De acordo com o censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 15% da população total do país é composta por pessoas de 60 anos ou mais. Dados do IBGE divulgados recentemente confirmam o que especialistas já previam: em 2046, 28% da população terá 60 anos ou mais, percentual que subirá para 37,8% em 2070. Mais de um terço dos brasileiros será idoso, enquanto a população total do país começará a diminuir a partir de 2042.

Estes números chamam a atenção de especialistas neste Dia Internacional e Dia Nacional do Idoso (1 de outubro). uma data dedicada a despertar a sociedade para as questões do envelhecimento e da necessidade de promover ações que melhorem e que zelem pela vida da população idosa.

“Em vinte anos, a população idosa no Brasil dobrou em números absolutos e trouxe novas questões, novas demandas e a necessidade de revisão de conceitos, parâmetros e até de modelos de serviços e programas que pudessem atender de maneira mais efetiva a essa população”, aponta a presidente do Departamento de Gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), Naira Dutra Lemos.

A violência contra a pessoa idosa é uma questão social grave que cresce com o envelhecimento da população. A Organização das Nações Unidas (ONU) destaca que a discriminação etária é uma grave violação dos Direitos Humanos e a data é reconhecida pela Resolução 66/127 da Assembleia Geral da ONU, de 11 de dezembro de 2011.

Segundo a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH), foram registradas mais de 82 mil denúncias de violência contra idosos somente em 2021. Além disso, nos primeiros três meses de 2024, a ONDH registrou 42.995 denúncias de violações contra pessoas com 60 anos ou mais, um aumento significativo em comparação com os mesmos períodos de 2023 e 2022, que tiveram 33.546 e 19.764 registros, respectivamente.

A Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) também tem se preocupado com o aumento da violência contra pessoas 60+, que há representam a população que mais cresce no estado. A Comissão da Pessoa Idosa da Alerj mantém um serviço gratuito (0800 0239191) para receber denúncias sobre violação de direitos. Em média, o serviço recebe pelo menos uma denúncia a cada dia, mas a maior preocupação é com o grande número de casos que não chegam ao conhecimento das autoridades. A Comissão encaminha todas as denúncias para órgãos como Defensoria Pública, Ministério Público e Polícia Civil para que tomem providências imediatas.

Violência patrimonial é a que mais cresce

A violência contra os idosos pode se manifestar de várias formas, incluindo abusos físicos, psicológicos, financeiros, negligência e abandono. De acordo com Paulo Akiyama, advogado especializado em direito de família no Brasil, a conscientização sobre a violência contra a pessoa idosa é fundamental, especialmente em um contexto de aumento significativo das denúncias de abusos. “São números alarmantes que ressaltam a urgência de medidas eficazes para proteger essa população vulnerável”, diz. 

“A violência psicológica é uma das mais devastadoras, causando intenso sofrimento emocional, angústia, depressão e diminuição da autoestima. A situação é agravada quando o agressor é uma pessoa próxima à vítima, dificultando a denúncia”, pontua o advogado.

Já a violência financeira tem se tornado cada vez mais comum, frequentemente perpetrada por familiares próximos, segundo Dr. Paulo. Casos de uso indevido de cartões, aposentadorias, empréstimos consignados e venda de bens sem autorização são algumas das formas dessa violência. 

Estatuto da Pessoa Idosa

Uma importante conquista legal para a proteção dos direitos daqueles com mais de 60 anos foi a promulgação da Lei nº 10.741, conhecida, inicialmente, como Estatuto do Idoso, posterior e corretamente alterada para Estatuto da Pessoa Idosa. Os principais pontos desta legislação são: prioridade em atendimentos de saúde, setores públicos e privados, reserva de vagas especiais e descontos ou gratuidades em transportes coletivos e benefícios previdenciários especiais.

A legislação brasileira, através do Estatuto do Idoso, estabelece que “o idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana”. No entanto, é importante que esses direitos sejam conhecidos e reivindicados. As agressões podem se manifestar de diversas formas e assegurar que os idosos conheçam seus direitos e tenham acesso a mecanismos de denúncia é fundamental para combater essa realidade.

“O Estatuto da Pessoa Idosa veio referendar o conteúdo da primeira política pública voltada à população idosa, elaborada e publicada no Brasil, a Política Nacional do Idoso, de 1994 e a SBGG, como entidade que estimula e apoia o desenvolvimento e a divulgação do conhecimento científico na área do envelhecimento é uma grande incentivadora deste documento”, explica.

A efetivação desses direitos ainda enfrenta desafios, como a necessidade de implementação adequada das políticas públicas e a conscientização da sociedade sobre a importância de tratar os idosos com respeito e dignidade. Porém, segundo a Dra. Naira Dutra Lemos isso não impede de valorizar o que já foi conquistado.

“Certamente, ainda há muito a ser feito quando falamos de direitos das pessoas idosas, nos mais diversos campos e quando pensamos nas possibilidades de construção de novas políticas públicas mas isto não nos impede de valorizar o que já foi feito, especialmente, enaltecer o Estatuto da Pessoa Idosa, uma grande conquista. O Estatuto foi, e ainda é, o propulsor de importantes debates, ideias e ajustes, os quais muitos hoje se encontram consolidados”, pondera.

