A desigualdade racial está presente também no acesso de idosos aos cuidados de uma pessoa contratada. Antes da pandemia, 8% (1.840.000) dos domicílios brasileiros com idosos tinham pelo menos um com alguma limitação funcional para realizar atividades básicas da vida diária – tais como tomar banho, ir ao banheiro, vestir-se, andar em casa de um cômodo para outro ou deitar-se. Ou seja, alguém que precisa de cuidados.

Em 72% dos casos, essa ajuda era dada por alguém não contratado (familiar ou próximo), e em apenas 28%, por cuidadores profissionais. Entre os que se declararam brancos, 40% eram auxiliados por esse tipo de profissional. O percentual foi bem menor entre os idosos que se autodeclararam pardos (17,5%) e entre os que se declararam pretos (10%).

Estas são novas conclusões da ConVid – Pesquisa de Comportamentos, coordenada pelo Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict/Fiocruz), que tem buscado investigar como a Covid-19 tem afetado a vida dos brasileiros. Segundo Dalia Romero, integrante da equipe da pesquisa e coordenadora do Grupo de Informação em Saúde e Envelhecimento (Gise), da Fiocruz, existem diversos aspectos de desigualdade no cenário analisado. 

Se apenas 10% da população idosa que se declarou preta recebia auxílio de um profissional, isso significa que em 90% dos casos a responsabilidade recai sobre os próprios familiares, quase sempre mulheres. Algumas inclusive precisam trabalhar como cuidadoras, o que as torna muito vulneráveis durante a pandemia. É um encontro de extremos da vulnerabilidade. São mulheres negras e pobres, que atuam como cuidadoras de um familiar ou como contratadas”, analisa.

No Brasil, cuidadores de idosos também estão em situação de muita vulnerabilidade. Dados da pesquisa mostraram que em 56% dos domicílios em que havia um idoso assistido por um cuidador, o profissional continuou trabalhando durante a pandemia, sem poder fazer isolamento. Esse percentual é de 76% nos domicílios de maior renda per capita. Não se tem informação se cuidadores dispensados na pandemia ficaram sem renda nem vínculo de trabalho.

Os primeiros resultados da ConVid já foram divulgados, e apontam por exemplo para o fato de que mais da metade dos idosos sem vínculo empregatício perdeu renda durante a epidemia. A investigação é coordenada pelo Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict/Fiocruz), em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidade Estadual de Campinas.

A amostra da ConVid foi calibrada por meio dos dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios (Pnad, 2019) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para obter a mesma distribuição por Unidade da Federação, sexo, faixa etária, raça/cor e grau de escolaridade da população brasileira. A pesquisa segue em andamento.

Fiocruz pesquisa saúde dos idosos frente à pandemia de Covid-19

O Grupo de Informação em Saúde e Envelhecimento (Gise), ligado ao Icict/ Fiocruz, está convidando gestores e pesquisadores a compartilhar experiências e informações sobre o enfrentamento da Covid-19 em relação à saúde da população idosa. A ação pretende mapear e compartilhar produtos e estratégias, formulados pelos profissionais de saúde de diversas regiões do país, orientadas ao cuidado de idosos frente à pandemia. A iniciativa é uma parceria com a Universidade da Maturidade, um programa da Universidade Federal do Tocantins.

Podem ser enviadas cartilhas, estudos, estratégias, notas técnicas e propostas, que serão reunidas no Ambiente Virtual de Estratégias e Produtos para Prevenção, Tratamento e Cuidado de idosos frente à Covid-19.

Será uma ferramenta de utilidade pública, que pretendemos desenvolver com a ajuda de diversos setores sociais. A ideia é identificar, organizar e dar visibilidade ao material que tem sido produzido sobre o cuidado com os idosos em tempos de pandemia, e também expor o que está invisível. Apesar de os idosos constituírem cerca de 70% dos óbitos por Covid-19, a proporção de material e recursos direcionados a este setor é pequena”, afirma a coordenadora geral do projeto e pesquisadora da Fiocruz, Dalia Romero.

Segundo ela, 50% da população idosa no Brasil é composta por analfabetos funcionais, o que se torna um fator de preocupação especialmente no momento em que “a pandemia está se interiorizando, chegando à área rural, e também às favelas, atingindo pessoas com maior vulnerabilidade”. 

Segundo a pesquisadora, a proposta tem como objetivo divulgar essas iniciativas em redes de profissionais de saúde e também para os demais interessados, por meio do lançamento de um portal. Os materiais identificados serão organizados com base em critérios como temáticas, estratégias de intervenção, lugar de origem da proposta, público-alvo, entre outros, buscando promover maior visibilidade às distintas produções existentes no território nacional, desenvolvidas em uma conjuntura de pandemia.

Esses conteúdos poderão ser usados por familiares, pelos próprios idosos, por agentes comunitários. A ideia é criar um ambiente virtual acessível de forma simples e amigável, utilizando informações coletadas na internet, mas principalmente com o que esperamos receber a partir desse convite que estamos fazendo a todos os gestores e trabalhadores da área de saúde do idoso no Brasil inteiro”, explica.

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