O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece atendimento de prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação de pessoas com doenças raras. Esta assistência é prevista pela Portaria nº 199, de 30 de janeiro de 2014, que implementou a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras. A medida representou grande avanço para a atenção integral às pessoas com doenças raras. No entanto, ainda falta muito para que o impacto aconteça na vida das pessoas.

Passada exatamente uma década, essa política pública ainda precisa ser efetivamente aplicada e integralmente cumprida, como destaca Anete Grumach, coordenadora do departamento Científico de Erros Inatos da Imunidade da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai).

“É necessário melhorar o acesso aos serviços de saúde e à informação, habilitar cada vez mais centros e profissionais de saúde para atuação, ampliar o conhecimento sobre as doenças raras, pesquisas e potenciais terapias, reduzir a incapacidade causada por essas doenças e contribuir para a melhora da qualidade de vida das pessoas e familiares que convivem com as doenças raras”, afirma.

Para ela, além da organização de política e rede nacional de doenças raras, é muito importante a participação de grupos e organizações de pacientes e familiares, mobilizando de forma coletiva e globalmente a comunidade”, comenta a especialista da Asbai.

A presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica (SBGM) também cobra uma maior efetividade da lei. “A Política Nacional ainda precisa de incentivos para que mais centros de referência sejam instalados e aqueles que existem sejam mais bem equipados para atender os cerca de 13 milhões de brasileiros que têm uma doença rara”, afirma Ida Schwartz.

Leia mais

SUS garante atendimento a doenças raras, mas precisa melhorar
Estado do Rio cria Estatuto da Pessoa com Doença Rara
Brasil tem 13 milhões de pessoas com doenças raras

 

Atraso no diagnóstico prejudica tratamento e qualidade de vida

As doenças consideradas raras podem apresentar uma grande diversidade de sinais e sintomas, com manifestações relativamente frequentes, que podem simular doenças comuns, e estes variam de doença para doença e de indivíduo para indivíduo com o mesmo diagnóstico, corroborando para o atraso do diagnóstico

Como se tratam, em geral, de doenças crônicas, progressivas, degenerativas e com risco à vida, o diagnóstico precoce favorece o tratamento adequado, com impacto na evolução da doença e sua gravidade. O tratamento consiste em acompanhamento clínico, fisioterápico, fonoaudiológico, psicoterápico, entre outros, com o objetivo de aliviar os sintomas ou retardar seu aparecimento.

O atraso no diagnóstico de pacientes com doenças raras é comum e, muito vezes, ocasionada pela baixa conscientização e reconhecimento das doenças raras entre os profissionais de saúde. Os pacientes passam por diversos médicos e especialistas antes de chegar ao diagnóstico, atrasando em muitos anos o diagnóstico correto.

“Considerando que cerca de 80% das doenças raras são de origem genética, o aconselhamento genético é fundamental na atenção às famílias e pessoas com essas doenças”, afirma Anete Grumach, da Asbai.

Abramed: diagnóstico pode levar até 15 anos no Brasil

Esclerose múltipla, hemofilia, autismo, tireoidite autoimune, hipopituitarismo, demência vascular, encefalite, fibrose cística, hiperidrose, osteogênese imperfeita, hipotireiodismo congênito e hiperplasia adrenal congênita, são alguns dos exemplos de doenças raras, a segunda causa de mortalidade infantil no país.

Pela complexidade dessas doenças, os diagnósticos precoces demoram em média sete anos nos Estados Unidos e de dez a 15 no Brasil, segundo a Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed). Embora seja imprescindível o diagnóstico precoce, ainda não se consegue identificar sua causa e fechar um prognóstico preciso em cerca de 40% dos casos.

“Devido à ampla diversidade das doenças raras, o diagnóstico é complexo e, em muitos casos não há cura, apenas cuidados paliativos com valores inacessíveis para a maioria da população de um país de baixa renda”, alerta a entidade.

Sem diagnóstico precoce e tratamento adequado, as sequelas causadas pelas doenças raras são responsáveis pelo surgimento de cerca de 30% das deficiências – que podem ser físicas, auditivas, visuais, cognitivas, comportamentais ou múltiplas, a depender de cada patologia.

Acesso a novas tecnologias e aconselhamento genético

Por ser, em sua maioria, de base genética e incidente maior em crianças, a análise neonatal a partir do histórico familiar já pode identificar, desde o nascimento, tratamentos adequados e assegurar qualidade de vida para o paciente, visto que a maioria das patologias não trm cura, muitas vezes são crônicas, progressivas e degenerativa. Além disso, o Teste do Pezinho pode identificar agravos.

Essa realidade afeta o paciente e seus familiares, pois, na ocasião de uma pessoa ser identificada com uma patologia rara, deve-se considerar o aconselhamento genético, uma vez que o histórico familiar influencia no aparecimento da condição.

Porém, com o acesso à tecnologia, redes de pesquisa colaborativas estão melhorando o compartilhamento de dados e recursos, padrões e protocolos comuns estão sendo desenvolvidos e o tempo médio para um diagnóstico está diminuindo.

Os avanços na genômica e na medicina de precisão permitem que os pesquisadores entendam melhor as causas subjacentes de muitas doenças raras e desenvolvam terapias direcionadas.

Capacitação de médicos e laboratórios

De acordo com a entidade, pela quantidade de CIDs (Classificação Internacional de Doenças) relacionados, o diagnóstico depende de uma atuação precisa e capacitada de médicos e laboratórios especializados, além de melhor acesso à informação para a população sobre o tema.