Profissionais de saúde devem denunciar

Nesse contexto, a conscientização e o acesso à informação são essenciais. Para isso, o Estatuto do Idoso, oferece uma estrutura legal para proteger os direitos dessas pessoas, mas é necessário também que a sociedade e os profissionais de saúde estejam atentos e preparados a apoiar a população na reivindicação desses direitos.

Profissionais de saúde, que têm a confiança dos idosos, desempenham um papel crucial na orientação e apoio a essas vítimas, promovendo ações preventivas e esclarecendo as consequências da violência. Para denunciar casos de violência contra a pessoa idosa, basta ligar para o Disque Denúncia 100. 

Idosos recebem exemplares do.Estatuto

“É muito importante fazer com que o Estatuto, que completou 21 anos em setembro, seja de fato cumprido e respeitado por toda a sociedade”, disse o presidente da Comissão da Pessoa Idosa da Alerj, deputado Munir Neto (PSD).

Em homenagem ao Dia Internacional e Dia Nacional do Idoso, comemorados nesta terça-feira, 1o de outubro, ele visitou um centro dia para atendimento a pessoas acima dos 60+ no interior do estado. Ele homenageou os idosos com vasinhos de flores e entregou exemplares do Estatuto.

Acompanhado da equipe da Comissão, Munir Neto também conversou com pessoas idosas nas ruas, questionando sobre o que pensam sobre o Estatuto e distribuindo cópias do documento. Seu Tarcísio, engenheiro aposentado, por exemplo, respondeu que apenas parcialmente eles têm seus direitos respeitados e que é importante cobrá-los.

Palavra de Especialista

Como o Brasil pode enfrentar os desafios da transição demográfica

População está envelhecendo rapidamente e os impactos precisam encarados

Por Rubens De Fraga Júnior*

No campo da saúde o impacto será significativo. O aumento da longevidade é uma conquista que deve ser celebrada, mas traz consigo um aumento proporcional na prevalência de doenças crônicas, como diabetes, hipertensão e doenças cardiovasculares. O Brasil já enfrenta dificuldades para lidar com essas condições na população mais jovem, e o cenário entre os idosos tende a ser ainda mais complexo. Precisaremos de um sistema de saúde que consiga lidar com a diversidade de condições associadas ao envelhecimento, promovendo um cuidado integral e multidisciplinar.

A pandemia de Covid-19 nos deu uma amostra de como as condições de saúde da população idosa podem ser comprometidas em situações de crise e de como o sistema de saúde ainda é frágil para lidar com um envelhecimento em massa. O aumento da demanda por serviços médicos, somado à escassez de profissionais capacitados para atender as necessidades específicas da geriatria, acentua as incertezas sobre a capacidade do Brasil de prover um cuidado adequado para essa população.

O aumento da população idosa exigirá uma adaptação na oferta de serviços de saúde, e também na infraestrutura urbana, transporte e moradia. As cidades precisam ser preparadas para garantir acessibilidade, mobilidade e segurança para aqueles que, em sua maioria, terão limitações físicas ou de locomoção. O envelhecimento deve ser visto como parte natural da vida, e não como um fardo social ou econômico.

A previdência é outro aspecto relevante neste cenário. Com menos trabalhadores em idade ativa e mais idosos se aposentando, o equilíbrio financeiro do sistema estará em xeque. Hoje, 76% dos idosos no Brasil recebem aposentadoria ou pensão, mas, com a tendência de diminuição da população economicamente ativa, como manter a sustentabilidade desse sistema? O envelhecimento da população exige uma revisão profunda de como organizamos o trabalho, o emprego e as aposentadorias.

O Brasil precisa transformar o envelhecimento populacional em uma oportunidade para a inovação e o desenvolvimento. Com soluções baseadas em evidências para enfrentar a transição demográfica, com foco na criação de políticas públicas que integrem saúde, previdência e economia.

O envelhecimento populacional é uma realidade global e irreversível. Países como o Japão e a Alemanha já enfrentam esse fenômeno há décadas e têm buscado maneiras inovadoras de lidar com as implicações econômicas e sociais. O Brasil, embora em uma fase mais inicial, pode aprender com as experiências internacionais, adotando políticas que priorizem a inclusão social dos idosos, o envelhecimento ativo e o cuidado integral.

Como professor de gerontologia e médico geriatra, vejo com preocupação os desafios que estão por vir, mas também com esperança de que, se trabalharmos juntos, poderemos transformar o Brasil em um país que valoriza a vida em todas as suas fases. É necessário agir agora para construir um futuro no qual o envelhecimento não seja visto como um problema, mas como uma oportunidade para criar uma sociedade mais inclusiva, saudável e justa”.

* Preceptor da disciplina de gerontologia da Faculdade Evangélica Mackenzie do Paraná (Fempar). Médico especialista em geriatria e gerontologia pela SBGG. Editor do Resenhas em Gerontologia.

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