As doenças inflamatórias intestinais (DII) já afetam cinco milhões de pessoas no mundo, vêm crescendo no Brasil e preocupando os especialistas. Segundo a Sociedade Brasileira de Coloproctologia (SBCP), as doenças inflamatórias intestinais (DII) atingem 100 pessoas a cada 100 mil habitantes, principalmente homens e mulheres entre 15 e 40 anos.
Os números são preocupantes, mas ainda menores do que em países como Estados Unidos e Canadá, onde a prevalência pode chegar próxima a 120/130 para cada 100 mil moradores. O maior estudo realizado no Brasil sobre essa enfermidade, com mais de 212 mil pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), apontou que em um período de nove anos a prevalência das doenças inflamatórias intestinais
Em 2022, a revista The Lancet Regional Health Americas publicou um estudo revelando um aumento de 233% no número de pessoas diagnosticadas com doenças inflamatórias intestinais (DII) no Brasil ao longo de oito anos. No ano de 2012, havia 30 casos por 100 mil habitantes, enquanto em 2020 esse número subiu para 100,1 casos por 100 mil pessoas.
As principais são a retocolite ulcerativa e a doença de Crohn. Ainda segundo a pesquisa, divulgada pelo Jornal da USP, apontou que a incidência da doença de Crohn, por exemplo, cresce a uma taxa alarmante de 12% ao ano no Brasil, com maior frequência nas regiões Sul e Sudeste.
Essas doenças atingem principalmente indivíduos entre 20 e 40 anos, embora possam ocorrer em todas as faixas etárias. A faixa etária mais comumente afetada pelas DIIs é entre os 15 e 35 anos, mas essas condições podem ocorrer em qualquer idade. A maior concentração de casos é entre as mulheres.
Esses dados ressaltam a importância de aumentar a conscientização sobre as DIIs e a necessidade de diagnóstico precoce. A campanha Maio Roxo foi criada para alertar a opinião pública para o aumento da prevalência dessas doenças, que não têm cura, mas podem ser evitadas e tratadas. Para conscientizar a sociedade sobre as DIIs e promover um diagnóstico precoce, a indústria, os pacientes e os médicos desempenham um papel fundamental.
Má alimentação e estresse contribuem
Essas doenças crônicas, progressivas e imunomediadas têm origem no próprio organismo, desencadeando uma resposta inflamatória anormal após exposição a determinados gatilhos. A condição é caracterizada por ativações imunes e consequentes inflamações no trato gastrointestinal.
Enquanto a retocolite ulcerativa afeta exclusivamente o intestino grosso, a doença de Crohn pode acometer todo o trato gastrointestinal, desde a boca até o final do intestino, sendo mais comum no intestino delgado e grosso.
Fernando Bray, coloproctologista e cirurgião do aparelho digestivo do Hospital Santa Catarina – Paulista, explica que as doenças inflamatórias intestinais autoimunes que inflamam e adoecem o tubo digestivo.
“A Doença de Crohn inflama todas as camadas intestinais e pode comprometer uma extensão da boca até o ânus do paciente. Retocolite Ulcerativa acomete somente o intestino grosso e o reto, com inflamação somente da camada mais superficial do intestino”, explica,
Segundo ele, as causas são multifatoriais: dieta, microbiota intestinal (microorganismos que vivem no intestino), estresse, uso de antibióticos e anti-inflamatórios. Podemos identificá-las via exames de imagens, endoscópicos e biomarcadores fecais.
“Os fatores de risco das Doenças Inflamatórias Intestinais não são conhecidos. Embora existam algumas causas que podem aumentar as chances como a parte genética, reação anormal ao sistema imunológico, fatores ambientais como vírus, bactérias, dietas, tabagismo entre outras. Ela é mais comum em caucasianos e é mais comum surgir entre os 10 e 40 anos de idade”, explica Rafael Sanchez Neto, coloproctologista e cirurgião do aparelho digestivo do Hospital Santa Catarina-Paulista.
Diagnóstico precoce é fundamental para o controle
Segundo a médica gastroenterologista Paula Senger, do Centro de Cirurgia, Gastroenterologia e Hepatologia (CIGHEP), é essencial identificar os sintomas precocemente e buscar o tratamento adequado para garantir maior sucesso no tratamento.
