Por Danielle Admoni*

Segundo a 7ª edição da Pesquisa Game Brasil (PGB), em 2020, 73,4% dos brasileiros dizem jogar jogos eletrônicos, um crescimento de 7,1% em relação ao ano passado. Os jovens de 16 a 24 anos representam 32,5% deste público.

Depois que a Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu o distúrbio em jogos eletrônicos como um problema de saúde mental, jogar deixou de ser uma simples brincadeira. Conforme a nova Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, a CID-11, o vício em jogos eletrônicos entrou para a lista de distúrbios de saúde mental sob a nomenclatura “Distúrbio de Games” (gaming disorder).

A OMS definiu essa patologia como um “padrão de comportamento persistente ou recorrente”, com uma gravidade suficiente para comprometer as áreas de funcionamento pessoal e social.

Ainda segundo um estudo publicado no Jornal de Psiquiatria da Austrália e Nova Zelândia, quase 2% da população mundial sofre de gaming disorder, equivalente a quase 154 milhões de pessoas.

Até 2023, o mercado de games deve alcançar US$ 200 bilhões em faturamento no mundo. Segundo estimativa da Game Brasil, consultoria especializada no mercado digital, 7 em cada 10 brasileiros afirmam que jogam games eletrônicos.

Como diferenciar entretenimento de vício

A dependência acaba gerando um colapso geral. É como se o jogo tivesse se tornado a prioridade em sua vida, tanto que a pessoa não só prejudica o desempenho escolar, como se afasta de amigos e familiares. Em um nível mais grave, o jovem se isola no quarto, esquece de comer, deixa de tomar banho e fica noites em claro jogando.

Há uma grande perda de controle sobre aspectos relacionados aos jogos, como duração e frequência das sessões; e a continuidade do vínculo com jogos mesmo com as consequências negativas.

Dificilmente, quem está acometido pelo vício em games percebe os sintomas. O comportamento na dependência está sempre associado ao prazer que os jogos proporcionam. Daí a importância de ficar atento às atitudes e mudanças possivelmente ocasionadas pelo distúrbio.

Os sinais de alerta do Gaming Disorder

Para ter esse acompanhamento, confira os principais sinais de alerta:

– Jogar ininterruptamente, sem ter noção de horário

– Deixar de fazer atividades escolares para jogar

– Faltar frequentemente às aulas, pois passou a noite jogando

– Deixar de sair com os amigos e familiares, pois prefere jogar

– Estar sempre cansado e com sono

– Mostrar-se irritado, agitado e angustiado quando estiver afastado do jogo (um sinal importante que configura abstinência)

Tem tratamento

A ajuda da família deve ser baseada no bom senso, já que apenas proibir os jogos só irá agravar os sintomas. Outros erros comuns são julgar, criticar e até compará-lo com o irmão, que não tem o mesmo problema. O caminho é tentar trazer racionalidade, mostrando os prejuízos que o excesso de jogos está gerando, como as notas baixas na escola. A partir daí, começar a negociar o tempo nos games e estimular outras atividades que foram preteridas, fazendo com que o jogo vá perdendo a importância afetiva.

Caso o vício esteja em um nível bastante avançado, será difícil que o jovem consiga promover as mudanças sozinho. Se ele define um limite para jogar, mas nunca consegue cumprir, o sofrimento cresce. Essa é a hora de buscar ajuda profissional, antes que o quadro se agrave.

O reconhecimento do vício em games como um distúrbio mental é um importante salto para tomar medidas de prevenção e tratamento. A classificação dá legitimidade ao problema, que pode vir a ser um transtorno mental como qualquer outro.

Para buscar ajuda, confira algumas opções:

– Ambulatório de Dependências do Comportamento do Proad/Unifesp (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Universidade Federal de São Paulo)

– Programa Ambulatorial do Jogo (PRO-AMJO) do IPq-HC-FMUSP (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo)

– Jogadores Anônimos

Obs: Artigo não exclusivo, publicado originalmente em São Paulo Para Crianças

Danielle Herszenhorn Admoni

Danielle Admoni, psiquiatra, especializada em Infância e Adolescência (Foto: Divulgação)

Graduada em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, com residência em Psiquiatria Geral e Psiquiatria da Infância e Adolescência pela Escola Paulista de Medicina da Unifesp e título de especialista pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).

Atuou no CAPS Juventude e vários ambulatórios de Psiquiatria e Neurologia da Unifesp, sempre relacionados à infância e adolescência. É médica concursada desde 2004 na Unifesp, atualmente lotada no Ambulatório de Adolescentes e no Núcleo Trans Unifesp como preceptora de residência.

Danielle colabora para a seção ‘Palavra de Especialista’ uma vez por mês, sempre às quartas-feiras.

 

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Danielle Admoni, psiquiatra, especializada em Infância e Adolescência (Foto: Divulgação)
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