Um mal-estar em 2016 levou Carlos Martinho Pereira Christão, na época com 19 anos, a uma unidade de saúde de emergência no Rio de Janeiro. Ao procurar ajuda para sintomas como vômito e diarreia, o jovem acreditou que seria medicado e liberado rapidamente.

No entanto, devido a alterações significativas em seus exames, foi necessário permanecer internado por 15 dias e, após esse período, seguir em avaliação até o diagnóstico de aplasia de medula, uma doença rara que compromete a produção de células do sangue.

Aos poucos, ele teve que deixar de fazer coisas simples, do dia a dia: “Tive que suspender atividades físicas, academia. Comecei a ter dificuldade para correr e, depois, até para caminhar”, relembra o jovem de 28 anos, que hoje trabalha na área de Tecnologia da Informação (TI) e leva uma vida normal.

Carlos foi submetido a tratamentos durante três anos, sem sucesso. Filho único, ele precisou recorrer a um doador não-aparentado, cadastrado em um registro de voluntários, para conseguir um transplante de medula óssea.  “Os médicos chegaram a cogitar a possibilidade de meu pai ser o doador, mas a compatibilidade nesses casos é de 50%”, conta Carlos.

Em casos como o dele, quando não há doadores aparentados compatíveis, a Oncoclínicas Rio de Janeiro costuma recorrer ao cadastro do Registro Brasileiro de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome), coordenado pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca), para o atendimento de seus pacientes.

Homenagem ao doador americano

Foi o que aconteceu com Carlos. A medula que salvou sua vida veio de longe, dos Estados Unidos e o procedimento foi um sucesso. “Quando localizaram o Patrick, ele era 100% compatível. Por coincidência, temos a mesma idade e praticamos esportes. Ele joga futebol americano e, para entrar no time da faculdade, tinha como condição ser doador de medula. E, na turma dele, foi o único que conseguiu de fato contribuir”, conta Carlos.

O carioca lembra bem dos dias de espera até a chegada da medula ao Brasil. “A medula vem de avião. Mas deu tudo certo. Hoje posso fazer tudo de novo e sou muito grato ao Patrick por ter me ajudado a chegar aqui”.

Patrick já ganhou até homenagem do carioca. Praticante de esportes, durante uma meia maratona o rapaz vestiu uma camisa com as frases “Thank you, Patrick! We did it (Obrigado, Patrick! Nós fizemos isso). Dois anos após a cirurgia, Carlos pôde fazer contato com Patrick.

Quando tive acesso à identidade dele, tentei contato, mas não consegui. Aí descobri o perfil numa rede social e pude saber como era. Uma prima que mora nos Estados Unidos me ajudou a achá-lo e fizemos um primeiro contato por mensagens. Ainda não tive a oportunidade de ir até lá para um encontro, mas está nos planos”, relata.

650 brasileiros estão à espera de doador de medula

Iniciativa garante o tratamento de pacientes com doenças que afetam as células sanguíneas, como foi o caso de um jovem carioca sem irmãos, que precisou recorrer a um registro de voluntários

Assim como aconteceu com Carlos, nunca se sabe quando alguém pode precisar de uma medula óssea – e o pior, não conseguir encontrar um doador compatível na própria família e precisar recorrer ao único banco de medula do país.

Atualmente, o Brasil possui 650 pacientes em busca de um doador de medula óssea não aparentado. Apesar do número de doadores cadastrados ultrapassar os 5,7 milhões, segundo a Associação da Medula Óssea (AMEO), a dificuldade para encontrar alguém compatível na população geral é enorme.

Segundo o Redome, as chances de um indivíduo encontrar um doador ideal entre irmãos de mesmo pai e mesma mãe é de 25%, enquanto que a compatibilidade entre indivíduos não-aparentados é de uma a 100 mil.

Por isso, a doação de medula óssea deve ser incentivada como um ato de solidariedade e esperança que garante o tratamento de doenças que afetam as células sanguíneas, como linfomas e leucemias. Em geral, pacientes que necessitam de transplante precisam contar com um parente compatível ou recorrer a um doador não-aparentado, cadastrado em um registro de voluntários.

Cadastre-se para ser um doador e seja a esperança entre 100 mil pessoas

Para conscientizar a sociedade e aumentar as chances de compatibilidade, a Semana de Mobilização Nacional para Doação de Medula Óssea acontece de 14 a 21 de dezembro, iniciativa criada por lei (nº 11.930/2009). O objetivo é incentivar e conscientizar sobre a importância da doação, além de esclarecer e captar novos doadores.

