A saúde mental dos jovens adultos atingiu níveis alarmantes. Pela primeira vez, a chamada “curva em U da felicidade”, que historicamente mostrava o auge da infelicidade na meia-idade, mudou: hoje, são os jovens entre 18 e 29 anos que apresentam os maiores níveis de tristeza em todo o mundo.
De acordo com o Relatório Mundial da Felicidade 2025, 19% dos jovens adultos afirmam não ter ninguém em quem confiar – um aumento de 39% em relação ao levantamento feito em 2006. Entre os motivos para essa sensação de desesperança estão a falta de suporte social e emocional associada à baixa qualidade das conexões interpessoais.
Dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), do IBGE, mostram que o Brasil segue a tendência apontada no Relatório Mundial da Felicidade: a incidência de depressão vem aumentando de forma alarmante. Entre os jovens brasileiros de 18 a 21 anos, a taxa aumentou de 2,47% para 6,23% nos últimos anos, um crescimento de 152%.
Os jovens vivem sob uma pressão constante e enfrentam ansiedade e depressão muito mais cedo. Muitos deles não acreditam mais que a juventude seja a melhor fase da vida”, comenta a psicóloga Aline Paixão, professora do curso de Psicologia do UniCuritiba, especialista em Clínica Analítico-Comportamental.
Entre os fatores destacados pelo relatório e que merecem atenção no Dia Mundial da Saúde Mental, celebrado em 10 de outubro, estão:
● Declínio das conexões sociais: 19% dos jovens não sentem que têm alguém em quem podem confiar, o que impacta negativamente seu bem-estar, equilíbrio emocional e saúde mental.
● Uso excessivo de tecnologia: horas e horas rolando o feed nas redes sociais e fazendo comparações reforçam os sentimentos de vazio e insatisfação.
● Pressão educacional e econômica: expectativas elevadas, empregos instáveis e incerteza quanto ao futuro profissional agravam a situação e elevam a ansiedade.
● Grandes eventos globais: pandemia, crises econômicas, inflação e instabilidade social aumentam a ansiedade existencial.
Déficit emocional
De acordo com especialista a confiança dos jovens vem diminuindo globalmente, mesmo em países onde a juventude, em geral, sempre recebeu suporte emocional adequado. “O uso intenso de redes sociais não reduziu a sensação de solidão. Pelo contrário, acrescentou pressão à vida dos jovens, que tentam, a todo custo, ter a suposta ‘vida perfeita’ retratada nas redes sociais.”
Mestre em Psicologia, ela avalia que os adolescentes e jovens de hoje apresentam mais sintomas depressivos e traços de ansiedade social do que os de 20 anos atrás. “A ascensão das redes sociais e o uso de aplicativos de conversa facilitam a comunicação, mas o meio digital não substitui interações presenciais de qualidade, que são cruciais para a saúde mental.”
De 2009 a 2018, o pico de infelicidade estava na meia-idade. Desde então, a tristeza aumentou entre os jovens. “Estamos diante de uma geração que já chega à fase adulta com déficits emocionais e psicológicos. Para reverter esse novo perfil geracional é urgente que os jovens recebam suporte social, educação emocional e acesso a serviços de saúde mental”, diz a psicóloga.
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8 em cada 10 estudantes relatam ansiedade e depressão
38,9% se sentem esgotados, 33,9% perdrm o sono por preocupações e 22% dse acham incapazes de superar dificuldades
O Instituto Ayrton Senna acaba de divulgar dados da Avaliação do Futuro, um dos maiores mapeamentos no Brasil sobre o impacto das competências socioemocionais no desempenho e bem-estar de estudantes da rede pública. Os resultados também revelam que o desenvolvimento socioemocional está diretamente relacionado à saúde mental dos alunos.
Oito em cada 10 estudantes brasileiros relatarem um ou mais sintomas de ansiedade e depressão em níveis altos, com 38,9% sentindo-se esgotados, 33,9% perdendo o sono por preocupações e 22% afirmando sentir-se incapazes de superar dificuldades.
Entre os sintomas mais recorrentes, o levantamento mostra:
- 38,9% relataram sentir-se bastante ou totalmente esgotados ou sob pressão
- 33,9% perderam o sono por causa de preocupações
- 20,4% disseram estar bastante ou totalmente infelizes ou deprimidos
- 22,1% perderam bastante ou totalmente a confiança em si mesmos
- 22% relataram sentir-se incapazes de superar suas dificuldades
- 7,9% afirmaram não conseguir se concentrar em suas tarefas
- Entre as meninas, 25,2% perderam bastante ou totalmente a confiança em si mesmas, contra 17,8% dos meninos
A avaliação, que integra as ações de monitoramento dos sistemas educacionais, foi realizada nos estados de Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará e Paraná em parceria com o Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (CAEd), da Universidade Federal de Juiz de Fora, e no estado do Ceará. O levantamento compõe um esforço nacional para compreender como aspectos emocionais e sociais interferem nos resultados de aprendizagem dos estudantes e na convivência escolar.
