O Brasil ganhou cerca de 2 milhões de novos diagnósticos de diabetes entre 2019 e 2021. Saltou de 7,4% da população com 18 anos ou mais em 2019 para 8,2% em 2021, ou 17 milhões de brasileiros de acordo com a mais recente pesquisa Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), divulgada pelo Ministério da Saúde em setembro.

O diabetes está associado a diversas complicações como a disfunção e falência dos rins, do sistema nervoso, do coração e dos vasos sanguíneos. Mas, além desses, a visão é uma das principais impactadas pela doença. Dentre as comorbidades oculares, a retinopatia diabética (RD) é a complicação microvascular mais comum do diabetes.

Dados apontam que 90% e 60% dos pacientes com diabetes tipo 1 e tipo 2, respectivamente, chegam a desenvolver a retinopatia diabética após 20 anos com a doença. A RD é uma doença que afeta os pequenos vasos da retina e pode surgir quando o diabetes não é controlado, além de ser a principal causa de cegueira em adultos de 20 a 74 anos de idade.

Além disso, cerca de 30% de pacientes com RD desenvolvem o edema macular diabético (EMD), que ocorre quando existe um extravasamento de líquido para a retina. O EMD pode trazer alteração na visão de cores, mudança da visão do contraste e até manchas ou pontos pretos na visão.

Cuidado com a saúde ocular do diabético

Na semana dedicada ao Dia Mundial do Diabetes (14/11), especialistas alertam para a conscientização sobre a importância do cuidado com a saúde ocular do paciente diabético.

De acordo com o oftalmologista Leôncio Queiroz Neto, presidente do Instituto Penido Burnier, o diabetes altera os vasos no fundo do olho, muitas vezes sem causar um único sintoma.

Para reconhecer a doença a dica do médico é observar alguns sinais que da mudança no metabolismo: aumento da sede, vontade frequente de urinar, repentina perda de peso, cansaço, falta de sono e fome descontrolada.

“Nos olhos a doença incide lentamente. Com o tempo pode causar glaucoma, catarata e a retinopatia diabética que se não for diagnosticada logo no início pode levar à perda irreparável da visão”, alerta.

Descontrole da glicemia causa doença

Segundo Arnaldo Furman Bordon, chefe do Setor de Retina e Vítreo do Hospital Oftalmológico de Sorocaba e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Retina e Vítreo, o aparecimento da retinopatia diabética está relacionado principalmente ao tempo de duração do diabetes e ao descontrole da glicemia.

“A hiperglicemia desencadeia várias alterações no organismo que, entre outros danos, levam à disfunção dos vasos da retina e, quando não tratada corretamente, leva à cegueira com diversos outros impactos na vida do paciente”, explica o médico.

Isso ocorre porque ainda não há um Protocolo Clínico de Diretrizes Terapêuticas (PCDT) para o tratamento de Retinopatia Diabética publicado, mesmo após aprovação pelo órgão competente em maio deste ano. Este cenário impede a melhora da prevenção, dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos de pessoas com diabetes e retinopatia diabética.

Segundo ele, a prevenção também é peça chave na diminuição do impacto que a retinopatia traz. Nas fases iniciais da doença, não há praticamente sintomas e essa é a melhor hora de se fazer o diagnóstico por meio de exames precoces e regulares.

40% dos diabéticos podem desenvolver glaucoma 

O oftalmologista ressalta que de acordo com vários estudos 40% dos diabéticos podem desenvolver glaucoma. “Isso porque, alterações na circulação provocadas pelo diabetes dificultam a drenagem do humor vítreo, gel que preenche o globo ocular e aumentam a pressão interna do olho que danifica a retina e nervo óptico”, esclarece.

Diabéticos também podem desenvolver o glaucoma renovascular como uma reação à retinopatia e portanto, tem o mesmo padrão de tratamento. No SUS os exames para diagnosticar glaucoma durante a pandemia  tiveram queda de 28% , mas já recuperaram parte desta perda.

Outro efeito do diabetes nos olhos é o aumento de radicais livres que se depositam nas paredes do cristalino e por isso antecipam a opacificação da lente do olho.

Para adiar a catarata que chega mais cedo para diabéticos as dicas do oftalmologista são: controlar a glicemia, proteger os olhos durante a exposição ao sol com lentes que contenham filtro UV (ultravioleta) e evitar excesso de sal que também compromete a osmolaridade celular do cristalino.

