Ato de amor ao próximo e que pode salvar vidas, a doação de órgãos e tecidos é a única chance de recomeço para quem aguarda na fila de espera. As equipes de captação de órgãos nos hospitais trabalham para esclarecer qualquer dúvida dos parentes do potencial doador. Após o “sim” da família, é dada a largada para o processo de doação e de transplante. Cada segundo é importante para que órgãos e tecidos cheguem aos receptores a tempo de salvar ou melhorar a qualidade de vida de até dez pessoas.

Enquanto que a recusa pela doação de órgãos e tecidos é de 39% no país e 25% no estado do Paraná,  o Hospital Universitário Cajuru (HUC), em Curitiba, tem a média de apenas 19% de recusa. Os dados são do Sistema Estadual de Transplante do Paraná, que tem a gestão realizada pela Central de Transplantes do estado. A unidade, que atende exclusivamente a pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), em Curitiba (PR), é destaque nacional na captação de órgãos.

O HUC mantém o maior índice de conversão estadual de entrevistas com as famílias em doações efetivadas. Em 2020, a taxa de conversão foi de 84%, e em 2021, está em 81%, bem acima das médias dos demais estados. Desde 2012, quando iniciou a atuação da Comissão Intra-Hospitalar para Doação de Órgãos e Tecidos, já foram 428 famílias entrevistadas, com 336 doações realizadas e 92 recusas. Apenas em 2023, já foram 36 famílias entrevistadas, 27 doações e apenas 9 recusas. A média de entrevistas convertidas em doações é de 74%.

“Somos modelo, pois o processo é muito bem estruturado e bem realizado. O resultado positivo na doação e no transplante de órgãos é fruto de um trabalho de uma equipe dedicada e capacitada no que faz”, ressalta o diretor-geral do HUC, o médico Juliano Gasparetto.

Oito em cada dez famílias tomam uma decisão

Uma atividade que faz a diferença para a sociedade. É assim que Maykon José de Freitas, se refere ao trabalho realizado pela Comissão Intra Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante (CIHDOTT), do Hospital Universitário Cajuru.

“Nosso serviço é pioneiro no Paraná por contar com um profissional responsável que atua junto de uma rede de apoio, o que permite alcançarmos números expressivos. Batemos o recorde de captação estadual em 2020 com nosso esforço diário para desconstruir mitos e reforçar a importância da doação de órgãos”, explica o coordenador da equipe de captação de órgãos do Cajuru.

Oito em cada dez famílias com quem o enfermeiro e sua equipe conversam sobre doação de órgãos e de tecidos tomam uma decisão que pode mudar até dez vidas. Ele lida com o fim e o recomeço em sua rotina como coordenador da Após confirmada a morte encefálica do paciente, são os familiares que autorizam ou não a doação. É quando entra o trabalho dos enfermeiros que conversam com a família e garantem o entendimento de todo o processo a partir dali. Um momento delicado e que não permite nenhuma falha.

“A doação de órgãos começa na conversa do doador com a sua família, pois é ela que será a sua porta-voz. É preciso declarar aos familiares a sua intenção, para que, após a sua morte, os familiares possam autorizar a retirada e doação dos órgãos”, reforça o enfermeiro Maykon.

Bastidores da doação e da conscientização

Para identificar potenciais doadores, a comissão da CIHDOTT realiza visitas diárias aos setores críticos de hospitais, principalmente às UTIs. A partir do momento em que é declarada a morte cerebral de um paciente, inicia-se a comunicação com os familiares. Uma etapa que passou por mudanças e adaptações durante a pandemia.

“Na pandemia, as conversas com os parentes precisaram ser feitas por videochamadas e essa distância criou uma barreira na aceitação da doação. A família precisa ser acolhida, pois vai receber a pior notícia: o falecimento do seu ente querido”, explica Maykon.

São muitas as equipes que correm contra o tempo nos bastidores do processo de doação de órgãos. Equipes como a do Laboratório de Imunogenética do Hospital Universitário Cajuru, que realizam exames de compatibilidade para o transplante de órgãos e tecidos.

Um laboratório que não dorme. É assim que a coordenadora dessa equipe, Helena Cazarote, se refere ao  trabalho essencial realizado ali, que começou há 25 anos e se mantém como referência no Brasil.

