Dados do Mercado Toxicologia Forense, estudo do Laboratório Pardini, com base em informações do Serpro de 2016 a 2023, apontam que a cocaína se mantém como a principal substância encontrada na maioria dos exames toxicológicos de motoristas de veículos pesados no Brasil. Cerca de 80% dos resultados positivos contêm a presença de cocaína. Outros 20% são de opiáceos, maconha e anfetamina. 

O chamado ‘rebite’, por exemplo, é uma droga barata e muito usada pelos caminhoneiros que precisam dirigir durante várias horas seguidas sem descanso. São, na verdade, anfetaminas, drogas estimulantes da atividade do sistema nervoso central, que fazem o cérebro trabalhar mais depressa, deixando as pessoas com menos sono, elétricas.

“Motoristas de veículos de grande porte, no geral, utilizam substâncias estimulantes, como a cocaína e a anfetamina, para se manterem acordados. Ambas estimulam o sistema nervoso central, inibindo o sono. Com essa estimulação artificial causada por essas substâncias, o motorista acredita que conseguirá trabalhar mais horas”, diz o médico toxicologista Alvaro Pulchinelli Jr, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML).

‘Um problema de saúde pública’, alerta médico

Para o especialista, que atua como diretor técnico na Toxicologia Forense do Grupo Fleury, a questão pode e deve ser tratada como um problema de saúde pública, uma vez que não estamos apenas falando de acidentes de trânsito, mas também da saúde dos motoristas.

“Essas substâncias podem atuar no sistema nervoso central do indivíduo, provocando alterações psiquiátricas, cardiológicas, aumento da pressão, aumento da frequência cardíaca, entre outras coisas. Sem contar com o risco de se viciar. Estamos falando de um problema que vai além da decisão do motorista de usar ou não a substância, influenciando também em sua saúde, na saúde dos outros usuários da rodovia e nas pessoas ao seu redor”, explicou.

Durante encontro realizado pelo Grupo Fleury na última quarta-feira (30), ele explicou que não dá para prever quem desenvolverá a dependência química, assim como ocorre com o álcool. Por isso, o exame toxicológico é fundamental para diagnosticar as condições dos motoristas que trafegam nas estradas brasileiras.

Apenas um contato com droga não garante resultado negativo

Segundo Pulchinelli, o consumo eventual de drogas também não garante que deixará de ser detectado no exame toxicológico de larga janela.

“Quanto maior a frequência e contato com as drogas mais fácil detectar, mas não é garantia que um único contato em um prazo de três meses antes do exame não significa que o motorista está absolutamente limpo e isento de problemas. Cada organismo metaboliza a droga de maneira diferente, pode positivar o exame se o metabolismo for mais lento. Portanto, não é seguro apenas um contato. A única forma é não ter contato nenhum com as drogas”, enfatizou.

Ainda segundo o médico, não existe droga pior. “Álcool, cocaína, maconha. Não existe droga mais ou menos pior, todas são perigosas. Uma única dose de álcool já aumenta chances de acidentes com lesão corporal, como apontam estudos. Todas elas são perigosas para condução de veículo motor e são deletérias à saúde”, enfatizou.

De acordo com Alvaro Pulchinelli, os exames toxicológicos desempenham um papel crucial na promoção da segurança viária, assegurando que os motoristas profissionais estejam livres de substâncias que podem comprometer suas habilidades ao dirigir.

“O teste é projetado para procurar substâncias estimulantes, como cocaína, anfetamina, metanfetamina, ecstasy, bem como substâncias depressoras do sistema nervoso central, como maconha e os opióides, ou seja, substâncias psicoativas que não permitem que o usuário delas estejam em plenas condições de conduzir veículos de grande porte com a capacidade integral e a responsabilidade exigidas”, explicou.

Segundo ele, a medida também protege os outros usuários das rodovias (motoristas passageiros, pedestres) bem como propicia menor impacto sobre o sistema de saúde com menos acidentes e sequelas.

“Os exames laboratoriais evoluíram consideravelmente, garantindo maior eficácia na identificação dessas substâncias, proporcionando assim uma avaliação mais abrangente da condição dos motoristas”, ressaltou.

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Quais são as substâncias detectadas no exame?

Segundo as exigências dos órgãos reguladores, Ministério do Trabalho e Contran, as seguintes drogas devem ser testadas nos exames toxicológicos de larga janela de detecção:

cocaína e derivados

maconha e derivados

anfetaminas (esctasy, rebite, bolinhas)

metanfetaminas( “Ice”, “Speed”, “Cristal”, “Cranck” etc.)

MDMA e MDA,

Anfepramona

Mazindol

Fempropore e

opiáceos (codeina e morfina).