Pandemia derruba tratamento no SUS

Levantamento minucioso nos dados do DataSUS mostra estabilização na oferta de fotocoagulação a laser da retina entre 2019 e 2021 pelo serviço público de saúdeForam16,36 mil procedimentos em 2019 e este ano somou  16,7 mil até setembro. Isso significa que se considerarmos o aumento de diabéticos houve redução do tratamento.

Em contrapartida, os relatórios do DataSUS revelam aumento exponencial na oferta de injeções intravítreas de antiangiogênicos. Passou de 2.061 em 2019 para 13.194 até setembro do ano. 

Queiroz Neto explica que o laser seca vasos tortuosos e frágeis que crescem na retina e podem levar à perda da visão caso extravasem após anos de convivência com o diabetes. Mas ainda não dá para comemorar. Isso só aconteceu porque a terapia foi incorporada ao SUS no final de 2019 com uma única marca de antiangiogênico.

A segunda opção só entrou no rol dos procedimentos em maio deste ano e a disponibilidade ainda é muito pequena. Queiroz Neto explica que invés de secar os vasos que se formam na retina por causa do diabetes, a injeção bloqueia a formação destes vasos e por isso é uma terapia mais efetiva. O tratamento, explica, é feito com 1 injeção/mês durante um ano e depois deste período a prescrição segue protocolos personalizados

Ida ao oftalmologista faz parte do tratamento

De acordo com publicação do Ministério da Saúde em 2020, o tratamento do diabetes se consolida com a insulina e o monitoramento da glicemia a partir de um acompanhamento médico e nutricional. O manual reforça também a importância da ida ao oftalmologista, preferencialmente especialista em retina, ao menos uma vez por ano.

De acordo com Bordon, o acesso ao tratamento e um PCDT estabelecido são imprescindíveis para diminuir o impacto da retinopatia diabética na qualidade de vida dos pacientes e nos cofres públicos.

Além disso, ele destaca que “existe uma falsa economia em não se tratar adequadamente esses pacientes, pois os custos diretos e indiretos da perda da visão são maiores. Já é hora do diabetes ser reconhecido como um causador de comorbidades em potencial para, então, podermos proporcionar melhor qualidade de vida aos pacientes.

As complicações do diabetes

Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), a estimativa é de que, ao redor do mundo, sejam 415 milhões de pessoas afetadas pela doença e, dentre eles, 16 milhões se encontram no Brasil.  Ainda não se conhece a causa da doença, contudo, o envelhecimento populacional e a baixa prática de hábitos saudáveis são conhecidos como fatores de risco.

No Brasil, isso é particularmente relevante por causa do processo acelerado de envelhecimento populacional observado nos últimos anos. Os distúrbios da retina, além da catarata, foram as principais causas de deficiência visual e cegueira em idosos participantes de estudos conduzidos no final da primeira década dos anos 2000.

Um estudo, que contou com 146 pacientes de 17 estados do Brasil, revelou que a cegueira afetou negativamente a qualidade de vida relacionada à saúde geral e específica à visão. Metade dos pacientes apresentou algum nível de ansiedade e depressão; destes, cerca de 50% com sintomas moderados ou graves.

Um terço dos indivíduos (34,2%) relatou pelo menos uma queda nos 12 meses anteriores devido aos problemas de visão; destes pacientes, 14% relataram fraturas. Visitas de emergência e hospitalização foram relatadas por cerca de 25% e 5% dos participantes, respectivamente.

Pandemia de diabetes no mundo

Queiroz Neto afirma que 9 em cada 10 casos de diabetes são do tipo 2. Significa que o organismo desenvolveu resistência à insulina causada por maus hábitos alimentares, sedentarismo, ganho de peso, hábito de fumar e  uso de corticoide em alta dose ou continuamente, bem como de alguns ansiolíticos.

Por isso, para o oftalmologista as mudanças no estilo de vida durante a pandemia de Covid podem ter contribuído para esta pandemia de diabetes no mundo todo. Os outros 10%, ressalta, têm diabetes tipo 1 que é hereditário e faz o pâncreas produzir uma quantidade insuficiente de insulina.

“A insulina é um hormônio que faz a glicose e outros tipos de açúcar serem absorvidos pelas células. No diabético os açúcares não penetram nas células e por isso sentem mais fome. Para se prevenir da doença, além dos cuidados com a alimentação a recomendação do médico é fazer exames de sangue periódicos e praticar atividades físicas”, explica o médico.

Com assessorias

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