade por suas ações, sempre atenta e preocupada com o desempenho escolar, mas sem abrir mão de outras atividades comuns a sua faixa etária.

Porém, no último ano do Ensino Médio, com o aumento da carga horária de aulas e o temor de não conseguir nota suficiente no Enem e cursar uma universidade pública, ela ampliou seus esforços e estudos. Ao fim deste árduo processo, foi bem sucedida. Conseguiu passar para cursar Direito na UFRJ.

Passado um tempo,  entretanto, a conta chegou: emagreceu mais de cinco quilos, embora não tenha mudado radicalmente a alimentação e, em um curto espaço de tempo, ao realizar um exercício físico, sentiu-se mal uma vez. Neste dia, a temperatura estava alta e creditamos o mal estar à falta de prática e ao calor excessivo.

Uma segunda tentativa de realizar atividade física resultou em um sintoma mais grave: Manuela desmaiou na rua ao sair de uma aula de futevôlei. Acendeu-se a luz vermelha. Após realizados exames de sangue,  recebemos um diagnóstico, acompanhado de muita angústia. Minha filha tinha desenvolvido hipertireoidismo – problema na tireoide – glândula que regula a função de órgãos importantes como o coração, o cérebro, o fígado e os rins, provocado pela produção excessiva dos hormônios T3 (triiodotironina) e T4 (tiroxina).

Segundo a endocrinologista, vários adolescentes  que, naquele ano chegaram no seu consultório,  tinham desenvolvido a doença durante o processo de preparação para o Enem.  Por sorte,  no caso da minha filha,  a doença teve tratamento, ainda que longo, e pudemos intervir antes de sequelas irreversíveis.

Ainda hoje, passados quatro anos, ela ainda precisa tomar medicamento e  lida com a exoftalmia, condição médica em que os olhos do paciente ficam mais salientes do que o normal, popularmente chamado de “olhos esbugalhados”, felizmente em um grau muito menor do que o inicial.

Equilíbrio frágil

Então, fica a pergunta que muitos de nós nos fazemos: como cobrar de nossos filhos na medida certa? Não há resposta exata para essa equação, cada pessoa é um universo, com suas singularidades, mas o  bom senso é sempre bem-vindo.

Neurocientistas já comprovaram que a inteligência não é vinculada exclusivamente a um talento específico. Ela é razão de várias capacidades que incluem a de socializar, assistir e assimilar filmes, livros de temas variados, ouvir música, realizar atividades físicas, se permitir tempo ocioso – esta uma tarefa árdua em tempos de uso excessivo de redes sociais.

Todas essas atividades ampliam o  nosso repertório  de vida. Isso não significa excluir o estudo de matérias específicas e obrigatórias no edital do Enem e de outros exames.

Vale orientar o seu filho a preparar uma agenda de  atividades diárias que contemplem, além dos estudos, a possibilidade de horas de sono de qualidade, alimentação saudável, realizar exercícios físicos, reservar horas para encontrar pessoalmente amigos, assistir filmes e séries, descansar e relaxar a cabeça, respeitando as suas singularidades.

A sociedade cobra, muitas vezes de forma exacerbada, a escolha prematura de uma carreira e a necessidade de alcançarmos um patamar de reconhecimento, retorno financeiro e sucesso nem sempre possível. E é muito difícil não transferimos essa carga para os nossos filhos.

Muitos adolescentes paralisam ao serem cobrados de forma excessiva, já que não possuem maturidade suficiente para lidarem com tamanha pressão. Mas como conhecer melhor os adolescentes que temos em casa, reconhecer seus talentos, suas forças e fraquezas para ajudá-los a tomar suas próprias decisões de forma responsável,  em uma fase na qual dificilmente eles se abrem com os pais?

Ter segredos faz parte do processo de amadurecimento

A resposta não é simples, não há receita de bolo. Mas é possível pensar em alguns caminhos. Nessa fase, eles começam a ter segredos (ao contrário do que o senso comum indica, é uma atitude saudável, que simboliza o início do processo de amadurecimento).

Dificilmente, um adolescente, ao ser questionado, conseguirá contar ou explicar o que se passa na sua cabeça em uma  conversa linear. Não faz parte da forma como eles aprenderam a se relacionar na era da internet. Estão habituados a receber mais informações do que a responderem a questionamentos.

A boa notícia é que, atualmente, há diversos recursos para abordar com nossos filhos temas que consideramos fundamentais ao seu aprendizado e experiência. Porém, é preciso “comer pelas beiradas”, entrando no mundo que eles conhecem, por meio da linguagem  nativa dessa faixa etária.

Esses recursos incluem, por exemplo, temas de séries, exemplos de casos que estão nos trending topics do twitter, comentados por influencers digitais, em realities shows, nos noticiários dos jornais, entre outros meios, que podem nos  conectar.

Conhecer para auxiliar

É  fundamental termos em mente que a internet, para eles, não é apenas distração, atividade de lazer – é a vida social  que conhecem, por mais estranho que isso ainda pareça para as gerações que os precederam.

O meio digital para os atuais adolescentes é o que a rua significou para a geração X (nascidos entre 1965 e 1981). Se quisermos fazer parte, precisamos estar, de alguma forma, inseridos nesse universo.

O trabalho é uma atividade fundamental para os seres humanos, nos possibilita sobreviver, traz realização pessoal, reconhecimento,  representa o desempenho de um papel social importante, mas nem sempre felicidade.  É meio, não fim.

Auxiliar os nossos filhos a lidarem com as frustrações da vida é tarefa difícil. Entretanto, é preciso que eles entendam que crescer e amadurecer passa, invariavelmente, por esse exercício!

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