“A partir do momento que temos a confirmação de um potencial doador, o laboratório entra efetivamente no processo para liberar os exames de compatibilidade no menor tempo possível. Isso causará impacto direto na sobrevida desse órgão e na qualidade de vida do paciente pós-transplante”, explica Helena.

Com a mais avançada tecnologia disponível no mercado, o laboratório atua como um facilitador para a eficácia do processo de doação, ao atender a Central de Transplantes, as equipes transplantadoras e as unidades de diálise do Paraná.

Líder entre os estados brasileiros na captação e entre os primeiros em transplantes de órgãos, o Paraná consolidou um sistema que é referência dentro e fora do país. Trabalho de ponta que é tema de estudos multicêntricos, em razão da qualidade das equipes e da estrutura apropriada.

Queda nas doações durante a pandemia

No mundo, nem mesmo os avanços tecnológicos impediram que as doações e os transplantes de órgãos fossem impactados pela pandemia. Só na primeira onda de covid-19, diminuiu 31% o número de transplantes realizados em todo o mundo, como aponta a pesquisa publicada no jornal científico The Lancet Public Health.

Ao considerar dados de 22 países, espalhados por quatro continentes, o estudo indica que 11.253 cirurgias desse tipo deixaram de ser efetuadas no ano passado, o que significa uma redução de 16% ao longo dos 12 meses.

transplante mais afetado foi o de rim com doadores vivos, que teve queda de 40% no comparativo entre 2019 e 2020. A pesquisa mostra ainda que a diminuição na quantidade de transplantes representou mais de 48 mil anos perdidos nas vidas de pacientes.

O Brasil não ficou fora desse cenário. O país, considerado o maior sistema público de transplantes de órgãos do mundo, viu os números despencarem com o agravamento da pandemia. O número de doadores de órgãos caiu 34% e o de transplantes de órgãos teve uma queda superior a 40% desde o início da pandemia da Covid-19, de acordo com a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO).

Segundo o mesmo relatório da ABTO, entre janeiro e junho o número de transplantes de medula óssea realizados no país diminuiu quase 20% em relação ao mesmo período de 2019. O principal motivo desse declínio é o aumento de 44% na taxa de contraindicação, em parte pelo risco de transmissão de covid-19. Os dados são da ABTO, em um comparativo do primeiro semestre de 2020 com o primeiro semestre de 2021.

A espera de pessoas por transplante de órgãos foi agravada pela pandemia. Apenas na primeira onda de covid-19, a captação de órgãos reduziu entre 40% e 50% no Brasil.  Mesmo com o aumento de 13% na taxa de notificação de potenciais doadores, foram 203 doadores efetivos a menos, na comparação entre os primeiros semestres de 2020 e 2021. A taxa de doadores efetivos caiu 13% e a efetivação de doações reduziu para 24,9%.

A covid-19 fez as doações caírem 23,13% no Paraná, segundo o Sistema Estadual de Transplantes. Enquanto o primeiro semestre de 2020 registrou 41,5 doações por milhão de população (pmp), 2021 teve apenas 31,9 pmp. Mesmo com as dificuldades trazidas pela pandemia, o Paraná ficou à frente de todos os estados brasileiros e muito acima da média nacional, que atingiu a marca de 13,7 pmp.

Referência no transplante renal

O Hospital Universitário Cajuru, em Curitiba (PR), que atende 100% por meio do SUS, é referência no transplante renal. Foram 60 procedimentos realizados no ano de 2020 e 24 no primeiro semestre de 2021. Desde 2007, quando o serviço de transplante de rim voltou a ser realizado no Hospital Universitário Cajuru, já foram mais de 810 rins transplantados, com 84,5% dos pacientes ainda sendo acompanhados pelo hospital. A média de sobrevida é muito boa, com 94% dos pacientes tendo sobrevida no primeiro ano e 89% nos primeiros cinco anos.

“A excelência da equipe de transplante torna possível que, em 95% dos casos, não haja rejeição do órgão em um prazo de um ano, índice semelhante aos hospitais de São Paulo e também dos Estados Unidos”, afirma o diretor-geral do HUC, o médico Juliano Gasparetto.

 

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