A Organização Mundial da Saúde (OMS) define como mortalidade materna a morte de uma mulher durante a gestação ou até 42 dias após, independentemente da duração ou da localização da gravidez, sendo causada por qualquer fator relacionado ou agravado pela gravidez ou por medidas tomadas em relação a ela. Todos os dias, cerca de 830 mulheres morrem em todo o mundo por complicações relacionadas à gravidez ou parto em todo o mundo.

No Brasil, em 2022 a taxa de mortalidade materna voltou aos patamares pré-pandemia. Após atingir a taxa de 117 mortes por 100 mil nascidos vivos em 2021, voltou a 57 em 2024, índice similar ao ano de 2019, segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entretanto, o país ainda está longe da meta da OMS, que é de 223 mortes para cada 100 mil partos e a taxa de morte materna da Europa Ocidental é de 8 para cada 100 mil partos.

É preciso avançar significativamente para melhorar o cuidado da saúde nesse período. Fatores como acompanhamento inadequado durante o pré-natal e complicações obstétricas podem contribuir com os índices de mortalidade materna no Brasil.  A maioria dessas mortes é evitável, com estimativas indicando que até  92% dos casos poderiam ser prevenidos.

No Brasil, as principais causas são patologias associadas à hipertensão gestacional (que leva à pré-eclâmpsia e eclâmpsia), hemorragias pós-parto (com destaque para a atonia uterina) e tromboembolismo (quando coágulos sanguíneos se formam nas veias, podendo se deslocar para os pulmões e causar a embolia pulmonar), além de infecções puerperais (contaminação por bactérias após o parto, afetando o útero e outras partes do trato reprodutivo e que podem evoluir para sepse).

À exceção da última, todas as demais causas da mortalidade materna podem ser detectadas e tratadas precocemente por meio das consultas pré-natais regulares, que também fornecem um espaço para a orientação sobre cuidados com a saúde da mãe e do bebê. No entanto, o início tardio do pré-natal dificulta a identificação de doenças pré-existentes e o tratamento adequado para as gestantes.

“A maioria das mortes maternas são evitáveis, por isso é essencial a conscientização sobre a importância de realizar corretamente o pré-natal, já desde a descoberta e início da gestação. Identificar doenças e fatores de risco de forma precoce também permite o planejamento necessário para realização de um parto seguro”, orienta Fabiana Ruas, ginecologista obstetra.

Para alertar a sociedade sobre a importância de debater o tema e promover políticas públicas que garantam o bem-estar das gestantes e seus bebês, o dia 28 de maio foi instituído como Dia Nacional da Redução da Mortalidade Materna.

“Entender cada uma dessas condições, saber como preveni-las e ter acesso às opções de tratamento mais modernos e eficientes são alguns pontos fundamentais para melhorar essas estatísticas e salvar vidas, já que muitas dessas mortes são evitáveis”, alerta a médica, que coordena a maternidade do Hospital São Luiz Anália Franco, em São Paulo.

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4 em cada 5 mortes na gravidez poderiam ser evitadas

Um estudo do Centro de Controle de Doenças e Prevenção (CDC), nos Estados Unidos, mostrou que mais de 80% das mortes relacionadas à gravidez poderiam ser evitadas. O relatório dos Comitês de Revisão de Mortalidade Materna (MMRCs, na sigla em inglês), divulgado em 2022, analisou 1.018 mortes relacionadas à gravidez entre 2017-2019.

O estudo do CDC, nos Estados Unidos, aponta que a maioria das mortes relacionadas à gravidez era evitável. Os dados revelam a necessidade de iniciativas de melhoria de qualidade nos sistemas de saúde, tanto público como privado, que garantam que todas as pessoas grávidas ou pós-parto recebam os cuidados certos no momento certo.

As informações dos comitês em 36 estados americanos sobre as principais causas de óbito por raça e etnia podem ser usadas para priorizar intervenções que podem salvar vidas e reduzir as disparidades de saúde.

O relatório do CDC aponta que as demais causas de morte relacionada à gravidez incluem as condições de saúde mental, incluindo óbitos por suicídio e overdose/envenenamento relacionado ao transtorno por uso de substâncias (23%); hemorragia (14%); condições cardíacas e coronárias (13%); tromboembolismo venoso – TEV (9%), infecção (9%); cardiomiopatia, uma doença do músculo cardíaco (9%); e distúrbios hipertensivos (pressão alta) da gravidez (7%).

