Em um organismo saudável, o coração costuma bater entre 60 e 100 vezes por minuto, em um ritmo regular e quase imperceptível. Mas quando esse compasso falha, o que era rotina pode se transformar em risco. Nesta quarta-feira (12/11) acontece o Dia Nacional de Prevenção das Arritmias Cardíacas e Morte Súbita, data criada para alertar sobre uma condição que pode ir de simples alterações benignas até casos graves, que trazem sérios riscos à vida: a arritmia cardíaca.
As arritmias cardíacas, causadas por distúrbios elétricos que alteram o batimento do coração, vão desde palpitações leves até situações graves de parada cardíaca. De acordo com dados do National Center for Biotechnology Information (NCBI), as arritmias estão associadas a 15% a 20% de todas as mortes no mundo, sendo responsáveis por cerca de 5 milhões de casos de morte súbita por ano.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o número estimado varia entre 180 mil e 250 mil mortes anuais relacionadas a esse tipo de evento Segundo a Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac), cerca de 20 milhões de brasileiros são afetados pela condição, que é responsável pela morte de 320 mil pessoas por ano no país, Mortes súbitas por arritmia grave ocorrem a cada dois segundos no Brasil – são 250 mil mortes súbitas por ano.
As mortes por doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), como doenças cardiovasculares, câncer e diabetes, aumentaram 43% nas Américas desde 2000, segundo o relatório NCDs at a Glance 2025, publicado pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).
De acordo com o documento, as doenças cardiovasculares continuam sendo a principal causa de óbito, respondendo por 2,16 milhões de mortes. O relatório também destaca desafios relacionados à poluição do ar, que eleva o risco de doenças cardiovasculares e respiratórias.
Risco de morte súbita e importância da prevenção
A arritmia ocorre quando os estímulos elétricos do coração, responsáveis por controlar os batimentos e garantir a circulação adequada do sangue, passam a se originar em locais incorretos, fazendo o coração bater de forma acelerada, lenta ou irregular.
De forma simplificada, a arritmia é qualquer alteração no ritmo das batidas do coração. Ela pode estar relacionada a um ritmo mais baixo que o normal, mais acelerado ou um descompasso que altera os batimentos, mas os mantém dentro do aceitável, entre 50 e 100 por minuto.
São alterações no sistema elétrico do coração. Quando benignas, geralmente estão relacionadas ao desenvolvimento, respiração, ações comportamentais e variações de normalidade que realmente nem precisam de tratamento. Mas há as arritmias malignas, mais comumente ligadas a outras doenças e que podem levar a quadros graves, inclusive à morte súbita”, explica o cardiologista Ricardo Ferreira, especialista em Estimulação Cardíaca Artificial pelo Instituto Dante Pazzanese.
Algumas arritmias são perigosas, pois podem causar uma parada cardiorrespiratória se não forem identificadas e tratadas precocemente”, explica acardiologista Lilian Cavalheiro, da AMA Especialidades Jardim São Luiz, unidade gerenciada pelo CEJAM (Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”) em parceria com a Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo (SMS-SP).
Estilo de vida e prevenção no trabalho
Fatores como estresse, ansiedade, excesso de cafeína, uso de drogas estimulantes, sedentarismo e jornadas de trabalho extensas estão entre os principais gatilhos para o surgimento de arritmias. “O estresse crônico e a privação de sono alteram o ritmo natural do corpo e aumentam os disparos elétricos do coração, podendo evoluir para quadros sintomáticos”, alerta a médica.
Tanto trabalhadores sedentários quanto aqueles expostos a esforço físico intenso podem estar em risco. Por isso, a Dra. Lilian reforça a importância de pausas durante o expediente, atividade física regular e programas corporativos de prevenção e check-up cardíaco.
A prevenção é sempre o melhor investimento. Empresas que oferecem programas de saúde e treinamento em primeiros socorros não apenas protegem seus colaboradores, mas também reduzem custos e salvam vidas”, afirma Lilian Cavalheiro.
