Pacientes com histórico de doenças cardíacas têm apresentado risco de evolução desfavorável quando infectados pelo coronavírus. Dados provenientes de diversos países afetados pela atual pandemia indicam que a presença prévia de cardiopatia aumenta expressivamente a proporção de casos graves – que necessitam de tratamento em UTI e suporte ventilatório – e de mortalidade.

No Brasil, a primeira morte registrada foi de um homem de 61 anos hipertenso e cardiopata. Segundo boletim divulgado pelo Ministério da Saúde, mais da metade das pessoas que morreram de Covid-19 no Brasil até o momento apresentava algum problema no coração. Esse cenário não é diferente lá fora. Em Wuhan, China, onde surgiu o novo coronavírus, uma análise de 44 mil pacientes infectados mostrou que, embora somente 4,2% tivessem cardiopatia, os cardiopatas compuseram 22,7% dos óbitos.

De acordo com informações do Colégio Americano de Cardiologia (ACC), que lançou um boletim para orientar os profissionais de saúde quanto ao assunto, em fevereiro, 50% dos infectados pela Covid-19 possuíam doenças crônicas e 40% apresentavam alguma doença cardiovascular ou cerebrovascular. Além disso, 6,7% dos pacientes manifestaram arritmia e 7,2% lesão no miocárdio.

Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) já havia alertado, baseada em evidências científicas, de que pacientes portadores de doença cardiovascular teriam uma taxa de letalidade de até 10,5%. Na sequência, apresentam maiores taxas de mortalidade os diabéticos (7,3%), pessoas com doença respiratória crônica (6,3%), hipertensos (6%) e pacientes com câncer (5,6%). No Brasil, a média anual de mortes por doenças cardiovasculares é de 350 mil.

Neste momento de crise de saúde pública, é muito importante informar aos pacientes cardiopatas sobre os riscos que correm ao se contaminarem com o coronavírus, e a necessidade de se cuidarem e se protegerem é ainda maior, seguindo seus tratamentos específicos, conforme prescrição médica Também queremos reforçar como é fundamental a população em geral seguir o isolamento social, para evitar o contágio, e tomar todas as precauções indicadas”, explica o presidente da SBC, Marcelo Queiroga.

Ludhmila Abrahão Hajjar, diretora de Ciência, Tecnologia e Inovação da SBC e professora da disciplina de cardiologia da Faculdade de Medicina da USP, afirma que dentre as complicações cardiovasculares, chama a atenção a elevada incidência de arritmias cardíacas, que podem ocorrer em 15% a 20% dos pacientes. Infartos agudos do miocárdio ocorrem em aproximadamente 8% dos infectados. A miocardite (inflamação aguda do músculo cardíaco) ocorre entre 5% e 10% dos pacientes.

De acordo com o médico Augusto Vilela, do Departamento de Cardiologia da Rede Mater Dei e do Hospital Belo Horizonte, os pacientes com doenças crônicas, como aqueles com problemas no coração, têm o sistema imunológico mais baixo. “Com isso, quando infectados, correm o risco de terem complicações mais sérias, decorrentes do coronavírus”, ressalta.

Outro ponto que deve ser destacado é que pacientes com problemas cardiovasculares usam medicamentos que podem favorecer o sangramento, agravando o quadro do coronavírus. “A doença é pouco conhecida e não se sabe ao certo tudo o que causa. Mas o fato é que a relação do Covid-19 com o coração não pode ser descartada”, explica dr. Augusto.

Dados publicados essa semana em periódicos médicos importantes como o New England Journal of Medicine, o Lancet e o JAMA, demonstraram que na China, os pacientes graves pioraram entre o 9º e o 12º dia e que 30% a 50% evoluíram para óbito por complicações cardiovasculares, infecciosas e renais entre o 14º e o 20º dia da infecção.

Os possíveis fatores de risco

De acordo com Luiz Guilherme Velloso, cardiologista da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, embora ainda careçam de estudos aprofundados, as explicações propostas para esses dados podem estar ligadas a fatores como:

– Idade dos pacientes (a população cardiopata costuma estar acima de 60 anos) e diagnóstico concomitante de outras doenças que afetam a imunidade, por exemplo diabetes e hipertensão arterial;

– Desdobramentos da falta de oxigenação do sangue, devido à lesão pulmonar ou choque, que pode ser muito mal tolerada em pacientes que tinham anteriormente insuficiência cardíaca, doença coronária ou arritmias;

– Agressão viral direta às células do músculo cardíaco (miocardite aguda).

Independentemente de qual seja o mecanismo pelo qual ocorre, a elevação dos marcadores de lesão miocárdica (troponinas) se associa ao importante aumento da mortalidade em pacientes com Covid-19″, afirma o especialista.

Sintomas, prevenção e tratamento

Nos pacientes com cardiopatias, os sintomas de sua doença preexistente podem ser confundidos com algumas das manifestações da Covid-19, como a falta de ar e a dor torácica. Velloso salienta, entretanto, que, idealmente, esses pacientes devem procurar orientações em consultas com cardiologistas e, até mesmo, avaliação remota, com o uso da telemedicina.

