No Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, estima-se que 1 a cada mil nascidos vivos possam ser afetados por alguma forma de talassemia, um tipo de anemia hereditária crônica causada por uma falha genética que afeta a produção de hemoglobina. Atualmente, cerca de 1.600 brasileiros, segundo dados da Associação Brasileira de Talassemia (Abrasta), vivem com a doença.
Com formas que variam de leves a severas, a talassemia pode comprometer significativamente a qualidade de vida dos pacientes, Nos casos mais graves, os pacientes precisam de transfusões de sangue regulares. a Embora rara, a doença preocupa, já que pode trazer complicações graves ao paciente. O acompanhamento especializado é essencial para a qualidade de vida dos talassêmicos.
Ele pode prevenir complicações da doença, que vão do atraso no crescimento à fraqueza muscular, anemia severa, deformações ósseas e alterações craniofaciais. “No caso de pessoas com o tipo mais grave de talassemia são necessárias transfusões de sangue ao longo de toda a vida. Já a cura requer um transplante de medula”, explica a biomédica e professora Yasmin Ribeiro, é essencial
O tratamento é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS). São Paulo concentra a maioria dos atendimentos (68%), seguido pelo Paraná (24%). O portador de talassemia precisa fazer transfusões sanguíneas constantes, em geral uma vez por mês.
Entre 2012 e 2022 foram realizados no país quase 134 mil procedimentos, a maioria transfusões de concentrado de hemácia. Só no Paraná foram cerca de 30 mil intervenções clínicas. Os pacientes portadores de talassemia são assistidos no ambulatório do Centro de Hematologia e Hemoterapia do Paraná (Hemepar), local de referência no Estado.
Doença é mais comum nos homens
Entre os desafios está o desconhecimento sobre a doença. De acordo com a Federação Internacional de Talassemia (TIF), mais de 100 milhões de pessoas em todo o mundo são portadoras de alterações em genes relacionados à talassemia, muitas delas sem sequer saber.
Mais de 300 mil bebês nascem todos os anos com formas graves do problema. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que cerca de 60 mil crianças nascem com talassemiaa cada ano no mundo.
Um estudo publicado em 2024 na revista The Lancet apresenta dados de talassemia na população mundial a partir de informações extraídas do Estudo da Carga Global de Doenças (GBD). De 1990 a 2019, o número de casos incidentes de talassemia, casos prevalentes, casos de mortalidade e anos de vida ajustados por incapacidade (DALYs) diminuíram 20,9%, 3,1%, 38,6% e 43,1%, respectivamente.
A taxa de prevalência global foi maior em homens do que em mulheres e a taxa de mortalidade global apresentou uma diminuição consistente com o aumento da idade. A conclusão dos autores é que a carga global da talassemia diminuiu significativamente, mas existem disparidades notáveis em termos de gênero, faixas etárias, períodos, índice de desenvolvimento social (IDS), entre outras variáveis.
Os pesquisadores afirmam que intervenções sistêmicas, que incluem triagem precoce, aconselhamento genético, exames de saúde pré-marital e diagnóstico pré-natal devem ser priorizadas em regiões com IDS baixo e médio-baixo. Além disso, os autores ressaltam que futuros estudos populacionais devem se concentrar especificamente nos subtipos de talassemia e na necessidade de transfusão, e os registros nacionais devem aprimorar a captura de dados por meio da triagem neonatal.
Dia Internacional da Talassemia e Dia Nacional das Hemoglobinopatias
Para divulgar e conscientizar a população sobre a doença, seus sintomas e cuidados foi instituído em 8 de maio oDia Internacional da Talassemia / International Thalassaemia Day. A data chama a atenção para uma das doenças genéticas mais frequentes no mundo.
As ações deste dia buscam dar visibilidade às dificuldades enfrentadas pelos portadores da doença e incentivar a adoção de políticas de apoio a pacientes, familiares e profissionais de saúde envolvidos no tratamento. No Brasil, o Congresso Nacional se ilumina de vermelho na noite desta sexta-feira (9/5) em apoio à data.
Mais comum entre europeus e seus descendentes, a talassemia é um tipo raro de hemoglobinopatias, um grupo de doenças de origem genética, em que mutações nos genes que codificam a hemoglobina afetam a sua produção ou função. Em 2012, foi instituída a Lei nº 12.631 que oficializa o Dia Nacional das Hemoglobinopatias como o dia 8 de maio, como forma de estimular ações de conscientização relacionadas a essas doenças.
