O uso abusivo de substâncias como álcool ou outras produz danos físicos, sociais e psicológicos. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), uma a cada 200 pessoas desenvolve transtornos associados ao consumo de drogas lícitas e ilícitas. Estudos mostram que os jovens são o principal público que utilizam algumas drogas, incluindo maconha, crack, álcool ou injetável (como heroína).

O aumento exagerado no consumo destas substâncias entre o público mais jovem nos últimos tempos tem chamado a atenção dos especialistas, principalmente devido à forte relação entre o uso abusivo de drogas e a saúde mental. Diante disso, o Dia Internacional sobre o Abuso e Tráfico Ilícito de Drogas (26/6) é um momento importante para a conscientização e alerta à sociedade para este grave problema.

Mas, afinal, como saber se uma pessoa, especialmente um adolescente ou jovem, está realmente envolvido com drogas ou dependente delas? E como as famílias podem ajudar de fato? Quando é hora de pensar em ajuda profissional ou mesmo numa internação? O Portal ViDA & Ação ouviu alguns especialistas a respeito. Confira:

Dependência química: 7 sinais de que seu filho usa drogas

São diversos fatores emocionais que podem levar aos transtornos gerados pela dependência química. Segundo o médico psiquiatra Daniel Pereira de Mesquita, do Centro Vida de Araricá, no Rio Grande do Sul, a dependência química causa problemas em várias áreas da vida do indivíduo, produzindo prejuízos principalmente na saúde mental.

De acordo com o especialista, é recorrente um quadro depressivo, anedonia, irritabilidade e revolta com a situação. Além disso, o mecanismo de negação que se manifesta pela não aceitação do problema é muito acentuado.

A dependência química não afeta somente o próprio doente, mas também aqueles de sua convivência. Problemas financeiros são comuns, degradação física (perda de peso, problemas dentários), rompimento de relacionamentos, desemprego, abandono acadêmico e, até mesmo, problemas com a justiça”, afirma o especialista.

Segundo o psiquiatra, os 7 principais sinais de alguém esteja com dependência química são:

  1. Descontrole na vontade de usar a substância.
  2. Aumento na intolerância, crises de abstinência.
  3. Alterações comportamentais.
  4. Isolamento social.
  5. Abandono de atividades cotidianas.
  6. Descontrole financeiro.
  7. Negligência consigo mesmo.

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E quando o dependente químico ‘perde o controle’?

Em casos mais graves, como identificar a necessidade de internação? “Primeiramente considero uma internação necessária quando o usuário perdeu o controle sobre o uso da substância. Esse descontrole repercute no âmbito de convivência, seja familiar ou social”, aponta o psicólogo Pablo Sauce, coordenador do Programa para Dependência Química da Holiste.

A ajuda profissional é fundamental porque, por se tratar de uma dependência, os sintomas de abstinência podem ser insuportáveis. Se livrar do vício não é uma mera questão de força de vontade, é um trabalho difícil que depende da ajuda de quem está no entorno do paciente, profissionais e família”, defende.

De acordo com o especialista, na maioria dos casos os familiares costumam ficar divididos entre a culpa e a angústia. “A culpa por achar que são inteiramente responsáveis pelas consequências do ‘desvio’ de conduta do usuário, agem como se o usuário fosse uma vítima, sem decisão própria e sem responsabilidade pelas consequências de seus atos”.

O problema é que essa posição de culpa acaba dificultando a tomada de decisão sobre o tratamento. O profissional conta que muitas famílias entendem o tratamento por uma via negativa e se mostram dispostas a fazer o impossível para poupar o usuário da “privação” que o processo de desintoxicação representa no imaginário.

Sobretudo o ato da internação por determinação médica, ou popularmente, a involuntária, é visto como um acontecimento traumático, do qual o usuário nunca mais poderá se recuperar ou perdoar a família – e não é assim”, comenta.

Nesses casos, além do dependente químico, a família precisa de ajuda profissional para aprender a entender a situação e a lidar com os próprios sentimentos. “A orientação nesses casos é ajudar a família a perceber, entre suas expectativas, o que há de falsas soluções negacionistas e indicar o caminho da corresponsabilidade, dela e do usuário”, pontua o psicólogo.

Quando decidir que a internação é mesmo necessária

O psicólogo Pablo Sauce, coordenador do Programa para Dependência Química da da Clínica Holiste, na Bahia, explica que a internação se torna necessária quando o usuário perdeu o controle sobre o uso da substância e esse descontrole repercute no âmbito de convivência, seja familiar ou social. Segundo o especialista, existem alguns sinais que acendem uma luz de alerta sobre a possibilidade de uma intervenção.