Como é feito o exame toxicológico de larga janela?

exame toxicológico de larga janela detecta o usuário regular de drogas que pode comprometer a capacidade do condutor de dirigir sob efeito da mesma ou sofrendo as consequências da abstinência. O exame é destinado à verificação do consumo, ativo ou não, de substâncias psicoativas, com análise retrospectiva mínima de 90 dias.

Com validade de 30 meses, o exame toxicológico de larga janela de detecção é capaz de identificar a presença dessas substâncias com base na análise de amostras de queratina em cabelos e pêlos do corpo, com alto nível de precisão. A janela de detecção precisa de substâncias ilícitas pode ocorrer por um período de até 90 dias após o uso da substância, mas pode chegar a 180 dias.

Sem falso-positivo, o exame detecta substâncias psicoativas com base na análise de amostras de queratina em cabelos e pelos do corpo, com alto nível de precisão. A queratina (presente nos cabelos, pelos e unhas) propicia uma maior janela de detecção das substâncias psicoativas.

Ocorre que quando uma droga é consumida ela vai para a corrente sanguínea e acaba por nutrir os bulbos capilares. Nesse momento, pequenas quantidades de moléculas das drogas consumidas são “aprisionadas” pela estrutura de queratina que está sendo formada.

Cabelo não é puxado nem arrancado, diz médico

A coleta do exame é um procedimento simples, rápido, não invasivo e indolor. A rede especializada da Toxicologia Pardini, por exemplo, possui mais de 12 mil profissionais treinados, exame é feito a partir da análise de uma pequena amostra de 3cm do cabelo da cabeça ou pelo corporal – a unha também pode ser analisada.

No laboratório, são coletas mechas finas de cabelo, em torno 3 cm rente à raiz. Não é preciso arrancar ou puxar o cabelo. Na hora do exame, a área a ser coletada é raspada. Para este tipo de amostra a janela de detecção é de 90 dias.

Caso o comprimento do cabelo do condutor não seja suficiente, a coleta será de amostra de pelos retirados do peito, pernas, braços ou axilas. Para este tipo de amostra, o período de detecção é de aproximadamente 180 dias.

A amostra é acondicionada em kits apropriados para envio ao laboratório de análise que são transportes por uma logística especializada, rastreada e monitorada dentro de um processo forense que permite total segurança de transporte. O material coletado segue para rigorosa avaliação, por dois métodos considerados altamente eficientes.

“O exame é feito a partir da extração da amostra de cabelo ou pelo, em quantidade média de 10mg. O cabelo é cortado ou raspado, não arrancado nem puxado. A amostra é medida e colocada em envelope metalizado, fechado na frente do condutor, que assina com código de barras. Em seguida, o material é enviado para o laboratório, onde se retira o nome da pessoa e deixa somente o código”, explica Alvaro Pulchinelli Jr.

Exame descarta uso de canabidiol, anabolizante, álcool e antidepressivos

No laboratório, a amostra é aberta por um técnico identificado e passa por dois métodos. Durante o exame, o cabelo é triturado e a substância dissolvida, com uso de um aparelho chamado espectrometria de massas. O médico explica que “o aparelho fornece o DNA da molécula, de forma inequívoca”. Em seguida, repete-se outro exame em espectrometria de massas mais sensível.

“A revisão do processo é toda de forma digital, e depois o laudo é liberado o laudo para o cliente”, completa. O prazo de entrega do exame é, em média, de 48 horas (para resultados negativos) a partir da chegada da amostra na planta produtiva do Toxicologia Pardini, em Minas Gerais.

O uso de produtos como gel, shampoo, condicionador ou tintura não influencia o laudo do exame. Também o consumo de energéticos, antidepressivos, álcool, anabolizantes, calmantes e similares não é levado em consideração na análise do material.

“Da mesma forma, se o condutor usa canabidiol (maconha medicinal), o exame consegue determinar a diferença para a maconha recreativa”, esclarece o médico. 

Resultado positivo dá suspensão da carteira por 3 meses

De acordo com a legislação do Contran, os prazos dos exames toxicológicos para exames de CNH são no máximo de 15 dias da coleta do exame. Os dados da data de coleta e do resultado são encaminhados diretamente para o Registro Nacional de Carteira de Habilitação (Renach).

De posse do resultado, o condutor possa dar prosseguimento às demais etapas da sua habilitação no Detran. Se o resultado for positivo, o condutor ficará com a habilitação suspensa por três meses e deverá fazer a contra prova no mesmo laboratório ou aguardar 90 dias para realizar um novo exame.

Condutores das categorias C (caminhões), D (vans e ônibus) e E (carretas), que não tenham realizado o exame toxicológico periódico (a cada 2 anos e meio), e estiverem dirigindo com o exame vencido – exercendo ou não atividade remunerada – são punidos com a chamada multa de balcão, no valor de R$ 1.467,35 e penalidade gravíssima de 7 pontos na carteira nacional de habilitação.