Por serem grupo de extremo risco para a infecção viral, os cardiopatas devem ao máximo evitar exposição a ambientes de alta contaminação, como os prontos-socorros”, afirma.

Para evitar a contaminação pelo vírus, vale ainda seguir à risca os cuidados de prevenção diários: manter o distanciamento social, se possível, permanecendo em casa; evitar contato com pessoas sabidamente com quadros suspeitos ou confirmados de covid-19; ter extrema atenção à lavagem e desinfecção das mãos; e evitar aglomerações e o contato com superfícies potencialmente contaminadas.

A SBC reitera que pacientes cardiopatas devem ser conduzidos de acordo com as atuais diretrizes vigentes, assegurando o melhor tratamento disponível para essas enfermidades crônicas. E, diante da pandemia atual, é fundamental a adoção sistemática de todas as medidas preventivas recomendadas pelo Ministério da Saúde, e a busca precoce por assistência médica em caso de surgimento de sintomas.

Buscando uniformizar as informações a respeito da infecção pelo novo coronavírus, a segurança, e a qualidade no cuidado do paciente e dos profissionais de saúde, a SBC publicou aos médicos associados um documento baseado na melhor evidência disponível até o momento e na opinião dos especialistas. O material tem como objetivo auxiliar o profissional de saúde no manejo dos pacientes, em concomitância ao cumprimento das recomendações do Ministério da Saúde e das secretarias estaduais. Acesse aqui a íntegra do material.

Médicos alertam para uso de medicamentos

Remédios para tratamento cardíaco, diabetes e inflamações estão sendo cogitados que podem piorar o quadro de quem for infectado pelo novo coronavírus. “Porém não há nenhuma evidência científica que confirme tal informação, e a orientação das sociedades médicas é que o paciente não interrompa a medicação pelo risco de descompensar o tratamento”, alerta Dr. Augusto Vilela.

Dessa forma, os pacientes infectados e que tenham diabetes, hipertensão ou insuficiência cardíaca devem ter mais atenção no acompanhamento médico. Os efeitos também foram apontados no uso do ibuprofeno, em estudos preliminares. Com base em novas pesquisas, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que, por enquanto, não há contraindicação do uso do medicamento.

Já Velloso alerta para o uso da cloroquina ou hidroxicloroquina no tratamento de doentes graves de Covid-19. Segundo ele, diversos medicamentos atualmente em uso para os casos graves de Covid-19 podem ter efeito prejudicial em lesões cardíacas, sejam elas preexistentes ou agudas. Exemplo disto é o agravamento de algumas arritmias pelo uso de hidroxicloroquina”, diz Velloso.

Outras doenças que podem ser agravantes

Infectologista da Federação Brasileira de Infectologia e da Central Nacional Unimed e Professor da Escola de Medicina da Santa Casa de Vitória, no Espírito Santo,  Lauro Ferreira destaca que pacientes cardiopatas, com diabetes e com doenças pulmonares crônicas são mais vulneráveis ao agravamento da Covid-19.

No caso de doenças cardíacas, é uma grande preocupação. Sabemos que o coronavírus tem uma fase de muita inflamação, ativação de mediadores químicos, e mesmo interação com receptores em células cardíacas podendo levar a arritmias miocardite e insuficiência cardíaca. A gripe comum, por exemplo, aumenta várias vezes risco de infarto do miocárdio só por conta deste evento inflamatório”, explica o médico Lauro Ferreira.

Lauro Ferreira afirma que doenças neurológicas, como AVC e Parkinson, também são fatores de risco consideráveis, já que muitas vezes esses pacientes possuem capacidade pulmonar e mobilidade reduzidas, o que pode agravar a Covid-19. Pessoas com outras doenças crônicas, como asma e obesidade, também precisam tomar cuidado. Essas situações se agravam em pacientes idosos, a partir dos 60 anos

O especialista também desmistifica que ter contraído algumas doenças mais comuns no Brasil, como dengue, zika e chikungunya, não coloca o paciente em grupo de risco do coronavírus. Segundo ele, não há neste momento qualquer associação ao agravamento da doença.

O novo coronavírus é uma família de vírus conhecida desde 1960, que sofreu uma mutação genética e acabou se transformando em algo que ainda não havia sido identificado em humanos. Transmitido pelo ar e pelo contato próximo com as pessoas infectadas, o COVID-19 pode ter sintomas semelhantes ao resfriado, evoluindo para casos graves de insuficiência respiratória aguda.

Pessoas acima de 60 anos ou que tenham doenças respiratórias, cardiovasculares ou diabetes estão mais propensas a contrair a doença. Segundo a OMS, para esta população, a instituição aconselha maior cuidado em evitar aglomerações ou locais com pessoas doentes.

Coronavírus e doenças cardiovasculares

A infecção viral leva a uma série de reações responsáveis por desequilibrar doenças cardiovasculares que antes estavam compensadas. Segundo Dr. Felix Ramires, cardiologista e coordenador do programa de Insuficiência Cardíaca do HCor, pacientes com doenças cardiovasculares prévias têm, por vezes, alterações em seu sistema imunológico além de um estado inflamatório crônico latente, o que pode agravar a evolução da doença. Em pandemias passadas por vírus respiratórios, a mortalidade por doenças cardiovasculares chegou a ultrapassar todas as outras causas, ficando à frente da pneumonia em outras situações.

