O Brasil enfrenta uma crise de saúde mental que impacta diretamente trabalhadores e empresas. Dados do Ministério da Previdência Social revelam que, em 2024, mais de 472 mil pessoas precisaram se afastar do trabalho devido a transtornos como ansiedade e depressão, o maior número registrado nos últimos dez anos. O aumento acende um alerta sobre as condições de trabalho, a sobrecarga emocional e a falta de suporte psicológico adequado.
Nesta segunda-feira (28 de abril) é o Dia Mundial de Segurança e Saúde no Trabalho e também no Brasil o Dia Nacional em Memória das Vítimas de Acidentes de Trabalho e Doenças Ocupacionais – que são aquelas decorrentes do exercício da profissão. O levantamento do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, com base em dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), aponta que de 2022 a 2024, a cada 3 horas e meia, é registrada uma morte no mercado formal de trabalho. De 2012 a 2024 foram registrados 8,8 milhões de acidentes de trabalho e 32 mil mortes.
Mas muito além das lesões por esforço repetitivo ou de acidentes envolvendo as mãos, nossa principal ferramenta de trabalho, os especialistas estão muito preocupados com a saúde mental dos trabalhadores brasileiros. O bem-estar psicológico é essencial para prevenir acidentes e doenças ocupacionais, contribuindo para um ambiente laboral mais seguro e produtivo.
Os principais fatores que afetam o bem-estar dos trabalhadores
A crise de saúde mental no ambiente de trabalho não surge isoladamente, mas é resultado de um conjunto de fatores que impactam diretamente o bem-estar dos profissionais. Sobrecarga de trabalho, pressão por metas inatingíveis, falta de reconhecimento, conflitos interpessoais, assédio moral e sexual, e a ausência de autonomia para execução de tarefas contribuem significativamente para esse cenário.
Esses desafios, aliados a ambientes tóxicos e a exigências desequilibradas entre vida pessoal e profissional, intensificam os níveis de estresse e ansiedade, levando ao recorde de afastamentos.
Para o psicólogo Valney José, esse cenário evidencia um problema estrutural que precisa ser enfrentado com urgência. “A sobrecarga no ambiente profissional, a insegurança no emprego e a dificuldade de equilibrar vida pessoal e carreira são alguns dos principais gatilhos para o adoecimento mental. Precisamos de políticas eficazes que incentivem a promoção da saúde mental dentro das empresas e na sociedade como um todo”, afirma Valney.
Norma trabalhista obriga empresas a gerir os riscos à saúde mental
Diante desse cenário alarmante, o Ministério do Trabalho anunciou a atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR–1), que estabelece diretrizes para a promoção da saúde no ambiente de trabalho. A nova versão da norma – que começa a valer a partir de 26 de maio – reforça a importância da adoção de políticas preventivas e do desenvolvimento de ações que garantam melhores condições psicológicas para os trabalhadores.
O cuidado com a saúde mental no ambiente de trabalho deve ser uma prioridade para empresas e gestores. Ambientes tóxicos, cobranças excessivas e falta de reconhecimento impactam diretamente o bem-estar emocional dos colaboradores, levando a quadros de esgotamento, baixa produtividade e aumento do absenteísmo. O especialista reforça que a prevenção deve ser prioridade e que o debate sobre saúde mental precisa ganhar espaço dentro das organizações.
A criação de espaços de acolhimento, flexibilidade na jornada e incentivo ao acompanhamento psicológico são medidas fundamentais para a construção de uma cultura organizacional mais saudável e sustentável”, diz o especialista em saúde mental.
Abril Verde conscientiza sobre saúde e segurança no trabalho
No contexto do Abril Verde, em alusão ao Dia Mundial da Segurança e da Saúde no Trabalho, celebrado em 28 de abril, é fundamental destacar a relevância da saúde mental dos trabalhadores. Durante este mês, empresas e organizações são incentivadas a implementar ações que promovam a saúde mental, como programas de suporte emocional, palestras educativas e a criação de espaços de diálogo abertos sobre o tema.
