Mesmo enfrentando dores agudas que o levaram diversas vezes a procurar atendimento em pronto-socorro, o empresário Brunno Falcão, de 41 anos, passou a maior parte da sua vida tendo sua condição minimizada como mera “frescura”, inclusive por alguns profissionais da saúde. Somente há três anos ele recebeu o diagnóstico de Síndrome de Ehlers–Danlos (SED). Desde então, Brunno tem conseguido controlar melhor as dores e elevar sua qualidade de vida.
Convivo com fortes dores – principalmente na lombar e cervical, bem como nas pernas –, com fadiga e alergias desde o nascimento e só descobriu que tinha uma doença rara aos 38 anos. Até então, os médicos não sabiam o que era, não me encaminharam a nenhum especialista e a dor só piorava. Eu já tinha desistido de buscar ajuda. Se não fosse pela insistência da minha esposa, que me levou a um centro especializado em dor, provavelmente eu nunca teria sido diagnosticado”, relata Brunno.
Ele costumava passar cerca de meia hora alongando e massageando a panturrilha ao acordar, pois sequer conseguia pisar no chão. Para controlar a doença, considerada incurável pela medicina, o empresário faz tratamento multidisciplinar, contemplando ainda medicamentos orais combinados com modulação da dor por via venosa (bloqueio simpático venoso).
Hoje a dor está controlada e me sinto muito melhor. Desde que iniciei o tratamento, além da medicação, fui orientado a reduzir a exposição do meu corpo a situações que pudessem desencadear a dor. Me recomendaram, por exemplo, substituir a corrida pela bicicleta – o que realmente contribuiu para a diminuição das dores – além de ter ajudado na perda de quase 15 kg. Também fui aconselhado a trocar os tipos de calçados, pois eu facilmente virava o pé, a adotar uma alimentação que não provocasse inflamação e a respeitar mais as limitações impostas pela síndrome”, explica Falcão.
Outro fator que contribui significativamente para o subdiagnóstico é o desconhecimento ou despreparo da maior parte dos profissionais de saúde, que raramente aprendem sobre a SED durante a formação acadêmica. O resultado é que muitos pacientes passam décadas sendo mal compreendidos, recebendo diagnósticos errôneos, como fibromialgia, transtornos psiquiátricos ou até sendo rotulados como hipocondríacos.
No dia 15 de maio é celebrado o Dia Internacional da Síndrome de Ehlers–Danlos (SED), uma condição hereditária do tecido conjuntivo que pode afetar diversos sistemas do corpo, como o musculoesquelético, cardiovascular, gastrointestinal, neurológico, entre outros. Justamente por isso, os sintomas costumam surgir de forma fragmentada e, muitas vezes, são atribuídos a causas distintas e desconexas.
Segundo a fisiatra Angélle Jácomo, do Centro Especializado em Hipermobilidade e Dor (CEHD), em Brasília (DF), o diagnóstico da síndrome, particularmente do subtipo hipermóvel (SEDh), ainda é um grande desafio na prática clínica, mesmo sendo o subtipo mais prevalente.
Um dos principais entraves é justamente o fato de que a SEDh não possui um marcador genético identificável até o momento, diferentemente de alguns outros subtipos da doença. Isso significa que não existe um exame laboratorial ou teste genético específico que possa confirmar o diagnóstico com precisão”.
Segundo ela, o diagnóstico é essencialmente clínico, baseado em uma combinação de achados físicos, histórico familiar e sintomas subjetivos, o que exige grande experiência do profissional e uma escuta qualificada”, revela a médica, apontando que estas características fazem com que a doença seja considerada “invisível”.
Pacientes com SED geralmente percorrem um longo caminho até obter um diagnóstico, visitando diferentes especialistas, como ortopedistas, reumatologistas, neurologistas, gastroenterologistas e psiquiatras, sem que seja estabelecida uma visão unificada do quadro clínico.
Muitos sintomas, como dores crônicas difusas, fadiga intensa, luxações recorrentes, distúrbios autonômicos, distúrbios gastrointestinais e alterações de humor, acabam sendo tratados de forma isolada, como se fossem condições independentes, quando, na verdade, fazem parte de um mesmo espectro sindrômico”, esclarece Welber Sousa, neurologista da clínica CEHD.
Evento de conscientização
Para abordar as dificuldades no diagnóstico e no enfrentamento da síndrome, a clínica CEHD promoverá o bate-papo “Entre nós: cuidar, compreender, conectar”, gratuito e aberto ao público, pacientes e familiares, no dia 15 de maio, às 19h, no auditório do Edifício Vitrium.
A data do evento foi escolhida propositalmente para coincidir com o Dia Internacional da Síndrome de Ehlers–Danlos, com o intuito de romper o silêncio e dar voz às milhares de pessoas que convivem com a SED sem o devido diagnóstico, sem escuta e, muitas vezes, sem acolhimento. A iniciativa busca mostrar que a SED não equivale a “exagero”, “preguiça” ou “drama”.
O evento tem como propósito principal acolher, orientar e conectar. Mais do que uma atividade informativa, trata-se de um encontro pensado para criar um espaço seguro, afetivo e construtivo, onde pacientes com Síndrome de Ehlers–Danlos (SED) e seus familiares possam compartilhar vivências e construir caminhos conjuntos de cuidado e fortalecimento”, explica Angélle Jácomo.
Além de conscientizar sobre os diferentes aspectos da síndrome e discutir os avanços terapêuticos, o evento contará com atividades interativas que visam reforçar o vínculo entre pacientes e profissionais, além de entre familiares e a equipe de saúde. Será também um momento importante para esclarecer dúvidas, desmistificar preconceitos e divulgar informações baseadas em evidências, com linguagem acessível e acolhedora.