“Ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina”. A frase proferida pelo presidente Jair Bolsonaro em agosto ainda causa discussão, em especial no cenário onde diversas farmacêuticas como a Moderna, Sinovac e Pfizer divulgaram os resultados das pesquisas das vacinas contra a Covid-19, em fase três dos testes clínicos. A previsão é que algumas possam ser utilizadas ainda este ano. No Reino Unido, por exemplo, a campanha vacinal em massa começou na última terça-feira (8/12) e nos Estados Unidos a vacinação emergencial começa esta semana.
No caso do Brasil, é possível que essa vacina seja obrigatória? O Supremo Tribunal Federal irá julgar sobre a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19 durante uma sessão que terá início em 11 de dezembro e término em 18 de dezembro. A tendência é que o plenário adote posição favorável à vacinação obrigatória, visto que já demonstrou esse posicionamento antes.
Segundo o advogado Sergio Vieira, sócio diretor da Nelson Wilians Advogados, há diversos caminhos para que a imunização seja imposta à população. O primeiro ponto é que a lei nº 13.979/ 2020, assinada pelo próprio presidente Jair Bolsonaro em 6 de fevereiro de 2020, prevê que para o enfrentamento de emergência de saúde pública de importância internacional – como a decorrente do novo coronavírus – poderá ser realizada a vacinação compulsória e outras medidas profiláticas.
Além disso, caso o STF decida por tornar essa cobertura vacinal obrigatória, os argumentos giram em torno da Constituição Federal. “No artigo 196, é apontado ser dever do Estado garantir, mediante políticas sociais e econômicas, a redução do risco de doença e de outros agravos. Nesse caso, a proteção coletiva à saúde se sobressai à autonomia individual de decidir sobre se vacinar ou não. Nenhum direito é absoluto, assim como nenhum direito precisa ser aniquilado, absolutamente, para prestigiar o outro”, garante.
Ainda de acordo com o especialista, o caso de crianças e adolescentes, sob cuidado dos responsáveis, a não imunização tem consequências conforme antecipa o Estatuto da Criança e do Adolescente. “É previsto cobrança de multa de três a 20 salários mínimos e a impossibilidade de frequentar creches, por exemplo”, aponta o advogado.
Para Sergio Vieira, cabe à Justiça determinar as punições em casos de não cumprimento da imunização. Da mesma forma, o ato de se recusar a tomar a vacina de uma doença altamente contagiosa pode incorrer naquilo que o Código Penal define como infração de medida sanitária preventiva, que assim prevê no art. 268. “Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa pode resultar em multa e detenção de um mês a um ano”, cita.
Guerra das vacinas
Como boa parte dos debates recentes do país, a novela da vacina contra o coronavírus pode parar no Supremo Tribunal Federal (STF). Essa é a avaliação da advogada Mérces da Silva Nunes, especializada em Direito Médico, sócia do escritório Silva Nunes Advogados Associados.
Segundo ela, o Estado de São Paulo possui autonomia para planejar um calendário de vacinação contra o coronavírus, mediante a proteção da Lei 13.979/20, que dispõe que as autoridades poderão adotar medidas, no âmbito de sua competência, inclusive de caráter compulsório (art. 3º, III).
“O STF também reconheceu a autonomia de estados e municípios para adotar medidas de enfrentamento”, explica. Por outro lado, o artigo 3º da Lei nº 6.259/75 dispõe que compete ao Ministério da Saúde elaborar o Programa Nacional de Imunizações, inclusive as de caráter obrigatório.
Em se tratando de pandemia, há efetiva necessidade de a vacinação ser executada em âmbito nacional, sob a coordenação centralizada no Ministério da Saúde. Mas certamente o conflito de competência entre as duas leis será decidido no Poder Judiciário”, antecipa.
Essa semana, numa clara posição de antagonismo ao governo federal e fazendo duras críticas ao Ministério da Saúde, o governador de São Paulo, João Dória, anunciou o plano estadual de vacinação contra o coronavírus. A CoronaVac, prometida para janeiro de 2021 e fruto de uma parceria entre o Instituto Butantan e o laboratório chinês Sinovac, ainda não possui registro concedido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por estar finalizando os estudos da fase III, a de eficácia.
Segundo o governo estadual, os documentos concluídos seriam entregues até o dia 15 de dezembro à Anvisa. A partir de então, caberá à Anvisa, um órgão federal, analisar se a CoronaVac poderá ser registrada em tempo hábil. Segundo Mérces da Silva Nunes, este poderá ser mais um embate que pode cair nas mãos do Supremo.
A Anvisa pode negar o registro da vacina se os documentos submetidos à análise, sobretudo os resultados relativos à fase III, não restarem comprovados. Mas, havendo divergência entre os poderes e entre as autoridades de saúde, o caso poderá, mais uma vez, ser levado ao Supremo para análise e decisão”, comenta.
Com Assessoria