Futuro fértil! Pode até parecer ficção científica, mas os cuidados com a fertilidade podem estar à beira de uma nova revolução, pois estão sendo desenvolvidas tecnologias que podem transformar os tratamentos. Esses avanços podem causar uma mudança radical na sociedade. Neste Dia Mundial da Fertilidade (4 de junho), especialistas destacam que as tecnologias de Reprodução Assistida permitiram que milhares de pessoas no mundo nascessem, de forma que elas não existiriam sem o advento desses tratamentos.

Com a queda das taxas de fertilidade na população e, portanto, o aumento do número de ciclos de fertilização in vitro, espera-se que o mercado de Terapia Reprodutiva Assistida continue crescendo no mundo todo. No lado mais positivo, o mercado está crescendo devido ao aumento da conscientização sobre os procedimentos.

“Além disso, cresce mundialmente o debate sobre a cobertura de benefícios do empregador com relação aos tratamentos de fertilidade, ou seja, as empresas começam a inserir benefícios de planejamento familiar e a preservação da fertilidade, incentivando o congelamento de óvulos, por exemplo”, explica Fernando Prado, especialista em Reprodução Humana, membro da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM) e diretor clínico da Neo Vita.

Mas o que será que o futuro nos reserva a respeito das evoluções em cuidados com a fertilidade? Ovário artificial, espermatozoide feito em impressora 3D, gravidez in vitro, produção de gametas a partir de células da pele… será que estamos falando de um filme de ficção científica ou no futuro veremos essas técnicas? O especialista Dr. Fernando Prado explica os avanços esperados:

Otimização da FIV (Fertilização In Vitro)

O médico espera novos avanços que melhorarão as taxas de sucesso de terapia de Reprodução Assistida e os tratamentos de fertilização in vitro.

“Desde sua criação, o impacto da fertilização in vitro foi significativo, com cerca de 8 milhões de nascimentos por meio desta técnica em todo o mundo até o momento. O efeito da fertilização in vitro na sociedade deve aumentar ainda mais, à medida que a comunidade de pesquisa e a indústria estão se esforçando para aumentar as taxas de sucesso.

Infelizmente, as taxas de sucesso da fertilização in vitro ainda são baixas – em média, apenas cerca de 40 a 50% por tentativa em mulheres jovens, com menos de 35 anos. As taxas de sucesso também diminuem com a idade”, conta o Dr. Fernando Prado.

“A curto prazo (cerca de 10 anos) serão dados mais passos incrementais: protocolos de fertilização in vitro otimizados, tratamento personalizado e melhores ferramentas de diagnóstico. Dentro desse prazo, poderemos usar essas melhorias para avaliar a qualidade do óvulo, esperma, embrião e útero receptor e determinar o melhor momento para a transferência de embriões.

Uma melhor compreensão da implantação e desenvolvimento embrionário também apoiará o desenvolvimento de diagnósticos aprimorados e o desenvolvimento de novos medicamentos para melhorar as taxas de sucesso”, diz o médico.

Produção de gametas a partir de células da pele

Existem vários desenvolvimentos interessantes, atualmente ainda em estágios embrionários, que abordam alguns dos principais desafios. “Muitos desses avanços provavelmente levarão tempo antes de chegar à prática clínica, devido a obstáculos técnicos e também a barreiras regulatórias e éticas.

Em breve, poderemos produzir espermatozoides e óvulos da pele dos pacientes ou de outras células somáticas (não reprodutivas), reprogramando-os em células-tronco e depois em óvulos e espermatozoides. Essa técnica é denominada gametogênese in vitro (IVG) e já obteve sucesso em camundongos e está sendo testada em células humanas em laboratório.

Isso é particularmente importante para pessoas que não podem produzir óvulos ou espermatozoides devido à genética ou tratamento do câncer, ou para mulheres mais maduras. Se entrar em prática, essa técnica permitirá que as mulheres se tornem mães em uma idade muito mais avançada e poderá permitir que casais do mesmo sexo tenham filhos geneticamente relacionados.

Várias startups começaram a trabalhar nisso, mas ainda há muitos desafios relacionados à mudança de camundongos para humanos, incluindo a validação cuidadosa de que nenhuma anormalidade é gerada durante o processo”, explica o especialista. No entanto, a técnica IVG enfrentará um dilema ético, de segurança e legal.

“O fornecimento fácil de óvulos e espermatozoides pode levar ao uso não autorizado, resultando em perguntas sobre quem são os pais legais e se os pais genéticos têm o ‘direito de não ser pais’. Em última análise, o IVG tem o potencial de mudar nosso próprio conceito de filiação e criar a necessidade de separar completamente os status de pais genéticos, gestacionais e legais.

Por essas razões, o impacto do IVG no futuro próximo provavelmente se limitará a permitir pesquisas até que tenhamos resolvido os desafios técnicos, de segurança, éticos e legais”, pondera o Dr. Fernando Prado.