Medidas como avaliações de risco psicossocial, programas de suporte emocional e a criação de canais seguros para denúncias de assédio são essenciais para transformar as relações de trabalho e reduzir os índices de afastamento por transtornos mentais. A alta nos afastamentos reforça a necessidade de ampliar o acesso ao atendimento psicológico, reduzir estigmas e criar redes de apoio que favoreçam o cuidado integral da saúde mental no país.
Investir no bem-estar dos colaboradores não é um custo, mas um benefício. Empresas que adotam práticas de apoio emocional e ambientes mais saudáveis colhem resultados positivos, tanto em produtividade quanto na retenção de talentos”, destaca o professor, palestrante, músico e criador do projeto “Diálogos Musicados Sobre Saúde Mental” que já percorreu mais de 100 cidades pela Bahia.
Palavra de Especialista
Abril Verde: pela construção de ambientes de trabalho mais seguros, humanos e dignos
O Abril Verde não é apenas um mês de conscientização, é um marco simbólico que nos lembra de que vidas estão em risco todos os dias e que temos o dever de agir. É um chamado para uma causa urgente e inadiável: a saúde e a segurança dos trabalhadores.
Como empresa que atua diretamente com vítimas de acidentes laborais, sabemos o quanto é doloroso e desafiador acompanhar a vida de trabalhadores que tiveram sua trajetória profissional e pessoal interrompida por falhas que poderiam (e deveriam) ter sido evitadas. A prevenção de acidentes não é apenas uma exigência legal, mas um ato de respeito à vida.
Somente em 2022, o Brasil registrou mais de 612 mil acidentes de trabalho, com 2.538 mortes, segundo dados do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho. Esses números são mais do que simples estatísticas — são vidas interrompidas, famílias desestruturadas, histórias que não deveriam ter sido interrompidas tão cedo.
A cultura de segurança precisa estar no DNA das organizações. Isso começa com a educação contínua, passa pelo uso correto e obrigatório de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e se consolida com a participação ativa de líderes e gestores na rotina de segurança.
Infelizmente, ainda vemos empresas tratando a segurança como um item burocrático, algo a ser “resolvido no papel”. Esse comportamento coloca em risco não só os colaboradores, mas também a própria sustentabilidade do negócio. Acidentes geram afastamentos, ações judiciais, indenizações, além de manchar a reputação corporativa.
Além disso, é necessário lembrar que os riscos não são apenas físicos. O adoecimento mental causado pelo estresse, ansiedade, assédio moral e pressão excessiva também deve ser central nas políticas de saúde do trabalho. A saúde mental é um direito, e o ambiente corporativo precisa ser mais humano e acolhedor.
Outro ponto importante, porém pouco divulgado, é o direito do trabalhador de recusar tarefas que ofereçam risco iminente à sua vida ou integridade, conforme previsto na NR–1 do Ministério do Trabalho. Cabe às empresas não apenas respeitar esse direito, mas garantir que ele seja conhecido e respeitado no ambiente de trabalho.
Quando um acidente acontece, o acompanhamento e apoio ao trabalhador são indispensáveis. Isso inclui o devido preenchimento da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), o acesso ao auxílio-doença acidentário (B91) e a garantia da estabilidade no emprego por 12 meses após a alta médica. O colaborador precisa se sentir amparado nesse momento tão difícil.
Por fim, a construção de uma cultura de prevenção começa com uma liderança comprometida, capacitação constante, mapeamento e mitigação de riscos reais, além do engajamento de todos, da base ao topo da hierarquia.
Transformar o ambiente de trabalho em um espaço seguro, saudável e digno é uma responsabilidade de todos nós, é um compromisso coletivo. Vamos fazer do Abril Verde um ponto de partida para que, ao longo de todo o ano, cada trabalhador volte para casa com saúde e com segurança.
*Caroline Alves é head de Planejamento da DS Beline