Internação psiquiátrica involuntária: você é contra ou a favor?

Estudo aponta aumento de 340% na procura pela medida entre 2003 a 2019. Surtos psicóticos e esquizofrenia são principais causas

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A internação involuntária – ou compulsória (obrigatória) – voltou ao centro do debate depois que o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, declarou a intenção de adotar a medida para reduzir a criminalidade na cidade e também as mortes por consumo de drogas entre pessoas em situação de rua. O crescimento das internações involuntárias psiquiátricas, que são feitas sem a autorização do paciente, tem chamado a atenção dos especialistas.

Até 2019, apenas a família do dependente químico poderia pedir a internação involuntária. A nova Política Nacional de Drogas autoriza a internação compulsória de dependentes químicos como uma decisão médica, sem a necessidade de autorização judicial, ampliou o número de pessoas que podem pedir internação sem o consentimento.

Segundo um artigo publicado pelo Brazilian Journal of Psychiatry, esse tipo de hospitalização subiu 340% entre os anos 2003 a 2019 na cidade de São Paulo. O estudo ainda mostra que a maioria dos pacientes estão na faixa etária entre 18 e 39 anos, normalmente por conta de surto psicótico e esquizofrenia. Apesar do aumento, houve uma queda de 37% na quantidade dos leitos de internação e nos atendimentos em unidades hospitalares que são oferecidos para assistência psiquiátrica.

“Uma forma de proteger as pessoas quando há casos extremos”, diz psicóloga

Para a psicóloga da Clínica Maia, Myriam Albers, ainda que a internação involuntária possa ser vista como abusiva, é uma alternativa que pode prolongar a expectativa de um dependente químico ou uma pessoa em isolamento do convívio social como em casos de depressão severa.
“A internação involuntária é uma forma de proteger as pessoas quando há casos extremos. Outro fator importante é o ambiente familiar, que também precisa participar do tratamento do paciente”, diz a psicóloga.
Segundo ela, uma das alternativas para diminuir o estresse do processo é a semi-internação, onde o paciente fica durante o dia internado e volta para a casa à noite.
“Quando a internação vem em um momento correto, em um surto ou momento agudo de doença psicótica, por exemplo, pode trazer efeitos positivos ao acesso do tratamento medicamentoso, psicossocial, além de dar a oportunidade ao indivíduo sobre a consciência do seu quadro de saúde”, completa.

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Demanda por mais leitos psiquiátricos

Mas para que a hospitalização seja levada em conta, Myriam Alberts alerta que é necessário analisar o histórico do paciente para manter a segurança e a integridade de cada pessoa.
“A internação é ineficiente quando se utiliza para corrigir ou há a falta de políticas públicas de assistência à saúde mental. A hospitalização pode ser pensada quando outras estratégias já foram utilizadas, mas não surtiram efeito desejado e há uma crise e desequilíbrio instaurado”, diz a psicóloga.

Diante do aumento do número de internações involuntárias, faz-se necessário aumentar o número de leitos em instituições especializadas no acolhimento dessas pessoas.

“À medida que cresce a população é fundamental a progressão dos leitos psiquiátricos. Outra questão é a melhoria no sistema ambulatorial, com maior prontidão em atendimentos nas unidades de saúde como UBSs e hospitais de saúde mental com semi-internação”, afirma a psicóloga.

Lei que permite internação involuntária divide opiniões

A nova lei permite que a internação sem o consentimento do paciente seja solicitada não só por familiares, mas a partir de um servidor da área da saúde, assistente social ou de órgãos integrantes do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad), como o o próprio Ministério Público, exceto profissionais da segurança pública. Em todos os casos, o aval médico continua sendo necessário.

A proposta desse atendimento involuntário é tirar o dependente químico dessa atmosfera de uso contínuo e compulsivo de substâncias tóxicas, momento em que o indivíduo não consegue tomar nenhuma decisão. A oferta é concedida em casos de risco à integridade física do indivíduo ou para pessoas ao redor, em casos de surto psicótico a alucinação, sensação de perseguição e vozes alteram a percepção, o que pode acarretar alguma ameaça física.

Mais de quatro anos após sua publicação, a nova lei ainda gera fortes debates. A internação involuntária divide a opinião de especialistas. Integrantes do Conselho Federal de Medicina (CFM) acreditam que a medida é importante e justificam sua defesa citando que a internação involuntária tem que seguir todos os critérios estabelecidos na lei. Entre esses critérios, os especialistas destacam que o dependente químico pode colocar em risco a própria vida ou de outras pessoas.

Já para especialistas do Conselho Federal de Psicologia (CFP), a internação involuntária pode levar a ações de internação sem a devida análise e destaca que cada dependente químico tem uma ligação diferente com a droga. Por isso, profissionais chamam a atenção para esse aspecto de personalizar caso a caso, avaliando todos os aspectos do usuário e, consequentemente, atuando de forma mais efetiva para a recuperação do dependente.

70% em clínica para ex-usuários vieram por internação involuntária

A Reviver Tratamentos, clínica de recuperação para tratamento de dependentes químicos com quase 20 anos de atuação em São Paulo, cerca de 70% dos pacientes iniciam o tratamento por meio de internações involuntárias, quase sempre solicitadas pelas famílias. A instituição afirma que segue a recomendação e também todos os demais critérios estabelecidos pela nova lei.

Ao chegar na Reviver, o paciente passa por uma série de cuidados, sendo acompanhado e assistido 24 horas por técnicos em dependência química, monitores, coordenadores e equipe de enfermagem, além de atendimento psiquiátrico que presta o suporte necessário para a fase inicial de desintoxicação.

Além do tratamento químico, há a proposta terapêutica. O paciente participa de terapias racionais emotivas, planos de prevenção da recaída e terapias comportamentais cognitivas. O objetivo é entender a patologia do indivíduo, suas vulnerabilidades, fragilidades e, a partir desse diagnóstico, propor a ele uma nova maneira de viver.

Nesse processo, o paciente começa a pensar com mais clareza e de forma mais racional, volta à realidade e reflete sobre suas perdas. Nessa jornada de autoconhecimento e autoavaliação, 98% dos dependentes químicos que entraram na clínica de forma involuntária, passam a aceitar o tratamento e ter uma mudança comportamental efetiva. E esse resultado é o que contribui para os índices de reabilitação da clínica.

Com Assessorias

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