A conferência global de clima — a COP 30, que acontece até o dia 21 de novembro de 2025 em Belém (PA) — está destacando, entre seus eixos de negociação, o nexo entre clima, qualidade do ar e saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) já afirmou que “a crise climática é uma crise de saúde” e que a ação climática deve colocar a saúde no centro da agenda.

Novos achados sobre poluição atmosférica e declínio cognitivo reforçam que medidas de mitigação de emissões e melhoria da qualidade do ar têm benefícios que vão muito além do meio ambiente — tocam “quem somos”, “como pensamos” e “quanto tempo podemos manter nossa mente saudável”.

Um estudo recente publicado na revista JAMA Neurology aponta uma associação alarmante entre a exposição prolongada à poluição do ar — em especial as partículas finas conhecidas como PM₂.₅ — e alterações cerebrais típicas da Doença de Alzheimer, além de maior risco de demência.

Segundo o estudo, cada aumento de 1 µg/m³ na concentração de PM₂.₅ esteve associado a um risco 19% maior de alterações neuropatológicas da Alzheimer — ou seja: não é só o pulmão que sofre com o ar poluído — o cérebro também.

Ou seja: se já sabíamos que respirar ar limpo era uma questão de saúde respiratória, agora entendemos que é também uma questão de memória, cognição e longevidade mental”, afirma Fernando Gomes, neurocirurgião, neurocientista e professor livre-docente da Faculdade de Medicina da USP.

O estudo analisou 602 cérebros após a morte e descobriu algo chocante: quanto maior a exposição às partículas finas de poluição no último ano de vida, mais intensas eram as lesões cerebrais típicas do Alzheimer. Confira o estudo neste link

Entre 287 pessoas que tiveram diagnóstico clínico de demência, o padrão se repetiu — quanto mais poluição, pior a memória e o funcionamento do cérebro. Os cientistas estimam que quase dois terços desse impacto (63%) são resultado direto das alterações cerebrais causadas pela poluição.

Para Fernando Gomes, no contexto da COP 30, que acontece agora em Belém, é fundamental que o tema da qualidade do ar seja entendido não apenas como um problema ambiental, mas como uma urgência para a saúde pública e para a saúde cerebral.

Quando falamos em poluição do ar pensamos naturalmente nos danos aos pulmões, ao sistema cardiovascular — e com razão. Mas este estudo revela que a poluição atinge também o cérebro: oxidação, inflamação, comprometimento da barreira hemato-encefálica, tudo isso pode acelerar o envelhecimento cerebral e facilitar o aparecimento de doenças neurodegenerativas”, afirma o médico.

Poluição do ar impacta no desenvolvimento cerebral de crianças
Pesquisa da Universidade da Califórnia aponta que até níveis baixos de poluentes estão associados a alterações no desenvolvimento neurológico infantil

Uma nova pesquisa realizada pela Universidade da Califórnia (Davis) revelou que a poluição do ar externo, mesmo em níveis abaixo dos padrões governamentais de qualidade, pode causar alterações significativas no desenvolvimento cerebral de crianças. O estudo revisou 40 pesquisas empíricas de diferentes continentes e encontrou associações preocupantes entre a exposição à poluição e mudanças em volumes de substância branca no cérebro, importantes para a função cognitiva, além de marcadores precoces para doenças neurodegenerativas, como Alzheimer.De acordo com a pesquisa, as crianças expostas a altos níveis de poluição apresentaram diferenças na estrutura cerebral em comparação com aquelas em áreas de menor exposição. Essas alterações incluem impactos na substância branca e na conectividade cerebral, fatores essenciais para o desenvolvimento neurológico saudável. Os pesquisadores alertam que essas mudanças podem ocorrer mesmo em regiões onde os níveis de poluição são considerados seguros pelas autoridades.Crianças e adolescentes são mais vulneráveis à poluição devido ao tempo que passam ao ar livre e à maior absorção de contaminantes, em proporção ao peso corporal, comparado aos adultos. O estudo reforça a necessidade de ações preventivas, como a instalação de purificadores de ar em escolas e residências próximas a áreas de maior poluição.

