Com a chegada ao mercado da primeira caneta farmacêutica brasileira para emagrecimento, o país inicia um novo capítulo na abordagem do sobrepeso e da obesidade. A partir desta segunda-feira (4 de agosto), s farmacêutica nacional EMS começa a distribuir nas principais redes de farmácias do país as primeiras canetas emagrecedoras de produção 100% brasileira: Olire, para obesidade, e Lirux, para diabetes tipo 2.
Desenvolvida nacionalmente, a nova opção promete ampliar o acesso ao tratamento medicamentoso e reacende o debate sobre a medicalização da perda de peso. Com preços a partir de R$ 307,26, os medicamentos prometem tornar mais acessível um tratamento que vem revolucionando o mercado mundial. Para se ter ideia, Mounjaro, que chegou recentemente ao mercado nacional, chega a custar mais de R$ 2.500 por mês.
O lançamento acontece em um momento crítico para a saúde pública brasileira. Segundo dados da World Obesity Federation, cerca de 41% dos brasileiros adultos deverão apresentar algum grau de obesidade até 2035. Globalmente, o cenário é ainda mais preocupante: uma análise publicada pela revista The Lancet em colaboração com a Organização Mundial da Saúde mostrou que, entre 1990 e 2022, os dados de obesidade mais que dobraram nos adultos e quadruplicaram entre crianças e adolescentes.
Inicialmente desenvolvidas para combater a diabetes, as canetas para emagrecer vêm sendo usadas por especialistas também no combate à obesidade, um uso off label, mas que não é prejudicial à saúde. E já há canetas voltadas especialmente para a obesidade, inclusive, aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) – como é o caso de Mounjaro. Em geral, elas agem simulando a ação do GLP-1, hormônio produzido no intestino que regula a glicemia, diminui a fome e aumenta a saciedade.
Nova caneta para emagrecimento: o que muda na luta contra a obesidade?
Especialistas analisam impactos clínicos, acesso e os cuidados necessários com a nova medicação produzida no Brasil
Para especialistas em emagrecimento, o lançamento das canetas nacionais pode representar um ponto de inflexão no combate à obesidade no país, tornando mais acessível um tratamento que, até então, estava restrito a uma parcela menor da população devido aos altos custos dos medicamentos importados.
Talvez um dos fatores mais preponderantes seja a mudança dos hábitos alimentares que se observa desde os anos 1970. Com pouco tempo para comer, as pessoas deixaram de fazer as refeições em casa e passaram a optar por comidas mais rápidas e mais calóricas – normalmente, ultraprocessados. A vida urbana também limita, em tempo e espaço, a prática de exercícios físicos regulares”, explica Alessandra Rascovski, endocrinologista e fundadora da Clínica Rascovski.
Mas o que essa novidade representa, na prática, para os pacientes? Quais são as diferenças em relação a medicamentos já consagrados, como a semaglutida e a liraglutida, que revolucionaram o mercado nos últimos anos?
Para a cardiologista Priscila Sobral, especialista em longevidade e referência no tratamento metabólico de pacientes com obesidade, o lançamento da caneta brasileira é um marco relevante tanto do ponto de vista clínico quanto social.
Não apenas por ser uma produção nacional, o que pode facilitar o acesso, mas porque amplia o debate sobre a obesidade como uma doença crônica e multifatorial, que exige acompanhamento individualizado e responsável”, destaca.
Eficácia e acesso
Em relação à eficácia, Dra. Priscila esclarece que os estudos clínicos iniciais indicam resultados promissores, embora seja necessário acompanhar a aplicação na prática para comparação direta com as opções internacionais.
Ela também alerta que o preço mais acessível, um dos pontos positivos do novo medicamento, deve vir acompanhado de critérios médicos rigorosos para a prescrição.
É importante lembrar que essa medicação não é indicada para qualquer pessoa que deseje emagrecer. Ela faz parte de um protocolo médico que considera histórico clínico, comorbidades e metas terapêuticas individuais”, explica.
Revolução no tratamento da obesidade
A tecnologia por trás dessas “canetas para emagrecer” representa um marco no tratamento da obesidade. A urgência no combate à obesidade se justifica pelos graves riscos associados à condição.