“Pacientes com doenças crônicas, hipertensão, diabetes e que já tiveram alguma doença cardíaca como infarto ou passaram por alguma cirurgia cardiovascular ou que tem insuficiência cardíaca, são um grupo de maior risco. Nesse grupo existe uma predisposição para desenvolver a forma grave da doença, não especificamente para ser contaminado pelo covid-19”, orienta.

Cuidados com os cardiopatas

O cuidado é o mesmo para todos. Porém, como este é o grupo de pacientes que tem o maior risco de desenvolver a forma grave da doença, mesmo tendo apenas hipertensão ou diabetes, a prevenção deve ser dobrada, para que eles não adquiram a doença. “Portanto, devem evitar aglomerações, sempre que possível trabalhar de casa, evitar contato próximo com pessoas que voltaram de viagem de lugares onde o surto esteja mais prevalente. Isolamento domiciliar deste grupo é mais recomendado para que não sejam contaminados com o vírus”, explica Dr. Ramires.

Além disso, outras pandemias virais como SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave) e MERS (Síndrome Respiratória do Oriente Médio) causaram miocardite e insuficiência cardíaca de rápida progressão, assinalando que o coronavírus pode ter potência de infectar o coração isoladamente.

Esses vírus foram implicados em descompensação de doença arterial coronariana com ruptura de placa e infarto agudo do miocárdio. O Ministério da Saúde inclusive antecipou a campanha da vacinação contra a gripe no Brasil. É fundamental que essa população se vacine, pois a gripe pode ser confundida com os sintomas da infecção pela covid-19. E um fator preocupante é a infecção combinada de coronavírus e influenza, que pode agravar a saúde do paciente”, diz.

Quando devo procurar o pronto-socorro? Quando apresentar sintomas de gripe, febre e cansaço, falta de ar e fadiga, no caso dos cardiopatas, se esse diagnóstico for precoce, o tratamento pode ajudar de forma que não desenvolvam a fase mais severa do coronavírus.

Dicas do cardiologista do HCor em relação ao coronavírus

Pelo seu alto poder de contágio, além de permanecer por muito tempo fora do corpo humano, as medidas de prevenção pessoal, como lavagem das mãos por exemplo, são prioridade e devem ser estimuladas em pacientes cardiopatas, principalmente em locais onde o foco de contaminação é maior.

“Idosos têm menos probabilidade de apresentar febre, portanto quadro com tosse, dispneia, mialgia deve ser valorizado nessa população. Os tratamentos sugeridos em diretrizes para pacientes cardiopatas podem oferecer proteção adicional nesses casos e devem ser avaliados individualmente. As vacinas de gripe e pneumonia devem estar em dia nessa população, com o objetivo de evitar uma infecção secundária caso acometido pelo novo coronavírus“, diz o cardiologista do HCor, Felix Ramires.

É recomendável triar pacientes infectados pela covid-19 que possuam doenças cardiovasculares, renais, pulmonares e outras patologias crônicas para atendimento prioritário. “Os sintomas de um infarto agudo do miocárdio ou de descompensação de insuficiência cardíaca podem estar mascarados pelos sintomas do novo coronavírus. Por isso é importante que os pacientes cardiopatas sigam o tratamento corretamente, além de estar em dia com as vacinas e lavar as mãos com elevada frequência”, orienta o especialista.

Campanha ‘De Coração, Contra o Coronavírus’

Diante do cenário de emergência em saúde pública devido à pandemia global de Covid-19, a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) está lançando a campanha “De Coração, contra o Coronavírus”. A ação visa levar informação e conhecimento aos profissionais de saúde, aos pacientes com comorbidades associadas a doenças cardiovasculares e à população em geral sobre as medidas preventivas e de combate à infecção.

O objetivo da campanha é apoiar as ações do poder público de enfrentamento à pandemia, informar e qualificar os médicos cardiologistas e demais especialistas com conteúdo de qualidade para auxiliá-los no tratamento dos infectados pela Covid-19, bem como esclarecer a população, principalmente os portadores de doenças cardiovasculares, dos riscos que essa doença traz e como evitá-la.

A estratégia de comunicação da campanha concentra-se nos meios digitais e nas redes sociais da SBC, que veicularão informações relativas aos riscos da infecção por Covid-19, principalmente aos portadores de comorbidades relacionadas às doenças cardiovasculares, e medidas de prevenção ao novo coronavírus. Serão utilizadas todas as mídias disponíveis, como Instagram, Facebook, LinkedIn, Twitter e YouTube.

A SBC preparou, ainda, um portal exclusivo para compartilhar – com acurácia e seriedade – as principais informações científicas sobre o covid-19. No ar desde 4 de abril,  ele pode ser acessado aqui (www.coronavirus.cardiol.online) e consolida, inclusive, mapas interativos atualizados sobre a disseminação do vírus no mundo.

Com Assessorias

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