A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) divulgou na manhã desta segunda-feira (12) que o reajuste anual máximo será de 9,63% no preço dos planos de saúde individuais e familiares firmados a partir de janeiro de 1999. São quase 8 milhões de beneficiários, o que corresponde a cerca de 16% do mercado de planos de saúde.

A mudança terá validade de 1º de maio deste ano até 30 de abril de 2024.  Este reajuste poderá ser aplicado pelas operadoras na data que se comemora um ano do contrato do serviço. Caso o mês de aniversário do contrato seja maio, é possível a cobrança retroativa do reajuste.

O percentual fixado pela ANS é bem superior ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA),que mede a inflação do país e que acumulou 4,18% entre maio de 2022 e abril de 2023. A organização não governamental Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) divulgou nota onde considera que o reajuste autorizado “extrapola o limite do razoável”.

De acordo com a entidade, dados oficiais apontam que não houve prejuízo em 2022, pois o resultado negativo operacional foi compensado pela rentabilidade das aplicações financeiras das empresas, impulsionada pelas altas taxas de juros.

“O índice de 9,63% é quase 67% maior do que o valor da inflação acumulada em 2022 e mais uma vez empurra para o consumidor problemas de gestão das operadoras do setor”, disse o Idec. Em 2022, o IPCA fechou em 5,79%.

O Idec acrescenta que os rendimentos dos consumidores não crescem no mesmo ritmo e lamenta que mais de 82% do mercado de saúde suplementar sejam compostos por planos coletivos, que não são regulados pela ANS e podem praticar aumentos sem qualquer limitação. Em sete dos últimos dez anos, os planos coletivos aplicaram em média um reajuste superior ao máximo permitido para os planos individuais e familiares.

ANS: ‘índices de reajustes dos planos são índices de custos’

Em nota, a ANS defende que a comparação com o IPCA não é adequada e que a atual fórmula para cálculo do reajuste anual dos planos de saúde vem sendo aplicada desde 2019, sendo influenciada principalmente pela variação das despesas assistenciais do ano anterior.

“Os índices de inflação medem a variação de preços de produtos e serviços. Já os índices de reajuste de planos de saúde são ‘índices de custos’, pois medem a variação combinada não somente de preços, mas também de quantidades consumidas. Dessa forma, o percentual calculado pela ANS considera aspectos como as mudanças nos preços dos produtos e serviços em saúde, bem como as mudanças na frequência de utilização dos serviços de saúde”.

De acordo com a ANS, em 2022, essa variação foi de 12,69% na comparação com 2021. Com base nessa mesma fórmula, no ano passado foi autorizado um reajuste de até 15,5%. Foi o maior percentual já aprovado pela ANS, criada para regular o setor em 2000. O aumento histórico ocorreu um ano após a aprovação inédita de um reajuste negativo.

Em 2021, as operadoras foram obrigadas a reduzir as mensalidades em pelo menos 8,19%, porque ficou constatada uma queda generalizada na demanda por serviços de saúde em meio ao isolamento social decorrente da pandemia da covid-19.

O limite de 9,63% recebeu o aval do Ministério da Fazenda e foi aprovado por unanimidade em reunião de diretoria colegiada da ANS. A decisão não se aplica aos planos coletivos, sejam empresariais ou por adesão. As operadoras não podem aplicar aumentos nas mensalidades acima do percentual estabelecido. O teto se aplica a planos regulamentados e adaptados à Lei nº 9.656/98.

Durante a reunião que aprovou o limite de 9,63%, o diretor-presidente da ANS, Paulo Rebello, destacou que cada plano pode ter um reajuste específico, desde que seja igual ou inferior ao percentual máximo estabelecido.

Em abril, quando a agência divulgou os dados econômicos financeiros do setor, ele já havia dito à Agência Brasil que os resultados apontavam diferenças no desempenho conforme o tamanho da operadora. As de grande porte tiveram os maiores resultados negativos. “Os percentuais de reajustes dependerão da situação de cada operadora”, disse na ocasião.

