Além de seguir os blocos de rua e trios elétricos ou aproveitar os bailes de Carnaval, beijar na boca é uma das atividades que muitas pessoas, especialmente as mais jovens, gostam de praticar e que, infelizmente, pode ser responsável pela transmissão de algumas doenças infecciosas.

Por mais inofensivo que isso parece ser, a troca de saliva pode provocar infecções como a ‘doença do beijo’, o herpes labial e até mesmo candidíase oral – conhecida como ‘sapinho’.  Por isso, especialistas alertam que todo cuidado é pouco durante essa época de festa, ressaltando a importância de cautela nos contatos bucais.

Além dos vírus causadores de resfriados, a mais comum e conhecida dessas doenças infecciosas é a mononucleose, popularmente chamada de “doença do beijo”. Segundo o Ministério da Saúde, a doença afeta, principalmente, pessoas com idade média entre 15 a 25 anos.

A mononucleose pode se espalhar facilmente em ambientes de aglomeração, como os blocos de Carnaval, já que a principal forma de transmissão é por meio dos fluidos corporais, especialmente a saliva. A condição ganha holofotes no período carnavalesco, quando as aglomerações facilitam a circulação viral, sobretudo entre pessoas mais jovens.

“A euforia dos foliões muitas vezes os leva a trocarem inúmeros beijos na boca, negligenciando a devida atenção à higiene. É crucial cuidar das trocas orais, principalmente considerando a eventualidade de lesões nos lábios e dentro da cavidade oral, decorrentes dos inúmeros beijos simultâneos durante o período festivo”, afirma a coordenadora do Curso de Odontologia da Faculdade Anhanguera, Maria Amélia Pazos.

Infectologistas explicam a doença

Fernando de Oliveira, infectologista e coordenador do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar (SCIH) do Hospital São Luiz Morumbi, diz que a doença contagiosa tem como principal agente causador o vírus Epstein-Barr, e outros como citomegalovírus e toxoplasmose.

Segundo ele, embora a maioria das pessoas se recupere completamente, algumas podem desenvolver complicações mais graves, como inflamação do baço e/ou do fígado, problemas hematológicos e, em casos raros, ruptura do baço, inflamações cardíacas e comprometimento neurológico.

Josias Oliveira Aragão, infectologista do Hospital do Servidor Público Estadual (HSPE), principal unidade do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual (Iamspe), explica que “essa é uma infecção bastante comum e a maioria das pessoas no Brasil já teve contato com o vírus e a transmissão ocorre pelo contato íntimo com a saliva contaminada”.

Doença deve ser diagnosticada em consulta

A cirurgiã-dentista Flávia Rabello de Mattos, do Centro de Reabilitação Rabello, na Tijuca, no Rio de Janeiro, explica que a mononucleose se caracteriza costuma ser silenciosa e é caracterizada por sintomas como febre, dor de garganta, fadiga e aumento dos gânglios linfáticos, com caroços no pescoço. 

“Na maioria das vezes, esses sinais são visíveis no rosto. Em outros casos, o vírus fica incubado e somente será identificado na cavidade oral por meio de uma consulta ao dentista e um exame de sangue. É nesses casos que devemos manter alerta máximo”, afirma.

Pessoas infectadas apresentam como principais sintomas cansaço, febre, irritação na pele e a sensação de glândulas inchadas. Mas o diagnóstico preciso só pode ser feito por meio de exames clínicos solicitados por clínico ou dentista. O profissional vai prescrever o melhor tratamento para a doença, incluindo, em geral, repouso e maior ingestão de líquidos.

Sintomas podem ser confundidos com dengue

Segundo Dr Josias, é possível ter mononucleose de forma assintomática, mas, caso apresente sintomas, eles se assemelham aos de outras doenças infecciosas e incluem febre, mal-estar e dor de garganta. “O que pode chamar a atenção para a mononucleose é o aparecimento de caroços, principalmente na região do pescoço e manchas no corpo”, complementa Fernando de Oliveira.

