Em março de 2012, a professora Valquíria Dias Correa da Silva, de 37 anos, foi diagnosticada, por meio de um exame de DNA, com Amiloidose Hereditária, chamada também de Paramiloidose ou Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF), uma das mais de 7 mil doenças raras já diagnosticadas em todo o mundo. Sem cura, genética e, como o próprio nome sugere, hereditária, a síndrome acarreta a perda progressiva dos movimentos, atrofia muscular e insuficiência cardíaca.

A doença é fisicamente debilitante, afeta todo o corpo e interfere significativamente na qualidade de vida. Geralmente, os primeiros sintomas aparecem entre 30 e 40 anos de idade, no auge da vida produtiva. Hoje, há cerca de 50 mil casos da síndrome no mundo e por volta de 5 mil no Brasil. Ao contrário de muitos outros pacientes, Valquíria já sabia do histórico familiar e da possibilidade de ter a doença.
Meu avô morreu com suspeita de leptospirose, mas os sintomas eram os mesmos da Amiloidose, que naquela época não era conhecida no Brasil. Ele tinha 39 anos de idade. Meu pai e tio, em decorrência da doença, também faleceram aos 38 e 39 anos. Já minha tia descobriu a enfermidade aos 40 anos e veio a óbito aos 51, sem tratamento específico, pois a síndrome já estava em estágio muito avançado”, conta.
Valquíria está entre os vários pacientes que dependem, hoje, do tratamento com Tafamidis, um medicamento de alto custo que passou a ser disponibilizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), após muita reivindicação dos pacientes.
“Comecei a tomar o remédio ano passado (2019). Hoje, espero uma renovação para pegar novamente a medicação na farmácia de alto custo do governo. Com o uso da medicação as dores diminuíram. Tenho dois filhos e trabalho diariamente, portanto, o remédio é essencial para que os sintomas não avancem e deixem sequelas graves, podendo afetar minha qualidade de vida”, afirma Valquíria.

Acesso a medicações alternativas

Há, ainda, outros métodos importantes para tratar a enfermidade, considerados inovadores: as medicações Inotersen e Patisiran, que se baseiam no silenciamento de genes. Como a Amiloidose Hereditária é causada pela mutação da proteína transtirretina (TTR), produzida sobretudo pelo fígado, esses medicamentos atuam diretamente na fabricação dessa proteína, reduzindo substancialmente sua produção pelo organismo. Eles agem na raiz do problema, na manipulação do chamado RNA – que é o responsável pela produção da proteína.
“É preciso viabilizar urgentemente o acesso a essas novas medicações aos pacientes. Esses remédios precisam ser incorporados pelo SUS o quanto antes, visando assim atender rapidamente a todas as pessoas que sofrem com a doença, que é significativamente degenerativa. O tempo, portanto, é extremamente precioso pra nós”, explica Fabio Almeida, presidente da Associação Brasileira de Paramiloidose (ABPAR), organização sem fins lucrativos, composta apenas por portadores da doença e familiares.
A Amiloidose Hereditária provoca distúrbios que comprometem os nervos sensitivos e motores, provocam transtornos no sistema nervoso, responsável por regular o funcionamento dos órgãos e sistemas do corpo, e pode afetar o coração. A enfermidade pode causar neuropatia autonômica, disfunção gastrointestinal, manifestações oculares, distúrbios cardíacos, comprometimento da função renal e síndrome do túnel do carpo, entre outras complicações.
“Se a doença não for tratada, seus sintomas agravam-se, o que pode resultar na morte do paciente, que ocorre, em média, 10 anos após o aparecimento dos primeiros sintomas”, afirma Fábio.

Transplante hepático pode gerar graves complicações

O transplante hepático é também uma forma de inibição da Amiloidose Hereditária. No entanto, além de ser um procedimento bastante invasivo que envolve muitos riscos, a técnica não dá resultados definitivos, já que a TTR pode estar, em menor quantidade, em outros órgãos.

“Em outubro de 2008, fui diagnosticada com a Amiloidose Hereditária. Minha avó materna faleceu por conta da doença; minha mãe e uma tia também. Minha irmã mais velha e uma prima já tinham feito o transplante hepático. Minha outra irmã, a do meio, também foi diagnosticada com a doença e fez o transplante, porém teve várias complicações que resultaram em um total de quatro novos transplantes em um período de um ano, o que acabou acarretando sua morte com apenas 38 anos”, lembra a costureira Tatiane Pettenon Morselli.

Tatiane também passou pelo transplante hepático, mas, em decorrência de uma trombose biliar, perdeu o órgão. “Logo depois, me submeti novamente a um segundo transplante, e desta vez ocorreu tudo bem. Por conta da doença, perdi muito peso e massa muscular, e, depois dos transplantes, perdi também força nos músculos por conta das complicações e tempos de internação. Hoje, faço uso de imunossupressor e anticoagulante para evitar uma nova trombose”, comenta.

Atualmente, a costureira trabalha por conta própria em casa, por meio de seu ateliê de costura. Foi a solução que ela encontrou para fazer o acompanhamento médico necessário, já que o fato de precisar se ausentar muitas vezes no mês para realizar exames e consultas acabou resultando no seu desligamento da empresa em que trabalhava.

“Percebo que os médicos ainda não sabem lidar muito bem com a doença, não possuem informações suficientes sobre ela. Por isso, é tão importante abordar doenças raras como essa, para que tanto especialistas quanto a população e autoridades se atentem às doenças menos conhecidas, que, apesar do nome, afetam milhões de pessoas pelo mundo”, completa.

Fonte: Aspar, com Redação
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