Infecção hospitalar pode ter causado a morte de Angela Ro Ro

Um dos grandes nomes da cena musical brasileira se despede dos fãs de forma triste e melancólica e também marcada por uma nova polêmica, como foi a sua carreira. Uma infecção hospitalar pode ter sido a causa da morte da cantora e compositora Angela Ro Ro, de 75 anos, na manhã desta segunda-feira (8), no Rio de Janeiro.

De acordo com seu advogado, Carlos Eduardo Campista de Lyrio, ela foi vítima de uma infecção generalizada após contrair uma bactéria na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Silvestre, no Cosme Velho, onde estava internada há dois meses e meio. A certidão de óbito aponta infecção generalizada e pneumonia bacteriana como causas da morte. O hospital não se manifestou até o momento sobre a versão do advogado.

Angela Ro Ro foi hospitalizada em 17 de junho para tratar problemas renais e pulmonares, contraindo uma infecção hospitalar que agravou seu quadro. As infecções hospitalares – também conhecidas como sepse – são aquelas adquiridas por pacientes durante o cuidado de outras condições.

Devido à infecção e à necessidade de assistência respiratória prolongada, Ângela Ro Ro precisou realizar uma traqueostomia, um procedimento que abriu a traqueia e a conectou à pele do pescoço para facilitar a entrada de ar nos pulmões. Em julho, a cantora iniciou um tratamento de reabilitação vocal e fez uma fisioterapia para recuperar voz. Após uma melhora, uma nova infecção levou a uma parada cardíaca fatal.

Saúde fragilizada e dependência química

Nos últimos tempos, Angela Ro Ro emagreceu muito. Em junho de 2025, antes da internação que culminou em sua morte, ela já relatava um quadro de anemia e fraqueza em suas redes sociais, pedindo força para superar o momento, conforme a Folha de S. Paulo.  O emagrecimento e a fraqueza foram parte do quadro de saúde fragilizado, que incluía desidratação, problemas renais e pulmonares, conforme mencionado pela CNN Brasil.

Antes da internação, amigos próximos já vinham manifestando preocupação. O produtor musical e amigo pessoal Paulinho Lima fez um apelo público nas redes sociais em maio de 2025, revelando as condições da cantora.

Dói em mim saber que a solidão existe sim dói! […] Roro está no seu apartamento, em Copacabana, onde sempre viveu desde criança, completamente debilitada, sem querer receber ninguém, se auto medicando, insistindo em não receber médicos, a não ser os que possa fazer consultas por telefone. Quem conseguiu entrar em sua casa, usando as mais diversas estratégias a encontraram debilitada, sem condições de ir sozinha ao banheiro”, escreveu ele no Instagram.

Angela Ro Ro também enfrentou a obesidade e a dependência química, falando muitas vezes abertamente sobre sua relação com a bebida e o cigarro em diversas entrevistas. Em 2016, disse à Revista Época que era “PhD no assunto”. “Comecei a fumar com 11 anos, comecei a beber de brincadeira com 20 para desinibir. Desinibi tanto que quase o fígado veio para fora”.

Cantora enfrentava sérios problemas financeiros

Ângela Ro Ro falava também abertamente sobre seus problemas financeiros – durante a pandemia ela chegou a pedir aos fãs que fizessem um pix de 10 reais. Segundo seu advogado, a cantora tinha uma renda de 800 reais por mês.

Antes da internação, era comum ver no Instagram postagens da cantora falando sobre seu estado de saúde, pedindo doações via Pix e manifestando o desejo de conseguir trabalho após melhorar. “Sem perspectiva de alta ou cura para trabalhar, humildemente peço ajuda a vocês”, escreveu a cantora.

Como determina a Lei dos Direitos Autorais brasileira (9610/98), os seus herdeiros receberão rendimentos em direitos autorais de suas músicas tocadas no Brasil por 70 anos após sua morte (ou de autores parceiros, no caso de canções feitas em parceria).

Pioneirismo no movimento LGBTQIA+

Figura controversa no meio artístico por conta do seu temperamento explosivo e passional, Angela Ro Ro foi uma das pioneiras do movimento LGBTQIA+, sendo uma das principais porta-vozes da luta contra a lesbofobia.

Em 2020, a cantora relembrou um episódio de violência que sofreu no início dos anos 1980 por ter se assumido publicamente homossexual. “Meu pai foi um policial civil e me negam pensão até hoje. A única coisa que a Polícia Civil do Rio me deu foi um espancamento e tentativa de estupro, me deixando cega de um olho”.

No início da década de 1980, Angela assumiu um relacionamento com Zizi Possi, 69 anos, que terminou de forma conturbada após ser acusada de agressão. Zizi não negou nem desmentiu a acusação.  A polêmica em torno do romance com Zizi resultou no álbum Escândalo (1981).

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A sinergia entre a vida pessoal e a pública

As letras das canções de Ângela Ro Ro sempre foram inspiradas em sua biografia, sentimentos, relacionamentos como mulher lésbica, além da sua vida boêmia. Além da história dessa mulher com a voz inconfundível na música brasileira, a sinergia entre a vida pessoal e a pública poderá ser conferida no documentário que leva o seu nome.

