O uso do anticoncepcional é constantemente motivo de debates tanto nas rodas de conversas entre mulheres quanto nos estudos promovidos pela comunidade médica. Alguns movimentos nas redes sociais relacionam o uso da pílula com o surgimento de alguns problemas de saúde, desde ganho de peso e enxaqueca até trombose e câncer.
O possível risco aumentado de surgimento de tumores malignos é um dos principais motivos de preocupação relacionados ao uso contínuo do medicamento. Um estudo publicado em 2018 no The New England Journal of Medicine levantou novas questões sobre a relação direta entre a contracepção hormonal e o câncer de mama. Os pesquisadores revelaram que o uso do anticoncepcional produziu um caso extra de câncer de mama para cada 7.690 mulheres por ano, considerando que cerca de 140 milhões usam o anticoncepcional em todo o mundo.
No entanto, é muito importante que as mulheres conheçam os benefícios e os reais riscos do método contraceptivo mais utilizado no mundo. Neste Dia Mundial da Saúde da Mulher (28 de maio), reunimos informações de três importantes autoridades no assunto para esclarecer mitos e verdades sobre o tema. César Fernandes, médico ginecologista e ex-presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo); Michelle Samora, oncologista do Centro Paulista de Oncologia (CPO), e Maria Luisa Mendes Nazar, ginecologista do Hospital Edmundo Vasconcelos.
Para César Fernandes, é muito importante que as mulheres visitem um ginecologista de confiança, para que, juntos, definam o método contraceptivo mais indicado para cada perfil, levando em consideração o estilo de vida, características físicas e histórico familiar. O ginecologista esclarece os mitos e verdades das pílulas anticoncepcionais:
A pílula anticoncepcional é segura
Verdade. Sim, a pílula anticoncepcional é um medicamento seguro e apresenta 99% de eficácia na prevenção da gravidez, além de oferecer benefícios adicionais à mulher. No entanto, é importante ressaltar que a pílula deve ser indicada pelo médico ginecologista, que avaliará o tratamento mais adequado para cada perfil de mulher. O medicamento possui em sua composição o hormônio estrogênio, que interfere nos mecanismos de coagulação sanguínea, contribuindo para que algumas usuárias tenham trombose.
No entanto, é importante reforçar que os riscos de uma mulher ter trombose aumentam muito mais com a gravidez do que com o uso do contraceptivo hormonal, por exemplo. Estudos mostram que os riscos de uma mulher ter trombose tomando pílula anticoncepcional é de 8, considerando um universo de 10 mil mulheres no intervalo de um ano. Já na gravidez, no mesmo intervalo de tempo, esse número passa a ser de 30 no universo de 10 mil mulheres.
Pílula anticoncepcional engorda
Mito. A pílula anticoncepcional definitivamente não engorda. Estudos mostram que usuárias de pílulas anticoncepcionais podem apresentar uma variação no peso de até 2 kg para mais ou para menos. O que ocorre é que algumas mulheres mais sensíveis à ação dos hormônios podem ter retenção de líquidos no organismo, alterando, dessa forma, o peso corporal.
Pílula anticoncepcional tem outros benefícios além do planejamento familiar
Verdade. Com o passar dos anos, médicos e cientistas perceberam benefícios para a saúde da mulher, relacionados ao uso da pílula, que iam além do planejamento familiar. Após a realização de estudo de comprovação, o medicamento passou a ser utilizado também no tratamento de sintomas como cólicas menstruais, sangramentos irregulares, TPM, acne, aumento de pelos (hirsutismo) e mesmo como tratamento para algumas doenças, a exemplo da endometriose e da síndrome dos ovários policísticos.
Estudos científicos indicam que a pílula anticoncepcional pode reduzir também a incidência das doenças benignas da mama, da artrite reumatoide, da doença inflamatória pélvica (DIP), da anemia por deficiência de ferro e mesmo do câncer de ovário e do endométrio.
Pílula causa infertilidade no longo prazo
Mito. O contraceptivo tem como objetivo impedir que os folículos ovarianos – que armazenam as células reprodutivas femininas – se desenvolvam e liberem o óvulo, impedindo, por meio deste mecanismo, a gravidez. Assim que o uso do medicamento for interrompido, o sistema reprodutor da mulher voltará a funcionar normalmente. Em casos de infertilidade conjugal, o casal deverá ser avaliado para esclarecer as reais causas subjacentes que dificultam ou impedem a gravidez.
