Cresce cada vez mais o número de adolescentes fumantes e isso pode gerar diversas consequências no futuro, visto que podem desenvolver doenças de forma precoce. Mas afinal, por que muitos jovens experimentam cigarros desde cedo?

O pneumologista e professor do curso de Medicina do Centro Universitário de João Pessoa – Unipê, Rodolfo Bacelar, explica que a juventude e adolescência, são as fases da vida que apresentam como uma das principais características a busca pelo conhecimento e o aprendizado pela experimentação.

“Isso por si só, junto ao fato de a nicotina ser uma substância de fácil acesso e legalizada, justifica boa parte dos casos. Existe a questão do comportamento do grupo, que é potencializado neste período, ou seja, se um jovem começa a fumar, é possível que todo o grupo passe pela experimentação e alguns destes permaneçam usuários”.

O mesmo pode ocorrer em famílias que fumam, onde os adolescentes são iniciados ao verem os pais fumarem. “Ainda, não podemos desconsiderar o poder de influência de ídolos, as mídias e as propagandas”, afirma.

De acordo com o docente, os adolescentes fumantes possuem grande chance de continuarem com a prática quando adultos, aumentando assim o risco de adoecerem e morrerem por doenças relacionadas ao tabaco.

“Eles podem desenvolver de maneira mais precoce o câncer de pulmão e de diversos outros órgãos, além de infartos, AVC e outras patologias. A iniciação precoce ao fumo também aumenta o risco do uso abusivo de outras substâncias, como álcool e drogas ilícitas”, comenta.

Como o sistema nervoso central destes indivíduos ainda passa por um processo de desenvolvimento e amadurecimento, o mesmo pode ser afetado, aumentando assim o risco de desenvolver outros problemas, entre elas: um pior desempenho cognitivo, baixo rendimento acadêmico, doenças psiquiátricas e comportamentais, entre outros.

O uso de drogas prejudica o pulmão de quem começa a fumar desde cedo, da mesma forma que prejudica os pulmões adultos, com a diferença de que este órgão será exposto mais precocemente aos riscos, visto que as drogas inaladas ou fumadas podem ter ações danosas de maneira mais precoce.

Quais doenças podem ser geradas no pulmão dos adolescentes no futuro?

Para Bacelar, as principais enfermidades são as doenças relacionadas à inalação de substâncias.

“A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), que muitos conhecem como bronquite dos fumantes ou enfisema pulmonar, é a principal delas. Além disso, pode agravar doenças pulmonares já existentes, como a Asma. Também, existe um maior risco de desenvolvimento de outras inflamações pulmonares com risco de evolução para fibrose pulmonar, que pode resultar inclusive na necessidade de transplante pulmonar”.

O especialista explica que cronicamente, a função do pulmão pode ser afetada a ponto de demandar o uso de oxigênio contínuo. Somado a isso, existe uma queda das defesas pulmonares, o que aumenta a chance de infecções e o risco de quadros mais graves.

Cigarro eletrônico pode antecipar diagnóstico da DPOC, hoje mais comum em idosos

Considerando que 90% dos pacientes diagnosticados com DPOC são ou foram fumantes, pneumologistas acreditam que o vaper será a principal causa da doença no futuro; enfermidade respiratória não tem cura, mas pode ser controlada com terapias inovadoras

Entre 1989 e 2021, a taxa percentual de fumantes acima dos 18 anos de idade no Brasil sofreu uma queda relevante, passando de 34,8% para 9,1%, de acordo com dados da Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN) e do Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), respectivamente. Simultaneamente a este expressivo resultado, o país registra um aumento da procura por dispositivos eletrônicos para fumar (DEF), os famosos vapers, os cigarros eletrônicos, utilizados por 1 a cada 5 jovens entre 15 e 24 anos.

Em função dos efeitos da fumaça de cigarro nos pulmões, o tabagismo é um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento da Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), uma enfermidade que atinge cerca de 210 milhões de pessoas em todo o mundo, sendo em torno de 6 milhões apenas no Brasil. A seguir, os pneumologistas Clystenes Odyr Soares, professor da UNIFESP, e José Roberto Megda Filho, avaliam as consequências dessa mudança de comportamento para a saúde dos brasileiros no futuro.

