Os males do cigarro e seus derivados começam na boca, assim como os cuidados com a saúde oral, diagnóstico precoce e o tratamento, iniciam na cadeira do dentista. Da cárie ao câncer, são muitos os prejuízos causados pelo tabagismo, que demandam intervenção precoce.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em ampla revisão sobre impacto do tabagismo na saúde oral, o consumo de tabaco (com e sem combustão) aumenta em seis vezes o risco de câncer de boca.

Também aumenta em seis vezes o risco de leucoplasia, uma lesão potencialmente maligna, que se manifesta como placa branca (lesão plana) nas superfícies da mucosa oral. O tabagismo está associado também com o aumento, em duas vezes, do risco de doença periodontal.

Além disso, a exposição ao fumo passivo resulta em um risco de uma vez e meia a duas vezes maior de causar cárie dentária em dentes decíduos e permanentes. Por fim, o relatório aponta também que fumar tabaco aumenta o risco de perda dentária em uma vez e meia.

O cigarro também é responsável por causar manchas nos dentes por conta, principalmente, da ação da nicotina e do alcatrão. A nicotina, ao se acumular nas superfícies dos dentes, deixa-os com aparência mais escura. Além disso, facilita o acúmulo de tártaro e mau hálito.

Os dados acendem um sinal de alerta neste 31 de maio, quando se realiza o Dia de Combate ao Câncer Bucal e o Dia Mundial Sem Tabaco em várias partes do mundo.

Um estudo que comparou a prevalência de periodontite, cárie dentária e patologias peri-implantares com o consumo de tabaco, reunindo mais de 22 mil pacientes, mostrou que a não exposição ao tabagismo resultaria, por si só, na redução de 37% dos casos de periodontite, 7% dos casos de cárie dentárias e 39% das patologias peri-implantares, como a mucosite.

Cigarro e saliva: um coquetel mortal

Quando exposta ao cigarro e seus derivados, a cavidade oral está mais sujeita a desenvolver câncer de boca, língua, garganta e laringe. O consumo de tabaco também aumenta o risco de periodontite, peri-implantite, cárie, osteíte alveolar (dor e odor fétido após extração de dente permanente) e halitose (mau hálito).

Outro ponto de alerta, de acordo com o dentista Sérgio Kignel, doutor em Diagnóstico Bucal, é a combinação entre cigarro e saliva, que forma um coquetel mortal, que pode levar ao desenvolvimento de câncer de boca. As substâncias derivadas do tabaco inibem a ação antioxidante da saliva.

Enquanto a saliva normalmente defende o organismo de uma série de doenças por meio de enzimas que neutralizam substâncias perigosas, o fumo destrói esses agentes, deixando uma mistura corrosiva de compostos químicos do tabaco na boca, que pode levar ao aparecimento de células cancerígenas. Assim, a saliva deixa de ser protetora, para atuar como vilã, sob influência do cigarro”, alerta.

Kignel acrescenta que esses males do cigarro ocorrem pelo fato de o produto conter vários compostos tóxicos diferentes, como nicotina, amônia, acetona, benzeno e alcatrão. Ao todo, a literatura aponta que há, ao menos, 40 substâncias cancerígenas no cigarro.

Com maior detecção em homens a partir dos 40 anos, o câncer bucal ou câncer da cavidade oral tem suas chances de cura reduzidas e tratamento mais complexo ao paciente, pois, em geral, é diagnosticado em estágios avançados.

A doença afeta lábios, estruturas da boca – gengivas, bochechas e céu da boca – língua, principalmente as laterais, a região sob a língua, as amígdalas e o palato fibroso, ou palato mole, que fazem parte da região chamada orofaringe.

 

Profissionais de saúde e a cessação do tabagismo

Diante dos males do tabagismo para a saúde bucal, é importante o papel dos dentistas na identificação dos danos deste consumo. O dentista tem papel importante também no diagnóstico de outros tumores da região de cabeça e pescoço, como o câncer de laringe, que atinge quase 8 mil pessoas no Brasil, anualmente.

Faz parte da rotina de nós, dentistas, examinar a cavidade oral em busca de sinais de alterações nas mucosas e nos dentes. Ao identificar algo anormal, cabe fazermos o manejo e encaminhamento, com foco do diagnóstico precoce”, afirma Kignel,  professor titular da disciplina de Semiologia do Centro Universitário Herminio Ometto (Uniararas).

Um estudo publicado em 2023 na revista científica Frontiers in Oral Health aponta que, quando perguntados sobre o seu papel na cessação do tabagismo de seus pacientes, os dentistas e estudantes de Odontologia entrevistados se mostraram, majoritariamente, responsáveis nesse processo, ou seja, buscar a cessação do tabagismo na prática odontológica é algo importante.

Os autores destacam que é importante eu os dentistas iniciem a discussão sobre a cessação do tabagismo, a fim de despertar a consciência e o conhecimento dos pacientes sobre as intervenções disponíveis para parar de fumar, como os grupo de apoio.

A orientação precisa começar na odontopediatra e precisa levar em conta os hábitos da nova geração, como o alto risco de uso de cigarro eletrônicos entre os jovens. A OPAS afirma que crianças e adolescentes que usam cigarros eletrônicos dobram o risco de fumar cigarros mais tarde na vida.

Medidas de prevenção

Além de abandonar o hábito de fumar, é aconselhável visitar o dentista, com foco na prevenção e diagnóstico precoce. Diante dos pacientes tabagistas, algumas condições requerem maior atenção dos dentistas e/ou estomatologistas.

