Um terço da população mundial tem hepatite, inflamação no fígado provocada por fatores como medicamentos, álcool e também por infecções virais, podendo ser transmitidas pelo sangue, água e alimentos contaminados. De acordo com dados divulgados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a estimativa é que 10 milhões de pessoas estão infectadas por hepatites virais em todo o mundo. Destas, 95% não sabem que possuem a doença e menos de 1% tem acesso ao tratamento. O resultado é que 1,4 milhão morrem a cada ano.
Estima-se que no Brasil mais de duas milhões de pessoas tenham algum tipo de hepatite e de 1,4 a 1,7 milhão são portadores do tipo C, o mais grave. A doença pode ser transmitida pelo contato com sangue contaminado (transfusão de sangue e hemoderivados, sexo desprotegido e compartilhamento e objetos de uso pessoal como agulhas de tatuagem, alicates e tesouras).
Para marcar o Dia Mundial da Hepatite (28 de julho), a OMS lança a campanha “NoHep – pelo fim das hepatites virais” para mobilizar governos e sociedade com o objetivo de eliminar a hepatite viral até 2030. A ação foca no tripé prevenção, diagnóstico e tratamento. No Brasil, o Ministério da Saúde criou a campanha ‘Hepatite C – O teste pode salvar a sua vida’.
Nos últimos dois anos, mais de 5,5 milhões de testes rápidos para hepatite C foram distribuídos. Não existe vacina contra a hepatite C, mas o tratamento é eficaz e disponível no SUS. A campanha é voltada à população com mais de 40 anos de idade, faixa etária onde registra maior taxa de detecção. Essas pessoas, em geral, foram expostas a cirurgias de grande porte, transfusões de sangue, fizeram tatuagem ou uso de drogas injetáveis antes de 1993.
A campanha ainda ressalta que a hepatite C, tem tratamento e tem cura. “O diagnóstico precoce e o novo tratamento ofertado no SUS irão evitar consequências mais sérias às pessoas que vivem com a hepatite C no país, como cirrose, câncer e até mesmo a morte. Garantido pelo SUS e comprovadamente eficaz, o novo tratamento demonstra a prioridade que temos dados às hepatites no ministério”, enfatiza o ministro da Saúde, Ricardo Barros.
A ação também tem como alvo, profissionais de saúde, profissionais de estética, manicures e tatuadores, incentivando a procurar os serviços de saúde para realizar a testagem. E, em caso positivo para a doença, iniciar e completar o tratamento. “Por se tratar de uma doença silenciosa, o diagnóstico precoce é importante afim de evitar complicações futuras, como por exemplo, cirrose ou câncer“, destaca Cátia Rejânia, hepatologista do Núcleo de Gastroenterologia do Hospital Samaritano de São Paulo.
Novos medicamentos
O Ministério da Saúde anunciou que vai superar a meta de distribuir 30 mil tratamentos para hepatite C no último ano. Desde 2015, foram enviados para todo o país 23.599 tratamentos, sendo que outros 6.925 tratamentos já foram aprovados e serão encaminhados aos estados nas próximas semanas. Uma nova compra de 35 mil novos tratamentos já está em andamento para distribuição até final de 2016. Apenas no primeiro semestre deste ano, mais de 15 mil pessoas já foram beneficiadas.
No total para, são 30.524 tratamentos, o que supera a meta estabelecida ano passado. Este montante teve um investimento de R$ 1,028 bilhões. A nova compra de medicamentos, que está em finalização no Ministério da Saúde, oferecerá 35 mil tratamentos. “Vamos continuar essa política que o Brasil sempre foi protagonista, ampliando acesso. Evidentemente queremos disponibilizar a terapia a todos e continuaremos com um esforço muito grande de economia no Ministério para fazermos muito mais com o recurso disponível”, ressaltou o ministro da saúde, Ricardo Barros.
O que é e como se manifesta
“Hepatite é uma inflamação do fígado, que pode ser causada por vírus ou bactéria, ou uso excessivo de medicamentos, álcool e outras drogas, além de doenças autoimunes, metabólicas e genéticas”, explica o gastroenterologista Moacir Augusto Dias, do Seconci-SP (Serviço Social da Construção). Segundo ele, os principais sintomas são mal estar, dor abdominal (principalmente no lado direito do abdômen), febre, dor de cabeça, cansaço, vômitos, pele e olhos amarelados (icterícia), coceira pelo corpo, urina escura e fezes claras.
De acordo com a Associação Brasileira de Portadores de Hepatite (ABPH), as hepatites virais são um dos maiores problemas mundiais de saúde, e matam duas vezes mais do que a Aids. “O nosso desafio é diagnosticar a presença do vírus e conter a doença antes dos danos que ela acarreta ao fígado. As mais graves doenças do fígado são causadas pela hepatite C, entretanto, apenas 5% dos portadores da doença estão diagnosticados”, explica Humberto Silva, presidente da ABPH.
O patologista clínico Helio Magarinos Torres Filho, que também é diretor médio do Richet Medicina & Diagnóstico, explica que na maioria dos casos, as hepatites virais apresentam sintomas bem característicos e os exames laboratoriais servem para complementar o diagnóstico clínico. Exceções acontecem em casos de infecção pelo vírus hepatite B (HBV) que pode, em raros casos, cursar de forma assintomática, mas o paciente pode transmitir a doença. “No caso da hepatite C, os casos de infecção assintomática são mais frequentes. Por isso a importância dos exames diagnósticos”, destaca.
