Morador de Niterói, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, o policial civil Lino Gomes, de 62 anos, é o que podemos chamar de um verdadeiro exemplo de superação. Diagnosticado com Leucemia Mieloide Aguda (LMA) em 2018, ele passou por muitas complicações ao longo do tratamento, foi transplantado graças à doação da medula óssea do próprio irmão, Walter Henrique, e conseguiu vencer o câncer.

“Se você tem fé e acredita no seu Deus, você pode vencer. Foi uma batalha. Um impacto. Mas meu lema foi vencer. Hoje estou bem, graças a Deus, fazendo meus exames (agora trimestrais), junto ao Dr Leandro Pataro, bem como exames cardiológicos, clínico geral, além de exames proctológicos. Tudo dentro da normalidade”, conta ele ao ViDA & Ação.

Para Lino, o diagnóstico precoce no Grupo de Hematologia e Transplante de Medula Óssea (GHTN) ajudou muito no tratamento do câncer, e o check-up anual foi o que o salvou.

“Um diagnóstico não é sinônimo de morte. A equipe do GHTN foi de extrema importância em todo o tratamento com a clareza de informações, o acompanhamento, cuidado e companheirismo. Tudo me foi muito esclarecido em uma linguagem bem transparente. Fazíamos exames periódicos e isso foi vital. Agradeço a Deus e aos profissionais de saúde que me acompanharam”, ressalta.

Neste sábado (17 de setembro), é lembrado o Dia Mundial do Doador de Medula Óssea. A data serve de alerta para a importância da doação, que se torna ainda mais necessária e urgente quando se trata de leucemias e linfomas. Afinal, o transplante pode determinar a cura definitiva para os pacientes.

“A doação de medula óssea é imprescindível no tratamento, quando este se faz necessário. É preciso acreditar, é preciso ter fé, mas, acima de tudo é preciso uma boa conscientização para que as pessoas doem medula. Conscientizar que doar não é “retirar a medula” e que não dói doar, mas que doando você está salvando uma vida e, indiretamente, eternizando a sua”, afirma Lino ao ViDA & Ação.

Complicações durante o tratamento

Roberto Magalhães (foto), médico especialista em hematologia e transplante de medula óssea e diretor do GHTN, conta que o tratamento com o paciente foi iniciado já no diagnóstico da leucemia. “A doença voltou, o que foi contra as nossas expectativas, e tivemos que tratá-lo novamente. Fizemos um transplante alogênico aparentado a partir da doação da medula óssea do irmão do paciente, obtendo muito sucesso”, afirma.

Sobre o caso de Lino Gomes, o médico esclarece que o paciente teve complicações graves relacionadas à doença no momento do diagnóstico. Posteriormente, quando teve recidiva da leucemia e durante o transplante de medula, esteve entre a vida e morte em diversos momentos, havendo duas complicações sérias no transplante de medula óssea, como a Doença do Enxerto Contra Hospedeiro Aguda (DECHa) e a Doença Hepática Veno-oclusiva (VOD).

“São duas complicações graves relacionadas ao transplante de medula óssea, doenças que podem levar os pacientes a óbito no transplante. O Lino passou por tudo isso e está com a doença em remissão há mais de dois anos. Nós, do GHTN, estamos muito felizes com esse caso”, destacou. O médico ressaltou a importância de pessoas com doenças hematológicas graves não deixarem de ir às suas consultas e se submeter a transplantes, mesmo no período da pandemia.

No transplante de medula, tipo sanguíneo não é determinante

De acordo com o Redome (Registro Nacional de Doares Voluntários de Medula Óssea), o  transplante de medula óssea é um tipo de tratamento proposto para algumas doenças que afetam as células do sangue, como as leucemias e os linfomas. Consiste na substituição de uma medula óssea doente, por células normais da medula óssea, com o objetivo de reconstituição de uma nova medula saudável.

Roberto Magalhães, que também é coordenador de hematologia do Complexo Hospitalar de Niterói (CHN), explica que o transplante de medula óssea é a melhor alternativa terapêutica para as leucemias agudas de alto risco e que não responderam bem ao tratamento inicial, sendo a única opção de cura.

“Já as leucemias crônicas e de baixo risco seguem o tratamento clínico, com sessões de quimioterapia, imunoterapia e terapia-alvo molecular”, esclarece o hematologista do grupo especializado em tratamentos de hematologia de alta complexidade hospitalar (Tratamento das Leucemias Agudas, Transplante Autólogo e Alogênico de Medula).

Segundo ele, é na medula óssea que se localizam as células-tronco hematopoéticas, responsáveis pela geração de todo o sangue (glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas). Essas são as células substituídas no transplante de medula.

O tipo sanguíneo (dentre outros fatores) é o que determina a possibilidade de um transplante de órgãos, mas com o Transplante de Medula Óssea não é assim. Ele esclarece que no Transplante de Medula Óssea (TMO) é a compatibilidade HLA que indica ser possível (ou não) o procedimento. HLA é a sigla em inglês para “Antígenos Leucocitários Humanos”, uma marca biológica presente em cada uma de nossas células. Cada indivíduo tem vários tipos de HLA, e os principais são: A, B, C, DR, DQ=.

“Herdamos o HLA dos nossos pais (metade da mãe, metade do pai), e é provável que, havendo um irmão, esse tenha 25% da mesma compatibilidade. Quando não há, procura-se essa compatibilidade nos bancos de doação de medula óssea, por isso é tão importante que mais e mais pessoas se tornem doadoras”, explica o especialista.