“O Brasil estava caminhando muito bem no controle do tabagismo e, infelizmente, o cigarro eletrônico veio de modo avassalador. Tudo o que se ganhou, certamente, estamos perdendo agora, porque o vaper é tão nocivo ou até mais do que o cigarro convencional. Não podemos deixar de mencionar que um fumante passivo pode desenvolver a doença na mesma intensidade de um fumante ativo: existem pessoas que nunca fumaram e adoecem pela exposição”, afirma Soares.

Proibidos no Brasil desde 2009 pela Anvisa e alertados pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) pelo fato de não haver comprovação científica de que esses produtos sejam inofensivos à saúde, os cigarros eletrônicos poderão vir a ser a principal causa de DPOC segundo Megda, visto o contato precoce com a irritação causada pelos elementos químicos presentes.

“São substâncias que se modificam quando expostas a altas temperaturas e irritam as vias respiratórias, alterando o sistema imunológico do pulmão e aumentando o risco de infecções, o que, por sua vez, facilita a penetração de vírus e bactérias. Essas inflamações e irritações crônicas podem fazer danos irreversíveis nas paredes dos alvéolos, é um quadro muito semelhante ao enfisema ocasionado pelo cigarro comum”, explica.

As diferenças entre o cigarro comum e eletrônico

Por mais que a concentração das substâncias nocivas seja inferior no cigarro eletrônico do que no cigarro tradicional, as formas de consumo, a frequência de utilização e a quantidade consumida tornam os dois similares.

“O cigarro eletrônico apresenta de tal maneira, mesmo que em menor concentração, substâncias nocivas à saúde. O “carro-chefe” é a nicotina, a responsável pelo vício. Além disso, ela tem efeitos adversos cardiovasculares e no desenvolvimento do sistema nervoso”, comenta.

De acordo com o pneumologista, outras substâncias como o propilenoglicol, formaldeído e acetaldeído são cancerígenas. Até metais pesados, como chumbo, já foram documentados no cigarro eletrônico. Então, os consumidores estão expostos ao risco de desenvolver doenças cardiovasculares como infarto e arritmias, doenças pulmonares como o enfisema e outras inflamações, piora de doenças respiratórias prévias como a asma, além do câncer.

O cigarro eletrônico diminui as defesas pulmonares facilitando infecções. E além disso, existe a própria doença pulmonar causada por substâncias presentes no cigarro eletrônico, a EVALI, onde uma importante inflamação impede a passagem do oxigênio dos pulmões para o sangue, levando à necessidade de suporte ventilatório.

Em surto recente, jovens precisaram ir para UTI e utilizar ventiladores mecânicos, existindo até aqueles que precisaram de transplante de pulmão. Além disso, ser mais “socialmente aceito” e a presença de essências, com seus cheiros, sabores e cores, faz com que as pessoas consumam ainda mais os vapes”.

Por fim, o professor do curso de Medicina do Unipê, afirma que não existe cigarro seguro. “Falando nos jovens, hoje o eletrônico é a principal porta de entrada no vício da nicotina seguindo depois com o tradicional. Não à toa, as grandes indústrias do tabaco são as também produtoras do cigarro eletrônico. É uma indústria baseada na aquisição de novos consumidores, viciados em nicotina, que tem capacidade de vício semelhante à cocaína.

Novo perfil de pacientes

Atualmente, a DPOC é uma doença que se manifesta majoritariamente após os 40 anos de idade, sendo 90% dos casos em indivíduos com histórico de tabagismo6. A opinião de ambos os especialistas é unânime ao se discutir a possibilidade de mudança do perfil destes pacientes.

“É fundamental considerar que o desenvolvimento total de um pulmão ocorre aos 25 anos. Considerando que adolescentes de 15 anos de idade têm contato com cigarros eletrônicos, é possível que tenhamos pacientes com casos DPOC aos 35, fugindo do estereótipo do idoso que fumou por décadas”, destaca Clystenes Odyr Soares.

Megda ressalta, ainda, que o fato de a fumaça ser menos irritativa que o cigarro comum, a presença das essências que dão diversos sabores faz com que se perca a consciência do quanto se está fumando.

“A pessoa começa a fumar em ambientes inclusive fechados, em situação que não fuma o cigarro normal, como perto da família, em ambientes que com o cigarro normal seria criticado, como rodinha de trabalho, e começa a fumar mais. Ainda não é possível estabelecer em quanto tempo o vaper criará uma lesão no pulmão, mas é fato que as substâncias tóxicas podem sim causar injúrias respiratórias de alta gravidade”, conclui.

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