Conheça os tipos de hepatite
Atualmente, são conhecidos mais de cinco tipos de hepatites virais, sendo as mais comuns as A, B, C e D. Destas, apenas duas podem ser prevenidas pela vacinação: as dos tipos A e B. O diagnóstico de infecção por hepatites virais pode ser feito através de diversos exames.
Hepatite A e E: A transmissão pode se dar pelo contato com saliva e fezes da pessoa contaminada ou por meio da ingestão de água e alimentos contaminados. As hepatites A e E não se tornam crônicas, apesar de poderem levar à morte por insuficiência hepática em alguns casos. A infecção dura de 10 a 50 dias. Quando aparecem, os sintomas mais comuns são: febre, pele e olhos amarelados, náuseas e vômitos, desconforto abdominal, falta de apetite, urina escura e fezes esbranquiçadas. Uma vez infectada, a pessoa desenvolve imunidade. A prevenção pode ser feita através da vacinação, higiene pessoal, melhorias das condições sanitárias, tratamento adequado da água e consumo de alimentos bem cozidos. é aconselhável manter as mãos limpas, beber água filtrada e ingerir frutas e verduras que tenham sido higienizadas em uma solução contendo água sanitária.
Hepatite B: É transmitida pelo sangue, por relações sexuais sem proteção e compartilhamento de objetos de uso pessoal cortantes que estejam contaminados, como lâminas de barbear, escovas de dente, equipamentos de manicure, agulhas, seringas, equipamentos de tatuagem e piercing, além de agulhas de acupuntura. A hepatite causada pelo vírus B tende a ser assintomática, por isso, grande parte dos infectados só descobre após anos, muitas vezes por acaso. O tempo médio de incubação do vírus é de 90 dias. Pode também passar de mãe para filho no momento do parto. A prevenção é feita através da vacinação. Este tipo evolui para doença crônica em 5% a 10% dos casos, podendo levar à cirrose hepática.
Hepatite C: Tem transmissão semelhante à hepatite B, através de com sangue contaminado que pode estar presente em objetos de uso pessoal sem esterilização, via transfusões, dentistas, manicure, tatuagens, colocação de piercings, uso de drogas, relações sexuais etc. Pode permanecer assintomática por um período bastante variável de tempo, décadas em alguns casos. Ainda não existe vacina para hepatite C. Para prevenir, evite uso de materiais cortantes ou agulhas que não estejam devidamente esterilizados e utilize objetos descartáveis bem como material próprio em manicures. A hepatite C atinge o quadro crônico na maioria das pessoas (70% a 80% das infecções), evoluindo para cirrose hepática e para câncer do fígado. A principal forma de se prevenir é praticar sexo seguro, usar preservativo nas relações sexuais e não ter contato com sangue contaminado. Não existe vacina.
Hepatite D: O vírus da hepatite D se manifesta na presença do vírus do tipo B e sua forma de transmissão é a mesma do vírus B, bem como as maneiras de evitá-la. A infecção concomitante acelera a progressão da doença crônica. A vacinação contra a hepatite B também protege de infecção com a D.
Doença hepática alcoólica: O consumo em excesso de bebidas alcoólicas pode causar a doença hepática alcoólica, já que é o fígado o principal responsável por metabolizar a substância. Quando o álcool é processado, o órgão produz substâncias altamente tóxicas que podem provocar três tipos de lesões hepáticas: acúmulo de gordura (fígado gordo), a inflamação (hepatite alcoólica) e o aparecimento de cicatrizes (cirrose).
Hepatite medicamentosa: É uma grave inflamação do fígado causada pelo uso de remédios em excesso ou porque a pessoa tem hipersensibilidade a certos medicamentos, como se fosse uma reação alérgica do fígado manifestada na forma de hepatite.
Usuários de drogas injetáveis e transfusões de sangue
De acordo com a Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH), a hepatite C é muito frequente entre usuários de drogas injetáveis. Porém, atualmente, há uma queda desse contágio, devido à popularização do crack, que não é uma droga injetável. A hepatite B é a mais prevalente no Brasil, principalmente na Amazônia e no oeste de Santa Catarina e Paraná – nestes últimos locais atribui-se à colonização italiana, pois a hepatite B foi endêmica na região mediterrânea no passado.
Já a hepatite A é mais comum nos locais com baixas condições sanitárias e água não-tratada, enquanto a hepatite E, que representa pouco mais de 2% dos casos, é pouco estudada no país, mas ainda não há um estudo com abrangência nacional. Um paciente que recebe um sangue contaminado com hepatite via transfusão pode desenvolver uma hepatite viral. No Brasil, o risco de hepatite transfusional, por HBV ou HCV, é muito baixo, pois há anos não se relata um caso confirmado, em parte pelo esforço investido na triagem sorológica e molecular.
Segundo o virologista José Eduardo Levi, membro do Comitê de Doenças Infecciosas Transmitidas por Transfusão da ABHH, até pouco tempo, se dispunha de um arsenal terapêutico limitado e de baixa eficácia contra o HCV, além de muitos efeitos colaterais. Nos últimos anos, o especialista recorda que houve uma verdadeira revolução com o desenvolvimento de drogas muito eficientes e bem toleradas, antivirais específicos que em pouco tempo de tratamento levam a cura. “O maior problema ainda é o custo destes novos medicamentos”, ressalta o virologista.
Recomendações importantes
- Manter boas práticas de higiene pessoal;
- Lavar bem e cozinhar os alimentos;
- Usar preservativos e seringas descartáveis;
- Utilizar equipamentos de proteção para quem trabalha com materiais como tintas;
- Fazer exames periódicos;
- Evitar automedicação – remédios somente com prescrição médica;
- Não ingerir remédios e chás caseiros.
Fontes: Richet Medicina & Diagnóstico e Seconci-SP