Ovário e espermatozoide artificiais

Órgãos artificiais também estão previstos. “Uma alternativa poderia ser o desenvolvimento de ovários artificiais produtores de óvulos, para os quais modelos preliminares em estudos com camundongos já foram publicados por grupos de pesquisa, mas ainda estão longe de serem usados em humanos”, diz o médico.

“Ovários artificiais também podem tratar a infertilidade prematura causada por tratamentos contra o câncer. Para tais pacientes, a fertilidade pode ser preservada isolando os folículos do paciente do tecido ovariano antes do tratamento do câncer, posteriormente transferindo-os para ovários artificiais transplantáveis, em técnica de bioengenharia que usa células ovarianas do paciente. A expectativa é a de que, após o tratamento e a recuperação do câncer, o ovário artificial pode ser transferido para a paciente”, diz o médico.

Ele lembra também que a qualidade do sêmen vem se reduzindo nas últimas décadas e há estimativas que em um futuro ainda distante (mas não tanto) pode ser um grave problema para a humanidade. “Já existem indicações de como seria feito o espermatozoide artificial: acredite se quiser, por meio de impressora 3D. Incluindo, lógico, um DNA nele”, conta o médico.

Biópsia ovariana e Maturação In Vitro

Outra tecnologia que seria menos controversa e poderia lidar com o pool finito de óvulos de uma mulher é a maturação in vitro (IVM) de óvulos imaturos, armazenados nos folículos ovarianos. “Atualmente, os pacientes recebem tratamento hormonal desconfortável para amadurecer os óvulos, para que possam ser colhidos para fertilização in vitro. Com o IVM, pode-se contornar esse processo estressante e caro”.

“O impacto mais significativo, no entanto, seria permitir a fertilidade ao longo da vida fazendo uma biópsia ovariana com folículos em uma idade jovem, congelando-os e amadurecendo-os para fertilização in vitro mais tarde”, explica o médico.

Gravidez In Vitro e laboratório

Olhando ainda mais para o futuro, mulheres sem útero funcional poderiam “dar à luz” através de úteros exógenos – gravidez in vitro em laboratório, ou seja, um útero artificial. “Isso também permitiria que homens solteiros e casais do mesmo sexo se tornassem pais sem usar uma barriga solidária.

O passo de úteros transplantados artificiais para úteros exógenos é significativo, uma vez que o útero de bioengenharia exógeno teria que ser sustentado por muitos meses e receber a quantidade certa de sangue, oxigênio, nutrientes e hormônios durante toda a gravidez.

O impacto social seria enorme, transformando totalmente a gravidez, com extensas discussões éticas antes da aceitação pública e regulatória. Provavelmente levará várias décadas até que essa tecnologia possa ser usada”, explica o médico.

Edição de genes e reparo de embriões

Há uma expectativa gigantesca com relação à técnica de edição de genes, o que poderia até mesmo curar o câncer, por isso esse tópico tem sido amplamente discutido também na ciência da fertilidade, uma vez que permitiria o reparo de embriões ou o temido aprimoramento de embriões.

“Em certos países, como no Brasil, o diagnóstico genético pré-implantação (PGD) durante a fertilização in vitro é um processo bem aceito e seu uso está aumentando. O PGD permite testar muitas mutações causadoras de doenças em embriões humanos e permite a escolha de transferir um embrião para o paciente.

Durante esse processo, muitos embriões são descartados, levando a um debate controverso, pois alguns consideram discriminação reprodutiva e redução da probabilidade de gravidez por fertilização in vitro. No futuro, e uma vez que as tecnologias de edição de genes tenham se mostrado seguras e eficazes, pode haver uma oportunidade de editar e reparar genes mutantes para evitar que a criança resultante tenha uma doença genética, mantendo a probabilidade de gravidez”, diz o médico.

“Atualmente, existe um entendimento na comunidade científica e com reguladores em todo o mundo de que a edição de genes deve ser aplicada apenas a células somáticas, e não a células germinativas (óvulos e espermatozoides), até que nosso conhecimento científico tenha avançado e nossas visões sociais evoluídas.

Muitas pessoas estão preocupadas com a edição de células germinativas mudando a espécie humana para sempre. É importante, no entanto, não superestimar o impacto da edição da linhagem germinativa e do reparo de genes causadores de doenças, especialmente porque eles seriam reparados em versões que ocorrem naturalmente na maioria da população humana”, explica.

Embora existam muitas discussões éticas, segundo o médico, é emocionante ver que esses avanços revolucionários nos cuidados com a fertilidade estão se tornando cada vez menos utópicos. “O impacto maior e de longo prazo será o aumento da idade dos pais, uma vez que os desenvolvimentos beneficiarão principalmente as mulheres mais maduras, expandindo a vida reprodutiva além da menopausa e do tratamento do câncer”, finaliza o médico.

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