Mulheres que tomam pílula demoram mais para engravidar
Mito. Evidências mostram que o uso de pílulas anticoncepcionais não interfere na capacidade de engravidar. Após a suspensão do tratamento com a pílula anticoncepcional, o retorno à fertilidade é rápido. Em geral, a ovulação ocorre já a partir do mês seguinte à parada do anticoncepcional.
Qual a verdade na relação entre pílula e câncer?
Michelle Samora, oncologista do Centro Paulista de Oncologia (CPO), explica que existem vários mitos quando o assunto é o uso de pílula e sua relação com casos de câncer. “É importante lembrar que cada caso é um caso. Existem mulheres que, com o uso do anticoncepcional, terão mais possibilidades de desenvolver um tumor de mama do que outras. Temos que olhar com cautela e usar a informação para discutir a melhor indicação para cada mulher individualmente”, comenta. Abaixo, a especialista esclarece algumas dúvidas sobre o assunto:
Apenas a pílula anticoncepcional que aumenta o risco de câncer?
Mito. Todos os métodos contraceptivos que liberam hormônio foram associados ao aumento da probabilidade da doença. Nesse grupo estão a pílula, adesivos, anéis vaginais, dispositivo intrauterino (DIU) de hormônio, injeções e implantes. Independente da via de absorção do hormônio, o risco existe.
Se eu utilizar algum método contraceptivo hormonal com certeza vou ter câncer de mama?
Mito. A pesquisa demonstra que o método contraceptivo hormonal apenas aumenta a chance de desenvolver o câncer de mama comparado com as mulheres que não o utilizam. Vale ressaltar que embora exista essa chance para as mulheres, o risco ainda é relativamente baixo.
O tempo de uso influência no aumento das chances de desenvolver o câncer de mama?
Verdade. O tempo de uso do método contraceptivo está inteiramente relacionado às chances de desenvolver a doença. O estudo avaliou que as mulheres que utilizam métodos hormonais por até um ano aumentam em 9% o risco, contra as mulheres que utilizam por mais de dez anos, com um risco aumentado de cerca de 38%.
Devo suspender o medicamento para não desenvolver câncer de mama?
Mito. O estudo não muda a indicação, considerando que a contracepção hormonal diminui riscos de câncer no ovário, endométrio e intestino. Ele é um alerta para a comunidade médica sobre mais um fator de risco para o câncer de mama, assim como a obesidade e o sedentarismo. Uma pessoa que possui mais de um fator de risco, além de buscar uma vida mais saudável, deve discutir com o seu médico outras opções de contraceptivos.
Mito ou verdade: emendar a pílula anticoncepcional faz mal?
Uma das alternativas para interromper a menstruação é o uso contínuo da pílula anticoncepcional, emendando as cartelas da medicação. A opção, no entanto, ainda gera dúvidas sobre eventuais malefícios à saúde da mulher. A ginecologista Maria Luisa Mendes Nazar, do Hospital Edmundo Vasconcelos, esclarece os principais pontos sobre o tema:
Emendar a cartela faz mal à saúde da mulher?
A ginecologista tranquiliza sobre o hábito e conta que optar por emendar a cartela não traz riscos à saúde. “O corpo vai receber a quantidade fixa de hormônio da medicação, que geralmente é composto por estrogênio e progesterona, e assim, não estimula o crescimento do tecido do útero e consequentemente não há menstruação. Esse processo não interfere na saúde”, conclui.
Há um limite de cartelas que possam ser emendadas?
Não, o que pode interferir é a adaptação de cada mulher à dose hormonal da medicação. Segundo a médica, o aconselhável é que sejam observados os efeitos durante três meses. Caso neste período ocorram pequenos sangramentos, é importante consultar o médico para a troca da pílula com uma dose hormonal maior.
Quando ocorre o escape é preciso interromper a pílula?
Em casos em que o uso já ultrapassou os três meses de adaptação, quando há o escape é indicado realizar a pausa de quatro a sete dias e retornar com a mesma medicação, sem problema algum, recomenda Maria Luisa Mendes Nazar.
Por que acontece o escape mesmo não interrompendo o uso?
A dosagem pode não impedir por completo o crescimento do tecido do útero, ocorrendo pequenos sangramentos. A médica enfatiza, porém, que esses escapes não são sinais de ineficácia contra a gravidez.
Essa opção é contraindicada para alguma mulher?
A contraindicação não é diretamente sobre o uso contínuo, mas sobre a composição da pílula. Segundo a especialista, mulheres com problemas circulatórios, cardíacos e com histórico de enxaqueca devem evitar o uso de estrogênio. Maria esclarece que para esses casos, há opção de pílulas somente com progesterona.
Com Assessorias