Mais sobre o exame de Toxicologia

  • exame toxicológico de larga janela de detecção verifica o consumo, ativo ou não, de substâncias psicoativas com análise retrospectiva mínima de 90 dias;
  • Ele precisa ser atualizado a cada 30 meses por motoristas das categorias C, D e E, que dirijam ônibus ou caminhões, por exemplo;
  • É possível verificar a situação por meio do aplicativo Carteira Digital de Trânsito (CDT);
  • A Senatran também usa o sistema de notificação eletrônica para alertar, com 30 dias de antecedência, o vencimento do prazo para a realização do teste, bem como as penalizações decorrentes de sua não realização.

Brasil tem apenas 15 laboratórios credenciados à Senatran

De acordo com Renato Fernandez, head de negócios da Toxicologia Pardini, exames toxicológicos de larga janela passaram a ser oferecidos em 2021 no Brasil, inicialmente nas Forças Armadas, depois na Aviação Civil e, finalmente, chegaram ao trânsito brasileiro. Ao todo, 23 milhões de exames foram feitos até hoje – excluindo o das Forças Armadas, que tem regulação própria.

O teste é realizado apenas por laboratórios credenciados pela Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran). Atualmente, são 15 laboratórios autorizados e reconhecidos pelo alto padrão de qualidade, por meio de acreditações nacionais e internacionais. O Toxicologia Pardini, laboratório do Grupo Fleury, é um deles e já emitiu mais de 3,5 milhões de resultados em dois anos.

Primeiro e um dos principais laboratórios do mercado de toxicologia forense no Brasil, com mais de 15 anos de experiência, o laboratório conta com mais de 7 mil pontos de coleta em mais de dois mil municípios em todos os estados do país, por meio de unidades próprias das marcas do grupo e do Lab-to-Lab Pardini.

Preço do exame caiu a menos da metade, mas motoristas não fazem

Ainda segundo Renato Fernandez, desde 2021, o preço do exame toxicológico para motoristas vem caindo. Era R$ 330 e passou para R$ 130, facilitando o acesso. Bem mais barato que a multa por infringir essa norma, que chega a quase R$ 1,5 mil.

Isso sem considerar a diferença de preço nos combustíveis de 2016 até hoje. Na moeda do diesel (o combustível usado pelos caminhões), o valor do exame era equivalente a 110 litros e hoje representa apenas 22 litros. “O problema não é preço, nem informação”, completou o coordenador do SOS Estradas.

Fernandez lembra que o uso de drogas na direção afeta dezenas de milhares de pessoas no Brasil, ocorrendo também com motoristas de carteira D (ônibus e vans), inclusive na área urbana.

“Atualmente, taxistas não são considerados na mesma exigência do exame toxicológico, já que estão ligados a leis municipais. Mas algumas capitais já estão interessadas em implementar o mesmo sistema, como Porto Alegre e Belo Horizonte”, ressalta.

Exame toxicológico no Brasil é referência mundial

Para Alessandro Ferreira, diretor do Grupo Fleury, o exame toxicológico não foi criado apenas com caráter punitivo, para estigmatizar o profissional das estradas, mas para gerar segurança para as famílias, para os trabalhadores. “São profissões em condições adversas. Portanto, a introdução do exame melhora as condições de trabalho”, comenta.

Ele acrescenta ainda o impacto econômico de acidentes nas estradas, que é muito superior à perda da carga pelas transportadoras.

“Grandes acidentes envolvendo ônibus e caminhões geram impacto no SUS e na Previdência Social. Motoristas terão que parar de trabalhar, serão aposentados, assim como as vítimas. Um acidente que fecha a Dutra por 4 a 6 horas, por exemplo, gera um impacto muito grande na vida das pessoas”.

Ainda de acordo com Ferreira, a exigência do exame toxicológico de motoristas de veículos pesados no Brasil é um dos três programas ligados a saúde que são referência mundial. Os outros são o PNI – Programa Nacional de Imunização, que serve de benchmarking para o mundo, inclusive para países mais desenvolvidos, e a Triagem Neonatal, o chamado Teste do Pezinho, que avalia doenças raras em recém-nascidos.

Mais números do Mercado Toxicologia Forense*

  • O Brasil tem cerca de 11.4 milhões de motoristas profissionais
  • Existem no mercado mais de 15 mil laboratórios de atendimento a esse público
  • Os estados com o maior índice de positividade são: São Paulo (63.200), Minas Gerais (30.900) e Paraná (22.700)
  • Os usuários são, na grande maioria homens, entre 38 e 39 anos

*Dados totais de Mercado CNH – Serpro 2016 a 2023 (Fonte: Fleury)

Com informações do Grupo Fleury e SBPC/ML

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