Em uma simples busca na internet, é possível encontrar várias empresas oferecendo cursos online de preenchimento de PMMA em diversas partes do corpo e peeling de fenol “profundo” para qualquer pessoa que deseja realizá-lo, sem qualquer restrição profissional. A facilidade com que muitas pessoas têm acesso a tratamentos invasivos ou que podem gerar sérios danos à saúde ultrapassa todos os limites da ética e expõe pacientes a risco até mesmo de morte.

Um exemplo recente foi o caso que envolveu a influencer Natalia Becker, dona de uma clínica de beleza em São Paulo acusada pela morte do empresário Henrique Chagas, em junho. Ela foi “capacitada” a fazer peeling de fenol num curso online oferecido por uma farmacêutica, que custou R$ 397.

Um levantamento inédito do Conselho Federal de Medicina (CFM) revela o risco ao qual a população está exposta pela realização de procedimentos estéticos invasivos por pessoas sem qualificação.

No País, dentre os 3.532 cursos na área de estética cadastrados na plataforma no Sistema de Regulação do Ensino Superior (e-MEC), do Ministério da Educação, 98% não exigem formação em medicina dos seus participantes, mesmo que boa parte deles se proponha a ensinar aos seus inscritos o uso de técnicas invasivas e de risco, como aplicação de fenol e PMMA, entre outras.

Alguns dos anunciantes se propõem a fazer a formação com a promessa de retorno financeiro aos inscritos e até liberando os alunos de etapas anteriores à conclusão da atividade. O trabalho mostra ainda que, no total, os cursos de estética oferecem mais de 1,4 milhão de vagas, sendo que 81% delas estão vinculadas a ensino à distância.

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Lei do Ato Médico é desrespeitada

Para a 2ª vice-presidente do CFM, Rosylane Rocha, há um quadro de descontrole e de desrespeito à Lei do Ato Médico. Ela apela às autoridades para a adoção de medidas urgentes para assegurar a obediência ao que está previsto na legislação, em especial por indivíduos que têm colocado a saúde e a vida da população em risco.

A proliferação de cursos de estética para não médicos e a prática frequente do crime de exercício ilegal da medicina motivaram a aprovação de um pacto em favor da segurança do paciente e em defesa do ato médico. O documento traz compromissos firmados por representantes dos Três Poderes, Ministério Público, entidades médicas e relacionadas ao direito e órgãos de defesa do consumidor para evitar a invasão de competências exclusivas do médico.

De acordo com a Lei 12.842/2013 (Lei do Ato Médico), a realização de procedimentos invasivos (diagnósticos, terapêuticos ou estéticos) caracterizados por inserções ou aplicações de substâncias que transpassam as camadas superficiais da pele deve ser feita exclusivamente por médicos.

Segundo o CFM, esses procedimentos “exigem dos seus executores adequada capacitação técnica oferecida apenas aos graduados em medicina. Isso reduz significativamente as chances de exposição dos pacientes a efeitos deletérios”. 

Rosylane Rocha justifica sua preocupação pelo fato de que pessoas sem formação em medicina não têm condições de agir, por exemplo, se houver uma intercorrência durante os atendimentos. Ela lembra que são os médicos que têm preparo para agir em situações de emergência, tratando de imediato possíveis complicações.

A médica ressalta que os procedimentos estéticos invasivos devem ser precedidos de consulta médica e exames específicos para reduzir as chances de problemas, devendo ocorrer apenas em ambientes preparados que respeitem as exigências da Anvisa e do CFM.

A conselheira alerta a população sobre os riscos da realização de procedimentos dermatológicos e estéticos invasivos com não médicos e orienta a população sobre como proceder. “Para saber se um profissional está capacitado para fazer um procedimento estético invasivo, o paciente pode acessar o site do CFM e do Conselho Regional de Medicina (CRM) do seu estado e fazer uma consulta para saber se a pessoa é mesmo médica”, observa.

 

 

Exercício ilegal da Medicina: quase 10 mil casos em 11 anos

Os dados detalhados da pesquisa foram apresentados na quarta-feira (25) durante o II Fórum do Ato Médico do CFM. Esse é mais um desdobramento da teia de complexa que envolve práticas que colocam a população numa zona de insegurança. Em março, o CFM já havia revelado que, a cada dia, pelo menos dois casos de exercício ilegal da medicina passam a tramitar no Poder Judiciário ou nas polícias civis dos estados brasileiros.

De acordo com a pesquisa coordenada pela Autarquia, entre 2012 e 2023, o País registrou 9.566 casos de crimes classificados como exercício ilegal da medicina, enquadrados no artigo 282, do Código Penal.

Eventualmente, alguns dos acusados nesses registros em tramitação na polícia e no Judiciário podem se egressos desses cursos livres e à distância que treinam de modo irresponsável pessoas a realizarem atos que podem resultar em mortes e sequelas”, afirmou o presidente do CFM, José Hiran Gallo 

De modo complementar, o presidente Gallo faz um apelo: “a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), as vigilâncias sanitárias de estados e municípios, o Ministério Público e a Polícia Civil precisam adotar estratégias urgentes para evitar que mais brasileiros sejam afetados por problemas que interferem na sua saúde e no bem-estar, assim como as mortes que estamos vendo com cada vez mais frequência”.

Eu acho que as informações tanto de exercício ilegal da medicina, quanto de proliferação de cursos, o controle do médico para não médico, reforçaram o fechamento desse pacto, esse acordo entre os vários players, acho que só para contextualizar de alguma forma da visibilidade do pacto, tá bom só isso.

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