Fenasaúde avalia reajuste como fundamental

Já a Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenasaúde), que representa as maiores operadoras de planos de saúde do país, avaliou que “o reajuste anual é fundamental para recompor os custos e, consequentemente, manter o equilíbrio financeiro do setor, que fechou o ano de 2022 com R$ 10,7 bilhões de prejuízo operacional”, disse a entidade.

A nota divulgada pela Fenasaúde, entretanto, traz uma comparação dos índices. Segundo a entidade, considerando os últimos três anos, a média dos reajustes autorizados pela ANS é de 5,64%, abaixo da média do IPCA de 6,79%.

O período escolhido pela Fenasaúde, no entanto, engloba o ano de 2021, o único dos últimos dez anos onde o teto fixado pela ANS ficou abaixo da inflação. Se considerarmos o reajuste dos últimos cinco anos, a média do limite fixado para o reajuste dos planos é de 6,48% e a média do IPCA é de 5,68%. Se a comparação envolver os últimos dez anos, o percentual máximo fixado pela ANS tem uma média de 9,27% ante 6,11% da inflação.

Em 2020, o reajuste de planos individuais e familiares foi negativo, de – 8,19%, e, em 2021, teve teto de 15,5%.  Atualmente, os planos individuais respondem por 17% do total de beneficiários em planos de assistência médica, cerca de 9 milhões de usuários. Na avaliação da FenaSaúde, essa oferta poderia ser aumentada com a revisão da atual fórmula de reajuste.

Entidade critica fórmula atual de reajuste dos planos individuais

Para a entidade que representa os planos de saúde, o setor vem sofrendo efeitos diretos do aumento da inflação na saúde e dos custos dos tratamentos, medicamentos, procedimentos hospitalares e terapias. E cita também a insegurança e instabilidade regulatória, a crescente judicialização e o aumento expressivo da ocorrência de fraudes estão entre os principais fatores que impactam as variações dos preços.

“Vivemos uma crise sistêmica, que está atemorizando toda a cadeia de prestação de serviços de saúde privada. Além dos fatores estruturais, temos ainda fatores conjunturais importantes que afetam a sustentabilidade do setor, como mudanças institucionais, regulatórias e legislativas profundas nas regras que regem o setor de saúde suplementar nos últimos dois anos”, analisa diretora-executiva da FenaSaúde, Vera Valente.

Ainda segundo ela, “a atual fórmula de reajuste dos planos individuais gera índices descolados do avanço real dos custos ao não levar em conta parâmetros como a sinistralidade das carteiras, a diferença entre modalidades de negócios, a regionalização de produtos, o fim da limitação de terapias e a velocidade da atualização da lista de procedimentos e medicamentos de coberturas obrigatórias”.

Fenasaúde também reclama de impactos do rol taxativo da ANS

Já no âmbito regulatório, segundo a Fenasaúde, “os últimos anos foram marcados por mudanças legislativas e regulatórias que impactaram diretamente na sustentabilidade do setor, como exemplo da Lei 14.454/2022, que modificou o caráter taxativo do rol, criando condicionantes frágeis e muito subjetivas para obrigar planos a cobrir itens fora da lista”.

A legislação do novo rol da ANS que fixa a cobertura obrigatória ofereceu uma resposta para a indefinição que vigorava até então e que fazia com que muitos casos fossem parar na Justiça, gerando sentenças contraditórias. Embora a Fenasaúde defendesse o viés taxativo, de forma que não fossem admitidas exceções à lista, prevaleceu um entendimento diverso.

A lei estabeleceu dois critérios principais para a cobertura de procedimentos ou tratamentos de saúde não incluídos no rol: ter sua eficácia comprovada em bases científicas e ter aval da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) ou de órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional.

