Melhorar a qualidade de vida dos pacientes com Alzheimer e também de seus cuidadores. Esse é um dos objetivos da Lei 14.878/24, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada em 4 de junho deste ano pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva que institui a Política Nacional de Cuidado Integral às Pessoas com Doença de Alzheimer e outras Demências (PNCIPDAOD).
A aprovação da lei pelo presidente Lula ajudará a melhorar a qualidade de vida das pessoas com Alzheimer e outras demências e também reduzirá o peso dos cuidadores, que em sua maioria são mulheres da família por volta dos 60 anos. De autoria do Senado, o Projeto de Lei nº 4.364, que estava em tramitação desde 2020, representa um marco para o país, que passa a olhar com mais atenção para as pessoas nesta situação, na opinião de especialistas.
O Plano Nacional em Demência traz diretrizes discutidas pela sociedade civil e alinhadas com as recomendações de governança e evidências cientificas da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da Alzheimer’s Disease International (ADI). Segundo a federação, o número de pessoas com a doença poderá chegar a 74,7 milhões em 2030 e a 131,5 milhões em 2050, devido ao envelhecimento populacional.
No Brasil, atualmente, há mais de 30 milhões de idosos, sendo que a projeção para 2050 é de que esse número chegue a 60 milhões. Hoje, o SUS conta com centros de referência que oferecem tratamento gratuito para pacientes com a doença, além de medicamentos que ajudam a retardar a evolução dos sintomas.
O texto traz princípios e diretrizes para o tratamento e determina que o Ministério da Saúde desenvolva campanhas de orientação e conscientização. A nova lei caracteriza a demência como “uma síndrome de natureza crônica ou progressiva, com deterioração da função cognitiva ou da capacidade de processar o pensamento, além da que pode ser esperada no envelhecimento normal”.
A nova lei estabelece diretrizes como a capacitação dos profissionais de saúde públicos e privados para a prevenção, identificação de seus sinais e sintomas em fases iniciais, e assistência e integração dos serviços de saúde existentes. A nova lei também promoverá a adoção de uma abordagem mais integral e humanizada para lidar com as questões de cuidado e saúde pública.
‘Todos nós esperamos uma velhice saudável’, diz ministra da Saúde
A ministra da Saúde Nísia Trindade disse que caberá à pasta orientar e conscientizar os prestadores de serviços da saúde pública e privada a respeito das doenças que levam a perdas cognitivas.
Do ponto de vista do Ministério da Saúde, caberá a nós a orientação e a conscientização dos prestadores de serviços de saúde, tanto públicos quanto privados, sobre as doenças que levam a essas perdas cognitivas, tanto Alzheimer quanto outras formas de demências”, pontuou a ministra.
Ela ressaltou a importância da promoção da saúde em todas as idades. “Todos nós esperamos uma velhice saudável, isso começa com a promoção da saúde muito cedo, mas sabemos do aumento da incidência de Alzheimer e outras demências. Então isso mostra o acerto de termos dessa política”, afirmou a ministra.
Diagnóstico precoce
A sanção presidencial é um passo importante e inclusivo para enfrentar os desafios associados às demências e promover o bem-estar de toda a comunidade, como parte do cuidado integral às doenças neurodegenerativas no Brasil.
Segundo a proposta, haverá diretrizes claras para o diagnóstico precoce, tratamento adequado e suporte integral aos pacientes e cuidadores. Além disso, gestores do Sistema Único de Saúde (SUS) deverão incluir notificações sobre a ocorrência da doença de Alzheimer e de outras demências nos sistemas de informação e registro.
O intuito da legislação é facilitar a disseminação de informação e apoiar a pesquisa clínica, inclusive mediante a colaboração com instituições internacionais. Também visa promover a educação da população sobre demências, reduzindo o estigma associado a essas condições e incentivando a solidariedade e a empatia na sociedade.
Para a Profa. Dra. Thais Bento Lima, docente do curso de Bacharelado e de Pós-Graduação em Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), a lei é “fruto do protagonismo e mobilização vigorosa da ABRAz (Associação Brasileira de Alzheimer)”.
Na sua opinião, os destaques da nova lei são o melhor diagnóstico e tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a capacitação de profissionais de saúde, mais suporte para cuidadores e os programas de amparo a idosos em instituições de longa permanência (ILPIs) – os antigos asilos.
Geriatras comemoram nova lei: ‘menos sobrecarga para os familiares’
O SUS terá de fazer uma reforma na política pública, especialmente na atenção aos pacientes com doença de Alzheimer, pois tanto os pacientes quanto os familiares terão direito a um tratamento com abordagem multiprofissional. Toda esta reestruturação trará um ganho na manutenção da autonomia e da independência do paciente nas diferentes fases da doença e, com certeza, trará uma sobrecarga bem menor para os familiares”, explica o geriatra Marco Túlio Cintra, presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG).
Capacitação dos profissionais de saúde públicos e privados para a prevenção, a identificação de sinais e sintomas destas doenças em fases iniciais, além de assistência e integração dos serviços de saúde existentes são algumas das diretrizes da lei, que também é bastante objetiva em relação ao tratamento adequado e ao suporte integral aos pacientes e cuidadores. Além disso, o SUS deverá incluir informações sobre a ocorrência da doença de Alzheimer, assim como de outras demências, nos sistemas de registro.
O projeto altera a Lei Orgânica da Assistência Social, Lei nº 8.742, de 1993, que trata sobre a organização da Assistência Social, para criar programas de amparo às pessoas idosas vulneráveis em instituições de longa permanência (ILPIs), apoiadas pelo poder público na prestação de atendimento integral à saúde física, mental e emocional dos idosos.