O primeiro semestre de 2024 registrou um aumento de 16 mil doadores voluntários de medula óssea em relação ao mesmo período no ano passado. Os dados são do Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome), que hoje conta com 5.784.307 doadores cadastrados em seu banco. Mas é preciso cada vez mais incentivar novas doações.

Carmen Vergueiro, hematologista e coordenadora da AMEO, afirma que o transplante de medula é uma opção que salva a vida de pessoas com as mais variadas doenças, entre elas a leucemia, alguns tipos de linfomas, síndromes e tumores, doenças autoimunes, entre outras.

Medula óssea x medula espinhal

A medula óssea é um tecido encontrado no interior dos ossos. Quando não funciona adequadamente, seja por doenças como leucemia, anemias ou doenças hereditárias, a transfusão de medula óssea pode ser a única alternativa para a recuperação do paciente”, esclarece Andreia Moreira, hematologista da Pró-Saúde.

Mas a desinformação ainda prejudica que mais pessoas sejam alcançadas e sejam doadoras, além de aumentar o processo e a espera de dezenas de pacientes.

O primeiro medo é o de achar que a medula óssea é aquilo que tem dentro da coluna espinhal. Aquilo é medula espinhal, mas as pessoas confundem. A medula óssea é o tutano e fica no interior do osso, uma espécie de sangue. Lá, estão as células progenitoras do sangue e essas células são usadas para fazer o transplante de medula óssea”, explica.

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Manter o cadastro atualizado facilita o processo

O cadastro para ser doador de medula pode ser feito junto a doação de sangue, apenas informando o desejo. Após, é feita uma tipagem sanguínea na amostra e então ela fica no banco de dados do Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea (Redome).

Caso surja uma pessoa compatível, o doador é contatado e novos exames são feitos para realmente comprovar a compatibilidade. Para ser doador há algumas regras, entre elas ter entre 18 e 35 anos, possuir um bom estado de saúde e não ter doenças transmissíveis ou ter tido câncer.

Um dos maiores problemas enfrentados atualmente, é encontrar o doador. Apesar de muitas vezes as pessoas se mostrarem compatíveis em primeiro momento, torna-se complicado encontrá-la.

A semana é importante para que a gente possa desmistificar alguns medos, mas também de pedir para que os doadores mantenham os dados atualizados. Muitas vezes as pessoas se cadastram, mas mudam de endereço ou de telefone e esquecem de atualizar seus dados. Se você se cadastrou como doador de medula óssea, sempre entre na sua carteirinha no site do Redome para atualizar os seus dados”, ressalta a coordenadora.

Compatibilidade entre população geral é de um a 100 mil

Todos os doadores são inscritos no Redome, um órgão do Ministério da Saúde e que funciona no Rio de Janeiro como um grande banco de dados, que armazena nomes,  compatibilidades e informações HLA de todos os voluntários.

Por outro lado, todos os pacientes inscritos ficam no Registro de Receptores de Medula Óssea (REREME). Todos os dias, o Redome faz uma espécie de match entre voluntários e pacientes para verificar possíveis compatibilidades.  Quando há uma possibilidade encontrada, o trabalho humano entra em ação.

Nós entramos em contato para saber se esse candidato realmente confirma a vontade dele de doar e aí começam os exames mais detalhados para avaliar a saúde do doador e a existência de doenças”, explica a Dra. Carmen. Até a doação ocorrer de fato, diversas etapas são necessárias.

Diversidade racial no banco de medula é um dos desafios

Outra dificuldade citada pela hematologista é em relação à diversidade racial no banco. “Hoje, o Redome precisa aumentar um pouco o seu perfil de pessoas da raça negra, porque a gente tem uma menor representação dessa etnia”, destaca.

Na verdade, são várias etnias da raça negra e a gente está pouco representado no registro. Então, uma pessoa da raça negra tem mais dificuldade de encontrar um doador dentro do Redome do que uma pessoa da raça branca”.

Para minimizar esse problema, a AMEO realiza durante a Semana de Mobilização Nacional para Doação de Medula Óssea uma série de divulgações e palestras sobre o tema para alcançar o maior número de pessoas, além de relembrar os doadores cadastrados de atualizarem seus dados.

Coleta pode ser feita pela veia e doador pode ter sintomas gripais

A compatibilidade é feita por meio de exames e, com a evolução e a alta sensibilidade nos testes, os resultados se tornam mais detalhados e especializados. De acordo com a Dra. Carmen, essa evolução fez com que o resultado dos transplantes melhorasse, mas afirma que algumas pessoas possuem maiores chances de encontrar um doador.

