Foram sete longos anos convivendo com minha mãe acamada, após sofrer um AVC (Acidente Vascular Cerebral) isquêmico que lhe causou afasia (perda da linguagem que leva à incapacidade de falar) e hemiplegia (paralisação de uma parte do corpo, no caso, o lado direito). E com um agravante: ela morava a 360 quilômetros de distância, o que nos obrigava a garantir cuidadoras para acompanhá-la. Foram tempos muito difíceis, enquanto seu quadro só se agravava até, infelizmente, a perdermos definitivamente para essa doença tão cruel.
Só quem já conviveu bem de perto com um doente crônico sabe como é difícil: a família toda adoece junto, tanto emocional como financeiramente. Esta triste realidade ficou constatada em uma pesquisa realizada com pacientes de artrite reumatóide, doença tão incapacitante quanto o AVC, que pode acometer pessoas em plena idade produtiva.
O estudo, encomendado pela Pfizer e Instituto Nielsen do Brasil, com 3.649 pacientes em 15 países, mostra que muitas vezes eles são obrigados a deixar o emprego no auge da vida produtiva. E passam a necessitar dos cuidados de familiares até para tarefas simples do cotidiano ou de contratar funcionários domésticos.
No Brasil, o paciente com artrite reumatoide recebe o diagnóstico com 39 anos, em média, um período de plena atividade produtiva. Com isso, a partir da evolução do quadro, muito precocemente esse paciente se vê obrigado a abandonar as atividades profissionais. A perda ou diminuição da renda do paciente é outro fator que também acaba por afetar a dinâmica e a rotina de todo o núcleo familiar, especialmente se o enfermo é responsável pela maior parte do orçamento doméstico.
“Em alguns casos é possível receber o auxílio da Previdência Social. Mas, se o profissional é autônomo, por exemplo, acaba perdendo sua fonte de renda e terá de viver com o suporte financeiro da família”, analisa a reumatologista Lícia Mota, que atua no ambulatório de Reumatologia do Hospital Universitário de Brasília e leciona na pós-graduação da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Federal de Brasília (UnB).
Cuidadores também precisam de atenção
Para o médico Jamiro Wanderley, doutor em medicina pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), assim como o paciente, o cuidador também precisa de acolhimento. Ele coordena o Curso para Cuidadores Informais da Faculdade de Ciências Médicas. “O ideal é que se faça, regularmente, um rodízio dentro do núcleo familiar para substituir o acompanhante. Assim, o cuidador pode fazer uma pausa para cuidar de sua vida pessoal. Caso contrário, chegará a um estado de saturação”, afirma.
Ao desgaste físico vivido pelos cuidadores, considerando que com a progressão do quadro muitos pacientes passam a necessitar de auxílio para atividades simples, como calçar os sapatos ou escovar os dentes, somam-se os aspectos psicológicos.
“Muitos acompanhantes sentem culpa porque têm de deixar o paciente sozinho para trabalhar. Outros acreditam que não estão fazendo o suficiente pela pessoa”, diz a psicóloga clínica Geralda do Nascimento Sá, diretora técnica do Grupo de Pacientes Artríticos do Rio de Janeiro (Gruparj), em Petrópolis (RJ).
Para oferecer apoio aos familiares dos pacientes, o Gruparj promove palestras de conscientização sobre a artrite reumatoide, discutindo como a doença muda os hábitos de vida e requer adaptações de toda a família. Além disso, a instituição oferece psicoterapia individual e terapia em grupo. “Assim, ajudamos o acompanhante a desconstruir a culpa e a entender que o paciente tem limitações, mas pode reconstruir a sua vida de uma forma diferente”, reforça Geralda.
Impacto econômico nas famílias
Outra pesquisa, realizada a pedido da Pfizer pelo Instituto Ipsos, com a participação de 200 brasileiros, indica que muitas famílias acabam contratando cuidadores profissionais ou empregados que se encarreguem das tarefas domésticas, o que também interfere nas finanças da casa.
Segundo o levantamento, antes de receber o diagnóstico o convívio dos entrevistados era maior com o núcleo familiar (79%) e depois com os vizinhos (8%), colegas de trabalho (7%) e amigos (3%). Após o diagnóstico, a proximidade com os familiares é citada por uma porcentagem menor de pacientes (73%).
E, para 8%, a empregada passou a integrar a rede de pessoas mais próximas e assumiu a mesma importância que os vizinhos (8%) e maior que a dos colegas de trabalho e amigos, ambos com 4%.
Apesar das mudanças provocadas pela enfermidade na rede social do paciente, a maioria dos entrevistados pelo Instituto Ipsos afirma que recebeu apoio integral dos familiares (91%) e dos amigos (83%) e que essa convivência ajudou a encarar os desafios da enfermidade.
Por outro lado, muitos reconhecem que o convívio com a enfermidade é difícil para os parentes (28%) e amigos (21%). Dos entrevistados, 8% disseram que a artrite reumatoide foi responsável pelo afastamento de familiares e 10%, dos amigos.
“Em todas as áreas da vida, a partir do diagnóstico de uma doença crônica progressiva como a artrite reumatoide, há uma verdadeira ruptura no cotidiano desse paciente”, conclui o terapeuta ocupacional Pedro Henrique Tavares Queiroz de Almeida, professor do curso de Terapia Ocupacional da Universidade de Brasília (UnB).
“Tudo o que ele fez nos últimos 40 anos, por exemplo, se torna difícil e ele precisa reaprender a fazer atividades. Esse aprendizado não é apenas um exercício individual, mas sim um esforço conjunto de todos que estão ao redor dele “, complementa.
Mais sobre a artrite reumatóide
De natureza inflamatória e progressiva, a artrite reumatóide afeta as articulações, podendo causar rigidez, deformidade articular, desgaste ósseo e incapacidade funcional, dificultando até mesmo a execução de atividades do dia a dia. Costuma ser diagnosticada por volta dos 40 anos, no auge da vida profissional, exercendo forte impacto para a atividade produtiva do paciente.
No Brasil, estima-se que 2 milhões de pessoas apresentem a doença, especialmente mulheres, o que equivale ao total de habitantes de uma cidade como Belo Horizonte (MG).
Vários fatores estão relacionados à doença, entre eles a predisposição genética. Sabe-se também que o cigarro pode desencadear ou agravar o quadro clínico. Além disso, uma vez que a doença acomete três vezes mais mulheres do que homens e que muitas pacientes apresentam melhora durante a gestação, a associação com fatores hormonais é outro ponto investigado pelos médicos.
Fonte: Pfizer e Instituto Nielsen do Brasil