Christianne Takeda, médica infectologista da Hapvida NotreDame Intermédica, diz que os sintomas podem ser confundidos com os da dengue ou de outras viroses, pois o quadro inicia da mesma forma, com dor de cabeça e febre.

“Os gânglios linfáticos aumentam e a fraqueza física e a dor no corpo também são recorrentes. No entanto, é preciso ficar atento. Geralmente a doença demora alguns dias para apresentar os primeiros sinais”, explica.

A diferença em relação a outras doenças infectocontagiosas é que também pode haver a presença de manchas vermelhas pelo corpo e o aumento no tamanho dos gânglios, principalmente no pescoço, além de aumento do fígado e baço nos casos mais graves. “Por isso é importante ter atenção aos sinais do corpo”, afirma.

Doença pode se agravar se não for detectada e tratada

Para fazer o diagnóstico é necessário procurar atendimento médico. Não existe um tratamento específico, os cuidados geralmente incluem repouso, hidratação adequada, analgésicos para alívio da dor e febre, e, em alguns casos, uso de corticoides para reduzir a inflamação.

“É importante seguir as orientações médicas e evitar o contato próximo com outras pessoas para conter a propagação do vírus”, alerta o médico.

O profissional explica que a maior parte dos sintomas deve regredir em alguns dias, mas o cansaço físico pode durar semanas e, nos casos mais graves, meses. De modo geral, o tratamento consiste apenas nos cuidados aos sintomas caso seja necessário.

“Poucos casos precisam de hospitalização e, quando isso acontece, geralmente é devido a alterações expressivas em exames de fígado ou quadros neurológicos”, complementa.

Segundo Christianne Takeda, a recomendação básica é manter o repouso e potencializar a hidratação. “Dependendo da intensidade dos sintomas, remédios podem ser prescritos pelo médico após a confirmação do diagnóstico por meio de exames laboratoriais, como hemograma e pesquisa de anticorpos. Para receber a orientação adequada, é fundamental buscar auxílio de profissional qualificado”.

Prevenção é evitar contato com a saliva contaminada

Maria Amélia destaca que patógenos como vírus, bactérias e fungos podem ser transmitidos pelo beijo. O mais comum é o vírus da mononucleose, mas, segundo ela, não há prevenção para esta doença, e o tratamento se baseia no controle dos sintomas.

Para Dr Josias, evitar contato com saliva infectada ainda é a principal forma enquanto não há nenhuma vacina disponível. Segundo ele, dados do Ministério da Saúde apontam que a mononucleose pode transmitida pela pessoa infectada e sem sintomas até um ano após a infecção.

Dr Fernando diz que a principal medida de prevenção da “doença do beijo” é evitar contato com pessoas contaminadas. Outras ações como não compartilhar bebidas, alimentos e itens de uso pessoal e manter a higiene das mãos também ajudam a reduzir os riscos.

“Outros cuidados gerais com a saúde, como hidratação e alimentação saudável, moderação no consumo de bebidas alcoólicas e descanso também auxiliam no fortalecimento do sistema imunológico e, por consequência, na prevenção de doenças”, enfatiza o infectologista do São Luiz Morumbi.

Cuidados com a saúde bucal também ajudam

Flávia afirma que os cuidados com a saúde bucal, focando na prevenção, também ajudam a afastar o risco da mononucleose.

“Procure manter uma gengiva saudável sem sangramento, evitando, com isso, ter uma porta de entrada para infecções. Recomendo sempre uma boa higiene após as refeições. E se qualquer lesão permanecer na boca por mais de sete dias, o ideal é procurar um profissional”, acrescenta.

O cirurgião-dentista Paulo Zahr alerta que o risco de transmissão dessas doenças pode ser reduzido com práticas simples de higiene bucal, como escovação regular dos dentes e uso de fio dental.

