Mesmo se tratando de uma doença que tem cura e pode ser prevenida, inúmeros casos de sífilis são registrados diariamente por todo o país. E o pior: muitas das vítimas são indefesos bebês, que não teriam como preveni-la, a não ser que seus pais tivessem identificado e tratado a doença antes de ser transmitida ainda no útero. De 2013 a 2016, foram registrados 32.641 casos de sífilis entre gestantes e congênita – aquela que é passada de mãe para filho.
Boletim divulgado pelo Ministério da Saúde no ano passado revela que apenas em 2015 a taxa de incidência foi de 6,5 casos por mil nascidos vivos no Brasil. O Rio de Janeiro apresenta quase o dobro desse número, com 12,4 casos a cada mil nascidos vivos. Muitos desses diagnósticos são feitos de forma tardia, o que pode causar graves sequelas, inclusive ao bebê. Há três níveis de sífilis, primário, secundário e terciário, quando a doença está no estágio mais avançado. Se não tratada, a sífilis afeta órgãos como o coração, ossos e sistema nervoso central.
Cerca de 43,7% das mulheres só descobrem a doença no momento do parto, da curetagem (em casos de aborto) ou pós parto, de acordo com dados lançados pelos municípios no Sistema Nacional de Agravos de Notificação (Sinan). Entre os anos de 2014 e 2015, os casos de sífilis adquirida aumentaram em 32,7%, em gestante 20,9% e congênita. Dos casos de sífilis adquirida, no mesmo período, os homens lideram os registros, chegando a 51,1% de casos a mais, em comparação às mulheres. Estima-se que, de 79% das gestantes que realizaram o pré-natal, quase 90% dos companheiros não procuraram o diagnóstico e o tratamento correto.
Diante essa realidade preocupante que atinge homens e mulheres, a Secretaria de Estado de Saúde (SES) alerta para a importância do tratamento completo, ou seja, também realizado pelo parceiro. “É fundamental que a gestante faça o teste de sífilis ainda durante o pré-natal, para não correr o risco de sofrer um aborto espontâneo ou mesmo de o bebê nascer com alguma sequela, como distúrbio neurológico ou surdez, por exemplo”, explica o superintendente de Vigilância Epidemiológica e Ambiental da SES, Mário Sérgio Ribeiro.
Seminário debate sífilis congênita no Rio
O cenário atual da doença no Estado do Rio foi um dos temas de abertura da programação do Seminário Estadual sobre Sífilis Congênita, realizado nesta sexta-feira (20). O evento contou com discussão sobre as experiências e desafios do tratamento da doença, a fim de aprimorar os protocolos de combate à sífilis. Além de especialistas da Secretaria de Saúde do Estado, o seminário contou com representantes dos conselhos Regional de Enfermagem do Rio (Coren) e de Secretarias Municipais de Saúde do estado (Cosems), além de representante da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro.
O secretário de Estado de Saúde, Luiz Antonio Teixeira Jr., afirma que, além de debater o tema, é preciso garantir que todas as unidades estejam preparadas para diagnosticar a doença e tratá-la de forma rápida e eficiente. “A SES vem dando apoio aos municípios para que o enfrentamento à doença seja completo, envolvendo homens e mulheres. O parceiro também deve fazer acompanhamento e desta forma prevenir um ciclo de reinfestação da sífilis”, ressaltou.
“A sífilis vem aumentando muito nos últimos anos e isso mostra que a gente tem um verdadeiro desafio pela frente. Essa doença tem um impacto direto na saúde pública, além de uma mortalidade elevada. Vamos colocar isso como prioridade para a secretaria estadual de saúde e trabalhar em parceria com os municípios. Vamos juntos enfrentar esse problema”, disse o subsecretário de Vigilância em Saúde da SES, Alexandre Chieppe.
Mais sobre a doença
A sífilis é uma Infecção Sexualmente Transmissíveis (IST) – antiga Doença Sexualmente Transmissível (DST) -transmitida pela bactéria Treponema Pallidum. A evolução da doença, que pode levar até a morte, é lenta e muitas vezes passa imperceptível. Por isso, o Dia Nacional de Combate à Sífilis é lembrado no terceiro sábado (21) de outubro para alertar sobre a importância da prevenção, diagnóstico e tratamento.
A sífilis se desenvolve de várias formas, em diferentes estágios, e pode ser transmitida por relação sexual sem proteção ou da gestante para o bebê. Um dos sintomas iniciais são feridas e manchas que aparecem e somem em alguns dias. A doença tem cura, porém, todas as vezes que a pessoa se expõe, por não desenvolver imunidade à bactéria que está no organismo ela contrai novamente.
A doença tem três estágios, sendo o terceiro o mais grave deles. “Se não tiver tratamento, além das lesões de pele que a pessoa pode vir a ter na sífilis secundária, ela pode evoluir para sífilis latente comprometendo válvulas do coração e gerando problemas cardiológicos e no sistema nervoso central”, ressalta a médica infectologista Joana Darc Gonçalves, da Aliança Instituto de Oncologia.