  1. Pedido de ajuda: Muitas vezes, o pedido de ajuda parte do próprio usuário quando o uso da substância não está mais associado à busca de prazer, mas ao apagamento de uma dor ou sofrimento associado à falta da droga. “Este é o sinal de que, passada a fase da lua de mel, a relação com a droga está virando uma lua de hell, ou seja, transformando a vida do paciente em um inferno.
  2. Alcoolismo crônico: Nos casos de alcoolismo crônico, um sinal importante é o quadro de confusão mental. Com aumento significativo dos esquecimentos e do número de acidentes cotidianos, assim como as perturbações causadas pela perda das funções hepáticas, são indícios evidentes da necessidade de uma internação urgente. 
  3. Ciclo de mentiras: O psicólogo explica que quando o usuário entra no círculo vicioso das mentiras, sem se preocupar com as evidências que atestam a gravidade do problema, é indício da entrada em uma espiral difícil de sair sem auxílio. “Geralmente os usuários se reinternam neste estágio porque sabem que, passado este ponto, não há retorno. ‘Só paro na internação’, como tenho ouvido dizer inúmeras vezes”, comenta.
  4. Mudança de rotina: Concomitante com os sinais anteriores, mudanças de rotina, como trocar o dia pela noite, mudança radical de turma ou isolamento, descuido pessoal, esvaziamento dos compromissos e reorganização da vida em função do uso da substância, indicam um quadro à beira de uma intervenção da ordem de uma internação, explica Pablo Sauce.
  5. Furtos e violência: Um inequívoco indício da necessidade de internação é quando o usuário passa a trocar objetos por substâncias, sejam dele ou furtados da família. Ou ainda passa a se endividar para sustentar a dependência, assim como quando passa a exigir dinheiro ou objetos dos familiares.

Qualquer um destes pontos acende um sinal de alerta que indica a necessidade de acompanhamento psiquiátrico. “É importante frisar que a dependência química não é um problema moral, mas de uma questão médica que deve ser acompanhada de perto por um profissional da saúde”, ressalta o psicólogo.

Dependência química nem sempre se resolve na internação

Para Paulo Henrique Pereira Pacheco, consultor em Dependência Química do Centro Vida de Araricá, muitas famílias têm a falsa ideia de que, com a internação, o problema está resolvido. Porém, eles têm um papel primordial em todo o processo de recuperação.

Dependentes químicos precisam ser protegidos e influenciados positivamente por grupos sociais saudáveis. Normalmente, o afastamento é a primeira consequência. No entanto, as famílias precisam se preparar para abordar o dependente químico com maior eficácia”, explica.

Segundo ele, muitas vezes, algumas ações facilitam a continuidade do comportamento adictivo do dependente. Portanto, sugere-se que busquem ajuda em terapias e grupos de autoajuda como Ar-Anon e Amor Exigente para entenderem o problema e adquirirem empoderamento para a reorganização do sistema familiar.

Dependência química: dicas para que o tratamento seja correto

Caso a família ou os amigos observem alguns destes sinais, Pacheco dá dicas importantes para que o tratamento seja feito da maneira correta e até o final.

  • Ter em mente que a dependência química é uma doença e que o adicto não tem controle sobre o consumo dessas substâncias e que muitas vezes já perdeu o controle sobre a própria vida;
  • É importante estar sempre próximo para perceber as mudanças de hábitos;
  • Ser compreensivo e paciente, levando em consideração a doença, para que o adicto não fique revoltado, pois sabemos que dependendo do caso pode colocar em risco a si próprio e a terceiros;
  • É interessante tentar fazer a pessoa se divertir com coisas simples, para que se dê conta que há outras maneiras de viver e de ser feliz;
  • Usar palavras positivas, para incentivar a retomada da vida.

 

A mentira e a manipulação fazem parte da doença, estar atento é importante, pois limite, disciplina e transparência são fatores fundamentais para recomeçar”, finaliza o médico.

Em alguns casos, Acompanhamento Terapêutico pode ser indicado

Para o psicólogo Filipe Colombini, especializado em orientação parental, o Acompanhamento Terapêutico, conhecido como AT, é uma das modalidades de terapia com mais efetividade , em caso de abuso de drogas. Segundo o diretor da Equipe AT, por ser uma abordagem que trata os pacientes fora do ambiente do consultório, em geral, o AT tem uma atuação mais intensiva do que a terapia convencional.

O trabalho em ambiente natural, fora do consultório, é importantíssimo para identificar quais são os gatilhos para o uso de drogas e quais habilidades o paciente precisa desenvolver para driblar o desejo de consumo. A intervenção precisa ocorrer no dia a dia porque são muitos os estímulos do cotidiano que levam uma pessoa a usar drogas e ter comportamentos impulsivos, quando existe esta tendência”, afirma.

E é aí que entra também o papel da família. Segundo o psicólogo, estabelecer uma parceria e o vínculo saudável entre pais e filhos é extremamente importante para a luta contra as drogas ter um encaminhamento positivo. “No contexto familiar, é preciso priorizar uma comunicação afetiva, tomando cuidado para o tema não virar tabu e nem ficar restrito a ameaças, punições e regras inflexíveis”, explica Colombini.

E quando falar com os filhos sobre prevenção às drogas?

Em relação à prevenção, o psicólogo Filipe Colombini explica que a família é normalmente um elemento de proteção. E a prevenção tem relação direta com um bom suporte parental. “No caso das crianças e adolescentes, o suporte dos pais é fundamental no combate às drogas, graças à proximidade, ao acolhimento e ao afeto, junto com a colocação de limites da forma adequada e a regulação das emoções”.

Ele afirma que muitos pais têm dificuldade em identificar qual o momento certo para começar a dialogar com os filhos sobre o uso de drogas. “A idade ideal é quando o filho está se inserindo em grupos, nas fases da adolescência e da pré-adolescência”, diz o psicólogo.

É importante falar sobre esse assunto sem gerar estresse e desgastes. Um dos papéis do psicólogo é mediar a relação entre pais e filhos, por meio de orientação parental e o próprio atendimento psicológico fora do consultório”, afirma Colombini.

Fontes: Centro Vida de Araricá, Clínica Holiste e Equipe AT

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