Para a Fenasaúde, a mudança impacta na sustentabilidade do setor. A entidade alega que foram criadas “condicionantes frágeis e muito subjetivas para obrigar planos a cobrir itens fora da lista”. Para a Fenasaúde, o rol taxativo também está relacionado com a judicialização, que é prejudicial a todo o sistema de saúde.

A entidade cita ainda o aumento expressivo das fraudes contra os planos como outro ponto de alerta e que igualmente recai sobre o aumento dos custos na saúde. A diretora ressalta, ainda, a necessidade de revisão do atual marco legal do setor, que data de 1998, de forma a ilustrar as mudanças pelas quais a sociedade brasileira passou nos últimos 25 anos, promovendo, assim, a ampliação da oferta de planos individuais no mercado.

Abramge: reajuste segue projeções, mas não recompõe perdas

Já a Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde) destaca que o reajuste dos planos de saúde individuais e familiares determinado pela ANS ficou próximo, mas ainda abaixo da estimativa entre 10% e 12% projetada pela entidade.

De acordo com a entidade, o índice é estipulado  com base em uma fórmula transparente e replicável prevista em norma e que utiliza dados públicos e auditados no cálculo. A fórmula, diz a Abramge, “não prevê a recomposição total do aumento da despesa, já que há descontos pelo fator de eficiência e faixa etária”.

“Importante lembrar que o teto de reajuste também é inferior à variação das despesas identificada pela própria ANS, de 12,69% (VDA – Variação da Despesa Assistencial, componente base do reajuste). Esse reajuste, invariavelmente, fica aquém das reais necessidades de recomposição de custos do setor”, destaca.

Segundo a Abramge, isso ocorre por duas razões. Primeiramente, a metodologia de reajuste atual, introduzida em 2018, não permite a recomposição dos desequilíbrios acumulados desde que a ANS começou a divulgar o índice máximo a ser aplicado aos planos individuais, em 2000.

Em segundo lugar, porque a referida metodologia de reajuste adota como referência uma média nacional de variação das despesas médicas, desconsiderando as profundas diferenças de porte e perfil das cerca de 700 operadoras de planos de saúde do país. 

“A utilização dessa média de forma indiscriminada agrava o desequilíbrio entre as operadoras e, em última instância, colabora para a escassez de oferta de planos individuais no mercado brasileiro”, afirma a entidade.

Número de operadores com prejuízos aumentou quase 400%

Segundo levantamento da Abramge, baseado em dados públicos e auditados, entre 2021 e 2022 o número de operadoras com contratos individuais, cujas receitas foram insuficientes para arcar com os custos de assistência à saúde, cresceu de 27 para 107 (1.710.561 beneficiários), representando um aumento de 396%.

No mesmo período, o número de operadoras com planos individuais que não conseguiram fechar as despesas assistenciais e administrativas saiu de 160 para 331, um crescimento de 107%. Atualmente, cerca de 70% dos planos – responsáveis pelo atendimento de 5.796.563 de beneficiários – estão fechando no negativo.

“É importante lembrar que nos últimos anos, a soma dos reajustes dos planos de saúde ficou abaixo da inflação oficial. O índice de reajuste nos planos individuais acumulado nos últimos 3 anos foi de 14,7%, ou seja, uma média de 4,5% ao ano (8,14% em 2020, -8,19% em 2021 e 15,5% em 2022), caracterizando o período como o de menores índices da história”, afirma a entidade.

Saúde suplementar movimenta 3% do PIB

Em 2022, os planos de saúde responderam por 83% das receitas dos principais hospitais privados do país, segundo a Anahp, e mais de 50% das receitas dos laboratórios de medicina diagnóstica, de acordo com a Abramed.

A saúde suplementar movimenta cerca de 3% do PIB e emprega quase 5 milhões de pessoas, que atuam em 165 mil estabelecimentos de saúde. Só em 2021, dado mais recente disponibilizado pela ANS, os planos de saúde cobriram mais de 1,6 bilhão de procedimentos, entre consultas, exames, internações, terapias e cirurgias.

Com Agência Brasil e Assessorias 

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