O neurologista Maciel Pontes comentou os achados da pesquisa: “Crianças expostas a altos níveis de poluição apresentam diferenças estruturais no cérebro que podem comprometer o desenvolvimento cognitivo e neurológico. É um fator que não pode ser ignorado, pois afeta a saúde mental a longo prazo”.

Pontes também ressaltou a situação alarmante no Brasil: “A poluição do ar que estamos vivenciando em 2024 está associada a um risco crescente de problemas neurológicos. Temos visto estudos que ligam diretamente a qualidade do ar ao aumento de doenças como AVC e também às mudanças cerebrais nas crianças”.

Microplásticos podem prejudicar memória e funções cerebrais, aponta estudo

Exposição a pequenas partículas de plástico mostrou efeitos semelhantes aos do Alzheimer em ratos geneticamente predispostos; especialista chama a atenção para impacto ambiental na saúde


Outro estudo conduzido pela Universidade de Rhode Island e publicado na revista Environmental Research sugere que o acúmulo de microplásticos no cérebro pode afetar funções cognitivas, especialmente em indivíduos com predisposição genética para doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer.

No estudo, os pesquisadores expuseram camundongos portadores do gene APOE4, considerado o maior fator de risco genético para Alzheimer e presente em cerca de 25% da população, a microplásticos de poliestireno por três semanas. O resultado apontou alterações de memória, comportamento e inflamação cerebral, semelhantes às observadas em humanos com Alzheimer.

Estudos anteriores já haviam identificado que um cérebro humano médio pode conter até sete gramas de microplásticos. Embora ainda não seja possível afirmar com certeza o papel dessas partículas no avanço da doença, a pesquisa reforça a preocupação de que fatores ambientais podem acelerar processos neurodegenerativos em pessoas predispostas geneticamente.

Já sabemos que a genética não explica sozinha todos os casos de Alzheimer. A interação com fatores ambientais, como poluição e hábitos de vida, pode ser determinante no risco de desenvolver a doença. Esse estudo mostra que os microplásticos podem ser mais um elemento relevante nesse quebra-cabeça”, avalia Mateus Trindade, neurologista do Sírio-Libanês.

Ainda segundo o especialista, pesquisas sobre prevenção ganham cada vez mais relevância diante do envelhecimento populacional. “O Alzheimer é uma das principais causas de incapacidade em idosos. Se comprovada a relação entre exposição a microplásticos e maior risco da doença, teremos um novo campo de atuação para estratégias de prevenção e políticas de saúde pública”, completa Mateus.

Confira pequenas mudanças de hábito que ajudam a diminuir o contato com partículas invisíveis de plástico:

  1. Prefira recipientes de vidro ou inox – evite aquecer alimentos em embalagens plásticas no micro-ondas, pois o calor favorece a liberação de partículas.
  2. Reduza o consumo de água engarrafada – opte por filtros em casa, que podem diminuir a ingestão de microplásticos presentes em águas minerais.
  3. Troque utensílios plásticos descartáveis – talheres, copos e pratos de plástico podem liberar fragmentos. Dê preferência a alternativas reutilizáveis.
  4. Atenção aos alimentos embalados – sempre que possível, escolha frutas, legumes e grãos vendidos a granel ou em embalagens de papel/vidro.
  5. Evite o uso de plásticos pretos para alimentos – eles podem liberar mais substâncias químicas nocivas e são difíceis de reciclar devido à cor. Optar por vidro, aço inox ou plástico claro é mais seguro e sustentável.

Os microplásticos já estão presentes no ar, na água e nos alimentos, mas podemos reduzir parte dessa exposição com escolhas simples. Essas medidas não eliminam o risco, mas podem ajudar a proteger a saúde a longo prazo”, conclui Mateus.

Com Assessorias

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