“Quanto vale uma vida para o estado, a prefeitura, a CDR (Clínica de Diagnósticos Renais)?”. A pergunta é de Leonardo Pinheiro, filho de um paciente renal crônico que, assim como outros, terá que ser transferido para outra unidade de tratamento, longe de sua casa, porque a clínica onde faz hemodiálise deixará de atender pacientes do Sistema Único de Saúde.

O pai de Leonardo é atendido na CDR de Cascadura, na Zona Norte do Rio de Janeiro, que, assim como a unidade do Anil, que mostramos esta semana, também fechará as portas para a rede pública. Outra unidade da rede, na Taquara, Zona Oeste do Rio, também encerrará as atividades para pacientes do SUS. Procurada, a CDR relutou em admitir o fechamento de mais duas unidades, mas acabou confirmando.

“O encerramento das atividades das CDRs Anil e Cascadura está ocorrendo única e exclusivamente por conta da inviabilidade financeira, gerada pela falta de reajuste da tabela SUS pelo Ministério da Saúde, que há anos está defasada e não cobre os custos do tratamento”, explicou a empresa, por meio de nota ao ViDA & Ação.

De acordo com a empresa, as unidades do Anil e Cascadura “atendiam 85% de pacientes SUS e deixarão de existir somente após a conclusão da transferência de todos os pacientes”. Já em relação à CDR Taquara, que reserva 16% de suas vagas para o SUS, a empresa informou que o contrato também não foi renovado. Com isso, os pacientes deverão ser remanejados para outras unidades contratadas pelo município.

São pessoas que faziam tratamento há mais de 10 nos, que organizaram suas vidas para fazer um tratamento que ninguém quer fazer, mas se ficar um dia sem fazer, morre. Da noite para o dia, em menos de 48 horas, foram avisadas que as clínicas iriam fechar, mas a CDR diz que avisou há seis meses à prefeitura”, disse Leonardo (veja o desabafo completo aqui).


Segundo ele, muitos pacientes demoraram a aceitar e se adequar ao tratamento, que é bastante puxado, já que durante três dias na semana, quatro horas por dia, eles são conectados a uma máquina que faz o papel do rim doente. A terapia substitutiva renal leva pacientes a sofrer instabilidades na pressão arterial e muitos outros problemas.

Quem faz o tratamento, não aguenta caminhar depois de uma sessão. Alguns foram morar mais perto de uma estação de trem para ficar mais fácil se deslocar até a clínica de diálise e agora serão transferidos ao “deus-dará”. Pode ser que nesse processo, pessoas não se adaptem, não consigam fazer o tratamento e morram”, presume Leonardo.

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Procurada novamente pelo ViDA & Ação, a Secretaria Municipal de Saúde reforçou que o pagamento para as clínicas conveniadas está em dia, inclusive para a CDR Anil, e que é direito da empresa não querer mais prestar serviço para o SUS. A SMS informou ainda que contrata e paga o serviço, mas a regulação para a diálise é com a Secretaria de Estado de Saúde, de acordo com a disponibilidade de vagas.

Procurada diversas vezes pelo Portal ViDA & Ação, a Secretaria de Estado de Saúde (SES), por sua vez, não se manifestou a respeito das questões abaixo, enviadas por email e whatsapp para a assessoria de imprensa do órgão (veja as questões apresentadas pela Redação e que ficaram sem resposta). A assessoria da deputada Martha Rocha, presidente da Comissão de Saúde da Alerj, também não retornou nossos contatos.


Pacientes podem buscar transporte sanitário


Em relação ao remanejamento para unidades mais distantes, a SMS informou que o paciente pode fazer a solicitação do transporte sanitário na Unidade de Atenção Primária onde é atendido. É preciso ir na clínica da família mais próxima, onde é cadastrado, informar onde faz diálise, frequência, horários e e fazer o pedido do transporte sanitário. Os documentos que precisará apresentar serão informados no local.

No dia 20 de abril, a Secretaria Municipal de Saúde homologou o resultado da Chamada Pública para credenciamento e contratação de estabelecimentos de saúde privados interessados em participar do SUS, de forma complementar para a prestação de serviços de Terapia Renal Substitutiva. Conforme publicado no Diário Oficial do Município, foram habilitadas 16 clínicas (veja abaixo) e outras quatro foram desabilitadas: CIN – Centro Integrado de Nefrologia, Clinef – Clínica de Nefrologia Santa Teresa e duas unidades da Santa Cecília Serviços Médicos.