A hemoglobina é uma proteína responsável por transportar oxigênio dos pulmões para os tecidos e gás carbônico dos tecidos para os pulmões. Alterações na hemoglobina podem causar diferentes níveis de anemia e dores generalizadas devido a obstrução de pequenos vasos, além de levar ao comprometimento da função de alguns órgãos e tecidos.
Mais comum em africanos e afrodescendentes, a Doença Falciforme é a hemoglobinopatia mais frequente no mundo, no Brasil. A estimativa é que existam cerca de 100.000 pacientes,. Já a talassemia, que é dividida nos tipos alpha e beta (mais comum), afeta cerca de 1.000 brasileiros.
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Mais sobre a talassemia – diagnóstico e sintomas
Conscientização, triagem e educação são fundamentais para a prevenção, o manejo e escolhas informadas. O diagnóstico da talassemia é feito por meio da história clínica do paciente, da sua origem étnica – já que a enfermidade é proveniente de países do Mediterrâneo – e de exames laboratoriais.
Os sintomas estão diretamente relacionados com a gravidade da doença. Os mais comuns são: cansaço e fraqueza; palidez e icterícia (pele amarelada); atraso no crescimento; abdômen desenvolvido; aumento do baço e alterações ósseas. Os pacientes também podem apresentar falta de apetite, respiração curta ou ofegante, inchaço do baço e sistema imune enfraquecido e vulnerável a infecções de repetição.
Ainda não há cura para a talassemia, mas existem opções de tratamento que permitem o controle do problema. A detecção precoce pode transformar a qualidade de vida de pacientes e orientar decisões reprodutivas em famílias com histórico da condição. A talassemia é uma doença de origem genética, que afeta a produção de hemoglobina, podendo levar à anemia hemolítica crônica, que se manifesta com palidez, déficit de crescimento e sobrecarga de ferro no corpo.
Quando não diagnosticada e tratada corretamente, a talassemia atrapalha o desenvolvimento físico e provoca o aumento do baço, infecções recorrentes, distúrbios cardíacos e endócrinos.
As manifestações da talassemia
A forma de a talassemia se manifestar varia amplamente, dependendo do tipo e da gravidade. Um histórico completo e um exame físico podem fornecer várias pistas que, às vezes, não são óbvias para o próprio paciente. Os seguintes achados podem ser observados:
Pele – A pele pode apresentar palidez devido à anemia e icterícia devido à hiperbilirrubinemia resultante da hemólise intravascular. Os pacientes geralmente relatam fadiga devido à anemia como o primeiro sintoma de apresentação. O exame das extremidades pode mostrar ulcerações. A deposição crônica de ferro devido a múltiplas transfusões pode resultar em pele bronzeada.
Músculo-esquelético – A expansão extramedular da hematopoiese resulta em deformações nos ossos faciais e de outros ossos esqueléticos, além de uma aparência conhecida como “face em esquilo”, com ponte nasal pouco significativa (em sela, afundada) associada a padrão facial convexo.
Cardíaco – A deposição de ferro nos miócitos cardíacos devido a transfusões crônicas pode interromper o ritmo cardíaco, resultando em diversas arritmias. Devido à anemia crônica, também pode ocorrer insuficiência cardíaca evidente.
Abdominal – A hiperbilirrubinemia crônica pode levar à precipitação de cálculos biliares de bilirrubina e se manifestar como dor em cólica típica da colelitíase. A hepatoesplenomegalia pode resultar em elevada quantidade de ferro e de hematopoiese extramedular nesses órgãos. Infartos esplênicos ou autofagia resultam de hemólise crônica devido à hematopoiese mal regulada.
Hepático – O envolvimento hepático é um achado comum em talassemias, particularmente devido à necessidade crônica de transfusões. Insuficiência hepática crônica ou cirrose podem resultar da deposição crônica de ferro ou hepatite viral relacionada à transfusão.
Os subtipos da talassemia
A talassemia é uma hemoglobinopatia hereditária causada por mutações em genes responsáveis pela produção das cadeias de globina, componentes fundamentais da hemoglobina. Existem diferentes tipos de talassemia e a Federação Internacional de Talassemia (TIF) classifica os pacientes como DT (dependentes de transfusão) ou NDT (não dependentes de transfusão).
São dois tipos principais: atalassemia alfa e a talassemia beta, que variam de acordo com o gene afetado. A alfa é causada por mutações nos genes HBA1 e HBA2 e, dependendo do número de genes deletados (de um a quatro), a condição pode ser assintomática ou potencialmente fatal. Já a beta está associada a mutações no gene HBB e tende a apresentar sintomas mais severos.