Com isso, conhecer os sinais, procurar orientação médico-odontológica precoce e manter ações preventivas são fundamentais para diminuir o risco de surgimento da doença.

“Por isso, vale ficar de olho nos sinais e nas práticas de prevenção que podem ser simples, como manter uma boa higiene bucal, evitar o fumo e o alto consumo de bebidas alcoólicas, usar preservativo na prática do sexo oral, manter uma alimentação rica em legumes, verduras e frutas e estar atento a mudanças na coloração ou no aspecto da boca”, explica o oncologista Augusto Takao, da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo.

Vacina contra o HPV pode prevenir

Segundo o oncologista, o acesso à informação, os cuidados de higiene bucal e a atenção a lesões que permaneçam por mais de 14 dias, bem como evitar o tabagismo e o consumo excessivo de álcool, são as medidas consideradas mais eficazes de prevenção ao câncer bucal. O médico destaca ainda a importância da vacina contra HPV que pode prevenir esse câncer.

Descobriu-se que algumas cepas variantes do HPV, podem ocasionar o surgimento de tumores na região da orofaringe. Com isso, a vacina do HPV passou a ser prescrita no auxílio da prevenção do câncer de boca”, comenta o Dr. Takao.

É importante consultar um médico imediatamente se qualquer um desses sintomas persistir por mais de duas semanas, pois a detecção precoce é essencial para o tratamento bem-sucedido do câncer bucal. As visitas periódicas ao dentista também ajudam na identificação precoce de lesões e alterações na cavidade bucal.

Principais sinais de alerta do câncer bucal

O diagnóstico precoce é essencial para aumentar as chances de sucesso do tratamento. Os principais sinais de alerta são:

– Feridas, inchaços, nódulos ou manchas espessas em qualquer lugar em torno da boca ou garganta que não cicatrizam após duas semanas
– Áreas com lesões vermelhas ou brancas na boca ou nos lábios
– Sensação de presença de nódulos ou algo preso na garganta
– Inchaços na gengiva que dificultam o uso de próteses dentárias
– Dormência, dor ou sensibilidade em qualquer lugar da boca, incluindo a língua
– Dor no ouvido, mas sem perda de audição
– Dificuldade para mover a mandíbula ou língua, assim como para mastigar, engolir ou falar
– Dentes amolecidos sem uma causa odontológica aparente
– Dor de garganta ou rouquidão prolongada

– -Pigarro e mau hálito.

Como é feito o diagnóstico

O diagnóstico do câncer bucal é realizado por meio de exames relativamente simples, e o prognóstico da doença está ligado à fase em que ela é detectada. Um dos passos mais importantes para o diagnóstico é uma boa anamnese seguida de um correto e completo exame da cavidade bucal.

O exame clínico extra-bucal (exame da face, regiões submandibular e submentoniana e articulação temporomandibular) e intra-bucal (exame de lábios, bochecha, língua e palato), incluindo visualização e palpação, de forma a detectar anormalidades também são realizados.

São considerados alguns tipos de lesões que podem ser câncer bucal ou lesões com potencial de malignização, como leucoplasias, queilose actínica, líquen plano, na sua forma erosiva ou ulcerada.

Além disso, exames de imagem, como a tomografia ou a ressonância magnética, biópsia e endoscopia, podem ser solicitados, principalmente se as investigações prévias forem inconclusivas. O diagnóstico precoce é essencial para o tratamento bem-sucedido do câncer bucal, e a detecção em estágios iniciais aumenta significativamente as chances de cura”, enfatiza o especialista.

O impacto do tabagismo na saúde geral

De acordo com a a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS/OMS), 22,3% da população mundial consumia tabaco em 2020, sob a forma de cigarros convencionais e outras formas (charutos, cachimbo, narguilé), assim como os produtos de tabaco sem combustão e cigarros eletrônicos;

  • Esses produtos são prejudiciais não somente para a saúde oral, mas para a saúde em geral.
  • O tabagismo é uma das causas de diversas doenças não transmissíveis e mata mais de 8 milhões de pessoas por ano.
  • A expectativa de vida dos fumantes é pelo menos 10 anos menor que a dos não fumantes.
  • tabaco é o único produto de consumo legal que mata até metade dos seus utilizadores quando utilizado exatamente como pretendido pelo fabricante.
  • De acordo com  o consumo de tabaco é responsável por 15% das mortes por doenças cardiovasculares, 24% das mortes por câncer e 45% das mortes por doenças respiratórias crônicas.
  • O custo total dos cuidados de saúde relacionados com doenças atribuíveis ao consumo de tabaco atinge 422 mil milhões de dólares.

Câncer bucal em números

  • Em todo o mundo, o câncer de cavidade oral (ou câncer bucal) responde por 390 mil casos anuais e 188 mil mortes, enquanto o câncer de laringe acomete 189 mil pessoas e resulta em 103 mil mortes por ano, segundo a Agência Internacional para Pesquisa do Câncer (IARC/OMS). 
  • De acordo com o Inca, em 2020, foram estimados cerca de 530 mil casos novos em todo o planeta, sendo 373 mil casos novos em homens e cerca de 157 mil casos novos em mulheres.
  • Em 2023, ainda segundo o Inca, a estimativa foi de aproximadamente 15,1 mil novos casos no Brasil. O câncer de cavidade oral é o quinto mais comum entre o público masculino: no ano passado foram 10.900 em homens e 4.200 em mulheres. A doença é duas vezes e meia mais comum entre eles, quando comparada com a incidência no público feminino.

Com Assessorias

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