No Brasil, desde 2019 o número de adolescentes que se tornaram mãe diminuiu cerca de 18%, de acordo com levantamento do Sistema de Informações de Nascidos Vivos, do Ministério da Saúde. Apesar da queda, 380 mil nascimentos de filhos de meninas de até 19 anos, em 2020, correspondem a 14% de todos os partos no Brasil. Em 2019 essa proporção era de 14,7%; e, em 2018, de 15,5%. Dentro desse total, 17.579 partos foram de mães entre 10 e 14 anos, enquanto 364.074 partos foram de mães entre 15 e 19 anos.

Há divisão entre grupos de adolescentes, pois há diferentes questões atreladas a cada grupo. “A gravidez entre 10 e 14 anos está muito ligada a questões vinculadas ao abuso sexual. O montante de meninas que engravidam entre 10 e 14 anos é menor, mas se tem uma preocupação muito grande com a frequência de abuso sexual vinculada a gravidez nessa faixa etária”, afirma Cláudia Barbosa Salomão, ginecologista membro da Comissão Nacional Especializada em Ginecologia Infanto Puberal da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).

É preciso atenção aos impactos biológicos e psicossociais. “Os impactos biológicos em meninas de 10 a 14 anos são, obviamente, maiores, pois estamos diante de um organismo muito mais imaturo do que o de uma menina de 15 a 19 anos”, explica a ginecologista. Ela revela, contudo, que os impactos psicossociais são frequentes em ambas as faixas etárias.

Adolescentes que engravidam tendem a abandonar a escola devido ao bullying que sofrem, o que as leva ao isolamento das pessoas com quem conviviam e passam a sentir uma sensação de abandono. Além disso, esclarece a especialista, ansiedade e depressão são eventos comuns que acompanham a gravidez na adolescência, especialmente na não planejada. A médica ainda aponta que há uma perpetuação da pobreza, já que a gravidez na adolescência é mais frequente quanto menor a condição socioeconômica da menina.

Outro grande problema é a reincidência da gravidez na adolescência. “Meninas que engravidam muito cedo acabam engravidando novamente em um curto período de tempo”, esclarece a ginecologista. As questões socioeconômicas estão também diretamente ligadas à falta de informação sobre questões de prevenção da gravidez e isso auxilia na reincidência do problema.

A Dra. Cláudia ainda pontua que a questão da assistência pré-natal é o que faz a diferença na vida de uma adolescente gestante. “Quanto mais assistência se tiver no pré-natal, menor vai ser o índice de complicações naquela gravidez na adolescência, muitos problemas são minimizados com uma assistência pré-natal”, conclui a médica, que também preside o Comitê de Ginecologia Infanto Puberal da Associação de Ginecologistas e Obstetras de Minas Gerais.

‘Maternidade é um desgaste psicológico complexo’, diz especialista

Talita Poli Biason, diretora médica associada da área de Saúde Feminina da Organon, lembra que, além dos problemas de saúde pública, as consequências psicológicas que a gestação na adolescência pode causar também é motivo de preocupação.

“A adolescência é a fase de transição da infância para a vida adulta, um período repleto de transformações físicas e psíquicas, que passa por questões que são de extrema importância para formação da individualidade, como a busca por independência psicológica dos pais e pela própria identidade. Uma gestação nesse momento reduz a possibilidade de uma adolescente passar plenamente por essa etapa da vida.

Ter que lidar ao mesmo tempo com adolescência, com as questões que são inerentes a ela, e com maternidade é um desgaste psicológico bastante complexo”, explica a hebiatra, acrescentando que pela Organização Mundial de Saúde (OMS),adolescência vai de 10 a 19 anos e que as consequências emocionais são mais intensas quando a gravidez ocorre até os 14 anos.

De acordo com a especialista, é imprescindível que a gestante adolescente tenha acompanhamento psicológico durante a sua gravidez para que ela consiga lidar bem com esta fase e não passe por dificuldades de adaptação social, que pode ocasionar um isolamento espontâneo dos amigos por vergonha de ser a única grávida entre eles, ou problemas mais graves como ansiedade e depressão.

“Se esta menina não tiver ferramentas que a ajudem a minimizar as consequências desta gravidez não planejada, isso poderá influenciar na relação dela com a criança, na decisão de querer ter outro filho no futuro e até de carregar a depressão para a vida adulta”, afirma Talita Poli

Além dos danos emocionais, há também os riscos para a saúde. De acordo com a OMS, adolescentes grávidas de 10 a 19 anos enfrentam mais riscos de eclampsia, endometrite puerperal e infecções sistêmicas do que mulheres de 20 a 24 anos. A entidade ainda revela que as complicações na gestação e no parto são a principal causa de morte entre meninas de 15 a 19 anos em todo o mundo.

Para combater essas estatísticas, Talita acredita que um modo eficiente é o compartilhamento de informação qualificada.

“É papel de todos nós orientar as meninas adequadamente, falando profundamente sobre as opções de métodos contraceptivos. Não adianta acharmos que elas estarão informadas por conta de um cartaz na parede. A informação tem que estar disponível em todos os canais que os adolescentes acessam e ser discutida de forma ampla e profunda”, conclui.

Referência:

  1. Ministério da Saúde – Secretaria de Vigilância em Saúde – Departamento de Análise da Situação de Saúde (MS/SVS/DASIS) – Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos – SINASC. Disponível neste link.

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