Muitas famílias têm deixado de consumir pratos tradicionais e aumentado a ingestão de alimentos ultraprocessados e de baixa qualidade nutricional. O resultado disso se vê na balança: mais da metade da população brasileira está com sobrepeso e a obesidade já atinge a 20% das pessoas adultas. Os dados são do novo relatório da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e da Organização Pan-americana de Saúde (Opas), Panorama da Segurança Alimentar e Nutricional na América Latina e Caribe, divulgado esta semana.
Segundo o documento, com base em dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), o sobrepeso em adultos passou de 51,1% em 2010, para 54,1% em 2014. A tendência de aumento também foi registrada na avaliação nacional da obesidade. Em 2010, 17,8% da população era obesa; em 2014, o índice chegou aos 20%, sendo a maior prevalência entre as mulheres, 22,7%. Outro dado do relatório é o aumento do sobrepeso infantil. Estima-se que 7,3% das crianças menores de cinco anos estão acima do peso, sendo as meninas as mais afetadas, 7,7%.
“O Panorama acende um alerta para toda a sociedade e também para o governo. Ao mesmo tempo em que o Brasil conseguiu superar a fome – alcançando níveis inferiores a 5% desde 2014, quando o país saiu do mapa da fome da ONU-, vem aumentando nos últimos anos os índices de sobrepeso e obesidade. Essa situação gera impactos importantes na saúde e deve ser um tema prioritário nas agendas das famílias e das autoridades”, afirmou o representante da FAO no Brasil, Alan Bojanic.
O crescimento econômico, a urbanização e a mudança nos padrões de consumo são alguns aspectos que explicam o crescente aumento do sobrepeso. Combater essa realidade implica em adotar sistemas alimentares saudáveis e sustentáveis que unam agricultura, alimentação, nutrição e saúde.
É necessário fomentar a produção sustentável de alimentos frescos, seguros e nutritivos, garantir a oferta, a diversidade e o acesso, principalmente da população mais vulnerável. Isso deve ser complementado com educação nutricional e advertências para os consumidores sobre a composição nutricional dos alimentos ricos em açúcar, gordura e sal.
Realidade Regional
De acordo com o relatório, cerca de 58% da população latino-americana e caribenha estão com sobrepeso (360 milhões de pessoas). Com exceção de Haiti (38,5%), Paraguai (48,5%) e Nicarágua (49,4%), o sobrepeso afeta mais da metade da população de todos os países da região, sendo Chile (63%), México (64%) e Bahamas (69%) os que registram as taxas mais altas.
A obesidade afeta 140 milhões de pessoas, 23% da população regional e as maiores prevalências são observadas em todos os países do Caribe: Bahamas (36,2%) Barbados (31,3%), Trinidad e Tobago (31,1%) e Antígua e Barbuda (30,9%).
A obesidade impacta mais as mulheres: em mais de 20 países de toda a região, a taxa de obesidade feminina é 10% maior que a dos homens. Segundo a representante regional da FAO, Eve Crowley, “as taxas alarmantes de sobrepeso e obesidade na América Latina e Caribe devem chamar a atenção dos governos da região para criar políticas que abordem todas as formas de fome e má nutrição, vinculando segurança alimentar, sustentabilidade, agricultura, nutrição e saúde”.
A diretora da OPAS, Carissa F. Etienne, explicou que a região enfrenta uma carga de má nutrição que deve ser combatida com uma alimentação balanceada, incluindo alimentos frescos, saudáveis, nutritivos e produzidos de forma sustentável, além de abordar os principais fatores sociais que determinam a má nutrição, como a falta de acesso a alimentos saudáveis, a água e saneamento, serviços de educação e saúde, e programas de proteção social, entre outros.
Melhorar a sustentabilidade da agricultura
A trajetória atual de crescimento agrícola regional é insustentável, devido, entre outros fatores, as graves consequências pelas quais passam os ecossistemas e recursos naturais da região.
“A sustentabilidade da oferta alimentar e sua diversidade futura estão sob ameaça, a menos que mudemos a forma como estamos fazendo as coisas”, disse Crowley, destacando que 127 milhões de toneladas de alimentos se perdem ou são desperdiçados anualmente na América Latina e Caribe.
Segundo a FAO e a OPAS, é necessário tornar mais eficiente e sustentável o uso da terra e dos recursos naturais, melhorar as técnicas de produção, armazenamento e transformação e processamento dos alimentos, e reduzir as perdas e os desperdícios de alimentos para assegurar o acesso equitativo dos mesmos.
Iniciativas brasileiras
O relatório Panorama da Segurança Alimentar e Nutricional na América Latina e Caribe destaca iniciativas adotadas pelo governo brasileiro para promover a alimentação saudável e alertar a população para os riscos da má-alimentação. Um dos destaques é a criação de legislações que regulam a comercialização e a publicidade de alimentos para lactantes e crianças, além de outros alimentos voltados à primeira infância. Também foi citada a campanha “Brasil Saudável e Sustentável”, que tem por objetivo sensibilizar e alertar a população brasileira dos benefícios da alimentação saudável.
Ainda no escopo das ações do governo brasileiro para a promoção da saúde e da segurança alimentar e nutricional da população, o Ministério da Saúde lançou o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT), em que a redução da obesidade e do sobrepeso é um dos principais objetivos. Há também o Plano de Segurança Alimentar e Nutricional, bem com iniciativas específicas, como o programa Academia da Saúde, principal estratégia para induzir o aumento da prática da atividade física, o programa Saúde na Escola, além da divulgação de publicações de orientação à população: Guia Alimentar para a População Brasileira e o Guia Alimentos Regionais Brasileiros.
A Academia da Saúde é a principal estratégia para induzir o aumento da prática da atividade física na população. O programa está presente em 2.789 municípios, com mais de 1.779 polos finalizados e 2.046 novas propostas de implantação. Há também ações preventivas nas escolas para evitar a obesidade em crianças e adolescentes, como o Programa Saúde na Escola (PSE), presente em mais de 50 mil escolas.
Outro avanço é o Plano Nacional de Redução de Sódio em Alimentos Processados, que já retirou 14.893 toneladas de sódio dos produtos alimentícios. O Brasil também contribuiu ativamente para a aprovação da Década de Ação pela Nutrição (2016–2025) – estabelecida na última Assembleia Mundial da Saúde, em maio de 2016 – para promover o fortalecimento das ações na área de nutrição, com foco na Agenda 2030 das Nações Unidas.
Fonte: ONU