Com base na gravidade, a talassemia beta apresenta três subtipos: a forma mais grave da doença é conhecida como talassemia major, também conhecida como anemia de Cooley, na qual o paciente necessita de transfusão de sangue por toda a vida; enquanto atalassemia intermediária apresenta anemia leve; e a doença assintomática com estado de portador é conhecida como talassemia minor. A hemoglobina inadequada leva à anemia hemolítica crônica e se manifesta com palidez, déficit de crescimento e sobrecarga de ferro no corpo.
Embora algumas pessoas comtalassemia alfa leve (portadoras silenciosas) levem uma vida normal, formas mais graves, como a Hidropsia Fetal (quando há ausência completa de genes alfa), são incompatíveis com a vida se não houver diagnóstico pré-natal e intervenção médica especializada.
Já a talassemia maior, forma grave da beta, requer transfusões de sangue regulares e, em alguns casos, transplante de medula óssea, considerado atualmente a única possibilidade de cura.
Teste do Pezinho e exames complementares
Apesar de não existir cura para as hemoglobinopatias como a talassemia é possível tratar com o controle da anemia, prevenção das crises hemolíticas e das infecções. Os tratamentos melhoram a qualidade de vida e aumentam o tempo de vida do paciente.
A detecção precoce dessas doenças é imprescindível e auxilia na intervenção e acompanhamento das doenças, assim é possível reduzir as taxas de mortalidade e garantir mais qualidade de vida. Alguns testes laboratoriais são capazes de detectar as hemoglobinopatias, como a Cromatografia Líquida de Alta Resolução (HPCL), utilizada no Teste do Pezinho.
O diagnóstico precoce da talassemia garante o tratamento desde os primeiros meses de vida. Como é um tipo de anemia hereditária (passada de pais para filhos), ela pode ser identificada cedo. O Teste do Pezinho, feito logo após o nascimento, é usado como triagem, mas para confirmar o traço talassêmico é necessário realizar exames complementares.
De acordo com a biomédica Yasmin Carla Ribeiro, professora do curso de Biomedicina do UniCuritiba – instituição da Ânima Educação -, o diagnóstico da talassemia é feito, principalmente, pelo exame de eletroforese de hemoglobina.
Ela explica que um hemograma completo com esfregaço sanguíneo e estudos do nível de ferro sérico e saturação de transferrina são usados para o diagnóstico, mas pode-se fazer ainda uma avaliação da medula óssea, eletroforese (análise da hemoglobina) e até testes genéticos.
Além desses testes convencionais, também é possível realizar o chamado ‘teste da bochechinha‘ nos bebês desde o primeiro dia de vida, visando a detecção precoce dessas doenças. Trata-se de teste de mapeamento genético capaz de identificar a predisposição genética de bebês a mais de 340 doenças raras, graves, silenciosas e tratáveis, desenvolvidas na primeira infância.
O teste não é invasivo, basta uma coleta de saliva do bebê. Caso seja identificado que a criança tem risco aumentado para alguma doença, é importante o acompanhamento com um médico geneticista. Algumas das doenças mais comuns nos resultados do Bochechinha são a anemia falciforme e a beta talassemia.
Testes genéticos para o diagnóstico precoce
O papel da genética é central tanto na identificação precoce , conscientização e prevenção da transmissão da talassemia. O diagnóstico precoce da condição por meio de painéis genéticos neonatais ou pré-natais pode mudar significativamente o curso do tratamento, possibilitando intervenções médicas oportunas e acompanhamento multidisciplinar desde o início da vida do paciente.
A bióloga geneticista Susana Joya destaca que testes genéticos – como o como o CGT (Carrier Genetic Test) – investigam variantes genéticas em até 2200 genes, incluindo os relacionados à talassemia, permitindo uma avaliação abrangente do risco genético reprodutivo.
O rastreamento genético em casais assintomáticos é eficiente para detectar se ambos são portadores de variantes genéticas associadas à doença. Se confirmado pelo teste de portador, esse casal tem 25% de probabilidade, a cada gravidez, de que seus filhos tenham a condição”, explica a especialista do laboratório Igenomix Brasil, do Vitrolife Group.