Cerca de 89 mil estudantes do Ensino Médio dos cinco estados brasileiros foram escutados. Na avaliação, foram identificadas correlações significativas entre o desenvolvimento de competências como autogestão, engajamento com os outros e resiliência e o desempenho em disciplinas como Língua Portuguesa e Matemática. Estudantes com maiores níveis de autogestão — a capacidade de planejar, persistir e lidar com desafios — apresentaram notas superiores e vínculos mais significativos com seus pares e adultos da escola.
A saúde mental é multifatorial
Esses números refletem desgastes emocionais que precisam ser olhados com cuidado. A saúde mental é multifatorial — envolve relações consigo mesmo, com os outros e com o contexto em que se vive. Tudo isso impacta a motivação e a confiança dos estudantes em suas próprias capacidades”, explica Ana Crispim, gerente de pesquisa no eduLab21, laboratório de ciências para a educação do Instituto Ayrton Senna.
Doutora em Psicologia pela University of Kent (Reino Unido) e especialista em psicometria, ela diz que entre os adolescentes, essas pressões podem ter origens diversas: desafios próprios da faixa etária, vulnerabilidades contextuais, desigualdades sociais, preocupações sobre o futuro (como a proximidade do vestibular), a convivência na escola, as expectativas familiares ou sociais e as comparações nas redes sociais.
Além disso, Crispim destaca que a escola tem um papel central nesse processo. “Além de identificar fatores de risco associados à prejuízos na saúde mental, as escolas precisam mirar em fatores protetivos como fortalecer espaços seguros, onde vínculos sólidos entre alunos e educadores favorecem a escuta, o acolhimento e o encaminhamento adequado. Programas estruturados de desenvolvimento socioemocional podem ser aliados nessa missão, ao estimular autoconfiança, engajamento, a construção de uma rede de apoio e estratégias de regulação emocional”.
O mapeamento socioemocional mostra que esses números são ainda mais altos para meninas: 25,2% relatam ter perdido bastante ou totalmente a confiança em si mesmas, em comparação a 17,8% dos meninos.
De acordo com Crispim, essa informação vai ao encontro de outras pesquisas nacionais e internacionais que mostram que meninas apresentam queda nas suas estratégias de resiliência emocional e de saúde mental desde o início da adolescência.
Sentimentos como tristeza, raiva e ansiedade tendem a ser mais complexos e difíceis para que o adolescente os administre, algo que parece ser ainda mais acentuado entre meninas. A adolescência é um período desafiador: fatores como a insatisfação com o corpo, somada à força dos padrões de beleza e das comparações e expectativas sociais, pesam no dia a dia. Por isso, o desenvolvimento de recursos e estratégias para melhor regular suas emoções e a contar com a compreensão e apoio dos adultos, fazem muita diferença nessa jornada”, explica Crispim.
Para Gisele Alves, gerente executiva do eduLab21, os dados reforçam a necessidade de olhar para a educação de forma mais ampla. “Não há bala de prata. É preciso adotar múltiplas estratégias — pedagógicas, psicológicas e sociais — para construir respostas efetivas à crise de saúde mental entre os jovens. E isso passa por políticas intersetoriais que unam educação, saúde e assistência social”, destaca
Alves lembra também que os professores são atores fundamentais nesse cenário. “Promover saúde mental na escola significa criar um ambiente onde aprender e se sentir bem caminham juntos. E isso vale para os estudantes e para os docentes, que enfrentam seus próprios desafios emocionais e precisam ter apoio nessa relação cotidiana com os alunos”.
A Avaliação do Futuro é fruto de esforços de longo prazo do Instituto Ayrton Senna e que ganha reforços a partir de sua parceria com CAEd, consolidando a liderança brasileira em estudos sobre educação baseada em evidências. Os resultados se somam a mais de uma década de pesquisas do eduLab21 que reforçam o papel das competências socioemocionais como eixo central de uma educação de qualidade e equitativa.
Autocuidado e bons hábitos
Aprender a lidar com emoções difíceis e cultivar conexões significativas são passos essenciais para atravessar esse cenário de solidão. Segundo Aline, práticas simples de autocuidado podem fazer diferença no dia a dia.
Na lista de orientações estão: reduzir o tempo de exposição às redes sociais, fortalecer vínculos presenciais, manter hábitos de sono e alimentação equilibrados e buscar apoio psicológico quando necessário. “Essas pequenas escolhas ajudam a construir regulação emocional e podem prevenir quadros mais graves.”
A professora do curso de Direito do UniCuritiba, Adriana Martins Silva, concorda com Aline e acrescenta: a crise de saúde mental dos jovens não é apenas um problema social ou psicológico, mas também um desafio legal e de direitos humanos.
Os jovens têm direito constitucional à saúde, incluindo a saúde mental. Políticas públicas, centros de atenção psicossocial e programas de prevenção ao suicídio são instrumentos legais que visam garantir esse direito”, informa a doutora em Direito.
Atendimento psicológico – O UniCuritiba oferece atendimento psicológico para adolescentes a partir de 12 anos, jovens, adultos e idosos. A Clínica Escola de Psicologia fica no Campus Milton Viana, rua Chile, 1.678, bairro Rebouças. Os atendimentos são realizados de segunda-feira a sexta-feira, das 8h30 às 21h, mediante agendamento pelo forms Agendamentos Psicologia.
Com Assessorias