Para a Abramed, o trabalho é multidisciplinar. É necessário contar com um exame médico clínico que encaminhe corretamente o paciente, enquanto os laboratórios de medicina diagnóstica precisam contar com profissionais atualizados para detectar as alterações genéticas.

Segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), uma equipe capacitada aumenta as chances de detecção de doenças raras: geneticistas, por exemplo. As análises também devem contar com médicos especialistas como neurologistas, pediatras e fisioterapia.

Todas essas premissas: capacitação de equipes e do uso de tecnologias, deve ser parte da formação do médico, é preciso explorar esse campo de atuação e atuar com medidas de prevenção. “A medicina preventiva não deve ser negligenciada”, destaca a Abramed.

Remédios caros inviabilizam tratamento, diz Abramed

Os Estados Unidos, União Europeia e Japão subsidiam, em algumas jurisdições, a pesquisa de medicamentos órfãos, cuja produção não seria lucrativa sem a assistência do governo. São medicamentos órfãos aqueles usados para o diagnóstico, prevenção e tratamento das doenças raras, mas, a raridade dos casos dificulta a comprovação da eficácia clínica destes medicamentos e a produção em larga escala.

Não há consenso entre indústria, operadoras de saúde e entidades reguladoras sobre a oferta de cuidado desses usuários. A saúde pública apresenta o mesmo problema. Por serem tratamentos de alto custo, muitas vezes, um único caso significa uma conta alta, o que pode levar o plano de saúde à insolvência, por exemplo.

O preço proposto pela indústria farmacêutica para incorporação da droga que trata da atrofia muscular espinhal (AME), por exemplo, é de R$ 5,7 milhões por paciente. A AME é uma doença rara e degenerativa, passada de pais para filhos, como é comum entre esse tipo de doença.

Alguns especialistas defendem que interesses puramente mercadológicos não devem superar os interesses da oferta de cuidado, mas não existe consenso, tornando a vida do paciente dependente de judicialização. Com a publicação da Lei 14.454 em 2022, o “rol taxativo” foi derrubado.

Assim, as operadoras de assistência à saúde poderão ser obrigadas a oferecer cobertura de exames ou tratamentos que não estão incluídos no rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, desde que haja aprovação por agências de avaliação de incorporação de tecnologias e comprovação de eficácia – como Anvisa e Conitec.

Agenda Positiva

Audiência pública debate política nacional para doenças raras

Uma audiência pública para discutir os dez anos de criação da medida, instituída pela Portaria 199/2014, do Ministério da Saúde – e os desafios para a atenção da população no que diz respeito a esse tema será realizada nesta quinta-feira (29) na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado Federal.

“Ainda são pouquíssimos os serviços de referência habilitados no país para atender essa população. A maioria deles ainda se concentra nas regiões sul, sudeste e centro-oeste e há apenas um serviço na região norte do Brasil. É urgente mudar essa realidade”, alerta a senadora Mara Gabrilli (PSD-SP), autora do requerimento para o debate.

A audiência pública faz alusão à Lei 13.693, de 2018, que instituiu Dia Nacional da Informação, Capacitação e Pesquisa sobre Doenças Raras, lembrado anualmente no último dia de fevereiro, e a Semana Nacional da Informação, Capacitação e Pesquisa sobre Doenças Raras, realizada anualmente na última semana do mesmo mês.

Durante o evento, será distribuída a Revista CASRaras que traz um balanço do trabalho realizado ao longo de 2023 pela Subcomissão Permanente de Direitos das Pessoas com Doenças Raras (CASRaras). Nos dias 28 e 29, o edifício do Senado também fica iluminado nas cores verde (cúpula menor) e rosa (anexo I). Já o edifício da Câmara dos Deputados fica iluminado em tons de azul e roxo, em alusão ao Dia Mundial das Doenças Raras.

Mais sobre as doenças raras

As doenças raras, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), afetam até 65 pessoas a cada 100 mil indivíduos ou 1,3 a cada dois mil. O Word Economic Forum, publicado em março de 2023, informa que mais de 400 milhões de pessoas vivem com alguma doença rara no mundo, sendo 75% delas começando na infância e ocasionando a morte de terço das crianças antes dos cinco anos de idade.

No Brasil, a Associação Brasileira de Doenças Raras (ABDR) estima que são 13 milhões de pessoas com algum dos sete mil tipos. A maioria ainda não tem cura, são crônicas, progressivas e estima-se que 70% a 80% delas são ocasionadas por fatores genéticos. As demais são oriundas de causas ambientais, infecciosas, imunológicas, entre outras.

O último dia do mês de fevereiro é marcado, todos  osanos, pelo Dia Mundial das Doenças Raras. A data foi criada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para levar informação para a população sobre essas patologias. Esse número representa cerca de 3,5 a 5,9% da população mundial com uma doença rara. Embora sejam individualmente raras, em um grupo acometem um percentual significativo da população, o que resulta em um problema de saúde relevante.

O número exato de doenças raras não é conhecido e pode ser impactado pela subnotificação, já que existe uma dificuldade no diagnóstico das doenças que, entre outros motivos, são menos conhecidas. Essa falta de conhecimento faz com que os sintomas sejam negligenciados pelos pacientes que sofrem com as comorbidades.

Com Assessorias

Gostou desse conteúdo? Compartilhe em suas redes!
Shares:

Related Posts

1 Comment

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *