Causadas por bactérias, vírus, parasitas, fungos e outros microrganismos, as zoonoses são doenças que podem ser transmitidas dos animais para os seres humanos e vice-versa, de forma direta, por meio do contato com secreções, mordeduras ou arranhaduras, e indireta, por meio de vetores como insetos e ectoparasitas.
A zoonoses representam um risco significativo para a saúde pública. Cerca de 60% das doenças infecciosas humanas têm sua origem em animais. Existem mais de 200 tipos de zoonoses, entre as quais a raiva animal, a esporotricose e a leptospirose.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), elas respondem por 2,4 bilhões de casos de doenças e 2,2 milhões de mortes por ano no mundo inteiro. No Brasil, as zoonoses respondem por 62% da lista de doenças de notificação compulsória. As estratégias contra este tipo de doença estão previstas no Manual de vigilância, prevenção e controle de zoonoses, editado pelo Ministério da Saúde.
Em homenagem ao Dia Mundial das Zoonoses, celebrado em 6 de julho, o Congresso Nacional é iluminado de verde na noite desta segunda-feira e na terça (7 e 8) . O objetivo é alertar para os riscos das doenças transmitidas entre animais e humanos, e com isto incentivar os governos a adotar políticas de saúde pública que considerem os fatores que aumentam esses riscos e dificultam o controle das zoonoses –– como mudanças climáticas, desmatamento, incêndios e viagens intercontinentais.
Neste mês, celebra-se o “Julho Dourado“, uma campanha nacional dedicada à conscientização sobre a importância da vacinação e prevenção de zoonoses em animais de estimação. Este período visa alertar os tutores de pets sobre os cuidados necessários para manter seus animais saudáveis e livres de doenças. Por isso, a campanha Julho Dourado faz um alerta para os tutores de pets sobre a importância da imunização e prevenção de zoonoses em cães e gatos.
Saúde Única ou One Health: o cuidado nas ‘famílias multiespécies’
A transmissão das zoonoses pode ocorrer de forma direta, por meio do contato com secreções ou do contato físico, como arranhões ou mordidas de animais. De forma indireta, por meio de vetores como mosquitos e pulgas, contato indireto com secreções ou consumo de alimento contaminado com o agente –– que pode ser viral, bacteriano, fúngico ou parasitário.
Independentemente da gravidade, as zoonoses precisam ser foco de atenção e prevenção para médicos, médicos-veterinários e tutores. “Um simples check-up pode prevenir doenças graves como raiva, leptospirose, calicivirose, esporotricose felina, entre outras, que podem ser tratadas logo nos primeiros sintomas, a fim de evitar complicações e transmissão em massa”, diz o especialista veterinário Thiago Teixeira, diretor geral do Nouvet.
A prevenção de zoonoses é um dos pontos mais importantes contemplados no conceito de Saúde Única ou One Health, abordagem que reconhece a interconexão entre saúde humana, animal, vegetal e ambiental e desempenha um papel fundamental na prevenção, detecção e controle dessas doenças.
A proximidade cada vez maior entre humanos e animais é extremamente positiva e grande parte das famílias atualmente são multiespécies, quando o vínculo afetivo é forte e os pets são considerados membros da família. A convivência íntima e os ambientes compartilhados, no entanto, requerem um cuidado maior para garantir a manutenção da saúde dos humanos e dos animais”, comenta o médico-veterinário Henry Berger, diretor-geral da VetFamily no Brasil.
A vigilância de doenças em animais e humanos, a educação sobre práticas seguras de convivência com animais de estimação, a gestão adequada de resíduos e o desenvolvimento de vacinas e de tratamentos eficazes são fundamentais para o combate a zoonoses e uma responsabilidade pública.
Porém, as famílias também têm papel fundamental na prevenção por meio de cuidados e hábitos rotineiros, como a higiene pessoal, dos pets, dos quintais e locais onde vivem os animais; controle de endo e ectoparasitas; vacinação regular conforme orientação do médico-veterinário e oferta de uma dieta balanceada e segura para os animais de estimação.
É importante que os tutores compreendam a importância de levar seus pets para consultas veterinárias preventivas regularmente, ao menos uma vez ao ano, ou nos primeiros sinais clínicos que o animal apresentar, como forma de detectar precocemente doenças que podem afetar pets e humanos, e também para receber orientações atualizadas sobre formas de prevenção e tratamentos”, alerta Berger.
Segundo ele, os tutores devem seguir sempre a recomendação do médico-veterinário quanto às formas de prevenção e a periodicidade do uso de antipulgas, carrapaticidas e vermífugos. “Hoje é possível encontrar alternativas de fácil administração e segurança, como tabletes palatáveis que previnem endo e ectoparasitas em uma única administração”, comenta Berger.
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Conheça algumas das principais zoonoses e como prevenir
Prevenida por meio de vacinação, a raiva está entre as mais graves e temidas zoonoses e é transmitida através da mordida de um animal infectado, como cães, gatos ou morcegos. O cuidado com o ambiente e evitar o acesso dos felinos às ruas são as principais medidas de prevenção da esporotricose, micose causada por fungos presentes no solo, vegetais em decomposição, espinhos e madeira, que pode ser transmitida diretamente pelo contato com o meio contaminado ou por arranhaduras, mordeduras e contato com lesões.
Os carrapatos também são potenciais transmissores de doenças que afetam humanos e animais, porém com sinais clínicos e níveis de gravidade diferentes e não transmissíveis de forma direta entre eles, como a febre maculosa, a erliquiose e a doença de Lyme. As pulgas também transmitem a dipilidiose, se ingeridas acidentalmente, o que pode acontecer facilmente com animais e crianças que convivem bem próximas a eles.
O controle de endoparasitas também é essencial, pois transmitem doenças como a toxocaríase, quando crianças pequenas ou mesmo adultos ingerem terra ou areia contaminada por excrementos com ovos de Toxocara canis. O parasita também pode estar presente na água ou vísceras e carnes inadequadamente cozidas.
A ancilostomíase é uma infecção intestinal causada pelo contato com fezes contaminadas com vermes do gênero Ancylostoma, o nematódeo mais frequente em cães no Brasil. Já a toxoplasmose, causada pelo protozoário Toxoplasma gondii, é adquirida principalmente pela ingestão de água, frutas, verduras e carnes cruas ou malpassadas contaminadas. Porém, o parasita também pode estar presente nas fezes de gatos infectados e, por isso, medidas preventivas devem ser tomadas e o contato direto com as fezes evitado.
Especialistas lembram ainda da importância do uso de repelentes e cuidados com o ambiente para evitar picadas de insetos como o mosquito-palha, transmissor da leishmaniose. Cães e gatos não são transmissores diretos da doença para humanos, porém podem ser vetores para contaminação de novos mosquitos.
A bordetelose é uma infecção bacteriana altamente contagiosa que afeta o sistema respiratório dos cães e pode ser transmitida para os seres humanos pelo contato direto da boca e/ou focinho e também por contato com secreções contaminadas. Apesar de ter um baixo risco de contaminação, essa zoonose pode afetar imunossuprimidos e idosos com comorbidades.
Como a leptospirose atinge os animais e por que manter a vacinação em dia
Outra conhecida zoonose, a leptospirose é muito comum em épocas de chuva intensa e enchentes. A transmissão ocorre principalmente pelo contato com água contaminada pela urina de animais infectados, como ratos. A leptospirose é uma doença causada por diferentes tipos da bactéria Leptospira interrogans;
Em áreas de risco para inundações, a incidência da doença pode aumentar em mais de 10 vezes, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, os sorovares Canicola, Icterohaemorrhagiae e Copenhageni são os mais frequentes nos casos que acometem cães, tornando a prevenção e a conscientização essenciais.
Para Kathia Almeida Soares, médica-veterinária, da MSD Saúde Animal, a melhor forma de prevenção é a vacinação contra a leptospirose, que deve ser administrada anualmente, considerando ser uma doença zoonótica, grave e, possivelmente, fatal, cuja exposição pode ocorrer independentemente da idade do animal.
Além da vacinação é necessário garantir higiene adequada da casa e quintal, evitar deixar lixo e alimentos dos animais expostos a fim de não atrair roedores e fazer o controle periódico de pulgas e carrapatos, pois esses parasitas podem servir como hospedeiros intermediários.
Mesmo com a vacinação, é essencial diminuir o acesso dos animais a fontes potenciais de infecção, como áreas pantanosas e águas paradas, e minimizar o contato com hospedeiros reservatórios, como roedores. “Neste Julho Dourado, a mensagem é clara: a prevenção é fundamental para garantir a saúde e o bem-estar dos animais de estimação”.
Manifestações e sintomas da leptospirose
A leptospirose se desenvolve quando as bactérias leptospiras penetram no corpo através das mucosas da boca, nariz ou olhos, ou pela pele lesionada, arranhada ou amolecida em contato com água contaminada.
Os microrganismos se multiplicam rapidamente após entrar no espaço vascular, em um processo conhecido como ‘leptospiremia’, e, em seguida, disseminam-se e replicam-se em muitos tecidos, como fígado e rins (colonização renal havendo a eliminação das bactérias junto com a urina – leptospirúria, podendo infectar outros animais e seres humanos). O grau de lesão dos órgãos é variável, dependendo da imunidade do hospedeiro, da virulência do microrganismo e da capacidade do hospedeiro de manter a infecção’’, explica a médica-veterinária.
Febre, letargia, falta de apetite, vômito, diarreia, petéquias (pontos avermelhados na pele devido ao sangramento), dor lombar, icterícia (pele e olhos amarelados), oligúria ou anúria (diminuição ou ausência da produção de urina devido ao comprometimento renal) são algumas das manifestações que o animal pode apresentar e que, inclusive, podem levá-lo à óbito.
Em relação ao tratamento, Kathia relata que antibióticos, como a Doxiciclina, inibem de imediato a multiplicação do microrganismo e reduzem rapidamente as complicações fatais da infecção, como insuficiência renal e hepática.
Quanto mais cedo esses agentes antimicrobianos forem usados, maior a probabilidade de reversão da lesão tecidual causada por essas bactérias. Além do tratamento com antibióticos, outras terapias, como fluidoterapia e suporte para alterações gastrintestinais, podem ser necessárias”, esclarece.
Com Assessorias