Os sintomas mais comuns das DIIs incluem dor abdominal e diarreia, sangramento nas fezes, emagrecimento, anemia e febre. Na doença de Crohn, podem ocorrer também fístulas e abcessos perianais.
O diagnóstico das DIIs é realizado por meio de uma combinação de sintomas clínicos, exame físico e exames complementares, como análises de sangue, fezes, colonoscopia, ressonância magnética ou tomografia específica para o intestino.
A gastroenterologista ressalta que o diagnóstico precoce é crucial, pois interfere diretamente na resposta ao tratamento e na prevenção de complicações relacionadas à doença.
“Uma vez que existe suspeita de doença inflamatória intestinal, é muito importante buscar um especialista para um diagnóstico preciso e iniciar o tratamento o mais cedo possível”, enfatiza a Dra. Paula Senger.
Uma vez diagnosticadas, as DIIs requerem um tratamento contínuo para controlar a inflamação e prevenir complicações. Segundo as especialistas, é fundamental que a sociedade esteja atenta aos sintomas e busque auxílio médico especializado para investigar possíveis casos de doenças inflamatórias intestinais. Quanto mais cedo for realizado o diagnóstico, melhores serão as respostas aos medicamentos e menores serão as chances de complicações e necessidade de cirurgias no futuro.
Novidade são os medicamentos imunobiológicos
O tratamento geralmente envolve o uso de medicamentos específicos (que são custeados pelo SUS – Sistema Único de Saúde), realização de cirurgias e, principalmente, mudanças no estilo de vida. No tratamento medicamentoso são utilizadas drogas anti-inflamatórias intestinais, que minimizam a irritação do intestino. Também podem ser utilizados antibióticos, que tratam abscessos e infecções secundárias, e corticosteroides, que desinflamam e modulam o sistema imunológico.
Paula Senger também ressalta que a abordagem multidisciplinar, com a participação de gastroenterologistas e coloproctologistas, é fundamental para o sucesso no tratamento das DIIs, que é contínuo e visa controlar a inflamação intestinal, prevenir a progressão da doença e evitar a necessidade de cirurgias.
Opções de tratamento incluem corticoides, imunossupressores e medicamentos biológicos, que assim como os corticosteróides, também modulam o sistema imunológico. Com os avanços da medicina, novos medicamentos imunobiológicos têm sido desenvolvidos, oferecendo mais opções de tratamento para os pacientes.
“Essas ‘pequenas moléculas’, de administração oral, têm se mostrado eficazes no controle da inflamação intestinal, complementando os medicamentos biológicos já disponíveis”, destaca a Dra. Mariane Savio.
Mais da metade das pessoas com doença de Crohn passam por cirurgia
Embora o tratamento clínico seja a primeira abordagem, a cirurgiã e coloproctologista Mariane Savio, também especialista em doenças inflamatórias intestinais no CIGHEP, destaca que em alguns casos pode ser necessária a intervenção cirúrgica, especialmente em pacientes com doença de Crohn.
“Mais da metade dos pacientes com doença de Crohn precisarão de algum procedimento cirúrgico em algum momento da vida, seja para a remoção de partes do intestino ou para tratar complicações na região perianal”, ressalta a médica.
No entanto, a cirurgiã enfatiza que o tratamento cirúrgico não significa o fim do tratamento, mas sim um importante passo para atingir a remissão da doença. Acompanhamento médico regular é essencial para monitorar a resposta ao tratamento e realizar ajustes, se necessário.
“O tratamento cirúrgico depende com relação à doença de Crohn e à retocolite ulcerativa. Tanto em uma quanto a outra é indicada a cirurgia, quando a terapia clínica não surte resultados. A partir disso, no Crohn é necessário tirar a parte do intestino doente e fazer uma anastomose (ligar duas partes do intestino). Após a cirurgia, o intestino funciona normalmente, apenas com mais evacuações. Entre seis a dez pessoas que fazem a cirurgia podem ter a recorrência da doença”, afirma Sanchez Neto.
Em relação à retocolite ulcerativa, um em cada três pacientes com mais de 30 anos terão que fazer uma cirurgia. Pelo fato da doença afetar mais o intestino grosso ou cólon, a cirurgia será uma colectomia (ressecção cirúrgica de uma parte ou da totalidade do intestino grosso) parcial ou total. Nos casos que afetam o intestino fino ou ânus, é preciso fazer uma ação localizada.
Com Assessorias