As principais causas de morte em todo o planeta são doenças em que o sobrepeso tem muita participação. Por isso, a importância de entender e combater essa condição, que não é apenas individual. Quanto menor a escolaridade, por exemplo, maiores os índices. Precisamos de políticas públicas e de acesso à informação também”, ressalta a endocrinologista.
Um recurso, não um milagre
A cardiologista reforça que o tratamento com canetas injetáveis, como a nova opção brasileira, pode ser uma ferramenta útil no processo de emagrecimento, mas nunca deve ser encarado como solução mágica.
Não é só aplicar uma injeção e esperar resultados. A mudança de estilo de vida, o controle de exames e o suporte profissional continuam sendo fundamentais para um emagrecimento saudável e duradouro”, afirma.
O que esperar daqui pra frente?
A chegada de uma alternativa nacional pode, de fato, tornar o tratamento mais acessível a uma parcela maior da população. No entanto, especialistas como a Dra. Priscila Sobral chamam a atenção para a necessidade de informação de qualidade e de uma abordagem ética no uso do medicamento.
Ela destaca ainda que embora seja um marco, a substância da caneta produzida no Brasil ainda não apresenta a mesma eficácia clínica da semaglutida, presente no Ozempic e no Wegovy, e também da tirzepatida, que vem se consolidando como uma das mais potentes no tratamento da obesidade e da resistência insulínica.
O maior risco que vejo hoje é a banalização do uso dessas canetas, como se fossem soluções mágicas. Medicamentos para obesidade devem ser prescritos com base em critérios clínicos, acompanhados de exames, mudanças de estilo de vida e reeducação alimentar.”, conclui.
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O mercado das canetas emagrecedoras
Os novos medicamentos da EMS utilizam liraglutida como princípio ativo, a mesma substância presente nos famosos Saxenda e Victoza, da dinamarquesa Novo Nordisk. Atualmente, o mercado brasileiro conta com diversas opções de medicamentos injetáveis para o tratamento da obesidade, cada um com suas particularidades:
- Saxenda utiliza liraglutida e é recomendado para pacientes com sobrepeso ou obesidade, proporcionando redução média de 9% do peso corporal com aplicação diária.
- Wegovy, baseado em semaglutida, é o primeiro medicamento injetável desenvolvido especificamente para tratar obesidade, reduzindo em média 17% do peso corporal durante um ano. É indicado para adultos com IMC acima de 30 ou acima de 27 quando há comorbidades relacionadas ao peso.
- Ozempic, também com semaglutida, difere do Wegovy principalmente na dosagem e é indicado para controle glicêmico em diabetes tipo 2.
- Mounjaro e Zepbound utilizam tirzepatida e apresentam os melhores resultados em termos de perda de peso, chegando a aproximadamente 25% de redução após o tratamento completo.
Semaglutida nacional chega ao mercado em 2026
A entrada da EMS neste mercado representa um investimento de mais de R$ 1 bilhão na construção de uma fábrica de peptídeos em Hortolândia, interior paulista. A unidade tem capacidade inicial para produzir 20 milhões de canetas injetáveis por ano, com possibilidade de dobrar a produção.
Inicialmente, foram distribuídas 100 mil canetas de Olire e 50 mil de Lirux nas redes Raia, Drogasil, Drogaria São Paulo e Pacheco, nas regiões Sul e Sudeste. A empresa prevê ter 250 mil unidades disponíveis até o fim de 2024 e alcançar 500 mil unidades até agosto de 2026.
Estamos consolidando a capacidade do país de desenvolver e fabricar medicamentos de alta complexidade, com tecnologia própria e competitividade global. Este movimento fortalece nossa liderança e amplia o acesso a terapias modernas”, afirmou Carlos Sanchez, presidente da EMS.
A EMS já se prepara para o próximo grande lançamento: a semaglutida nacional, prevista para 2026, quando expira a patente da substância conhecida pelos medicamentos Ozempic e Wegovy. Este movimento consolidará a posição da empresa em um mercado que movimenta R$ 6 bilhões anuais no Brasil.
Para Iran Gonçalves Jr., diretor médico da EMS, “com a produção nacional, oferecemos alternativas seguras e de alta qualidade para o tratamento da obesidade e do diabetes tipo 2, desenvolvidas com tecnologia de ponta e em conformidade com os mais altos padrões internacionais”.
Com assessorias