No caso da mulher, se não tratada corretamente, a gestante pode vir a ter um bebê com neurosífilis e com sífilis congênita – quando a doença passa para o bebê por meio da placenta. A sífilis congênita pode causar aborto, má formação e várias alterações na criança. Por isso a importância de tratar, “é fundamental não apenas para a pessoa, mas também das pessoas com as quais ele convive”, acrescenta a especialista.
Estágios da doença
A sífilis, transmitida pela bactéria treponema pallidum, pode ser adquirida em uma relação sexual desprotegida ou mesmo passada da mãe para o filho durante a gravidez e sua manifestação se dá basicamente, em três estágios. Em um primeiro momento, a doença se manifesta até o 90º dia após o contágio por meio de uma ferida, geralmente única, no local de entrada da bactéria (pênis, vulva, vagina, colo uterino, ânus, boca ou outros locais da pele). Esta ferida não dói, não coça, não arde e não tem pus, podendo estar acompanhada de ínguas na virilha.
Na sífilis secundária, após o surgimento da ferida inicial e a cicatrização espontânea, aparecem manchas no corpo, principalmente, nas palmas das mãos e plantas dos pés. No estágio mais avançado dasífilis, órgãos internos – incluindo cérebro, olhos, nervos, coração, vasos sanguíneos, fígado, ossos e articulações – podem ser danificados, mesmo após décadas da doença. Pode ocorrer, inclusive, dificuldade de coordenação dos movimentos musculares, paralisia, cegueira gradual, demência e até a morte.
O diagnóstico da sífilis é clínico, epidemiológico e laboratorial, que acontece através de um exame de sangue. A doença pode ser tratada no Sistema Único de Saúde através de injeções de Penicilina. Uma vez curada, a sífilis não pode reaparecer – a não ser que a pessoa seja reinfectada por alguém que esteja contaminado.
Sífilis congênita
Quando a doença é transmitida de mãe para filho durante a gestação, ela é denominada Sífilis Congênita. Em decorrência disso, podem surgir complicações como: aborto espontâneo, parto prematuro, má-formação do feto, surdez, cegueira, deficiência mental e/ou morte ao nascer. Isso reforça a importância da realização do pré-natal. Neste caso, se a gestante for detectada com a doença, poderá receber o tratamento corretamente, assim como o seu parceiro sexual, para evitar a reinfecção e transmissão no parto. A ausência de tratamento durante a gestação podem ocasionar sintomas na criança logo após o nascimento, durante ou após os primeiros dois anos de vida. O mais comum é surgirem os sinais logo nos primeiros meses.
Tratamento em Macaé
De acordo com a coordenadora de Vigilância em Saúde de Macaé, Ana Paula Dalcin, a doença é considerada um problema importante de saúde pública no Brasil. Com o objetivo de detectar a sífilis precocemente e encaminhar para tratamento adequado, a Secretaria de Saúde criou, em 2016, um Plano de Enfrentamento da Sífilis, em que vários dispositivos da saúde desenvolvem ações permanentes para qualificação do trabalho realizado na rede municipal.
“Entendemos que o melhor método seja a prevenção por meio de proteção nas relações sexuais, mas, com a intensificação do trabalho de vigilância, percebemos o aumento nas notificações. A preocupação são os casos de sífilis congênita, transmitida de mãe para filho, que podem acarretar a morte do bebê ou deixar sequelas como surdez, problemas neurológicos e má formação óssea”, explica.
Diagnóstico e tratamento na rede pública
A coordenadora acrescenta que a sífilis congênita é uma grande preocupação, por isso, a importância de iniciar o pré-natal o quanto antes. “O teste está disponível para toda sociedade, inclusive o teste rápido, em que a pessoa sabe o resultado no mesmo dia. O exame é gratuito e a primeira opção de tratamento é com penicilina benzatina (injetável), tanto para gestante, quanto para o seu companheiro. Por se tratar de uma doença sexualmente transmissível, também é fundamental o uso de preservativo”, frisa, lembrando que as mulheres que estão planejando engravidar devem fazer o teste antes para evitar o risco da transmissão ao bebê.
De acordo com o Ministério da Saúde, a penicilina benzatina é um medicamento seguro e eficaz no combate a sífilis e reconhecido na Assembleia Mundial da Saúde como essencial para controle da transmissão vertical de sífilis. Ana Paula explica, ainda, que os bebês nascidos de mulheres com diagnóstico positivo de sífilis são acompanhados até os três anos de vida. “Cinquenta por cento dos bebês são assintomáticos no nascimento, por isso a necessidade de acompanhamento”, observa.
Fonte: SES-RJ, Aliança Instituto de Oncologia e Secretaria Municipal de Saúde de Macaé (RJ)