A média nos dá um número, mas varia muito de acordo com a sua etnia, genética e de quem que você herdou essa compatibilidade, pois isso pode fazer com que você tenha uma compatibilidade relativamente frequente, ou às vezes, muito rara. Um doador de medula óssea é uma pessoa muito especial”. 

Com a compatibilidade confirmada por meio de exames e a vontade exercida, a  doação pode ser feita de duas formas: por coleta no osso da bacia ou pela veia. O procedimento é simples e o doador pode sentir dores locais após a coleta, ou em casos da doação pela veia, sintomas gripais, como dores de cabeça e pelo corpo.

Após o transplante, a pessoa receptora segue em acompanhamento longo e contínuo, podendo ser até mesmo pela vida toda. Uma das primeiras etapas é a verificação se a medula “pegou”, que dura entre duas a quatro semanas até ela começar a funcionar de forma correta.

Exames com alta sensibilidade facilitam o transplante

Depois do transplante começa um processo conhecido como “quimerismo artificial”, que trata-se de quando a pessoa realiza um transplante de medula óssea alogênico, ou seja, aquele que precisa de um doador de medula.

No caso do transplante de medula, o quimerismo é o objetivo, pois as células doentes do receptor serão alteradas por células novas e saudáveis. Quando ele ocorre de forma total, as chances de sucesso são maiores.

Uma das formas de medir o quimerismo de um indivíduo , é por meio de exames moleculares, como o kit NGS Devyser para Quimerismo, que a Biometrix Diagnóstica fornece aos laboratórios.

É um protocolo simples para medição e monitoramento rápido e confiável de quimerismo em pacientes transplantados de medula óssea”, destaca Marcelo Mion, gerente de suporte ao cliente e treinamento da empresa.

Segundo ele, devido a sua alta sensibilidade, medição precisa e suporte de um software personalizado, o kit garante que o monitoramento de recaídas seja aprimorado e precoce, além de facilitar a compreensão sobre o quimerismo nos pacientes.

Saiba mais sobre o transplante de medula óssea

  • É na medula óssea que se localizam as células-tronco hematopoéticas, responsáveis pela geração de todo o sangue (glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas). Essas são as células substituídas no transplante.
  • O transplante de medula é indicado para tratar doenças relacionadas à fabricação de células do sangue e com deficiências no sistema imune.
  • Os principais beneficiados são pacientes com leucemias originárias das células da medula óssea, linfomas, doenças originadas do sistema imune em geral, dos gânglios e do baço, e anemias graves (adquiridas ou congênitas).
  • Outras doenças, não tão frequentes, também podem ser tratadas com transplante de medula, como as mielodisplasias, doenças do metabolismo, doenças autoimunes e vários tipos de tumores.
  • A medula óssea do doador se recompõe em 15 dias.

Como funciona o Redome e onde doar no Rio

O Redome é o terceiro maior banco do tipo no mundo, com financiamento exclusivamente público, pelo Ministério da Saúde. De acordo com o site do Redome, é possível se cadastrar como doador voluntário de medula óssea nos hemocentros localizados em todos os estados do país.

No Rio de Janeiro, além do Hospital Pedro Ernesto, o Inca faz a coleta de sangue e o cadastramento de doadores de segunda a sexta-feira, de 8h às 14h30. Não é necessário agendamento. Para outras informações, clique AQUI.

A instituição, em parceria com o Hospital Unimed, na Barra da Tijuca, mantém a unidade de Transplante de Medula Óssea (TMO), que recentemente alcançou uma marca significativa: três transplantes bem-sucedidos no mesmo dia, totalizando 24 procedimentos até setembro de 2024.

Como se tornar doador

Para se tornar doador voluntário de medula óssea, é preciso ir ao hemocentro mais próximo, realizar um cadastro no Redome coletar uma amostra de sangue para exame de tipagem HLA para garantir a compatibilidade. Além disso, o doador precisa:

· Ter entre 18 e 35 anos de idade;

· Um documento de identificação oficial com foto;

· Estar em bom estado geral de saúde;

· Não ter nenhuma doença infecciosa, crônica ou incapacitante para cadastro e doação de medula óssea, como doença neoplásica (câncer), hematológica (do sangue) ou do sistema imune.

Ao tornar-se um doador, você faz parte de uma rede de solidariedade que pode fazer a diferença na vida de pessoas que precisam”, alerta Andreia Moreira, hematologista da Pró-Saúde.

Para outras informações, procure o hemocentro do estado e agende uma consulta de esclarecimento.

Com informações de Assessorias

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