O triste episódio que se tornou conhecido como o massacre de Blumenau, quando quatro crianças foram mortas e outras cinco ficaram feridas numa creche, demonstra como a violência está presente no ambiente escolar. O aumento desses episódios têm mostrado relação com um processo de cooptação e radicalização de jovens à extrema direita.
Um relatório que aborda ataques às escolas e alternativas para a ação governamental, apresentado ao Grupo Temático de Educação durante a transição do governo federal, informa que eventos de violência às escolas no Brasil começaram a ser registrados no início dos anos 2000. Até o ano passado, foram 16 ataques, com um total de 35 mortes, sendo que quatro eventos aconteceram no segundo semestre de 2022.
Segundo André Bakker, coordenador de pesquisa e projetos do Instituto Aurora, a juventude brasileira, sobretudo de adolescentes e jovens adultos brancos, está exposta a ambientes online que, paulatinamente, promovem esse tipo de conduta.
“Por radicalização, entendemos o processo de adesão ou cooptação de um indivíduo a ideias de caráter extremista, supremacista, misógino, xenofóbico, racista e antidemocrático. Em redes sociais, jogos e fóruns virtuais, essas pessoas compartilham ideias cada vez mais extremas, chegando ao ponto de reverenciar autores de ataques violentos”, explica.
Para evitar que casos como esse se repitam, o Instituto Aurora está trabalhando para que o extremismo seja incluído na política pública de educação em direitos humanos e desenvolvendo formas de disseminar informação para educadoras e educadores. A solução para este problema não é simples, mas deve ser vista como um processo permanente.
“Enquanto a educação em direitos humanos (EDH) for negligenciada, teremos dificuldade de prevenir a violência nas escolas, pois quando se investigam esses casos notamos que a maioria está associada a traumas, bullying, preconceito e outras ofensas que acabam culminando em uma reação de extrema violência. Como é o caso de um ataque armado justamente em uma escola, que é o lugar que gostaríamos de enxergar a construção da cultura de paz e de valorização do ser humano”, comenta a diretora-executiva do Instituto Aurora, Michele Bravos.
Combate ao extremismo deve ser incluído em políticas públicas
Na tentativa de compreender a política pública de educação em direitos humanos no Brasil, o Instituto Aurora contatou, no ano de 2022, todos os estados brasileiros e obteve retorno de 22. Assim, foram realizadas 34 entrevistas, com pessoas em cargos de gestão no serviço público e outras designadas a acompanhar às áreas de: educação em direitos humanos; direitos humanos; e educação, dos respectivos estados.
O levantamento mostra quais as principais temáticas de atuação da educação em direitos humanos, sendo que apenas um estado (RN) mencionou preocupação com a radicalização e disseminação de discursos de ódio entre jovens. Os temas mais citados foram direitos humanos, diversidade, educação étnico-racial, criança e adolescentes e LGBTQIA+.
Para a instituição, é fundamental que os cidadãos brasileiros sejam educados em direitos humanos, um tema ainda muito distorcido pelo senso comum. Reconhecer os direitos de todas as pessoas é a chave para trocas mais saudáveis.
“A EDH é uma educação para uma cultura de direitos humanos, em que casos de violência possam ser prevenidos; e uma educação com direitos humanos, em que os estudantes têm chances de se desenvolver em suas potencialidades ao mesmo tempo que encontram segurança para dialogar frente a conflitos; e educação sobre direitos humanos, em que todos conhecem seus direitos e dos outros, apontando para uma noção de cidadania mais crítica e para relações interpessoais mais saudáveis”.
De Caso Pensado
O texto de um educador sobre as ameaças que as escolas têm sofrido nos últimos dias dá a dimensão dessa exposição dos estudantes a movimentos radicais. Confira o texto que circula em grupos de whatsapp:
Entendam: a onda de ataques e violência gratuita crescente são um projeto. Não é obra do acaso.
Quanto mais medo e ódio produzem mais seu projeto Nazi/Fascista vence: muita gente boa, sensata, consciente clamando por polícia armada em porta de escola.
Daí é um passo para a população exigir polícia dentro da escola e finalmente: que a própria escola seja militarizada.
Depois vem o que? Curso de tiro pra professores e alunos? Venda de armas em massa? Ora, esse é o projeto de quem mesmo? Eis a armadilha. Em pouco tempo teremos muita gente boa dizendo: “Ééé o Bolsonaro tinha razão!”
Quem estuda história sabe. A estratégia e velha e sedutora porque mexe com sentimentos muito profundos em nós: de preservação. Atacar as crianças com uma machadinha não é aleatório, quer mandar um recado direto: “não adianta proibirem as armas, nós vamos machucar vocês do mesmo jeito, ninguém está a salvo!”
Quem viu Guerra nas Estrelas – a ascensão do Imperio – conhece muito bem o enredo: o Mal promove levantes e caos em vários lugares do sistema: cria um clima de medo e horror e depois se apresenta como “a solução” de “pacificação”, mas para isso precisa de plenos poderes porque a democracia “é lenta” e burocrática demais.
A “democracia” morre com uma salva de palmas e surge um sistema totalitário que extermina toda e qualquer oposição – e todos aqueles que lhe conferiram tal poder.
Em uma das cenas mais tristes do filme, praticamente um rito de passagem, o jovem Anakin, ataca uma escola Jedi e mata as crianças. Ali ele morre também e o grande vilão Vader nasce. A arte traduz a vida.
Precisamos ter cuidado para não sermos sequestrados pelo medo e ódio, e clamarmos por um mundo ainda mais violento e opressor.
Não é solução, de forma alguma, transformar escolas em presídios, encher escolas com gente armada, transformar professores em pistoleiros.
Solução é caçar impiedosamente todas as células Nazi/fascistas, criar leis muito mais severas para incitação ao ódio e punições ainda mais severas para as Fake news, e investir pesadamente na Educação das novas gerações para que cresçam sabendo que o Nazi/fascismo é um projeto inadmissível, que corrói nossa civilidade e humanidade.
Polícia para quem precisa de polícia: ou seja, os criminosos.
Nossa luta será imensa.
Porque odiá-los é fácil.
E é exatamente isso que eles querem: que o ódio vença.
Andréa Serpa
07/04/2023