A morte de uma estudante de 17 anos num colégio público do Paraná, durante ataque na manhã desta segunda-feira (19/6), trouxe de volta à pauta um tema da maior gravidade que tem assombrado as famílias em todo o país: a segurança escolar. Pressionados pela imprensa e pela sociedade nos últimos meses por conta dos atentados ocorridos no país, parlamentares discutiram e até implementaram em algumas capitais botões anti-pânico, detectores de metal, obras para aumento na altura de muros, investimento em rondas municipais e outras medidas.
Para Fernando Silva, CEO da PWTech, startup de sistemas de filtragem, referência humanitária no acesso à água potável em comunidades isoladas, o problema encobre uma outra dura realidade que não é superada há décadas e expõe desigualdades sociais existentes e políticas públicas pouco desenvolvidas.
“Hoje, o Brasil tem aproximadamente 190 mil escolas e 20 ataques com feridos nos últimos 20 anos. Apesar da gravidade do problema, a probabilidade de uma criança ser atacada em uma unidade educacional é muito baixa. Porém, quando falamos de necessidades básicas, estamos afirmando que o número de escolas sem banheiros é de 5,2 mil unidades, sem abastecimento de água são 3,5 mil unidades e mais de 8 mil escolas sem água potável”
Ele reafirma que o problema dos ataques são graves e merecem todo o cuidado necessário para que não se repitam e que não ganhem ainda mais proporções como os que aconteceram.
“Os falsos alarmes de novos ataques não passam de brincadeiras já investigadas pelas autoridades. No curto prazo, ações mais efetivas estão sendo tomadas como o fim das divulgações na imprensa, a remoção de posts promovendo a violência e pela diminuição da propagação de fake news pela sociedade. Destinar verbas para novas ações de segurança se tornou prioridade e projetos de Lei estão tramitando nas votações em caráter de urgência. Agora e os investimentos em saneamento básico e água potável nas mais de oito mil unidades escolares no país? Estão sendo votados? Ou são itens que não oferecem riscos à população?”, ressalta.
Os questionamentos se colocam urgentes em pauta quando o assunto é saneamento. Para Fernando Silva, quando falamos de regiões que sofreram uma corrida em termos de desenvolvimento, como a região norte, a situação é ainda mais complicada do que em escolas localizadas no sul do país.
“Na década de 60, o norte do país sofreu um forte impulso econômico pela migração desenfreada financiada pelo governo da época. A região era vista como ouro pelos sulistas, mas, com a falta de planejamento e a escassez de recursos pelo manuseio errôneo dos solos e das florestas, a região, que era considerada rica em biodiversidade, muitas vezes, ficava escassa, deixando milhares de cidades criadas no decorrer do período, largadas à própria sorte, sem infraestrutura básica. Hoje, em muitas comunidades da região, a escola não é só um lugar para o ensino, e sim para uma alimentação saudável e para a disponibilização de recursos básicos, que faltam nas residências”, explica o especialista.
Foram analisadas informações de 138 mil escolas, com um total de 38 milhões de alunos. De acordo com o levantamento, pelo menos 5.200 (3,78%) escolas não possuem banheiro, 8.100 (5,84%) não têm acesso a água potável e 7.600 (5,53%) não têm esgoto. Outros 3.500 (2,59%) estabelecimentos de ensino não dispõem de abastecimento de água. Além disso, em 57 mil (41,72%) não há pátios ou quadras cobertas, um fator importante para a realização de atividades em espaços arejados. Os dados são do Censo Escolar 2021.
A Operação Educação, do Tribunal de Contas da União (TCE), segue analisando mais de 1088 escolas públicas e municipais. Cerca de 770 auditores de 32 tribunais participam das visitas, onde são checados 200 itens — entre eles, a situação de refeitórios, bibliotecas, acesso à água potável e saneamento básico, acessibilidade, entre outros. A Operação teve início na manhã desta segunda-feira e segue até a próxima quinta-feira dia 27/04.
