Minutos após o pronunciamento oficial do governador Wilson Witzel e a publicação de um decreto “game change” anunciando medidas severas para conter o avanço do novo coronavírus no Estado do Rio de Janeiro, um clima de medo, ansiedade e pânico já estava instalado dentro e fora das redes sociais na fatídica sexta-feira, 13 de março. O nome do governador entrou rapidamente para os Trending Topics do Twitter já no fim da tarde, a maioria elogiando as medidas preventivas; outros, ainda com desconfiança e resistência em seguir as orientações.
No trabalho, aplicativos de conversas e redes sociais não se falava mais outra coisa. Choviam mensagens nos grupos de whatsapp e facebook de que eventos, manifestações, shows musicais e outras atividades eram cancelados ou adiados para evitar aglomerações. A vida noturna e cultural da cidade sofria um choque de realidade em plena sexta-feira de verão. A sensação era de que, no dia do já tradicional #sextou, o Rio parou. Ou quase.
Em minha pequena bolha, não foi diferente. No email da Redação do ViDA & Ação, pipocaram notas oficiais cancelando os mais diferentes eventos – de congressos médicos a festival de rock (e não apenas no Rio, mas também em outras capitais, visto que as medidas anunciadas aqui se multiplicam em várias cidades do país). Na saída do trabalho, no Centro da cidade, o movimento nos bares a caminho do metrô era visivelmente menor por volta das 20 horas.
O Circo Voador imediatamente comunicou o adiamento do show dos Paralamas do Sucesso, para o qual o jornalista Vinicius Marins levaria a esposa. O espetáculo “O Som e a Fúria – um estudo sobre o trágico”, ao qual eu iria assistir com o amigo e jornalista Chico Aguiar no Oi Flamengo, também foi cancelado. Optamos por jantar no Seriguela, ali perto, que tinha um terço do movimento geralmente típico das sextas-feiras, segundo frequentadores.
Na volta, passando pela noite sempre efervescente da Lapa, percebemos muita gente se acotovelando para ouvir e dançar ao som da música nas calçadas de alguns bares, alheios às recomendações para evitar aglomerações. Era o outro efeito causado pelo coronavírus: o da negação. Muitos – na maioria jovens – não temem os riscos da anunciada pandemia mundial.
Apesar do rebuliço nas ruas, dentro das casas, a realidade não parecia ser a mesma de uma sexta-feira. Um dos endereços mais badalados do pedaço para quem gosta de samba, o Baródromo estava visivelmente vazio para os padrões da casa numa sexta-feira, mesmo tendo no palco o grupo Arruda, um dos melhores da cidade.
Pé na areia: carioca deixa de ir à praia
Outro ícone da vida cultural cidade – símbolo do carioca – também sofreu um revés em tempos de coronavírus. Neste sábado (14), sites e agências mostraram praias praticamente vazias para um final de semana ensolarado de verão, com sensação térmica de quase 40 graus. “Praia de Copacabana triste para um sábado. Daria até para jogar frescobol molhando os pés”, comentou o jornalista Cleyber Fintelman, morador de Copa, ao observar as fotos publicadas pelo Globo Online.
Já no Leblon, Barra e Recreio, o número de pessoas que botou os pés na areia foi menor que em fins de semana anteriores, mas longe do que se poderia chamar de vazias. Alguns frequentadores acharam exagero a medida de evitar também as praias, por se tratar de local aberto e arejado, aparentemente não apropriado para a proliferação do coronavírus, embora concordem que o transporte público seria impactado com mais pessoas a caminho do mar. À Agência Brasil, teve quem revelasse não acreditar no contágio pelo vírus ao ar livre, debaixo do sol.
A TV Band também mostrou a Praia de Copacabana vazia para um sábado ensolarado e quente, enquanto os supermercados triplicaram o movimento e alguns até enfrentam falta de produtos como arroz e papel higiênico nas prateleiras. Já a Globonews mostrou que as medidas alteraram a rotina do carioca e a Praia do Arpoador estava bem mais vazia, num dia de sol forte e céu limpo – veja aqui.
Corrida a farmácias e supermercados
Na noite de sexta-feira, horas depois do decreto do governador, passei novamente por uma das farmácias mais movimentadas do Centro do Rio, a Pacheco ao lado do Metrô da Carioca. Estava vazia, mas a busca foi em vão: nada de álcool gel, nem máscaras. Um cartaz no caixa avisava os limites para compra em até 5 unidades para o álcool gel e 2 caixas para máscara descartável.
O racionamento tem sido necessário. Segundo um funcionário, logo pela manhã bem cedo os clientes fazem fila na porta e imediatamente acabam os produtos mais cobiçados do momento – a exemplo da correria que foi a busca por água mineral, recordista de vendas no Rio neste verão, por conta da água das torneiras contaminada por geosmina.
Aliás, água mineral é que o não falta mais nas gôndolas e o preço até baixou no supermercado em frente da minha casa. Na manhã deste sábado, levei três vezes mais tempo que o comum para fazer as comprinhas da semana – nada em excesso ou para estoque, apenas para reposição. O motivo? As filas enormes nos caixas.
Contrariando recomendação do governador, muita gente correu para comprar alimentos e gêneros de primeira necessidade, temendo um desabastecimento. O Superprix baixou a taxa de entrega em domicílio (de R$ 7 para R$ 5) para não deu conta de atender a tantos pedidos. E teve que suspender o serviço antes mesmo do meio dia, gerando insatisfação de clientes na loja da Tijuca.
Nos grupos de whatsapp, circulou uma imagem de um cartaz (ao lado) sugerindo que o Guanabara – um dos maiores e mais populares hipermercados da cidade – deixaria de funcionar de 16 a 20 de março, o que causou ainda mais alvoroço. Em nota, a assessoria da rede esclareceu que as lojas funcionam normalmente. “A informação desse cartaz é direcionada ao setor de compras, que realiza atendimento com hora marcada e a agenda da próxima semana está toda comprometida”, informou.
Risco de desabastecimento é monitorado
No final da tarde, a Associação de Supermercados do Estado do Rio de Janeiro (Asserj) emitiu uma nota que confirma a grande corrida aos estabelecimentos. E, para causar ainda mais alarde, informou que “até o momento o abastecimento nos supermercados segue dentro da normalidade”. Entre os produtos mais procurados nos supermercados estão papel higiênico, leite, sucos e alimentos congelados.
A entidade assegura que, “devido ao aumento de vendas em algumas lojas, as redes de supermercados estão preparadas e tomando medidas preventivas, como o estreitamento de parcerias com os fornecedores, antecipando pedidos de compras e trabalhando com estoques mais elevados do que a normalidade para garantir uma melhor entrega para a população”.
A Asserj ressalta que os supermercados prestam um serviço essencial de abastecimento para toda a sociedade e segue em constante monitoramento da situação junto aos órgãos competentes. E reitera ainda que, “neste momento, não há necessidade de preocupação por parte dos moradores do Estado e de corridas aos supermercados”. Em vídeo, o presidente da Asserj, Fábio Queiroz, chegou a afirmar que gravará pronunciamentos diários para que a população seja comunicada oficialmente sobre a movimentação.