O estudo pondera que a principal causa básica de morte varia por raças e etnias da população estadunidense. As doenças cardíacas e coronárias foram a principal causa subjacente de mortes relacionadas à gravidez entre negros; as condições de saúde mental, para pessoas brancas hispânicas e não hispânicas; e a hemorragia, para asiáticos não hispânicos.

“Não somente os sistemas de saúde, também comunidades, famílias e outros serviços de apoio precisam estar cientes das complicações relacionadas à gravidez e serem envolvidos em medidas que evitem mortes desnecessárias”, enfatiza Erich de Paula, médico hematologista, professor associado da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Campinas (Unicamp) e membro da Sociedade Brasileira de Trombose e Hemostasia (SBTH).

Para o especialista, em se tratando de TEV, o relatório do CDC é uma alerta para um cenário que tem tudo para ser muito semelhante no Brasil, onde o número de mortes maternas relacionadas à gravidez é infelizmente muito maior.

“Os dados do estudo dos EUA chamam atenção para a necessidade de que tanto pacientes quanto profissionais da saúde estejam cada vez mais cientes das melhores práticas para prevenção do tromboembolismo venoso durante a gestação. Ele também mostra que sangramentos representam uma causa importante de morte relacionada à gestação, o que também deve servir de alerta para o uso exagerado de medicamentos anticoagulantes na gestação”, ressalta o médico hematologista.

Para acessar o estudo completo do CDC, clique aqui.

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Atenção para a hipertensão arterial

José Geraldo Lopes, vice-presidente da Comissão de Hipertensão e Gestação da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), destaca que a implementação de cuidados pré-natais adequados pode contribuir significativamente para a detecção precoce e o tratamento eficaz da hipertensão arterial durante a gestação, reduzindo assim o risco de mortalidade materna.

”A identificação precoce dos fatores de risco é uma etapa fundamental para prevenir desfechos maternos e perinatais desfavoráveis relacionados às síndromes hipertensivas, bem como o uso precoce de medicamentos como o AAS e cálcio que previnem a pré-eclâmpsia“, esclarece.

De acordo com o especialista, no contexto da hipertensão arterial durante o ciclo gravídico-puerperal, o principal motivo de encaminhamento para o pré-natal de alto risco ocorre quando a hipertensão arterial crônica está presente durante a gravidez.

Nestes casos, quando há suspeita ou confirmação de pré-eclâmpsia, é recomendada uma avaliação rápida em uma unidade de saúde que possa verificar prontamente a condição clínica e laboratorial da gestante, bem como a vitalidade fetal.

“Geralmente, essa avaliação rápida só é possível quando a gestante é atendida em maternidades ou unidades de pronto atendimento”, alertou.

Para garantir a eficiência do encaminhamento, é essencial que haja uma articulação eficaz entre os diferentes níveis de atenção à saúde (primária, secundária e terciária) que compõem a Rede de Atenção Materno-Infantil. Isso requer uma coordenação assertiva por parte da gestão, que deve englobar também uma atuação comprometida dos profissionais de saúde da equipe multidisciplinar.

Tromboembolismo venoso responde por 9% de casos de mortes nos EUA

Entre as principais causas subjacentes de morte relacionada à gravidez nos EUA, o tromboembolismo venoso (TEV) foi responsável por 9% dos casos de óbito. No Brasil, não há dados tão detalhados sobre a contribuição quantitativa da embolia pulmonar para a mortalidade materna.

Porém, segundo dados do Ministério da Saúde, coletados entre os anos de 2010 e 2021, o número de internações relacionadas a tromboembolismo venoso ultrapassou 520 mil, com um total de mais de 67 mil óbitos entre 2010 e 2019.

Identificado no relatório como “embolia trombótica”, o TEV decorre da formação de uma trombose (coágulo de sangue) em alguma veia (em geral das pernas), e da migração de parte deste coágulo para os pulmões. Os sintomas da trombose nas pernas incluem dor, edema, enrijecimento e mudança da coloração.

No caso da embolia pulmonar, que ocorre quando parte do coágulo se desloca para o pulmão causando uma obstrução da circulação pulmonar, os sintomas incluem desde quadros mais leves com dor torácica e certa falta de ar, até quadros críticos, levando à parada cardiorrespiratória e até a morte.

Com informações da Febrasgo, Rede D´Or e Ferring

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