“No entanto, para que a lei cumpra seu objetivo, o Ministério da Saúde tem um papel primordial na orientação e na conscientização dos profissionais da área da saúde, tanto os que trabalham no setor público como no setor particular, sobre estas doenças que levam a perdas cognitivas”, disse.
Expectativa a médio e longo prazo
O texto engloba princípios e diretrizes para o tratamento da doença e demanda uma articulação de áreas como saúde, assistência social, direitos humanos, educação, inovação e tecnologia, com o intuito de proporcionar maior qualidade de vida, ampliar o acesso a serviços e reduzir o estigma e isolamento social das pessoas com Alzheimer.
O presidente da SBGG espera, a curto prazo, que haja uma grande divulgação da lei para todos os meios, não apenas para a população, mas, também, para todas as áreas interessadas e que atuam diretamente com estas doenças. “É importante que o poder público continue ouvindo as instituições que trabalham e são referência para esta parcela importante da sociedade e que surjam outras leis como esta”, comenta Dr. Marco Túlio Cintra.
Para ele, a lei sancionada é importante porque promove a saúde, abordando a prevenção; o diagnóstico; o tratamento e a reabilitação em casos de demência na pessoa idosa, destacando também a capacitação profissional, que gera uma descentralização do cuidado e melhora a qualidade de vida da pessoa.
Este paciente terá a perspectiva de um diagnóstico mais precoce em uma fase que em que a perda de funcionalidade é ainda incipiente ou leve, o que será ótimo para o paciente e sua família. Todavia, para a plena abordagem da lei, será necessário o uso de recursos públicos e esperamos que as pessoas com demência estejam entre as prioridades dos gestores da área da saúde para a plena aplicação da lei aprovada”.
A médio e a longo prazo, o presidente da SBGG deseja que se desenvolvam outras políticas de saúde, sempre preservando o paciente idoso, para que esse tenha um tratamento diferenciado junto as suas necessidades. “A lei é interessante porque também incentiva a pesquisa, o uso de tecnologia e o amparo à família, mas é bem complexa porque é multisetorial, envolvendo educação, saúde, moradia e previdência, e isso também envolve investimento”, observa.
Alzheimer: uma crise de saúde pública que precisa ser enfrentada
Paera Ricardo Coutinho Nunes, professor do curso de Medicina da Inspirali na Faseh, o Programa de Saúde da Família (PSF) será uma estratégia fundamental para garantir a acessibilidade e a inclusão social das pessoas com Alzheimer. “Essa Política procurará prover à população de informações a respeito das variadas síndromes demenciais, se utilizando de toda a rede do SUS”.
Ele explica que o principal objetivo da nova legislação é a “implementação de programas e serviços voltados ao enfrentamento participativo, multidisciplinar e democrático relacionado ao Alzheimer e às demais síndromes demenciais”.
De acordo com o médico, a nova política será articulada e efetivada de maneira multissetorial “com serviços direcionados a múltiplos aspectos, como assistência social, previdência, direitos humanos, educação, inovação e tecnologia e demais aspectos que se mostrarem necessários para a adequada implementação”.
O professor destaca as estratégias e ações propostas para diagnóstico precoce e tratamento adequado da condição. “Incluem boas práticas de gestão, capacitação de profissionais e serviços na atenção básica, estabelecimento de protocolos voltados às várias alternativas terapêuticas disponíveis, além da observância das recomendações internacionais, especialmente ao Plano de Ação Global de Saúde Pública da OMS, garantia de uso de tecnologia, descentralização, dentre outras”.
Ricardo salienta como a política aborda a questão do suporte e do cuidado para familiares e cuidadores de pacientes com Alzheimer. “Será oferecido um sistema de apoio interdisciplinar, visando capacitação e às necessidades psicossociais deles. As pessoas envolvidas no cuidado cotidiano dessa população estão cada vez em maior número e as consequências da falta de formação, orientação, respaldo técnico, mas também psicossocial, se não enfrentadas com urgência e seriedade, poderão trazer resultados lastimáveis para todos os envolvidos”.
O docente aponta que a política estabelece ainda iniciativas para capacitar e qualificar profissionais de saúde no atendimento a pacientes com esse tipo de condição. “Haverá incentivo à formação, capacitação, pesquisa científica e instrumentalização adequada de modo a tornar mais precoce e célere o diagnóstico e todas as propostas relacionadas ao tratamento dos pacientes”.
Desafios, oportunidades e expectativas
Para Ricardo, são muitos os desafios para a implementação da política. “A começar, pela incidência em progressão dos casos, uma vez que o envelhecimento da população, e o surgimento de enfermidades degenerativas é indiscutível e irreversível. E a capilarização desta política para difundi-la em todo o território nacional, de modo a atingir e incluir a todos, especialmente a população e os profissionais das áreas envolvidas na prestação deste serviço”.
O docente evidencia também as oportunidades. “Estão relacionadas ao estímulo à pesquisa, à multidisciplinaridade que a política exige, além da oferta de empregos específicos, dentre outras potencialidades”. Segundo com o médico, em relação ao impacto dessa legislação na saúde pública brasileira, as expectativas não se atrelam apenas ao curto prazo, mas sobretudo ao médio e longo prazo.
Como uma política de redução de danos, mas principalmente de efetivação de medidas que, se bem estabelecidas, poderão transformar o envelhecimento da nossa população de maneira substantiva. As pessoas poderão viver mais, e por mais tempo, além de terem melhor qualidade de vida, e poderão ser sujeitas de si mesmas pelo maior tempo possível”.
Com Assessorias