Por Dani Maia Teles*
21 de setembro é o dia dedicado à conscientização sobre o Alzheimer. Por isso, quis fazer um breve relato contando como é lidar com a dor de ver quem se ama indo embora um pouquinho a cada dia…
Oswaldo. O pai, o avô, o cara tímido, o cdf, o religioso, o coração grande. Falava Latim, Esperanto; entendia de Matemática a Disco Voador; de Catolicismo a Kardecismo. Foi seminarista, saiu, conheceu o amor, se casou e teve filhas. Fez Faculdade de Direito já quase com 50 anos. Passou em todos os concursos que prestou. Nunca aprendeu a dirigir por causa de uma miopia cavalar. Sua diversão, seu passatempo é e sempre foi a leitura. Ah, os livros.
Dizem que eles nos fazem conhecer o mundo através de suas histórias. Aqui em casa, a gente tem outro motivo para agradecer aos livros: eles fizeram meu pai, um leitor voraz, exercitar os neurônios a vida toda. E parece que esse “exercício” fez com que a progressão do Alzheimer fosse bem lenta, graças a Deus.
É, é isso mesmo. Meu pai tem Alzheimer há quase 15 anos. Uma morte em vida. Dói muito admitir, mas a realidade nua e crua é essa.
Tenho meu pai ainda vivo. Seu corpo está ali, sentando ao sofá, mas ele parece que já se foi há muitos e muitos anos. Sim, ele tem alguns poucos (e cada vez mais raros) momentos de lucidez, quando chama por nossos nomes e faz as clássicas brincadeiras do passado. Nessas horas, o coração enche de alegria e as lágrimas escorrem pelo rosto. A gente finge normalidade e tentar acreditar que ele está ali, inteiro, de novo. Mas dura só alguns segundos e o olhar já fica distante e ouvimos ele perguntar: “que lugar é esse, onde estamos?”
Não é fácil, mas quer saber? Já houve fases mais difíceis. A do início, por exemplo, acho que foi bem mais difícil, tanto pra ele quanto para nós filhas e para a minha mãe. Vê-lo perceber que estava se esquecendo das coisas e sofrendo por isso era desesperador. Nessa época, acho que sofri mais com todo o processo. Depois, chegou a tão temida fase de não nos reconhecer e perguntar quem éramos. Essa me doía imensamente até porque a caçulinha aqui achava que ele nunca ia se esquecer de mim…..mas, claro, que tolice, ele se esqueceu.
Em meio a tantas lembranças e esquecimentos, o que eu queria contar é que mesmo em meio a todo esse processo de perda de memória, meu pai continua a pessoa mais doce do mundo. E antes que você venha me dizer que isso é corujice de filha, deixa eu explicar. Não é isso, não, juro!
É que a vida toda as pessoas falaram isso dele e mesmo agora, com a doença em estágio avançado, as cuidadoras e as pessoas que o conhecem por agora sempre comentam com a gente: “nossa, mas ele é um doce “, “um gentleman”, “que energia de pessoa do bem”. Como ouvia isso desde criança, ouvir agora os mesmos elogios/comentários me aquieta o coração porque eu percebo que apesar de o Alzheimer ter levado quase tudo do que ele foi um dia, não levou o mais importante: sua essência, seu coração generoso e sua alma pura.
E pra não terminar tão down, quero dizer algo que aprendi com toda essa dor: pela emoção, a gente consegue “trazer de volta” essa pessoa, de novo. Dura só um pouquinho, é rápido, mas é lindo. Recomendo. Então, abrace, dê beijo, cante a música preferida dela, puxe uma mínima conversa e se surpreenda. No mais, força para você, pra mim e para todos que sofrem com isso.
Dani Maia é jornalista tem pai com Alzheimer há quase 15 anos