A voz marcante de Angela Ro Ro vai para a tela do cinema. A trajetória da artista será tema de uma cinebiografia, um documentário chamado “Angela Ro Ro”, em fase de finalização para exibição no Canal Curta! em 2026, com direção de Liliane Mutti – mesma cineasta que em 2022 lançou o longa “Miucha, a Voz da Bossa Nova“, exibido em 32 países. Ela fala um pouco sobre a cinebiografia:

A Angela é completamente única no cenário musical mundial, de uma personalidade que reconhecemos desde o primeiro verso, seja como cantora ou compositora. Ela vem atravessando décadas nos palcos, com uma capacidade contagiante de rir, mesmo nos momentos em que a vida lhe deu rasteiras”, diz a diretora.

Entre as muitas histórias, a cinebiografia vai contar sobre o dia em que Ro Ro foi apresentada a Caetano pelo baiano Glauber Rocha. Além disso, na trilha sonora não poderia faltar “Escândalo”, letra composta por Caetano especialmente para Ro Ro, e a participação dela tocando gaita no álbum “Transa”, gravado em Londres.

Angela Ro Ro, é a maior blues women brasileira e é a única mulher do disco “Transa”, de 1972, e da sua reedição no show de 2023, onde acompanhamos todas as suas participações em São Paulo, em cima e fora dos palcos”, adiantou a cineasta. “Atravessamos os tumultuados anos 80 com ela e seguimos ela nos palcos, que é onde domina a cena como ninguém, às vezes só Ro Ro e um piano”, observa Mutti.

A trajetória musical de Angela Ro Ro

Nascida no Rio de Janeiro em 1949, Angela Maria Diniz Gonsalves recebeu o apelido de Ro Ro ainda na infância, por causa da voz grave. Começou a estudar piano clássico aos cinco anos. Em 1971, ela muda-se para Londres e alterna o trabalho de faxineira e garçonete com o de cantora e pianista.

Ao voltar para o Brasil em 1974, começa a se apresentar nas melhores casas noturnas do Rio de Janeiro, com repertório escolhido de acordo com seus gostos pessoais como Ella Fitzgerald, Jacques Brel e Maysa. Dois anos depois, ela participa do festival de rock Som, Sol e Surf e alcança maior sucesso como cantora e compositora. Ela estreou com o álbum Angela Ro Ro em 1979, se destacando pelas músicas Amor Meu Grande Amor e Tola Foi Você.

Com uma voz singular, Angela Ro Ro deixa um legado de 145 obras musicais e 271 gravações registradas no banco de dados do Ecad. Entre elas, destaca-se “Amor meu grande amor”, sua canção mais regravada, com 39 fonogramas liberados”, informou o Ecad, em nota de pesar e solidariedade a familiares, amigos e fãs.

Desde 1979, com seu primeiro álbum, Ro Ro transitou por diversos gêneros musicais, como o samba-canção, o blues e suas derivações, como o rhythm ‘n’ blues, o rock e o jazz. Durante os mais de 50 anos de carreira, ela teve músicas gravadas por nomes como Ney Matogrosso, Maria Bethânia e Frejat, como “Balada da Arrasada” e “Fogueira”.

A artista também deixou sua marca no Canal Brasil ao comandar os programas “Escândalo” e “Nas ondas da RoRo”, onde uniu música, entrevistas e seu jeito irreverente de se conectar com o público.

Cinebiografia de Angela Ro Ro leva passado e presente da cantora para a telona 

• • A trajetória artística da cantora desde sua aparição em 1972 até sua consagração nacional em 1979.
  • Momentos importantes de sua vida, como a sua relação com o piano e sua saída para Londres durante o regime militar.
  • Sua participação em produções musicais, como o disco “Transa” de Caetano Veloso, onde tocou gaita.
  • A sua liberdade para se expressar e desbravar o mundo da música, enfrentando preconceitos e nunca se intimidando, conforme a sua personalidade. 

Uma das características mais marcantes de Ro Ro nos palcos era sua interação direta com o público e os músicos que a acompanham. Quem já assistiu, sabe como Angela Ro Ro performa, conversa e brilha, dona da cena, com a sua espontaneidade arrebatadora.

O Teatro Rival é um lugar muito importante para mim, eu sempre faço meu primeiro show do ano aqui, há mais de 30 anos. É um ambiente onde fico bem próxima ao público, mais intimista e tenho muita troca com as pessoas. Me sinto completa, a vontade aqui. Vou continuar cantando até quando conseguir”, contou Angela do seu camarim.

Agenda Positiva

Canal Brasil homenageia Angela Ro Ro

O Canal Brasil abre espaço em sua grade para uma homenagem à cantora Angela Ro Ro nesta terça e quarta-feira, dias 9 e 10 de setembro, a partir das 22h30, serão exibidas duas maratonas do programa “Escândalo”, apresentado por ela entre 2004 e 2005. Na atração, ela recebia grandes nomes da música brasileira para apresentações e conversas sobre suas trajetórias e influências.

Nesta terça, a maratona relembra as conversas com os artistas: Frejat, Ney Matogrosso, Zélia Duncan Moska, Sandra de Sá, Joyce, Lucina, Antônio Adolfo e Carol Saboya, Flávio Venturini, Fred Martins, Kleiton e Kledir, Oswaldo Montenegro, Zé Rodrix, Jorge Vercilo, Rosa Marya Colin, Eliana Printes.

Na quarta, irão ao ar as conversas com Lô Borges, Luiz Melodia, Barão Vermelho, Jerry Adriani, Danilo Caymmi, Toni Platão, Zé Renato, Arrigo Barnabé, Tavito, Cida Moreira, Wanda Sá, Rita Ribeiro, Alaíde Costa, Olivia Byington, Jane Duboc e Miúcha.

Com informações de Veja, Canal Brasil e Ecad

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