As 16 clínicas de Nefrologia atualmente habilitadas pelo município do Rio são: Casa de Saúde Grajaú, Centro Nefrológico de Cascadura, CDR – Clínica de Doenças renais, Clínica de Diálise São Benedito, Davita Brasil Participações e Serviços de Nefrologia, Gamen – Grupo de Assistência Médica Nefrológica, Instituto Segumed – Campo Grande, Olaria, Realengo e Santa Cruz, Nefroclin Clínica Nefrológica, Renal Vida Serviços Médicos, Renalcor Serviços Médicos, Renalvida Assistência Integral ao Renal de Campo Grande, Uni Rim Nefrologia e Productor Sistema Integrado de Saúde.

Confira a nota oficial da CDR na íntegra:

As Clínicas de Doenças Renais (CDR) existem há mais de 30 anos com o único objetivo de tratar pacientes renais e promover qualidade de vida para os portadores de doença crônica. Justamente por isso, ter que fechar uma unidade e deixar de tratar o paciente renal é uma decisão muito difícil.

O encerramento das atividades das CDRs Anil e Cascadura está ocorrendo única e exclusivamente por conta da inviabilidade financeira, gerada pela falta de reajuste da tabela SUS pelo Ministério da Saúde, que há anos está defasada e não cobre os custos do tratamento. O reembolso praticado pelo SUS é o menor da América Latina e, após anos de defasagem, inviabilizam cada vez mais a oferta de um tratamento de qualidade e segurança para o paciente nos valores praticados.

Como qualidade e segurança são premissas das unidades CDR, a decisão pelo fechamento do Anil e Cascadura é irrevogável. Ambas atendiam 85% de pacientes SUS e deixarão de existir somente após a conclusão da transferência de todos os pacientes.  

O contrato das duas unidades com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) encerrou-se em 01/05/2021 e foi cumprido integralmente com qualidade e excelência, mesmo diante da insustentabilidade econômica enfrentadas pelas unidades.

Seis meses antes do fim do contrato, as CDRs Anil e Cascadura informaram à SMS que não participariam do novo chamamento público para que as Secretarias Estadual e Municipal pudessem planejar, com tempo adequado, o remanejamento dos pacientes.

Justamente por isso, tanto a comunicação com os pacientes sobre o fechamento da unidade, quanto da transferência, foram feitas em parceria com a SMS e a Regulação Estadual, respeitando as orientações dos entes públicos responsáveis pela oferta de vagas para atendimento SUS. Reiteramos que o tratamento destes pacientes está garantido nas unidades até que haja a conclusão das transferências.

Por sua vez, o contrato da CDR Taquara com o SUS, que oferta 16% de suas vagas, também não foi renovado.

Nossas perguntas sem resposta à Secretaria de Estado de Saúde:

1 – Como, quando e para onde os pacientes serão transferidos? Quais são os critérios do Sisreg para este remanejamento? Há risco de haver alguma solução de continuidade no tratamento desses pacientes?

2 – As demais CDRs administradas pela mesma rede já informaram se também fecharão as portas ou deixarão de atender pacientes do SUS? Se positivo, quais serão as providências por parte do Estado em relação a estes pacientes?

3 – Qual é o valor repassado para cada paciente e/ou sessão de diálise pelo SUS e quantas são realizadas em média neste espaço e nos demais existentes no Estado?

4 – Quantos pacientes dialisados pelo SUS existem atualmente no Estado do Rio? Com a pandemia, aumentou a espera por pacientes renais por hemodiálise, tendo em vista que a DRC é uma das sequelas que podem ser deixadas pela Covid? Se positivo, quantos havia antes e quantos agora? E quais têm sido as providências para o atendimento adequado a este público?

5 – Há alguma possibilidade de fornecer transporte a estes pacientes que estão sendo remanejados?

6 – Esses pacientes terão prioridade na fila de vacinação da Covid no estado, visto que são mais vulneráveis à gravidade 

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