Pessoas mais jovens e atletas também podem sofrer
Embora muitas vezes associada ao envelhecimento ou doenças pré-existentes, a morte súbita cardíaca também pode atingir pessoas jovens e atletas. Casos como a síndrome de Wolf-Parkinson-White e cardiomiopatia hipertrófica estão entre as principais causas em indivíduos aparentemente saudáveis.
Em muitos casos, o paciente é o primeiro da família a apresentar o quadro, sem histórico conhecido. Por isso, a avaliação médica antes do início de atividades físicas intensas ou não é essencial, mesmo em pessoas jovens”, orienta.
O diagnóstico precoce é a chave para evitar complicações. Exames, como o eletrocardiograma, o Holter de 24 horas e o teste ergométrico, ajudam a identificar alterações no ritmo cardíaco. Atualmente, existem procedimentos que vão atrás do problema ao invés de esperá-lo aparecer. Isso representa uma evolução muito grande em termos de investigação médica”, explica o Dr. Ricardo Ferreira.
O tratamento é individualizado e pode envolver uso de medicamentos, ablação (procedimento minimamente invasivo) ou o implante de dispositivos como o marca-passo ou o CDI (desfibrilador implantável). Cada arritmia tem uma origem diferente, e o tratamento deve ser adaptado às comorbidades e necessidades do paciente”, explica. Lilian Cavalheiro.
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Como identificar os sintomas e procurar socorro médico
Os sintomas mais comuns de quem sofre com a arritmia estão relacionados à frequência muito alta dos batimentos, as palpitações. Mas também podem ocorrer tonturas, desmaios, fadiga e mal-estar generalizado. É muito importante estar atento a esses sinais e procurar atendimento médico para entender a origem do quadro e receber o tratamento mais adequado.
Os sintomas mais comuns das arritmias incluem palpitações, falta de ar, cansaço e dor no peito. Durante a prática de exercícios físicos, alguns alertas devem acender: tontura, desmaios, dores no peito e acelerações persistentes do coração são indicativos de que algo pode estar errado. “Esses sintomas não devem ser ignorados, mesmo por quem é jovem e parece saudável”, reforça Cavalheiro.
Segundo a especialista, é fundamental procurar atendimento médico sempre que esses sinais surgirem. O acompanhamento regular com o cardiologista também pode ajudar a identificar o problema antes mesmo que os sintomas apareçam.
Em casos de suspeita de parada cardiorrespiratória (PCR), os primeiros minutos são decisivos. A orientação da cardiologista é clara: “Cheque se o local é seguro, peça ajuda e acione o Samu (192). Inicie imediatamente a ressuscitação cardiopulmonar (RCP) com compressões firmes e rápidas, entre 100 e 120 por minuto, com profundidade de 5 a 6 cm no tórax, até a chegada do socorro.”
Ela defende que o ensino de suporte básico de vida seja difundido desde as escolas. “Saber agir diante de uma emergência é um ato de cidadania. Pequenas ações podem fazer toda a diferença entre a vida e a morte”, finaliza.
Avanços no tratamento
Dois avanços recentes na cardiologia estão transformando o tratamento e a prevenção de arritmias graves: o desfibrilador subcutâneo e as próteses sem eletrodo intracardíaco. Ambos representam alternativas menos invasivas e mais seguras em relação aos dispositivos convencionais, com foco na redução de complicações e na melhoria da qualidade de vida dos pacientes.
O desfibrilador subcutâneo atua na prevenção da morte súbita cardíaca sem a necessidade de fios dentro do coração, enquanto as próteses sem eletrodo intracardíaco, marcapassos totalmente sem fio, são implantadas diretamente dentro do órgão, por cateter, dispensando cabos e cortes maiores. Essas tecnologias, ainda pouco conhecidas pelo público, exemplificam o avanço da medicina cardiovascular rumo a soluções mais discretas, duráveis e seguras.