Importância do diagnóstico e tratamento precoces

Como um dos dez tipos de câncer mais comuns, as leucemias atingem milhares de casos novos anualmente. A doença tem por característica o acúmulo de células malignas na medula óssea e na circulação sanguínea, substituindo as saudáveis. É um mal que pode acometer pessoas em todas as faixas etárias.

Roberto Magalhães destaca a importância do diagnóstico precoce da leucemia e da doação de medula óssea. “A leucemia é um tipo de câncer no sangue; estar atento aos sintomas e manter os exames de rotina em dia é fundamental. Por isso, essa campanha é necessária para que todos estejam conscientes da importância do diagnóstico precoce e de tornarem-se doadores de medula”, afirma.

Segundo o médico, a conscientização da leucemia parte da necessidade de orientar as pessoas quanto a realização de exames regulares, visando expor os sintomas que podem ser compatíveis com a doença, bem como a execução de exames de sangue periódicos.

É preciso tirar o estigma da palavra ‘leucemia’, diz médico

Roberto alerta para a importância de desmistificar a doença, ou seja, tentar tirar o estigma da palavra “leucemia”, pois ela é sinônimo de morte para muitos: “Existem alguns tipos de leucemias que possuem evolução lenta, e os novos tratamentos são capazes de promover a cura sem a quimioterapia, como a Leucemia Mieloide Crônica (LMC), tratada com comprimidos direcionados contra a mutação dessa doença ou podendo, até mesmo, em alguns casos, não necessitar de tratamento imediato, como na Leucemia Linfocítica Crônica (LLC).

Enquanto existem outras que são agudas, mais graves, que realmente arriscam a vida da pessoa. Nesses casos se faz necessário tratamento quimioterápico e transplante de medula óssea em regime de hospitalização, mas, ainda assim, se o diagnóstico for feito rápido e o paciente transferido para um centro de referência, adultos, jovens e até mesmo pacientes idosos podem ter a cura dessa doença que pode ter um desfecho fatal”, afirma.

“Existem tratamentos muito eficazes para melhorar a qualidade de vida do paciente, como o transplante de medula óssea, que ainda é cercado de muitas dúvidas. Além de tratamentos clínicos modernos, como a terapia-alvo molecular e o uso de anticorpos monoclonais biespecíficos, que estimulam o organismo do próprio paciente a combater a doença. Essas terapêuticas estão disponíveis em centros de referência em hematologia, como o CHN, que está equiparado às grandes unidades mundiais no cuidado ao paciente onco-hematológico”, explica o especialista.

Causas, fatores de risco e tratamento para leucemia

A leucemia atinge os glóbulos brancos e pode ser conhecida pela sua forma crônica ou aguda: em sua classificação crônica, os glóbulos brancos ainda conseguem cumprir seu papel de forma normal, e a condição evolui lentamente; já na aguda, eles não conseguem fazer nenhum trabalho das células sanguíneas, e a doença avança de forma rápida, transformando-se em uma emergência médica.

Segundo Magalhães, existem alguns fatores de risco que devem ser observados, como o histórico genético familiar de doenças sanguíneas; se a pessoa já recebeu outros tratamentos de câncer no passado com quimioterapia ou radioterapia; se houve exposição ocupacional à radiação e a agentes petroquímicos e tabagismo, pontos que devem ser levados em consideração no momento do diagnóstico.

Quando se fala em sintomas, o hematologista destaca anemia, palidez, fraqueza, cansaço, palpitação, hematomas e sangramento na gengiva e no nariz como os sete dos principais sinais que o paciente deve considerar como alerta.

O diagnóstico de casos crônicos desse tipo de câncer é feito por meio de exame de sangue de rotina e confirmado pelo hematologista por intermédio de testes mais específicos. Segundo Roberto Magalhães, quanto mais cedo o quadro for reconhecido, mais chances de cura o paciente tem. O tratamento é feito de acordo com o perfil de cada indivíduo e com o estágio em que a doença se encontra.

Segundo ele, pessoas de todas as idades estão suscetíveis à leucemia, e não realizar os exames de rotina pode levar à detecção tardia e prejudicar o sucesso do tratamento. “Quanto mais cedo for identificada a doença, há mais chances de cura e de qualidade de vida para o paciente”, finaliza Roberto.

Leucemia em números

De acordo com estimativas do Instituto Nacional de Câncer (Inca), mais de 10 mil novos casos de leucemia serão diagnosticados em 2022 no Brasil. Dados do CHN  corroboram a estatística: só em 2021, 16% de todos os pacientes internados na Unidade de Hematologia e Transplante de Medula Óssea do hospital eram portadores da doença. Atualmente, o hospital é responsável por 50% dos transplantes de medula no Estado do Rio de Janeiro.

No último ano, o CHN realizou 107 transplantes de medula óssea. Desse total, 19 foram alogênicos, para o tratamento da leucemia aguda. Dados do Registro Nacional e Internacional de Transplantes comprovam que a leucemia aguda é a principal indicação de transplante alogênico no Brasil e no mundo.

Sobre o especialista

Com formação internacional em Pesquisa Clínica e Translacional, mestrado e doutorado e Médico Hematologista da UFRJ pelo Ministério da Educação,  Roberto Magalhães vem atuando desde 2007 na linha de frente e em pesquisas científicas para o tratamento de doenças hematológicas e transplante de medula óssea, buscando as melhores práticas e tratamentos para seus pacientes.
Ele participou ao lado do médico Leandro Pataro da fundação e implementação do programa de Transplante de Medula Óssea do Complexo Hospitalar de Niterói (CHN), da Fundação da Unidade de Transplante Autologo de Medula Óssea do Hospital Icaraí e, posteriormente, do Grupo de Hematologia e Transplante de Medula Óssea (GHTN).
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