Logo que o candidato à Presidência da República, Jair Bolsonaro (PSL), recebeu uma facada durante agenda política em Juiz de Fora (MG), na quinta-feira (6), os adeptos das teorias da conspiração inundaram as redes sociais com teses sobre uma possível farsa envolvendo o atentado.

Usando um vídeo em câmera lenta, uma das principais argumentações era: cadê o sangue da faca? Ao ViDA & Ação, Alfredo Guarischi, cirurgião especializado em abdomen, do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, explica o que aconteceu e também os procedimentos pelos quais o presidenciável passou e os prognósticos em relação a sua recuperação.

Por que não tinha sangue na faca?

“A faca lisa, ao entrar e sair imediatamente, possivelmente não fica muito manchada de sangue, mas em geral deixa vestigios. Não sei se foi limpa ou envolvida em algum tecido antes de ser fotografada”, questiona Dr Alfredo. Segundo ele, a hemorragia interna ocorreu porque a faca cortou vários vasos sanguíneos.

Um cirurgião ouvido pelo ‘Estado de Minas’,  que opera  há mais de 10 anos em um hospital de Belo Horizonte, disse que o corte sofrido em uma veia abdominal, que levou o candidato a ter uma hermorragia interna, não se exterioriza de imediato, o que pode explicar também o pano branco não ter sido machado de sangue. O sangue fluiria para dentro e não para fora. Segundo ele, o líquido peritoneal (contido na cavidade abdominal) é de baixa viscosidade e, por isso, pode ter diluído o sangue.

Quais órgãos foram realmente atingidos?

A primeira informação após o atentado é de que o candidato passava bem e a facada havia sido desferida apenas de raspão. Já com o paciente na Santa Casa de Juiz de Fora, surgiu a informação de que precisaria operar porque o golpe atingiu o fígado. Em seguida, veio o esclarecimento. O candidato sofreu três perfurações no intestino delgado e uma lesão transfixante no intestino grosso.

De acordo com os boletins, vítima de traumatismo abdominal por arma branca, Bolsonaro deu entrada no hospital com sinais de choque hemorrágico avançado, com pressão muito baixa e muito pálido. Ele sofreu perfurações na região do cólon transverso, a faca atravessou o intestino de lado a lado. Na cirurgia foi feito um corte longitudinual no abdomen até o púbis. Foram feitas uma ressecção, com corte de 10 centímetros do intestino, e a colostomia.

Por que teve que fazer uma colostomia? O que é isso?

A lesão mais grave e mais profunda, no intestino grosso, foi a principal dor de cabeça dos médicos, por representar alto risco de contaminação devido à presença de fezes. Daí a necessidade de submeter o paciente a uma colostomia.

O procedimento era necessário para evitar o risco de contaminação dos órgãos internos pelas fezes que vazaram do intestino grosso no momento da facada. “Um paciente grave com lesão do intestino grosso é mais seguro fazer uma colostomia (colocar o intestino para fora do que suturar pelo rico da sutura abrir ou infecção”, explica o cirurgião.

Na colostomia, o intestino é colocado na parede abdominal, numa bolsinha, onde temporariamente serão excretados gases e fezes. Em alguns meses o paciente deverá se submeter a uma cirurgia para reversão da colostomia, voltando a ter as funções intestinais restabelecidas gradativamente.

O tempo para reverter depende do paciente estar bem. Pelo menos dois ou mais meses”, afirma Dr Alfredo.

Ele ainda corre risco de vida? Pode ter uma infecção?

Existe risco de infecção, por conta da massa fecal que fazou do intestino, e por pneumonia, já que passou muito tempo em choque e perdeu muito sangue (cerca de dois litros). De acordo com os médicos que o atenderam, “mais cinco minutos mais e ele teria morrido”. A alta hospitalar depende da evolução do quadro do paciente, mas não deve ocorrer antes de sete a 10 dias, segundo a equipe que o atende.

A infecção pode ocorrer pois a faca, ao cortar o intestino, liberou fezes. A pneumonia pode ocorrer em qualquer cirurgia de urgência. O paciente deve se recuperar em pouco tempo se não ocorrer complicações. Em geral em três dias volta o intestino a funcionar e não haverá sequelas”, disse o dr Alfredo.

‘Foi uma dor insuportável’, disse o candidato

Estava muito preocupado porque parecia uma pancada na boca do estômago, como uma bolada em um jogo de futebol. A dor era insuportável. Tinha algo mais grave acontecendo”, disse o candidato, em vídeo gravado dentro da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da Santa Casa de Juiz de Fora, em que também agradeceu à equipe médica, que “detectou e evitou um mal maior”.

A equipe médica do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, informou que está dando continuidade ao tratamento iniciado na cidade mineira. Após passar por avaliações e ser submetido a uma cirurgia para estancar hemorragia interna, o candidato foi levado para a capital paulista, na manhã desta sexta-feira (7). O candidato foi submetido a uma série de exames e, segundo boletim médico, ele encontra-se consciente e “em boas condições clínicas”.

Para AMB, golpe foi premeditado

A Associação Médica Brasileira também se manifestou em repúdio ao atentado. Para a AMB, o ataque foi premeditado por conta do local onde a facada foi dada, pelo alto risco de morte.

“Provavelmente as investigações chegarão à conclusão de que o ataque foi premeditado, dado o local onde a facada foi dada. Quem fez sabia o que estava fazendo e queria que o golpe fosse fatal”, afirma a nota.

O presidente da AMB, Lincoln Ferreira, médico cirurgião mineiro, acompanhou o trabalho da equipe médica da Santa Casa de Juiz de Fora, onde o candidato recebeu as e foi operado. A cirurgia, que durou quatro, transcorreu bem e a hemorragia foi controlada.

Segundo a nota, o paciente foi “atendido por uma equipe altamente capacitada e comprometida” e que sua recuperação “é importante não só para ele e sua família, mas principalmente para a democracia brasileira”.

ONU condena atentado

Apesar de ele ser contra os direitos humanos… os direitos humanos também valem para ele. O Escritório para a América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) condenou nesta sexta-feira (7) o ataque contra Jair Bolsonaro.

“Confiamos nas autoridades brasileiras para uma pronta investigação e punição dos responsáveis”, comentou a representante regional para América do Sul do ACNUDH, Birgit Gerstenberg, expressando a solidariedade de seu Escritório com o candidato.

O ACNUDH também observou o crescimento das tensões nas últimas eleições em países da América Latina e manifestou preocupação com os casos de ameaças contra candidatos concorrendo a cargos nos poderes executivo e legislativo no Brasil.

Para Birgit Gerstenberg, “o processo eleitoral precisa garantir o direito à participação nos assuntos públicos, incluindo o direito à vida e à integridade física, bem como às liberdades de expressão, reunião e associação”.

 

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