Segundo ela, os testes genéticos são ferramentas que podem auxiliar na prevenção e planejamento familiar, se assim for o desejo do paciente. Para conhecimento de todas as possibilidades no campo da genética, é recomendável sempre contar com o aconselhamento genético. Em casos de histórico familiar, suspeita clínica ou origens étnicas de maior risco (como mediterrânea, asiática e africana), a sugestão é buscar orientação genética ainda no planejamento familiar, afirma Susana.
O Teste Genético Pré-Implantacional para Doenças Monogênicas (PGT-M) é umas das possibilidades no planejamento, para os casais que já tem risco genético detectado previamente. O PGT-M é um estudo realizado em uma biópsia de um embrião gerado no tratamento de Fertilização In Vitro (FIV) e pode ser realizado para condições monogênicas, como as talassemias, incluindo também a análise do antígeno leucocitário humano (HLA) ajuda a identificar os embriões não afetados que são HLA compatíveis com a criança afetada, se o casal já tiver um filho com a condição.
Palavra de Especialista
Talassemia: condição genética e hereditária afeta a produção de hemoglobina
Por Mônica Veríssimo*
Em 8 de maio é lembrado o Dia Internacional da Talassemia. Causada por uma alteração genética, a condição altera a produção da hemoglobina, proteína do sangue responsável pelo transporte de oxigênio para os tecidos do organismo. Estima-se que anualmente 300 mil crianças nasçam com formas severas de hemoglobinopatias, incluindo a talassemia¹. No Brasil, a estimativa é que cerca de 1,1% da população apresente síndromes talassêmicas².
Existem dois tipos principais de talassemia: alfa e beta. A hemoglobina humana é formada por proteínas chamadas alfa-globinas e beta-globinas que, por sua vez, precisam de alguns genes para serem construídas. Alterações nesses genes irão determinar o tipo e o grau de talassemia.
Entre os principais sintomas da doença estão: aparência pálida, febre, aumento do baço, coloração amarelada da pele (icterícia), deformidades ósseas faciais, inchaço abdominal e urina escura. Porém, os sinais e os sintomas dependem do tipo e da gravidade da talassemia que a pessoa tem.
O diagnóstico da talassemia é realizado por meio de hemograma e eletroforese de hemoglobina, cujo objetivo é avaliar o tipo de hemoglobina circulante no sangue. Também podem ser realizados testes genéticos para avaliar qual é a alteração genética responsável pela doença e diferenciar os tipos de talassemia.
No caso da alfa talassemia há uma mutação no cromossomo 16, que se manifesta pela falta de produção de globinas alfa. Ela pode se manifestar, dependendo do número de genes comprometidos, de quatro formas: portador silencioso, traço alfa talassemia, doença da hemoglobina H e hidropsia fetal. Na talassemia beta há uma mutação no cromossomo 11, que pode se manifestar de três formas: maior (o tipo mais grave), intermediária ou menor, que pode ser assintomática e passar desapercebida.
A talassemia tem cura e ela pode ser obtida através do transplante de medula óssea, em que o doador deve ser totalmente compatível e aparentado. Atualmente outras modalidades de transplante com menor grau de experiência como haploidentico (pai ou mãe) ou não aparentado podem ser realizados.
Temos ainda a terapia gênica, em que a alteração genética pode ser corrigida e não precisa de doador, mas essa alternativa de tratamento ainda está restrita a poucos centros e vinculada a estudos clínicos. Quando não há possibilidade de transplante, o tratamento vai depender da gravidade da doença. Os pacientes mais graves recebem transfusões de sangue, que são eficazes e os auxiliam a levar uma vida normal, com menos limitações e sintomas, seguindo todas as orientações médicas.
Devido às transfusões recorrentes, geralmente realizadas em um intervalo de duas a quatro semanas, os pacientes apresentam aumento de ferro corporal, o que pode causar danos ao organismo. Por isso, para evitar possíveis complicações do excesso de ferro no corpo é necessário o uso de medicamentos denominados quelantes de ferro.
Hoje temos novos medicamentos que buscam substituir a transfusão, ainda não oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas que poderão em um futuro bem próximo fazer parte do arsenal terapêutico promovendo qualidade de vida aos pacientes.
É recomendado que as pessoas procurem por orientação médica em caso de suspeita da doença. Importante ressaltar que os sinais podem ser notados nos primeiros meses de vida e o teste do pezinho (triagem neonatal) pode diagnosticar precocemente a beta talassemia, o que pode contribuir para um tratamento mais efetivo e uma vida plena aos pacientes.
*Especialista em Hematologia e Hemoterapia pediátrica.
Com Assessorias