O governo Jair Bolsonaro — que já minimizou a doença causada pelo novo coronavírus chamando-a de “gripezinha” – agora busca tornar invisíveis os mortos pela Covid-19 no país e demonstra “profunda ignorância sobre o tema”. “A tentativa autoritária, insensível, desumana e antiética de dar invisibilidade aos mortos pela Covid-19, não prosperará”, diz o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass).
Em nota, a entidade criticou declarações dadas pelo empresário Carlos Wizard, secretário de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde, de que os dados das secretarias são “fantasiosos”. Disse que o posicionamento de Wizard “insulta a memória de todas aquelas vítimas indefesas desta terrível pandemia e suas famílias”.
Wizard disse, de acordo com reportagem do jornal O Globo, que o ministério fará uma recontagem das mortes por Covid-19, doença respiratória causada pelo novo coronavírus, pois alguns gestores locais teriam inflado os números para obter uma fatia maior do orçamento de combate à pandemia. Ele não apresentou quaisquer evidências da alegação que fez.
Em nota, a Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos, informou que retirou o Brasil da lista de monitoramento da Covid-19. O levantamento da instituição americana é referência mundial na contabilização de casos de coronavírus. Nos últimos dias, o governo brasileiro vem atrasando a divulgação dos dados oficiais.
A universidade explicou que a retirada foi causada pela suspensão da divulgação dos dados na plataforma do Ministério da Saúde. O portal saiu do ar na noite de sexta-feira e retornou neste sábado, mas sem indicar os dados totais de casos e mortes desde o início da pandemia. A universidade prometeu reincluir as estatísticas brasileiras assim que houver a normalização
Desde a última quarta-feira, o Ministério da Saúde, comandado interinamente pelo general Eduardo Pazuello, passou a divulgar os dados sobre a pandemia de Covid-19 no país às 22 horas — o dado saía entre 16h e 17h durante a gestão de Luiz Henrique Mandetta e às 19h sob comando de Nelson Teich.
Guerra contra o Jornal Nacional
Os dados divulgados na sexta trouxeram apenas o número de novos casos e novas mortes causadas pela doença, sem informar os totais, como era feito até então. Além disso, o site do ministério da Saúde onde eram divulgadas várias informações relativas à pandemia (covid.saude.gov.br) foi retirado do ar na noite de sexta-feira e neste sábado mostra apenas a mensagem “Portal em manutenção”.
Indagado na sexta sobre o atraso na divulgação dos dados, Bolsonaro afirmou: “Acabou matéria do Jornal Nacional”, numa referência ao telejornal da TV Globo transmitido pouco depois do horário em que os dados da doença costumavam ser informados pelo ministério”
Apesar da tática de publicação dos números fora do horário do telejornal, na sexta-feira a emissora interrompeu transmissão da novela para transmitir os números da doença. Até sexta-feira, o Brasil tinha 645.771 casos confirmados de Covid-19, com 35.026 mortos, segundo cálculos com base nos números informados anteriormente pelo ministério.
Em todo o mundo, mais de 7 milhões de casos
Os casos de Covid-19 no mundo superaram a marca dos 7 milhões neste sábado, com salto no número de ocorrências no Brasil e na Índia, segundo contagem da Reuters. Cerca de 30% destes casos, ou 2 milhões de infecções, estão nos Estados Unidos. A América Latina tem o segundo maior número, com 15% dos casos.
No mundo, as mortes causadas pelo novo coronavírus se aproximam de 400 mil. Os EUA contam cerca de 25% das mortes, mas na América do Sul o registro tem rapidamente crescido, puxado pelo Brasil. O número de mortes vinculadas à Covid-19 em cinco meses no mundo é agora igual ao número de pessoas mortas anualmente por malária, uma das doenças infecciosas que mais matam.
A primeira morte por Covid-10 foi registrada em 10 de janeiro, em Wuhan, na China. Em abril, o número de mortos já superava 100 mil, segundo levantamento da Reuters com base em dados oficiais de governos ao redor do mundo. A doença precisou de 23 dias para sair de 300 mil para 400 mil mortes.
Os EUA são o país com maior número de mortos de Covid-19, quase 110 mil. Mas o Brasil está rapidamente alcançando e poderá superar o Reino Unido ao registrar o segundo maior número de mortes pelo novo coronavírus no mundo.
Na sexta-feira, o Ministério da Saúde informou que o Brasil registrou mais 1.005 mortes em decorrência do novo coronavírus, elevando a contagem total para 35.026. O número de casos cresceu em 30.830 novas infecções, o que fez com o total no país atingir 645.771, segundo o ministério.
O número de mortos no mundo é provavelmente maior que o oficialmente informado pelos governos uma vez que muitos países não fazem testes de todas as vítimas e alguns deles não contam mortos fora de hospitais.
Ameaça de sair da OMS
Na sexta-feira, o presidente Jair Bolsonaro fez críticas ao trabalho da Organização Mundial da Saúde (OMS) na pandemia e disse que o governo pode deixar a organização que, de acordo com ele, atua “com viés ideológico”. No fim de maio, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou a saída do país da OMS, congelando repasses que o governo norte-americano faria à entidade.
“E adianto aqui, os Estados Unidos saíram da OMS, e a gente estuda, no futuro, ou a OMS trabalha sem viés ideológico, ou vamos estar fora também. Não precisamos de ninguém de lá de fora para dar palpite na saúde aqui dentro”, disse Bolsonaro a jornalistas na portaria do Palácio da Alvorada, na noite desta sexta-feira (5).
O presidente fez referência à controvérsia causada pelas pesquisas que a OMS conduzia sobre a hidroxicloroquina no tratamento do novo coronavírus. “Para que serve essa OMS? A OMS recomendou há poucos dias não prosseguir mais com os estudos sobre a hidroxicloroquina, e agora voltou atrás. É só tirar a grana deles que eles começam pensar de maneira diferente”, disse Bolsonaro.
A OMS retomou esta semana os estudos com o medicamento, após aplicar uma suspensão dos testes por 10 dias, depois da revisão de um estudo publicado pela revista médico-científica The Lancet.
A OMS é uma agência internacional especializada em saúde, fundada em 7 de abril de 1948 e subordinada à Organização das Nações Unidas (ONU). Com sede em Genebra, na Suíça, a entidade é composta por 194 Estados-Membros e dois membros associados. No caso do Brasil, para aderir à organização, o país ratificou internamente um tratado internacional de criação da agência. Uma eventual saída desse tratado teria que passar pelo Congresso Nacional.
Divulgação de balanço
Bolsonaro também comentou a mudança de horário na divulgação do balanço das infecções e mortes por covid-19, atualizado diariamente pelo Ministério da Saúde. Desde a última quarta-feira (3), a pasta só envia os dados consolidados do dia por volta das 22h. Antes, esse balanço era enviado por volta das 19h.
“É para pegar os resultados mais consolidados e tem que divulgar os mortos do dia. Ontem, os mortos eram de dias anteriores. Se quiser, faz um consolidado para trás, mas tem que mostrar os mortos do dia”, disse Bolsonaro, sobre a metodologia de divulgação adotada pelo Ministério da Saúde.
Em comunicado à imprensa, o ministério informou que os números de casos de covid-19 e de mortes causadas pela doença são repassados à pasta pelas secretarias estaduais e municipais de Saúde. O ministério acrescenta que analisa e consolida os dados e que em alguns casos “há necessidade de checagem junto aos gestores locais”.
“Desta forma, o Ministério da Saúde tem buscado ajustar a divulgação dos dados, que são publicados diariamente na plataforma covid.saude.gov.br“, destaca o texto.
Com Assessorias