relacionamentos

Vimos por aí muitos relacionamentos iniciando e terminando com tamanha velocidade que até assustamos. A dificuldade em se estabelecer vínculos parece ter se tornado um grande desafio da atualidade, em todos os sentidos. E não seria diferente na hora dos relacionamentos afetivos. Mas o que determina o tempo e a intensidade de um relacionamento? Por que cada vez mais as pessoas estão tendo relacionamentos superficiais e instantâneos? Neste artigo para o Blog Vida & Ação, o psicólogo Nicolau José Maluf Jr. analisa os amores contemporâneos, a repressão afetiva e a incapacidade de amar, cada vez mais comuns em nosso tempo.

“Não é novidade para ninguém que as relações afetivas têm se mostrado mais transitórias e pouco duradouras. Se de um lado o “casamento compulsivo”, aquela obrigatoriedade de manter uma relação já esvaziada de amor e de desejo, deixou de ser uma imposição moral e legal–  as pessoas divorciadas não são mais vistas, já há alguns anos, como estranhas no ninho, ou “erradas”. Também é fato que não só entre os mais jovens a possibilidade ou a escolha de criar e manter um vínculo duradouro tem sido substituída pela transitoriedade.

Se até o final dos anos 60 a questão era a repressão sexual a questão de hoje em dia é a “repressão afetiva”. Até uns 60 anos atrás as coisas eram feitas para durar. Literalmente. Se um aparelho, uma máquina quebrava, era levada ao conserto. Hoje, o consumidor é como que obrigado a comprar outro, e isso acelera o consumo. E os lucros, claro. As coisas tornam-se descartáveis. Transferindo  dos produtos para as relações, o novo, a “novidade” passa a ser referência de valor, e a ser priorizado. E as pessoas e relações também passaram a ser descartáveis.

Não que a duração, a permanência numa relação seja por si só marca ou  registro de algo positivo. Claro que não.  Muitas vezes encontramos  parceiros e parceiras que se detestam, que mantém um casamento de “fachada”, que só permanecem juntos por razões neuróticas, religiosas, ou econômicas. Ou por medo da solidão.

Passamos, todos nós, quando somos crianças, por experiências afetivas que deixam marcas, registros, que determinam em grande parte nossa maneira de ver as coisas e viver a vida quando finalmente somos adultos. Algumas dessas experiências irão constituir o núcleo  daquilo que é conhecido como “neurose”. A configuração desses registros é que surge como personalidade. Um jeito de ser no mundo.

Assim, quando examinamos a incapacidade de amar, vemos que não é somente a influência de fatores externos às pessoas, fatores de mercado por exemplo, que marcam o modo de agir  em geral. Se é verdade de um lado que relações passaram a ser “coisificadas” e vividas como se fossem mercadoria a ser consumida, também é verdade que há fatores psicológicos que estruturam internamente essas influências nas pessoas.

Os valores e costumes de um determinado tempo são “introjetados”, tornam-se parte da própria pessoa, através da conexão ( inconsciente) com elementos da psicologia de cada um. Não é mais necessário haver um agente externo demandando alguma coisa. Quantos homens impotentes e quantas mulheres frígidas a repressão sexual causou?

Com a modificação dos costumes e do mercado de trabalho, comportamentos que antes eram vistos negativamente passam a ser aceitáveis, e até desejáveis. Mas há certas ansiedades mais profundas, da natureza humana e da vida emocional, que simplesmente  mudam de lugar e permanecem. Essas ansiedades é que surgem agora como “medo de envolvimento”, mesmo que na aparência se apresentem como exercício de liberdade.

Hoje em dia,  quantos homens e mulheres são afetivamente impotentes? Muitas vezes encontramos comentários sobre como  o desenvolvimento da tecnologia, por si só, teria contribuído para um aumento das possibilidades de contato entre as pessoas, e com isso favorecido “traições” virtuais e coisas do gênero. É verdade que com a globalização e o desenvolvimento da tecnologia, houve estímulo para um “atravessar fronteiras” um abandono dos valores mais tradicionais.

Não é a tecnologia em si o problema. Se a pessoa passa a se conhecer melhor, ela lida melhor com isso no plano pessoal. “Conhece-te a ti mesmo”, frase atribuída a Sócrates  (ou Pitágoras). Mas a frase completa na verdade é: “conhece-te a ti mesmo e assim conhecerás os deuses e o universo” . Uma interpretação possível naquilo que nos interessa no momento é a de que alguém, ao se conhecer mais profundamente, também terá ensejo de saber reconhecer, conhecer, mais vigorosamente, o  outro.

* Nicolau José Maluf Jr. Psicólogo, analista reichiano, Doutor em História das Ciências, Técnicas e Epistemologia pelo HCTE/UFRJ.

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