A falta de água potável nas escolas também chamou a atenção do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância). Com base no Censo Escola 2021, o Unicef destacou que ainda há no Brasil 3.000 escolas municipais sem água e outras 21 mil com acesso inadequado.
“A hidratação na hora dos estudos é fundamental para um melhor desempenho acadêmico, além disso, a disponibilização de água potável permite que as crianças tenham hábitos de higiene pessoal, como lavar as mãos antes da merenda. Esse simples gesto pode evitar a proliferação de doenças por veiculação hídrica, como diarréia aguda e cólera”, reforça Silva.
Quanto às auditorias da Operação Educação, no Pernambuco, são vistoriadas 90 escolas em 16 municípios. No dia de hoje, oito escolas já haviam sido fiscalizadas: nestas, foram encontradas diversas irregularidades, desde carteiras quebradas, alimentos utilizados para a merenda vencidos e acessibilidade comprometida.
No Piauí, serão 40 escolas em 30 municípios. Em Parnaíba no primeiro dia de operação, os auditores encontraram uma escola com apenas um banheiro, identificado como masculino e sem porta, para atender todos os estudantes da unidade. Em Teresina, as falhas encontradas estavam ligadas a manutenção e acessibilidade.
Segundo dados do Censo, pelo menos 12,9 milhões de estudantes da educação básica da rede pública frequentam unidades que apresentam algum problema de infraestrutura. Quase um milhão deles estão matriculados em estabelecimentos de ensino sem acesso à água potável e 390 mil estudam em escolas sem banheiros.
“Quando há investimento em saneamento básico, há melhorias na saúde e no meio ambiente, impactando positivamente na economia e na qualidade de vida da população. Logo, há um aumento no Índice de Desenvolvimento Humano”, reforça Silva.
Iniciativa privada debate gestão da segurança escolar
Enquanto isso, segue-se o debate em torno da possível privatização dos serviços de segurança nas escolas. Para especialistas que atuam neste segmento, a garantia da segurança escolar é uma tarefa extremamente importante em todas as instituições de ensino, especialmente naquelas onde se concentram crianças e adolescentes. Diante dos ataques vivenciados nos últimos meses, tal questão torna-se ainda mais delicada, fazendo com que pais, alunos, professores e todos os demais profissionais da educação estejam sempre em estado de alerta.
Para Tatiana Diniz, coordenadora do Grupo de Excelência em Segurança (Geseg), a segurança privada, a segurança pública e toda a comunidade escolar (formada por alunos, pais, professores, funcionários, direção, etc.) precisam se unir e trabalhar em conjunto, caso contrário não haverá a proteção integral, que se dá de forma tanto preventiva quanto reativa.
“A segurança escolar está passando por uma reformulação desde os últimos ataques ocorridos por agressores em 2022 e 2023. Os debates são importantes para entender como eles agem, suas motivações e quais os meios para reduzir o risco desses ataques”, contextualiza Tatiana, que participou na semana passada do evento “A Extensa Dimensão da Segurança do Ambiente Escolar”.
No encontro, promovidos pelo Conselho Regional de Administração de São Paulo (CRA-SP), especialistas em gestão de segurança falaram sobre os meios mais adequados e eficientes para a manutenção da paz, da harmonia e da segurança dentro do ambiente escolar. Foram discutidos os principais problemas enfrentados pelas escolas na gestão da segurança, bem como suas respectivas causas e consequências.
“O ambiente escolar precisa ser preservado como lugar de integração e convivência pacífica, por isso a instalação de equipamentos extremamente ostensivos ou normas muito restritivas podem causar estresse e insegurança nos alunos. Todas as soluções devem ser pensadas de forma a manter um nível adequado de segurança sem prejudicar o bem-estar de toda a comunidade escolar”, disse Tatiana.
Com informações da PWTech e CRA-SP