“É importante ficar alerta e evitar trocar beijos quando há lesões visíveis ou sintomas de doenças transmissíveis. Além disso, a comunicação aberta e a conscientização sobre a saúde pessoal de cada um também podem ajudar a prevenir a transmissão de doenças”, alerta Paulo Zahr.

Conheça outras doenças infecciosas transmitidas pelo beijo

Herpes labial

Entre as outras infecções que podem ser transmitidas pelo beijo, destaque para o herpes labial, O herpes simplex vírus (HSV-1) pode ser transmitido através do contato direto com uma lesão ativa ou ferida no lábio. Ela se manifesta com pequenas e dolorosas bolhas nos lábios.

“A manifestação mais comum é a de feridas nos lábios pós o aparecimento de pequenas bolhas, e que regridem e cicatrizam em alguns dias. Sua infecção inicial em quem nunca teve contato com o vírus pode causar alterações sistêmicas, como dor de cabeça, febre, mal-estar e feridas na cavidade oral”, afirma Maria Amélia.

Em geral, as lesões duram menos de uma semana e seus sintomas podem ser abreviados com o uso de medicamentos prescritos por um médico, como explica o Dr. Josias.

“As feridas na boca podem retornar ocasionalmente, pois o vírus causador do herpes não é eliminado do corpo, fica em estado latente. Lesões semelhantes podem aparecer nos órgãos genitais, então também é uma infecção de transmissão sexual.”

A dentista Caroline Cavalcante, da Hapvida Interodonto, indica que o herpes labial é uma doença facilmente identificável. “Antes de beijar alguém, perceba se há pequenas pápulas ao redor da boca ou nos cantinhos. As pápulas do herpes tem a aparência de pequenas espinhas’, explica.

Compartilhar batom pode facilitar a transmissão de herpes labial

O compartilhamento de batons pode facilitar a transmissão de herpes labial durante o Carnaval. O porquê está no contato entre o item com a boca de quem vive com o vírus causar da doença. Ao passar o produto nos lábios, o vírus fica em sua superfície e ao emprestá-lo a outra pessoa, ocorre a infecção. Os sintomas surgem entre três e cinco dias. Entre os sinais estão: bolhas com secreção, ardência, coceira e dor na região afetada.

A infectologista Andrea Almeida, do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual (Iamspe), alerta sobre a importância do não compartilhamento de itens pessoais como: batons e outras maquiagens, além de escova de dente e lâmina de barbear. “O herpes labial pode ser transmitido mesmo quando o paciente não apresenta sintomas. Por isso, o ideal é evitar emprestar produtos pessoais”, alerta a especialista.

Outro cuidado extremamente necessário é suspensão do contato sexual enquanto houver sintomas de herpes, pois o vírus pode ser transmitido para o parceiro e de uma região do corpo para outra. Por exemplo, pode ocorrer a passagem do vírus do lábio para as genitálias.

O tratamento de herpes é feito com terapia medicamentosa, proporcionando alívio em poucos dias. Mas, atenção, a doença não tem cura. Uma vez em contato com o vírus, ele permanece no corpo. A medicação minimiza os sintomas, mas não impede o surgimento de novos surtos da doença e a transmissão do vírus.

Sapinho

Mais conhecida como ‘’sapinho’’, a candidíase oral é responsável pelo surgimento de uma série de sinais que afetam as mais variadas regiões da boca, embora sejam muito mais recorrentes na área da língua. Além de afetar a saúde bucal, a candidíase pode trazer malefícios para outras regiões, espalhando para, por exemplo, órgãos do sistema respiratório e até mesmo para a pele.

“Esse fungo é normalmente passado de pessoa para pessoa por meio do contato direto. Um bom exemplo de prática que favorece essa transmissão é o beijo, mas o contato sexual também pode ser o responsável pelo contágio. Além disso, o ato de compartilhar utensílios e objetos também pode ser um possível agente causador do problema”, alerta o o cirurgião dentista Paulo Zahr, também presidente do Grupo OdontoCompany.

Cárie dentária

Certas bactérias, como Streptococcus mutans, que contribuem para a cárie dentária, podem ser transmitidas pela troca de saliva. Essa é mais um risco que se corre ao trocar beijos com estranhos.

Infecções respiratórias

O vírus da gripe ou resfriado, responsáveis por infecções respiratórias, podem ser transmitidos através das gotículas de saliva presentes no beijo.

HPV

A transmissão do papilomana vírus humano (HPV) acontece por meio de contato direto. Pelo beijo, pode ser transmitida caso existam feridas na boca que entrem em contato com o vírus, mas o contágio mais comum acontece nos genitais, por meio de relações sexuais. O HPV é o causador das verrugas genitais, também chamadas de condilomas. Muitas pessoas não apresentam esse sintomas relacionados ao vírus, porém, ainda assim, pode ocorrer o contágio.

“Além das verrugas, o HPV é responsável por alguns tipos de câncer, sendo o principal o do colo uterino. Por isso, é importante a realização de exames preventivos”, afirma o médico.

A principal forma de prevenção são as vacinas, que protegem contra os principais subtipos do vírus relacionados ao câncer e às verrugas. Além disso, a prevenção deve ser complementada com o uso de preservativos em caso de contato sexual.

O tratamento das verrugas é realizado por dermatologistas, urologistas, ginecologistas ou proctologistas, dependendo da localização das lesões.

É importante ressaltar que a PrEP (profilaxia pré-exposição) não previne a transmissão dessas doenças por ser um método de prevenção específico para o HIV. Caso tenha sintomas relacionados a essas infecções, é fundamental buscar ajuda de um profissional médico.

Sífilis

“A sífilis é uma infecção bacteriana mais conhecida por ser uma IST, porém, também capaz de ser transmitida pelo beijo. A infecção ocorre através de pequenas feridas na boca, e o curso da doença causa manifestações sistêmicas que podem ser fatais. O tratamento consiste no uso de antibiótico”, afirma Maria Amélia.

A importância da hidratação

Além das preocupações com as doenças transmitidas pelo beijo, a Dr. Maria Amélia explica a importância da hidratação durante o Carnaval, especialmente devido ao calor intenso e a movimentação intensa do corpo nos blocos.

“O uso moderado de bebida alcóolica é recomendado, pois o exagero pode favorecer a desidratação. A diminuição do teor de água, provocada por essas substâncias, pode diminuir a produção de saliva, aumentando o risco de problemas bucais, cáries e inflamações nas gengivas”.

Para garantir o sucesso bucal durante o Carnaval, a dentista recomenda a programação cuidadosa para não esquecer itens essenciais de higiene oral em viagens, como escova de dente, creme dental e fio dental. Além disso, enfatiza a necessidade de escovar os dentes após as refeições e, quando não for possível, ao acordar e antes de dormir.

Doença do beijo não é IST, mas exige cautela

A “doença do beijo” não é considerada uma infecção sexualmente transmissível (IST), já que o vírus EBV não é disseminado por sêmen ou por secreções vaginais e anais. Mas a dentista ressalta ainda a importância da vacinação para as ISTs:

“A vacina para as doenças sexualmente transmissíveis está disponível gratuitamente nos postos de saúde. A pessoa imunizada tem menor impacto nas manifestações ao contrair essas doenças. E a vacina não previne só a mononucleose, também combate herpes, hepatite e sífilis”, afirma Flávia.

Neste período de festas, blocos, muita gente reunida na rua, a dentista Flávia Rabello também aconselha que não se partilhe bebidas no mesmo copo ou garrafa.

“É praticamente impossível saber se a saliva do outro está comprometida, e também transmite gripe H1N1, doenças respiratórias e doenças do trato digestivo. As mãos são outros transmissores do vírus quando levadas à boca. Então, é melhor tomar cuidado. Para que acabar com a brincadeira mais cedo, não é? ”, brinca ela.

Com Assessorias

 

 

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